CONTARDO CALLIGARIS
Estilos da vida
Nós todos adotamos ou inventamos um estilo singular para a história de nossa vida Fonte: folha.uol.com.br 21/04
VOCÊ SE lembra daqueles personagens de quadrinhos que são impiedosamente seguidos por uma nuvem preta, que é uma espécie de guarda-chuva ao contrário? Eles não têm para onde fugir: deslocam-se, mas a chuva os persegue, mesmo debaixo do teto de sua casa.
Claro, no outro extremo do leque há pessoas que são seguidas por um sol esplendoroso, mesmo quando estão no escuro ou no meio de um desastre que deveria empalidecer a luz do dia (se ela tivesse vergonha na cara).
Em suma, cada um de nós parece estar sempre numa condição meteorológica que lhe é própria e não depende nem da estação nem dos acontecimentos do momento.
Esse clima privado, como um pano de fundo que nos seria imposto, é uma consequência quase inevitável dos primórdios de nossa vida e das bênçãos ou maldições murmuradas ao redor de nosso berço.
Talvez sejamos um pouco mais livres para escolher o estilo da vida que levaremos, seja qual for nosso pano de fundo.
Geralmente, por estilo DE vida, entende-se um modelo que a gente imita para construir uma identidade e propô-las aos olhos dos outros. Mas o estilo DA vida, que é o que me interessa hoje, é outra coisa: é a forma literária na qual cada um narra sua própria vida, para si mesmo e para os outros. Um exemplo.
Acabo de ler (e continuarei relendo por um bom tempo) "The Book of Dreams" (o livro dos sonhos), de Federico Fellini (ed. Rizzoli). São mais de 400 páginas, em grande formato, que reproduzem fotograficamente os cadernos nos quais o diretor italiano registrou seus sonhos, em palavras e desenhos, de 1960 a 1968 e de 1973 a 1990 (ele morreu em 1993).
Tullio Kezich, que assina a introdução, conta que, em 1952, no seu primeiríssimo encontro com Fellini, o diretor lhe perguntou o que ele tinha sonhado no dia anterior. Tullio não sabia e ganhou uma filípica de Fellini sobre a importância de não perder o "trabalho noturno", que seria no mínimo tão significativo quanto o que pensamos e fazemos quando estamos acordados.
Fellini amava dormir e sonhar; ele vivia com um caderno ao lado da cama, onde registrava texto e visões imediatamente, ao despertar. E note-se que seu interesse pelos sonhos era anterior a seu primeiro contato com a psicanálise (que foi desastrado, com um freudiano, em 1954, e bem-sucedido com um junguiano, Ernst Bernhard, de 1960 a 1965, quando Bernhard morreu).
Vários amigos que me viram ler o livro me perguntaram se, então, os sonhos de Fellini serviam de material para seus filmes. A questão não cabe. O que o livro revela é que, para Fellini, o sonho era, por assim dizer, o gênero literário no qual ele vivia (e portanto contava) sua vida- nos cadernos da mesa de cabeceira, nos filmes e no dia a dia.
Cuidado. Fellini não especulava nem um pouco sobre, sei lá, a "precariedade" de nossa percepção, que pode confundir sonho com realidade. Ele nunca se perguntava se o que estava vivendo era sonho ou realidade, porque, para ele, o sonho era, propriamente, o estilo da realidade.
Esse estilo era o que fazia com que seu olhar estivesse constantemente maravilhado ou atônito: graças a esse estilo, ele atravessava (e contava) a vida como "um mistério entre mistérios" (palavras dele).
Pois bem, nós todos adotamos ou inventamos um estilo singular para a história de nossa vida -é o estilo graças ao qual nossa vida se transforma numa história.
Cada um escolhe, provavelmente, o estilo narrativo que torna sua vida mais digna de ser vivida (e contada). Há estilos meditativos, investigativos, introspectivos, paranoicos ou, como no caso de Fellini, oníricos e mágicos.
