sábado, 31 de março de 2012


Tribunais internacionais devem se complementar, diz Cançado Trindade
Professor Emérito da UnB esteve na universidade nesta quarta-feira, para abertura do III Seminário Latino-Americano de Direitos Humanos unb.br  29/03
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Recebido de pé pelo auditório lotado do Memorial Darcy Ribeiro, o professor emérito da UnB Antônio Augusto Cançado Trindade participou da abertura do III Seminário Latino-Americano de Direitos Humanos, nesta quarta-feira, 28 de março. Cançado Trindade, que é juiz da Juiz da Corte Internacional de Justiça, em Haia, veio da Holanda especialmente para o encontro. Ele proferiu a palestra O acesso da pessoa humana à justiça internacional na era dos tribunais internacionais na conferência de abertura. Ele defendeu que os tribunais devem coordenar suas ações, para garantir a “evolução harmônica de sua jurisprudência”.
A dinâmica do mundo atual apresenta uma grande diversidade de relações entre os países e, consequentemente, conflitos diferenciados decorrentes dessas relações. Uma das características dessa configuração é a quebra de fronteiras, o que determina uma interação mais próxima entre as pessoas de nacionalidades diferentes. Ou seja, o aumento de conexões entre países e pessoas e a intensidade dessas relações geram novos paradigmas de solução de conflitos que precisam ser resolvidos em níveis internacionais. Segundo o jargão jurídico, as entidades – Estados ou organizações – que têm direitos e deveres no plano internacional têm personalidade jurídica internacional.
“A atual operação no plano internacional de múltiplos tribunais internacionais tem gerado novas possibilidades de solução pacífica de controvérsias e ampliado o acesso à justiça em diferentes domínios do direito internacional contemporâneo”, disse Cançado Trindade. “Esse é um fenômeno próprio dos nossos tempos”. Para o professor emérito, os diferentes tribunais internacionais são necessários para acompanhar a expansão da personalidade jurídica internacional. A responsabilidade dos países sobre as relações que estabelecem com outros países e com pessoas também aumenta nesse contexto.
Cançado Trindade considera o aumento de possibilidades na solução de conflitos internacionais um avanço, mas acredita que ainda há obstáculos ao sistema. “Um problema é o das reparações devidas às vítimas de violações graves de seus direitos internacionalmente reconhecidos, ainda não suficientemente resolvidos”, declara. “Outro problema pendente é o da necessária adequação da normativa de direito interno à normativa internacional aplicável”. Além disso, o professor acredita que é importante evitar jurisprudências diferentes nos tribunais. 
Os tribunais internacionais operam em áreas distintas do Direito Internacional e trabalham de forma complementar. Cançado Trindade acredita na convergência entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito Penal Internacional, para garantir que a condenação das pessoas não exclua a responsabilidade dos Estados. “Não se pode esquecer que, em muitos conflitos, o indivíduo agiu segundo ordem do Estado”, explica.
SOLENIDADE – O reitor José Geraldo de Sousa Junior participou da mesa de abertura do seminário e disse que os debates ajudam na construção dos Direitos Humanos. “Um encontro como esse, que não fica apenas na retórica dos grandes discursos, abre espaço para a representação de vivências transformadoras”, afirmou. “Na UnB há uma dimensão de acolhimento para esse tema”. José Geraldo lembrou o fundador da universidade, Darcy Ribeiro. “Ele colocou como um dos eixos para a construção institucional da UnB os Direitos Humanos, junto com a sustentabilidade e a paz”, declarou.
O reitor mencionou os 25 anos do Centro de Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas (Ceppac), do Instituto de Ciências Sociais, como uma das contribuições da universidade para os debates sobre Direitos Humanos, além do Decanato de Extensão, que tem os Direitos Humanos como um dos oito eixos para os projetos, e o Núcleo de Estudos Para a Paz e Direitos Humanos (NEP), do qual foi um dos fundadores.
SAIBA MAIS:
Os tribunais penais internacionais tratam, basicamente, de crimes ocorridos em conflitos armados, tanto internos quanto internacionais. Nos tribunais internacionais de Direito Penal, uma promotoria especializada seleciona casos de violação de direitos do Estado sobre indivíduos que ficam sob sua jurisdição.
Nos tribunais internacionais de Direitos Humanos as vítimas de violações enviam seus casos, individualmente ou em grupos. Pode haver ou não a interferência de organismos internacionais.
A Corte Internacional de Justiça lida com controvérsias entre Estados sobre assuntos variados e questões relativas à Organização das Nações Unidas (ONU).
Hoje existem no mundo tribunais penais – que tratam de casos de responsabilidade individual –, como o Tribunal Penal Internacional (TPI), o Tribunal para a Ex-Iugoslávia, Tribunal para Ruanda e os tribunais especializados para o Camboja, para Kosovo, para Serra Leoa, e para o Timor Leste. Os três tribunais internacionais de Direitos Humanos – cuidam de questões relativas à responsabilidade do Estado sobre indivíduos – são as Cortes Europeia, Interamericana e Africana. Há ainda os tribunais que trabalham na integração regional e no direito do mar.

