terça-feira, 26 de abril de 2011

CONGRESSO

Visão sombria sobre o código

Estudo da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência aponta uma série de potenciais prejuízos ambientais no texto em análise na Câmara Fonte: correioweb.com.br 26/04

Se a revisão do Código Florestal proposta pelo relator, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), for aprovada sem alterações pelos deputados, o país perderá nos próximos anos pelo menos 83 milhões de hectares de áreas de preservação, reduzirá em 31% a já deficiente preservação nas margens de rios e encostas e não resolverá um dos principais problemas decorrentes do desmatamento desenfreado: os deslizamentos de terras. O quadro foi traçado por um estudo da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC) realizado por 12 pesquisadores e divulgado ontem. Os estudiosos reuniram mais de 300 trabalhos científicos para rebater os principais pontos propostos por Rebelo para alterar o código. De acordo com a entidade, seriam necessários ao menos mais dois anos de estudos para se chegar a uma legislação minimamente sustentável.

Os cientistas publicaram o estudo para pressionar o Congresso a adiar a votação do Código Florestal. Analisado desde setembro de 2009 na Câmara, a revisão da lei ambiental estará pronta para ser votada no fim da semana e encontra acolhida em diferentes setores do governo. “É a primeira vez que o Brasil aprovará um código ambiental sem ciência. Deveríamos dar um passo à frente. Em dois anos, teremos condições de um acordo mais sustentável”, defende a presidente da SBPC, Helena Nader.

O relatório elaborado pela entidade elenca pelo menos quatro pontos críticos do relatório preliminar de Rebelo — o texto final ficará pronto, provavelmente, no fim da semana. A SBPC critica a diminuição da proteção nas margens de rios; a possibilidade de redução das reservas legais que cada propriedade rural deve observar; a falta de critérios de preservação em áreas urbanas; e o critério de compensação das áreas desmatadas (veja quadro). De acordo com os cientistas, o principal problema do relatório é não considerar inovações tecnológicas que permitem o aumento da produtividade e o mapeamento das áreas de risco em encostas nos centros urbanos.

Margens de rios
Além de criticar a proposta de Rebelo, o estudo cita que o próprio código vigente tem lacunas. Uma delas é a proteção mínima às margens de rios, de 30m. Em locais como a Amazônia, o espaço ideal chegaria a 400m. O mínimo proposto pela nova legislação deveria ser superior a 100m, defendem os pesquisadores. As áreas de brejo, que representam 17% das propriedades rurais, também necessitariam de proteção, mas não são mencionadas.

O estudo ainda rebateu a argumentação ruralista de que o espaço para produção é insuficiente devido à alta extensão de terras protegidas ou sob demarcação indígena. “O Brasil tem terra de sobra e várias áreas utilizáveis a serem recuperadas. Não é verdade dizer que não há terra porque índios e APPs dominam a maior parte do território. Só por conta da erosão do solo, perdemos R$ 9 bilhões”, diz Antônio Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa).

Criticados por protelar a entrega do estudo, os cientistas alegam que não foram chamados a participar das discussões. “Se chegássemos sem ser convidados, diriam que estávamos fazendo lobby”, afirma Nobre.

Rebelo tem reunião hoje com os ministros Izabella Teixeira (Meio Ambiente), Afonso Florence (Desenvolvimento Agrário), Wagner Rossi (Agricultura), além de lideranças dos partidos e o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS). O grupo espera fechar os últimos pontos do acordo para votar o relatório na semana que vem, provavelmente na quarta-feira, dia 4. Procurado pela reportagem, o relator não retornou os pedidos de entrevista.

