quarta-feira, 28 de abril de 2010

Justiça define futuro de bairros planejados

FSP 28/04

STJ analisa caso que põe em xeque respeito a regras estabelecidas por loteamentos, como limitar a construção de prédios

Resultado de julgamento sobre edifício levantado em desacordo com regras da City Lapa, zona oeste de SP, pode influenciar futuras decisões
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Está nas mãos do STJ (Superior Tribunal de Justiça) uma decisão que pode mudar o futuro dos bairros e loteamentos planejados em todo o país.
Em jogo, está o respeito ou não às regras criadas por particulares especificamente para esses lugares, como, por exemplo, limitar a altura de prédios ou proibi-los, independentemente das leis de zoneamento definidas pelo poder público.
O caso do STJ é o de um prédio de oito andares na City Lapa, zona oeste paulistana, onde a Companhia City implantou o conceito de "bairro-jardim", com ruas sinuosas, arborizadas e livre de grandes edifícios.
A associação de moradores e o movimento Defenda SP pedem a demolição do prédio, esqueleto embargado em 1996. A construtora CCK contesta.
Falta só o voto de um ministro para o tribunal decidir. Em março, o julgamento foi suspenso -estava empatado em dois a dois. A sentença deveria sair ainda em abril, mas, diz o STJ, não há um prazo definido.

Legislações
O edifício desrespeitou as regras do loteamento na City Lapa para se instalar, segundo os moradores. Legislação municipal determina que as regras dos loteamentos devam ser respeitadas desde que sejam mais restritivas que as municipais.
Embora haja essa restrição, construtoras muitas vezes conseguem alvarás da prefeitura, baseados no zoneamento municipal menos restritivo. Foi o que ocorreu em São Paulo: a CCK obteve o documento que autoriza a construção. Em 1999, o Tribunal de Justiça paulista acolheu o argumento pró-demolição. A construtora, então, recorreu ao STJ.
Agora, se a decisão for favorável à construtora, abre-se precedente para modificar as regras de loteamentos antigos semelhantes, o Pacaembu, os Jardins América e Europa e o Alto de Pinheiros, todos em áreas nobres de São Paulo -a City Lapa não será afetada pois foi tombada, em 2009, pelo conselho do patrimônio municipal.
A mudança "implicaria a desconstituição de todas as restrições urbanístico-ambientais no Brasil, em especial no município de São Paulo, abrindo à especulação imobiliária ilhas verdes da cidade", disse o ministro Herman Benjamin, relator do caso e responsável por um dos votos pró-demolição.

Defesa
Eliana Calmon, que votou a favor da construtora, argumenta haver legitimidade no alvará.
"A obra chegou à oitava laje com alvará da prefeitura. Esse tipo de construção era possível na região", afirmou o advogado Ruy Carlos de Barros Monteiro, que defende a CCK. "O argumento do precedente é o único que sobra para eles, porque juridicamente não há como sustentar essa demolição", disse.



Calem-se - reportagem especial
Brasília amordaçada


Na última parte da série sobre as restrições à música brasileira durante a ditadura militar, compositores da cidade revelam que partiam até para o corpo a corpo a fim de liberar suas obras. Muitas vezes, eram recebidos aos gritos pelos censores

Carlos Marcelo

Ao folhear pela primeira vez as cópias dos documentos da Divisão de Censura de Diversões Públicas obtidas pelo Correio, Aldo Justo Fagundes balança a cabeça e cerra o rosto. “É um negócio absurdo.” Refere-se ao parecer de 18 de maio de 1973, assinado pelo técnico João Camelier, recomendando a “não liberação” da música Quem semeia e quem semente, por conta da “mensagem negativa”, da crítica ao “status quo vigente” e do tema: “crítica política”.

Quem semeia toda a guerra e dita a luta, mostra um rumo só Sobre esta via a fome se aflita, baixa a fronte Sem poder a verdade acrescentar…

Há 37 anos, Aldo Justo era um estudante que saiu do Rio Grande do Sul para a capital federal com um violão embaixo do braço e um desejo imenso: participar dos festivais promovidos por colégios, febre da juventude brasileira no começo dos anos 1970. Ceub, Elefante Branco, Objetivo, Pré-Universitário… “Os festivais eram a principal forma de canalizar a produção musical de quem estava começando”, lembra o compositor, que depois montaria o Liga Tripa, referência cultural da cidade por fazer “guerrilha musical”, com apresentações ao ar livre por ruas e bares como o Beirute.