Quanto a mim, o estilo narrativo da minha vida é, sem dúvida, a aventura. Não só pelos livros que me seduziram na infância ("Coração das Trevas", de Conrad, seria o primeiro da lista). Mas porque a narrativa aventurosa sempre foi o que fez que minha vida valesse a pena, ou seja, não fosse chata, mesmo quando tinha toda razão para ser.
Quando meu filho, aos quatro ou cinco anos, parecia se entediar, eu sempre recorria a um truque, que ele reconhecia como truque, mas que funcionava. Eu me calava e me imobilizava de repente, como se estivesse ouvindo um barulho suspeito e inquietante; logo eu sussurrava: "Atenção! Os piratas!".
Nem ele nem eu acreditávamos na chegada dos piratas, mas ambos achávamos que a vida merecia um pouco de suspense.
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VINHOS
JORGE CARRARA - jcarrar@attglobal.net
Adega chilena chega aos 140 anos com portfólio consistente Fonte: folha.uol.com.br 21/04
A chilena Viña Errazuriz comemora 140 anos de vida. Pode celebrar também ter um portfólio de qualidade consistente do topo até a base, a ala dos Reserva. Menção nela para dois tintos, ideais para massas e carnes e um branco, boa alternativa para peixes.
ERRAZURIZ RESERVA CABERNET
SAUVIGNON 2009
Mescla toques de eucalipto e goiaba branca, típicos dos cabernet chilenos, com frutas vermelhas num paladar equilibrado
AVALIAÇÃO 87/100
PREÇO R$ 36,18
ERRAZURIZ RESERVA CARMENÈRE
2010
Redondo, com taninos finos e boa textura. Tem aroma e sabor persistente dominado por frutas maduras (framboesa, amora)
AVALIAÇÃO 88/100
PREÇO R$ 36,18
ERRAZURIZ RESERVA SAUVIGNON
BLANC 2010
Frutas cítricas (limão-siciliano, leve tangerina), toques de mel e aspargos marcam seu paladar vivaz, com boa acidez
AVALIAÇÃO 88/100
PREÇO R$ 36,18
ONDE todos na Vinci, tel. 0/xx/11/2797-0000
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Estudos relacionam obesidade a flora intestinal "ruim"
Desde 2006, trabalhos estão mostrando que facilidade para engordar depende das bactérias que há no intestino
Novo estudo mostra que há três diferentes tipos de flora, assim como existem diferentes tipos sanguíneos Fonte: folha.uol.com.br 21/04
Os cientistas estão, nos últimos anos, começando a entender como vivem os trilhões de seres que há no intestino de cada ser humano. Ainda que seja você quem come chocolate todos os dias, uma flora intestinal que não ajuda pode ser a culpada pelos seus pneuzinhos, dizem os pesquisadores.
Em 2006, um estudo na "Nature" mostrou que gordos tinham um tipo diferente de flora intestinal. Não se sabia bem se a obesidade era causa ou consequência.
Três anos depois, um pesquisador americano, Jeffrey Gordon, da Universidade Washington, propôs na "Science Translational Medicine" que engordar era consequência. Ele dizia que as pessoas deveriam saber que tipo de bactérias há em seu intestino para saber se eram vulneráveis à obesidade.
Agora, um outro trabalho na "Nature" mostra que existem três diferentes tipos de flora intestinal. Do mesmo jeito que cada ser humano tem um tipo sanguíneo, todos tem um "tipo intestinal".
Cada um representa um tipo de bactéria diferente que predomina no intestino. Assim, ao menos por enquanto, esses tipos não tem nomes fáceis como "O positivo" ou "A negativo", mas "predominândia de Bacteroides" ou "predominância de Prevotella".
Ficou claro para os pesquisadores que o tipo intestinal nada tem a ver com com a etnia do indivíduo, com o seu país de origem ou com a sua maneira de se alimentar.
Como cada bactéria tem uma eficiência diferente na hora de extrair energia dos alimentos, é possível que aquele amigo que come feito quem nunca viu comida e continua magro tenha tido a sorte de nascer com o tipo de flora intestinal certa.
Os cientistas, de várias instituições europeias (com colaboração da Universidade Federal de Minas Gerais), não conseguiram, porém, apontar qual das três floras intestinais é de gordinho e qual é de "magro de ruim". Estudaram bactérias de europeus, americanos e japoneses.