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ENTREVISTA CARMEN REINHART

Países desenvolvidos terão anos sem brilho, com crescimento fraco

ECONOMISTA QUE ESTUDOU CRISES APONTA QUE ENTRADA DE CAPITAL EXTERNO PODE SER PERIGOSA A EMERGENTES

RAIO-X
CARMEN REINHART

IDADE E ORIGEM
55 anos, nascida em Havana (Cuba), mudou-se para os Estados Unidos aos dez anos

CARGO ATUAL
Economista do Peterson Institute for International Economics, em Washington

FORMAÇÃO
Bacharel em economia pela Florida International University; Ph.D pela Universidade Columbia Fonte: folha.uol.com.br 25/04


A crise global como vimos em 2008 e 2009 chegou ao fim, mas a "sombra" dela ainda vai permanecer por muitos anos.
Uma das consequências é que os países ricos, como os Estados Unidos, deverão ter anos sem brilho, com baixo crescimento.
Essa é a opinião de Carmen Reinhart, uma das mais importantes economistas americanas e autora, ao lado de Kenneth Rogoff, do elogiado livro "Oito Séculos de Delírios Financeiros", em que analisam diversas crises ao longo do tempo.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

Folha - Nos últimos meses, os mercados, especialmente nos EUA, têm se comportado como se a crise tivesse chegado ao fim. A crise acabou?
Carmen Reinhart - O drama que vimos no fim de 2008 e no início de 2009 chegou ao fim. Não se vê algo algo daquela dimensão muito frequentemente.
Mas uma solução duradoura ainda não foi atingida. As economias avançadas -a maioria das europeias, os EUA e o Japão- têm dívidas pesando sobre suas cabeças.
Você veio do Brasil, sabe que o grande drama da crise da dívida na América Latina foi quando o sistema começou a implodir no início dos anos 1980, mas levou um bom tempo até que fosse resolvido.
Os mercados sobem e descem. Para falar a verdade, os mercados começaram a contar com o ovo antes de a galinha pô-lo, antecipando uma recuperação mais forte do que o que ocorreu realmente.


Os mercados desenvolvidos vão enfrentar o mesmo problema que os latino-americanos nos anos 1980?
Eles não vão, eles estão. Em 2006, dava para imaginar uma conversa envolvendo a reestruturação da dívida de países europeus?
É preciso colocar as coisas sob perspectiva. Não acredito que as condições serão as mesmas, porque os emergentes perderam o acesso aos mercados internacionais de capital de uma maneira que os países desenvolvidos não perderam.
Não tenho dúvida de que, se a Grécia e a Irlanda não tivessem a União Europeia por trás, nós teríamos "default" (calote), reestruturação.
Se nós olharmos quem está comprando os títulos da dívida deles, é o BCE (Banco Central Europeu), e não investidores privados.
Então, quando você me pergunta se a crise já acabou, eu acho que a sombra que ela projetou é grande e que nós ainda não a superamos.


Então, a sra. não vê o desemprego nos Estados Unidos recuando nos próximos dez anos para o nível do fim de 2007, próximo a 5%?
Acho que vai demorar um tempo até voltarmos a 5%. A minha expectativa é de que o desemprego nos EUA permaneça teimosamente alto, acima de 8%.
Para começar, os preços do setor imobiliário estão muito longe da recuperação e o setor de construção é um que exige muita mão de obra.
Eu acho que os EUA e a maioria dos países avançados terão anos sem brilho, com crescimento abaixo da média.
As dívidas das famílias americanas estão perto do seu nível recorde e as empresas financeiras estão altamente endividadas.
Nos EUA, o único setor que está relativamente enxuto é o de empresas não-financeiras, mas, ao mesmo tempo, os planos de investimento delas, quanta gente mais pretendem empregar, dependem da expectativa de como será o consumo.
E isso nos traz de volta à questão das dívidas das famílias.


Voltando à questão fiscal, quais serão as consequências dessa crise na economia real dos Estados Unidos?
Não estamos ainda no nível de uma crise fiscal nos padrões de Portugal, da Grécia e da Irlanda, mas os efeitos serão mentais.
As expectativas das pessoas serão reduzidas, os valores de aposentadorias não serão os entregues em sua plenitude e os impostos também devem subir.


Qual é a sua avaliação sobre a atuação do governo Obama e do Fed [Federal Reserve, o banco central dos EUA]?
Eu acho que o Fed tem atuado de maneira bastante agressiva e rápida, mas ele precisa convencer o mercado e o setor privado de que, quando chegar o momento, também vai agir agressivamente e rapidamente para aumentar os juros.
Sobre a administração Obama, acho que já chegou a hora de apresentar um plano para reduzir a dívida.
Uma coisa é dizer que temos, com a crise, uma situação fora do comum e estímulo é necessário.
Mas é preciso estabelecer uma estratégia para reduzir a dívida. Dizer que a dívida vai se estabilizar em 77% [em 2021] é realmente medíocre.