Aldo Justo lembra que, para se inscrever nos festivais, era necessário entregar uma fita cassete com a gravação, acompanhada da letra. Depois, duas triagens: da comissão julgadora e da censura. “Era um procedimento rotineiro e a gente apelava com requerimentos, tentando liberar nossas composições”, detalha o músico. Para conseguir cantar Quem semeia e quem semente, Aldo fez o de praxe: alterou versos, suprimiu outros. Então, a música foi aprovada.

Por conta da proximidade da sede da Polícia Federal, Aldo Justo e outros músicos locais tentavam pessoalmente a liberação de suas canções. Não havia advogados nem gravadoras para fazer a intermediação; frente a frente, o compositor e o censor. Às vezes, surgia a possibilidade de diálogo: “Tira essa parte que a gente analisa de novo…”. Mas outras vezes…

Ao lembrar à reportagem os gritos que ouviu do censor, Aldo desanuvia a expressão facial e ironiza: “Inocente útil, eu? Fiquei até lisonjeado…”. Conta que, assim como Chico Buarque, ao menos uma vez conseguiu driblar a censura. Foi com as referências à situação política da América do Sul que embutiu em letra sobre uma garota, Meire, que vivia “levando golpes dos meirineiros”: “A Meire cá do Sul/ Di Alendê/ A Meire caladinha/ Di arendê”. Deu certo: a música, com citação ao líder chileno Salvador Allende, foi classificada para o festival do Objetivo. “Essa foi a fase mais nacionalista da música brasileira. Muita tensão gera criatividade”, acredita Aldo Justo.

Cariello: “Ofensa à ordem pública”
No início dos anos 1970, Antônio Carlos Vieira Cariello morava em uma casa na 712 Sul. Filho de funcionário público, tinha chegado de Vitória em 1963. “Brasília me alargou os horizontes”, reconhece. Assim como o irmão mais velho, Orlando (candidato a governador pelo PSTU em 1998 e 2002), Antônio Carlos (conhecido também pelo apelido Toninho) estudou no Ciem, depois foi para a UnB. Aluno do professor Raul Santiago, na Escola de Música, gostava de Chico Buarque e, “em especial”, de Geraldo Vandré. Dizia que suas composições refletiam o interesse por questões sociais e políticas. Uma delas, O anjo, foi inscrita em festival do Ceub. Por conta de versos como “eles pensaram em liberdade, mas as ruas da cidade eram becos sem saída” e “farei prisão virar liberdade em cada coração para isso só preciso de minha voz e meu violão e um coro imenso cantando o que penso”, a música foi censurada. Motivo: ofensa à ordem pública.

O parecer 2971/73, que aponta a tal “ofensa” em O anjo, foi assinado em 11 de maio de 1973 pelo técnico José do Carmo Andrade. Quatro dias depois, a avaliação ganhou endosso de F.V. de Azevedo Netto, chefe da SCTC-SC/DCDP. Assim, O anjo ficou de fora do festival. Outras músicas politizadas de Cariello não passaram incólumes. Engajado no movimento estudantil, ele fazia música assumidamente revolucionária. “Eu botava pra quebrar”, reconhece. E botou para quebrar quando ignorou os rumores dominantes (“quem vai lá corre o risco de não voltar”) e foi até a sede da Censura, na Polícia Federal. Em conversa com um técnico da PF, tentou a liberação de três músicas. O diálogo foi interrompido pelo chefe do censor, que questionou a menção a Jesus Cristo em uma das composições. “Esse Jesus da sua letra não passa de um comunista disfarçado!”, criticou, à época, o censor.

A rispidez aumentou – e foi devolvida na mesma moeda. O chefe, então, encerrou a conversa com um soco na mesa e uma ameaça.

E assim Cariello fez. Continuou, ainda por algum tempo e de forma clandestina, cantando os seus versos e os de compositores cubanos como Carlos Puebla: “Aqui se queda la clara, la entrañable transparencia / de tu querida presencia, Comandante Che Guevara!”. Mas, em retrospecto, Antônio Carlos Cariello acredita que as intervenções da censura comprometeram as pretensões musicais que alimentava: “A censura desanimou a minha carreira como letrista comprometido. Foi um período muito ruim, muito sofrido. Passamos por momentos extremamente perigosos”. Conta que sua vida passou por “reviravolta radical”: depois de morar em Belo Horizonte e se tornar mestre em meditação, está de volta à Brasília e já iniciou contatos para retomar a produção artística. Acredita que sua visão de mundo é “bem diferente” dos tempos em que tinha 21 anos e se encontrava com outros amigos, como Paulo Tovar, para discutir política e escrever música. “Sou outra pessoa hoje em dia”, resume. Mas guarda reflexão desencantada sobre os tempos de silêncio: “Eles não censuraram a música, não censuraram a poesia. Eles censuraram o país”.