Era um grupo de poucas dezenas de pessoas. Os cientistas estão planejando repetir o trabalho agora com 400.
Mesmo que eles consigam novos resultados, certamente o tipo intestinal não será a única explicação para a obesidade. Outros fatores, como a alimentação e questões genéticas não-relacionados ao intestino, certamente têm um peso grande.
De qualquer forma, não é possível subestimar o papel das bactérias no organismo humano. Ela são muitas: enquanto o corpo humano tem cerca de 10 trilhões de células, cada pessoa carrega consigo mais de 300 trilhões de bactérias de todos os tipos.
Ou seja: há bem mais células de bactérias em você do que células de você mesmo.
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CARLOS HEITOR CONY
A história do mundo Fonte: folha.uol.com.br 21/04
RIO DE JANEIRO - Estamos cansados de lamentar as deficiências do ensino tal como vem se praticando no Brasil, sobretudo dos tempos autoritários para cá, quando as reformas no campo educacional foram desastrosas e ainda não chegamos ao fundo do poço.
Temos exceções. Há uma brilhante geração de profissionais que dão para o gasto. Surpreendo-me com eles, na faixa dos 30 anos, que dominam um conhecimento surpreendente nos ramos da administração, da economia, da técnica e da ciência.
Mas são exceções, repito. Prevalece a grande, a imensa massa do estudante comum, que passa pelas escolas e até mesmo pelas faculdades e aprende pouco, pouquíssimo, e, o que é mais doloroso, aprende mal.
São conhecidos diversos casos que nos envergonham. Em época de vestibular, é comum a divulgação de besteiras que circulam nas provas, algumas delas de fazer os paralelepípedos da rua Lins de Vasconcelos chorarem (estou usando uma velha imagem do Nelson Rodrigues que é do meu agrado.)
Tempos atrás, após palestra em faculdade de uma das capitais mais prósperas do país, um professor mostrou-me a cópia da prova de um aluno que se habilitava ao curso superior. A questão formulada era: "O que aconteceu de importante no Brasil em 1954". Resposta: "Getulio Vargas foi enforcado porque mandou matar Carmem Miranda, que estava em Paris".
Para muitos da geração que está chegando ao mercado da comunicação e da publicidade, o mundo, a história do mundo começou com Elis Regina, com o cinema novo e a bossa nova.
Antes disso, havia a muralha espessa, intransponível, que fazia Tiradentes descobrir o Brasil, JK nascer em Brasília e Jesus Cristo ter morado no Vaticano, onde proibiu o uso da camisinha.
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Reforma na praça Roosevelt despeja acervo feminista Fonte: folha.uol.com.br 21/04
A nova praça Roosevelt, prometida pela prefeitura para 2012, terá cachorródromo, floricultura, uma base da Polícia Militar e uma da Guarda Civil. Não haverá mais, no entanto, lugar para uma biblioteca com 12 mil livros e documentos que ocupava o local desde 1991.
O acervo é do CIM (Centro de Informação da Mulher), organização que reúne material sobre as causas e organizações feministas desde 1979, quando brasileiras exiladas em Paris começaram a coleção. Além dos livros, a biblioteca tem 1.700 periódicos e 3.400 cartazes.
A biblioteca saiu da praça no dia 14 de janeiro e ainda não tem lugar para ficar.
Antes, em um espaço de 380 metros quadrados na Roosevelt, cedido pela prefeitura, a biblioteca agora ocupa uma sala alugada de 119 metros quadrados.
"É o principal acervo sobre o movimento feminista, eu diria que não só em São Paulo, mas também no Brasil", diz Maria Rosa Dória Ribeiro, doutoranda em história social na USP.
Segundo a prefeitura, o projeto inicial da praça previa abrigar o CIM. O prédio, porém, foi vetado pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental.
A coordenadora do centro, Marta Baião, reclama de que não foi devidamente avisada e que houve perda de material na mudança.
A subprefeitura diz que ofereceu dois espaços, mas eles não foram aceitos.
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