E quais efeitos os países emergentes devem sofrer?
Ainda não acabou o ciclo de busca por rendimentos maiores nos países emergentes, neste momento de juros baixos nas economias avançadas.
A combinação do desemprego nas economias avançadas e de dívida alta nesses países inclina a política monetária para o afrouxamento e para a manutenção dos juros baixos.
Então acredito que os países emergentes terão provavelmente que continuar a lidar com essa faca de dois gumes que é a enorme entrada de capital estrangeiro.


Por que é uma faca de dois gumes?
Entrada de capital externo, como os brasileiros bem sabem, está geralmente associada à alta da moeda.
A valorização cambial pode ser tolerada até o ponto em que não começa a deteriorar a conta-corrente, o que já começou a ocorrer no Brasil. Ela também só pode ser tolerada enquanto não começa a afetar a capacidade competitiva de um país, especialmente do setor industrial, o que também já ocorre no Brasil.
O problema com a entrada de capital é que ou você não recebe nada ou recebe demais. Eu acho que essas questões de administração do ingresso de capital externo vão perdurar por mais algum tempo nos países emergentes.


Qual é a sua opinião sobre a forma como o Brasil está administrando a entrada de capital externo?
Tenho algumas preocupações. Acho que o Brasil está indo no caminho certo ao aumentar os tributos sobre o capital especulativo, mas temo que, se o país continuar com a intervenção esterilizada [no câmbio] e perpetuar o diferencial de juros, isso é um negócio perigoso.


Por quê?
Porque, com base na minha própria pesquisa, quando você tem políticas que perpetuam o diferencial de juros você tende a dar mais força para esse processo, ou seja, atrair mais capital.


A China está tentando conter a inflação. Quais são os riscos que ela pode trazer para a economia global?
Os riscos que a China traz têm a ver com o seu tamanho, é a segunda maior economia do mundo, e tem grande influência sobre os mercados de commodities.
A China enfrenta algumas questões parecidas com as do Brasil, mas não de maneira tão aguda, porque ela tem mecanismos de controle de capital.
O dilema que eles enfrentam é que, quanto mais tempo eles tentarem impedir a valorização do yuan, mais as pressões inflacionárias durarão e mais serão crônicas.
A China vai ter um período difícil, tentando conter a inflação sem tirar muito do crescimento. Eu preciso acrescentar, porém, que a questão da inflação na China é pior do que os dados oficiais mostram.


E a inflação no mundo? Os preços, especialmente nos emergentes, continuam a subir. É um problema que vai continuar?
Acho que é um problema para os emergentes agora, mas que deve se generalizar.
Porém, até isso ocorrer deve ser um período de longa gestação. A inflação é uma questão para os emergentes, devido à entrada de capital.
Para os desenvolvidos, é uma questão ainda menor, especialmente pela falta de força das suas economias. E é um problema ainda menor para os EUA, porque, ao contrário da libra e do euro, o dólar não teve um enfraquecimento sustentado.

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Justiça com folga

Para a maioria dos brasileiros, o feriado prolongado de Páscoa começou na quinta-feira. Não para os juízes e servidores de tribunais em sete Estados e no Distrito Federal, cuja folga teve início um dia antes. Nada a estranhar, em repartições que em muitos casos se recusam a funcionar em horários compatíveis com a rotina de trabalho dos cidadãos comuns, os menos privilegiados. Fonte: folha.uol.com.br 25/04