Acervo de raridades

A burocracia da repressão provocou efeito colateral que nem músicos nem censores imaginavam quando ocupavam lados opostos do ringue: a preservação de músicas que se perderam no tempo e na trajetória da música brasiliense. Em requerimentos apresentados à Polícia Federal em 22 de outubro de 1981 pelo estudante André Mueller, por exemplo, surgem algumas das primeiras composições da Plebe Rude, como Fascinação (“Então eu saio a cem na contra-mão/ Só eu, meu carro azul e a solidão/Por que faço tudo isso? Só pra chamar tua atenção!”) e uma música com o nome da banda (“Plebe pobre, plebe podre, plebe suja, plebe ignara, saiam do escuro, saiam da sombra, apareçam”), jamais gravadas pelo grupo. O mesmo ocorre com o Capital Inicial: Eu tenho medo de me divertir, música da dupla Flávio Lemos/Loro Jones com letra do baterista Fê Lemos (“Vou tentar uma jogada/Meio louca alucinada/ Levantar uma bolada/ E alugar uma namorada”), examinada e liberada em novembro de 1985, nunca foi registrada em discos. Idem A roupa certa, Ermengarda e Substitutos, letras de Fê que foram submetidas à PF em outubro de 1984 para realização de show da banda na cidade.

A consulta ao acervo da Coordenação Regional do Arquivo Nacional no Distrito Federal (CRDF) permite acompanhar a diversidade da produção brasiliense dos anos 1970. De Paulo Tovar, morto ano passado aos 54 anos, o Correio encontrou a música Regresso dos barcos, submetida e liberada em setembro de 1977. Mesma sorte não teve, quatro anos antes, Ita Catta Preta (também já falecido), posteriormente integrante do Liga Tripa. A censura implicou com Guerrilera: “Sugiro devolução da letra ao interessado para correção no último verso, uma vez que contrária (sic) os interesses nacionais”, recomendou a censora Vilma Duarte do Nascimento, em 17 de abril de 1973.

Nas centenas de caixas de papelão que guardam as composições apresentadas à censura na década de 1970, há letras de outros nomes conhecidos na cena cultural da cidade: Vicente Sá, Sérgio Duboc, TT Catalão, Clésio/Climério Ferreira, Rosa Passos (três parcerias em 1980 com Fernando de Oliveira), Antônio de Pádua Gurgel, Mangueira Diniz, Oswaldo Montenegro, Rênio Quintas (11 músicas, entre elas Sul ou norte e Caminhos da cidade), Clayton Aguiar (Chorinho do funcionário público). Parte da cultura brasiliense acabou preservada, quem diria, por conta da eficiência burocrática da unidade repressora oficial.(CM)


Os duelos de Renato


Em 1981, quatro anos antes do início do sucesso nacional com a Legião Urbana, o jovem Renato Manfredini Jr. submeteu à censura algumas de suas composições da época de Aborto Elétrico. Ganhou seu primeiro veto por conta dos versos niilistas de Heroína (“Eu não quero mais viver, eu quero ser um vegetal”). Tempos depois, já contratado pela gravadora EMI-Odeon, Renato Russo voltaria a ter embates com a censura. Baader-meinhof blues e O reggae, duas faixas do primeiro disco da Legião, tiveram a radiodifusão proibida. E Dado viciado, submetida em 1984, mas gravada apenas no álbum Que país é este 1978-1987, foi vetada por três censores diferentes.

Em 1987, Faroeste caboclo também ganhou três condenações por “linguagem vulgar e grosseira” e “expressões empregadas por viciados e traficantes de drogas”. A Emi-Odeon, então, utilizou recurso maroto: substituiu no recurso os trechos considerados problemáticos, mas os manteve no disco e no encarte. Meses depois, a artimanha foi notada e a gravadora, multada. “A referida melodia vem sendo veiculada através de organismos de radiodifusão locais em sua versão integral”, alertou a censora federal Telma Maria de Melo Costa. Tarde demais: mesmo com 9 minutos de duração, a saga de João de Santo Cristo já era uma das músicas mais executadas em todo o país. (CM) .

Fonte: correioweb 28/04

terça-feira, 27 de abril de 2010

Direitos autorais e acesso ao conhecimento FSP 27/04

GUILHERME CARBONI, PABLO ORTELLADO e CAROLINA ROSSINI


O projeto de reforma da lei de direitos autorais, apesar de modernizador, fica a dever ao onerar a cópia de livros nas universidades



O Ministério da Cultura vem, ao longo dos últimos quatro anos, promovendo com a sociedade amplo debate sobre a reforma da lei de direitos autorais (lei nº 9.610/ 98).
Esse debate, que incluiu a realização de seminários temáticos, reuniões setoriais e que, em breve, passará por ampla consulta pública, deve ser saudado como a mais participativa reforma de uma lei de direito autoral de que se tem notícia.
As propostas de alteração da atual lei são muitas, mas aqui destacamos as que visam um melhor balanceamento entre o interesse privado dos titulares de direitos autorais e o interesse público pelo livre acesso ao conhecimento.
O projeto de reforma da lei, divulgado parcialmente em um dos debates promovidos pelo Ministério da Cultura, diz claramente que "a proteção dos direitos autorais deve ser aplicada em harmonia com os princípios e normas relativos à livre iniciativa, à defesa da concorrência e à defesa do consumidor".
Além disso, regula expressamente a sua função social, ao dizer que a lei terá que atender "às finalidades de estimular a criação artística e a diversidade cultural e garantir a liberdade de expressão e o acesso à cultura, à educação, à informação e ao conhecimento, harmonizando-se os interesses dos titulares de direitos autorais e os da sociedade".
O objetivo visto acima pressupõe alargamento das atuais limitações e exceções aos direitos autorais -hipóteses em que as obras protegidas podem ser livremente usadas, sem necessidade de autorização prévia ou pagamento aos titulares de direitos.
Na atual lei, essas hipóteses são restritivas, com a proibição, por exemplo, da "cópia privada", da mudança de suporte e da cópia feita para fins de preservação do patrimônio cultural.
A cópia privada é aquela feita em um único exemplar, sem fins lucrativos, para uso do próprio copista, e é um recurso que permite, por exemplo, que alguém copie um CD legitimamente adquirido para escutar no carro, sem risco de estragar o original.
Além de autorizar a cópia privada, o projeto de lei autoriza também a livre cópia quando há mudança de suporte -ou seja, quando o dono do CD copia suas músicas para um iPod. Por fim, o projeto permite ainda que qualquer obra possa ser copiada para fins de preservação do patrimônio cultural.
Embora todas essas possibilidades sejam de bom senso, hoje não são permitidas pela lei atual. Por esse motivo, em recente comparação entre 16 países, a lei brasileira foi considerada a quarta pior no que diz respeito ao acesso ao conhecimento.
Apesar de o projeto modernizar a nossa lei, buscando torná-la compatível com o mundo digital, ele fica a dever em pelo menos dois pontos: ao onerar a fotocópia de livros nas universidades e ao não reduzir o prazo de proteção dos direitos autorais.
Embora no projeto de lei a cópia feita pelo copista sem fins lucrativos seja livre e sem ônus financeiro, a cópia de livros passa a ser onerada.
Isso não apenas cria distorção injustificada entre a cópia de livros e a cópia de CDs ou fotos como onera desnecessariamente o estudante brasileiro que faz uso de fotocópias simplesmente porque não tem os meios econômicos para adquirir livros ou então porque alguns livros estão esgotados no mercado.
O projeto também não reduz o prazo de proteção dos direitos autorais. A reprodução das obras permanece, assim, monopólio dos detentores de direitos por 70 anos após a morte do autor (embora o direito internacional só obrigue a 50 anos após a morte).
Estamos vivendo uma oportunidade única para reverter essa situação da atual legislação de direitos autorais, que cria barreiras ao acesso ao conhecimento e ao desenvolvimento nacional.


GUILHERME CARBONI , mestre e doutor em direito civil pela USP, com pós-doutorado na Escola de Comunicações e Artes da USP, é advogado, professor universitário e autor do livro "Função Social do Direito de Autor". E-mail: carboni@gcarboni.com.br.
PABLO ORTELLADO , doutor em filosofia, é professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, onde coordena o Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação.
CAROLINA ROSSINI , advogada e professora de propriedade intelectual, é "fellow" no Berkman Center for Internet and Society (centro Berkman para internet e sociedade) da Universidade Harvard e coordenadora do projeto Recursos Educacionais no Brasil: Desafios e Perspectivas.