Como parte do esforço para modernizar o Judiciário e dotá-lo de padrões mínimos de eficiência administrativa, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu uniformizar o período de funcionamento de tribunais estaduais e fóruns. Resolução do CNJ estipula atendimento ao público de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h.
O expediente, ordinário para a maioria dos trabalhadores, exigirá mudanças em nada menos que 74% dos tribunais do país, segundo levantamento em reportagem desta Folha. Em apenas 7 dos 27 Tribunais de Justiça os cidadãos têm acesso às cortes por pelo menos nove horas diárias. Em muitos Estados, os fóruns abrem só no período da manhã, ou da tarde.
Além de desperdiçar dinheiro público, o meio expediente nos Estados cerceia o direito de acesso dos cidadãos à Justiça, ao impor entraves à obtenção de informações e à consulta de processos.
Como ocorre a cada iniciativa do CNJ, também a simples padronização de horários enfrenta agora resistências em setores da magistratura (inclusive ministros do Supremo Tribunal Federal) e de servidores do Judiciário. Representantes dos tribunais estaduais e da Associação dos Magistrados Brasileiros argumentam que a resolução é inconstitucional e ameaçam recorrer ao STF.
Os refratários alegam falta de recursos e supostas particularidades regionais. No Nordeste, dizem representantes da magistratura, o calor intenso no período da tarde não seria propício ao trabalho. Resta explicar por que o redivivo determinismo geográfico fica reservado a funcionários da Justiça, com exclusão da massa de habitantes que trabalha no horário tradicional, sem direito a sesta.
Como bem assinalou o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Ophir Cavalcante, "a toga é indumentária, não escudo para justificar diferenciação dos demais trabalhadores".
É de esperar que a determinação do CNJ, uma vez em vigor, seja diligentemente cumprida pelos tribunais estaduais. O acesso pleno dos cidadãos brasileiros a seus direitos não será alcançado enquanto continuarem a vigorar anacrônicos privilégios no Poder Judiciário do país.

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Impostos acelerados

Arrecadação federal permite evitar corte de gastos, indica economia ainda aquecida e pode prejudicar o combate contra a marcha da inflação Fonte: folha.uol.com.br 25/04



A arrecadação de impostos no primeiro trimestre de certo modo deu razão ao governo contra os descrentes em um bom resultado fiscal neste 2011. Isto é, contra quem duvida que o governo possa cumprir sua meta de poupar (obter como superavit primário) algo em torno de 3% do PIB.
Os números da receita tributária federal neste primeiro quarto do ano, no entanto, também podem chancelar a crítica de que a atividade econômica continua em ritmo acelerado, incompatível, pois, com a redução da inflação.
No primeiro trimestre, a receita do governo cresceu quase 12% sobre os três meses iniciais de 2010 -crescimento real, descontada a inflação. Tal conta inclui a arrecadação de impostos, a de contribuições e a da Previdência.
A receita do Imposto de Renda de empresas e indivíduos cresceu quase 20% no período. O pagamento de IR não aumentava assim desde setembro de 2008, imediatamente antes da explosão da crise financeira que levou o Brasil e o mundo à recessão.
Mesmo técnicos do governo acreditam que até o fim do ano o ritmo da colheita tributária deve cair para cerca de 9%. Ainda assim, tributação em alta velocidade, mais que o dobro do ritmo de crescimento da economia.
Observe-se que economistas respeitáveis do setor privado não acreditavam que a receita de impostos pudesse continuar a crescer a velocidade tão maior que a da economia. No entanto, cresce.
Tal relação, impostos-PIB, não é mera curiosidade aritmética a respeito do apetite fiscal do governo, nem um outro modo de dizer que a carga tributária continua a aumentar. Indica que o governo pode manter resultados de superavit fiscal razoáveis e evitar o crescimento da dívida pública sem fazer maior esforço de contenção de gastos. Ou seja, evita deficit maiores e, assim, o incremento da dívida, sem reduzir tamanho e despesa da máquina pública.
O forte resultado da Receita Federal do Brasil, de resto, é outro indício a reforçar as dúvidas a respeito do arrefecimento da atividade econômica. Há, evidentemente, sinais de desaceleração. A oferta de crédito aumenta menos rapidamente, a oferta de trabalho não é tão mais abundante, a indústria anda devagar. Mesmo o aumento impressionante da receita de impostos de agora pode refletir a euforia de meses atrás.
Ainda assim, o conjunto dessas indicadores parecem refletir o sucesso de uma economia que ainda corre a 5% ao ano. A julgar pela experiência recente do desempenho econômico brasileiro, não parece um ritmo compatível com o controle da inflação.

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