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Incentivo - Mais vigor à cultura negra

Três projetos do Distrito Federal ganham verba da Fundação Palmares para divulgação das artes afro-brasileiras

A cultura afro-brasileira ganhou mais espaço no cenário das artes. Grupos de teatro, de dança e de artes visuais, que antes lutavam para conseguir a proximidade com o grande público, agora começam a traçar um novo caminho na história da cultura negra. A concretização acontece com a entrega, hoje, do 1° Prêmio Nacional de Expressões Culturais Afro-Brasileiras — edital dedicado exclusivamente à arte negra que concederá mais de R$ 1 milhão a 20 projetos de todo o país, apenas este ano.

Três desses projetos são do Distrito Federal. “Companhias de teatro e dança de todo o Brasil realizam um fórum uma vez por ano. E, nesses encontros, buscaram o apoio financeiro do Ministério da Cultura, já que existe essa necessidade da inserção da arte negra a exemplo das cotas nas universidades. Daí surgiu a ideia do edital”, explica Elísio Lopes, diretor de Fomento e Promoção da Cultura Afro-Brasileira da Fundação Cultural Palmares, que incentiva o prêmio ao lado do Centro de Apoio ao Desenvolvimento (Cadon) e com patrocínio da Petrobras.

Mais de mil projetos se inscreveram. Cerca de 600 não se adequaram aos critérios e, portanto, cerca de 400 disputaram as 20 vagas. “Isso prova que ainda existe um grande universo que não conseguimos atender este ano, com o primeiro edital. Mas, no ano que vem, pretendemos repetir”, acrescentou Elísio Lopes.

Do DF, os projetos que venceram fazem parte das três categorias do edital: dança, teatro e artes visuais. O espetáculo de dança Bata-Kotô, apresentado pela Companhia Experimental de Dança Negra Contemporânea Mário Gusmão (Cedancomg) — fundada por Júlio César Pereira em 2007 — foi um deles. Bata-Kotô, que significa tambor de guerra, realizará oficinas profissionalizantes gratuitas de dança e percussão e um espetáculo com mesmo nome do projeto. Para tanto, receberá R$ 80 mil.

Laboratório de ideias
“Queremos construir um pensamento crítico em relação a dança negra. Porque ainda há preconceito. As pessoas ainda pensam que não há técnica, não há estética própria na dança afro-contemporânea”, explica uma das bailarinas e assistente de coreografia, Marianne Lima Martins.

No teatro, o espetáculo No Muro — Ópera Hip-Hop ganhou R$ 80 mil para investir na peça e, também, em oficinas profissionalizantes. “O projeto surgiu em um laboratório de dramaturgia da Universidade de Brasília (UnB), com Marcos Motta. Fizemos oficinas com jovens da periferia para montar a peça. Com o prêmio, vamos ampliar a ideia”, disse um dos idealizadores do espetáculo Plínio Perrú.

O último projeto do DF que receberá verba foi o trabalho fotográfico da jornalista e professora Denise Camargo. Resultado de sua tese de doutorado, as fotografias feitas em terreiros de candomblé Brasil afora vão se tornar agora exposição. Mais do que isso: “Paralelo à exposição, vou realizar oficinas com educadores de escolas públicas, para dar visibilidade à cultura do candomblé, que ainda é visto com preconceito, e tentar fazer com que a lei federal de ensino da história negra nas escolas seja aplicada”, explicou Denise Camargo. A fotógrafa receberá verba pública de R$ 40 mil. “Esse edital é uma novidade boa. Sinal de que a arte negra vem ganhando espaço em função das discussões e demandas da sociedade civil. Estamos abrindo um espaço importante”, avaliou ela. Fonte: correioweb 27/04

segunda-feira, 26 de abril de 2010

LITERATURA
OFF FLIP TEM CONCURSO DE CONTO E POESIA

Autores podem se inscrever nos dois gêneros, com um texto em cada, pelo site www.premio-offflip.net. Os vencedores ganham R$ 2.000, livros, convites para mesas da Festa Literária Internacional de Paraty e estadia para o evento. Os candidatos devem ser brasileiros ou residentes no país, sendo que concorrentes locais podem competir em uma categoria à parte. E os 30 textos finalistas sairão em livro.

FSP 19/04

domingo, 25 de abril de 2010

Sucesso literário requer talento para performance

Lobo Antunes assume que, atualmente, os autores, além de escrever, devem exibir habilidade para o stand-up comedy

Um dos maiores nomes da literatura contemporânea, português acha que leitores temem as obras que os obriguem a olhar para si

O poder da escrita António Lobo Antunes descobrira ainda criança, nos versos que ouvia o pai recitar e nos poemas que ele próprio, menino, viu saírem de sua mão. Foi bem mais recentemente, porém, após 30 anos de literatura, que descobriu um outro poder: o da fala.
Estrela da festa de Paraty, em 2009, o escritor mostrou, nesta entrevista, concedida de Lisboa, que tão aprimorado quanto sua escrita é seu discurso. O mesmo homem que põe o personagem a perguntar "Achas que a vida foi vida?", ensina, ao telefone, que "não temos tempo para ouvir o outro, pois perdemos a vida a ganhá-la". Em "O Arquipélago na Insônia", lançado esta semana, Antunes volta a escrever um livro que, entre a poesia e os fantasmas que o habitam, não se presta a sinopses. "Quando escreve, você está tentando cumprir qualquer coisa impossível, que é transformar em coisas ditas coisas que não se podem dizer, que você apenas pode sentir."

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/images/ep.gif

FOLHA - Esse livro nasceu da ideia da casa habitada por mortos?
ANTÓNIO LOBO ANTUNES
- Você não escreve com ideias, mas com palavras. Uma vez, o Degas foi mostrar um soneto ao Mallarmé. O Mallarmé disse que os sonetos eram uma merda. O Degas: "Mas eu tinha ideias tão boas". E o outro: "Pois, mas você não escreve com ideias". São as palavras que geram as palavras. Nos momentos bons, a mão torna-se feliz e caminha sozinha. Por isso é impossível falar de um livro.

FOLHA - Mas o senhor foi um sucesso ao falar de seus livros na Flip.
ANTUNES
- É porque o jornalista, o Humberto Werneck, era muito bom. Eu estava há muitos anos sem ir ao Brasil, porque , generoso, tinha pensado "Caramba, preciso deixar um país para o Saramago". Vê como sou simpático? Ir a Paraty foi um esforço enorme, mas então decidi me divertir. E fiquei surpreendido. Era tanta gente entusiasmada que tive de sair com seguranças. Agora sou um chuchu, o que é também incômodo. Quando começa a haver unanimidade, você se pergunta: o que fiz de errado?

FOLHA - O senhor se pergunta isso?
ANTUNES
- Me pergunto se todo sucesso não é um fracasso adiado. Há muitos artistas e pouca arte. Em qualquer bar há uma série de pintores que não pintam, escritores que não escrevem. É a era da performance.

FOLHA - O senhor acompanha a literatura contemporânea?
ANTUNES
- Gosto muito de Virgílio, Ovídeo, Horácio. O que eles escreveram não tem uma ruga. Os grandes poetas da nossa língua, no século 20, são os brasileiros. Cabral, Drummond, Jorge da Lima. O Fernando Pessoa a mim me aborrece. Como é que um homem que nunca trepou pode ser bom escritor? Mas a idade de ouro do livro acabou. No século 19, havia 30 gênios escrevendo ao mesmo tempo. Agora, se encontrar cinco bons escritores no mundo já não é nada mau.

FOLHA - Talvez os autores se dispersem em viagens, jantares...
ANTUNES
- Resolvo o assunto de maneira simples: aceito quatro convites por ano. Se sai o tempo todo, você não tem tempo para escrever. Tem que ser uma galinha a proteger seus ovos. A jantares não vou porque as pessoas ficam à espera de que eu diga coisas inteligentes. É como esperar que um acrobata ande na rua dando saltos mortais.

FOLHA - Essa falta de escritores se deveria também à falta de leitores?
ANTUNES
- As pessoas vivem mal. Quando têm que parar e olhar para elas, ficam assustadas. E a literatura pede esse olhar. Mas é uma alegria tão grande achar um livro bom. Eu, como leitor, quero que o autor me comova, que me dê a alegria de uma frase bem feita. Um livro tem que ser aquilo que um procurava e não achava.


O ARQUIPÉLAGO DA INSÓNIA

Autor: António Lobo Antunes
Editora: Alfaguara
Quanto: R$ 44,90 (256 págs.)

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CRISTOVÃO TEZZA

FSP 24/04

O Brasil de Jorge Amado


Jorge Amado representa nação que ainda sonhava em fundir o universo urbano com a mitologia rural




DURANTE MEIO século, Jorge Amado foi o maior formador de leitores de literatura adulta no país. O Brasil se espelhava nele; em suas obras de temática política e social, Jorge Amado antevia um país utópico-socialista em que o Estado teria alma, tal como a massa dos brasileiros continua a sonhar, e em suas obras-primas de imaginação e costumes (como "Gabriela, Cravo e Canela" e "Dona Flor e seus Dois Maridos"), deu forma viva a uma visão de Brasil que há mais de cem anos vinha tentando se encontrar no caldeirão da nossa cultura.
A miscigenação brasileira, caso único no mundo, se não recebeu ainda uma clara ou hegemônica formulação política ou mesmo teórica (depois de Gilberto Freyre), certamente tem na literatura de Jorge Amado a sua mais completa realização ficcional. E igualmente completa do ponto de vista formal: cada frase de seu texto, com sua sintaxe de bravatas, seu sincretismo retórico, seu rompimento de fronteiras e sentidos, põe as coisas díspares do mundo a serviço de uma narração totalizante que enquadra toda diferença na moldura de mitos populares.
No caso de Jorge Amado, pode-se comprovar o todo pela parte, pelo DNA de seus raríssimos contos, três deles agora relançados numa bela edição em volumes ilustrados e comentados -"O Milagre dos Pássaros", "As Mortes e o Triunfo de Rosalinda" e "De como o Mulato Porciúncula Descarregou seu Defunto".
Os títulos mesmos já se integram em sua utopia narradora, como se Jorge Amado cantasse sempre o mesmo livro em diferentes formas; para ele, a própria distinção entre romance e conto é irrelevante, sendo essa outra fronteira que não resiste à sua voz.
Do mulato Porciúncula casando com sua noiva morta, passando pelo monólogo do assassino de Rosalinda e subindo o adultério aos céus com um saboroso milagre dos pássaros, encontramos uma literatura que cria, canta e afirma uma utopia brasileira como nenhum outro autor foi capaz. Jorge Amado representa o momento único de uma nação que ainda sonhava em fundir o universo urbano com a mitologia rural.
Como todo épico, seu narrador centraliza o mundo colocando-o em praça pública e em altos brados -não há intimidade em Jorge Amado que não seja uma expressão coletiva. E não há diferença que não acabe amansada pelo seu turbilhão narrativo, em que mortos e vivos, letrados e ignorantes, prostitutas e mães, retórica elevada e coloquialismo, preciosismo e palavrão, cornos e casanovas, vão todos se fundindo num painel carnavalesco. A paródia perpétua e devoradora de sua linguagem mantém sempre um eixo de valor positivo, alegre e otimista; é a única fronteira que Jorge Amado respeita, e que jamais ultrapassou.


DE COMO O MULATO PORCIÚNCULA DESCARREGOU SEU DEFUNTO
Autor: Jorge Amado
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 33 (80 págs.)
Avaliação: bom

AS MORTES E O TRIUNFO DE ROSALINDA
Quanto: R$ 30 (72 págs.)
Avaliação: bom

O MILAGRE DOS PÁSSAROS
Quanto: R$ 31,50 (64 págs.)
Avaliação: bom

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Empresas respondem a centenas de processos contra terceirização

Fonte: Reporter Brasil 19/04

Cada vez mais usada no processo produtivo como forma de baratear o custo da mão de obra, a prática da terceirização tem levado centenas de empresas a responder a ações civis públicas propostas em todo o país pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). O combate à terceirização que considera ilícita é hoje uma das principais bandeiras do órgão. Os procuradores elegeram como alvo os setores econômicos mais importantes de cada Estado. Em Minas Gerais, as atenções estão voltadas para as siderúrgicas. Na Bahia, o Polo Petroquímico de Camaçari, na região metropolitana de Salvador. E no interior de São Paulo, multinacionais instaladas no Vale do Paraíba. Em muitos casos, já há liminares determinando que as companhias p! arem de terceirizar determinadas atividades. O tema já chegou, inclusive, no Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de um recurso ajuizado pela ArcelorMittal.

O Ministério Público alega nas ações que essas empresas terceirizam atividades-fim para pagar menos encargos trabalhistas. A Lei nº 7.102, de 1983, autoriza a terceirização nos serviços de vigilância e limpeza. No entanto, não existe no país uma legislação específica sobre o assunto para as demais atividades. Por esse motivo, hoje o principal parâmetro adotado é a Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Por essa orientação, a terceirização pela companhia de serviços especializados ligados à atividade-meio poderia ocorrer, desde que não exista subordinação direta do funcionário com o tomador de serviços. O conceito de atividade-meio, porém, gera inúmeras interpretações na Justiça do Trabal! ho e também entre advogados. "O empregado terceirizado tem menos direitos trabalhistas e geralmente faz o mesmo serviço que o funcionário contratado", afirma Fábio Leal, presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT). "As terceirizações ilícitas criam um empregado de segunda classe."

O Ministério Público do Trabalho só ajuiza ações civis públicas depois de verificar a existência de inúmeras demandas individuais de trabalhadores terceirizados contra os tomadores de serviço. Os procuradores têm priorizado os grandes centros industriais do país. No interior de São Paulo, que abrange 599 municípios, o MPT da 15ª Região propôs 24 ações civis públicas e firmou 104 Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) nos últimos dois anos. Os municípios de Campinas, São José dos Campos e São Carlos, que abrigam diversas multinacionais, foram alvo das principais ações. Em um processo contra a Volkswagen, em São Carlos, o MPT obteve uma liminar, em primeira instância, proibindo a terceirização na fabricação de motores. Por meio de sua assessoria de i! mprensa, a montadora informou que não comenta assuntos que estão sub judice.

Em janeiro, o Ministério Público ajuizou uma ação contra a Basf na Vara do Trabalho de Guaratinguetá. A discussão envolve trabalhadores contratados por uma empresa terceirizada como "ajudantes gerais" de empregados da linha de produção de embalagens da Basf. Os procuradores alegam que, neste caso, há discriminação salarial entre empregados e terceirizados de mesma categoria profissional. "No Brasil, a terceirização é estratégia para baixar custos à custa dos direitos trabalhistas", afirma o procurador do Trabalho em São José dos Campos Luiz Carlos Fabre. De acordo com ele, atualmente não há mais como delimitar de forma precisa o que seria atividade-fim. O procurador diz que o Judiciário tem considerado mais a questão da precarização do ambiente de trabalho. Procurada pelo Valor! , a Basf informou que não terceiriza os serviços de sua atividade fim. Segundo a empresa, a terceirização utilizada em seu processo produtivo atende completamente a legislação em vigor.

Em Minas Gerais, o trabalho do MPT está voltado para as siderúrgicas, na terceirização do processo produtivo de carvão e reflorestamento. O Ministério Público da 3ª Região entende que esses setores estariam diretamente relacionados à atividade-fim das companhias, pois o carvão seria a principal fonte de produção do ferro-gusa, aço e outros metais. Já a produção de carvão seria garantida pelas atividades de reflorestamento desenvolvidas pelas empresas. Nos últimos oito anos, o órgão ajuizou 23 ações civis públicas contra cerca de 40 empresas da área. Uma dessas discussões judiciais envolve a ArcelorMittal - antiga Belgo Mineira. A procuradora do trabalho da 3ª Região, Adriana Augusta de Moura Souza, afirma que foram verificadas péssimas condições de higie! ne nos alojamentos dos trabalhadores, submetidos a jornadas estafantes. Em 2005, o TST determinou que a empresa extinguisse a terceirização naqueles setores. Da decisão, a Arcelor recorreu para o Supremo Tribunal Federal (STF), mas o processo está ainda pendente de julgamento.

Outro grande polo industrial que tem motivado investigações do MPT é o de Camaçari, na Bahia. Desde 2008, o órgão firmou 23 TACs com empresas e ajuizou seis ações. Os processos que envolvem os maiores valores foram ajuizados contra Brasken, DuPont e Oxiteno e tramitam em duas varas de Camaçari. Em agosto, o Ministério Público obteve liminar que determinava à Brasken o término da terceirização de atividades-fim por meio de cooperativas ou de outras empresas. De acordo com a procuradora do trabalho da 5ª Região Virgínia Sena, a terceirização ilícita ocorreria no setor de manutenção. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Braskem informou que recorreu da decisão no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da Bahia e obteve uma decisão favorável que permite continuar com a terceirizaç! ão no setor de manutenção. A empresa entende que a área é uma atividade-meio da empresa, cuja finalidade é a produção e comercialização de produtos petroquímicos.

As ações ajuizadas contra a Oxiteno e a DuPont ainda não foram julgadas. Procurada pelo Valor, a DuPont informou estar certa de não existir fato que comprove a precarização dos direitos trabalhistas, e "reforça o seu compromisso, respeito e o cumprimento da legislação". A ArcelorMitall não retornou aos pedidos de entrevista. E a Oxiteno informou que não irá se manifestar sobre o assunto.