O diálogo entre os tribunais ocorre em reuniões periódicas para discutir casos julgados e desafios comuns. Nos encontros, os juízes trocam informações para evitar divergências nas jurisprudências.

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LITERATURA.  Morre aos 82 anos a poeta Adrienne Rich
Morreu na última terça, aos 82, a poeta americana Adrienne Rich, ícone da literatura feminista. Conhecida por suas críticas sociais, Rich recebeu diversos prêmios literários, como o National Book Award, em 1974. Assumiu-se lésbica e foi pioneira na luta por direitos civis dos homossexuais. FOLHA SP 30/03

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CARLOS HEITOR CONY.  O homem que vendeu a alma
'La Bohème' ficou, no consenso de puccinianos ou antipuccinianos, como a sua obra-prima FOLHA SP 30/03
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TUDO SE explica: Puccini vendeu a alma ao demônio. Foi essa -e não podia ser outra- a explicação de seus rivais e inimigos, roídos e moídos não pelo sucesso popular e financeiro das obras do compositor, mas pela beleza simples, humana, quase cafona, de suas partituras.

De Monteverdi a Menotti, todos os autores de ópera, incluindo Mozart, gostariam de ter escrito alguns dos momentos puccinianos que definem, justificam e eternizam o gênero lírico no que ele tem de mais autêntico.

Nem Verdi em todo o seu esplendor nem Wagner em sua empáfia conseguiram aqueles acordes que atingem não a arte pela arte (Puccini nunca foi disso), mas o belo pelo belo. E, dentro do seu universo, "La Bohème" ficou, no consenso de puccinianos ou antipuccinianos, como a sua obra-prima por excelência, pois é uma ópera intrinsecamente pucciniana.

Nem sempre solistas, coro, orquestra, "régie", cenário e vestuário mostram-se adrede para uma "La Bohème" a preceito. É ópera que requer clima e trabalho. Requer paixão.

Se o sucesso internacional e histórico da ópera, em si mesma, se deve ao gênio musical de Puccini, o triunfo de cada récita também pode ser creditado aos seus montadores famosos, entre outros, Luchino Visconti, Ingmar Bergman, Franco Zefirelli, e até mesmo Margarita Wallmann, com seus cabelos brancos, sua perna aleijada, sua visão da arte, do palco, da vida.

Já perguntei a vários cantores, aqui e no exterior, sobre a ópera que consideram a melhor, a mais próxima da sensibilidade de cada um. A resposta, geralmente, sai enrolada para um tipo de pergunta assim. Alguns complicam, fazem distinções sutis, escondem o jogo como podem.

Mas depois de um aperto, todos terminam admitindo: "Bem cantada, bem encenada, 'La Bohème' pode não ser a mais nobre das óperas, mas é a mais ópera de todas".

Afinal, o temperamento de cada um se identificará com a discutível e não demonstrada poesia de Rodolfo, a inacabada pintura de Marcello, a música não ouvida de Schaunard, a filosofia (essa sim, explicitada) de Colline, que não transcende a uma ária sentimental dedicada ao próprio capote. Conheço filósofos piores.

Cada vez mais, os divos e divas se recusam a cantar nos ensaios gerais, preferindo guardar a voz para o espetáculo. Não é nada, não é nada, esse vedetismo acaba prejudicando os grandes momentos líricos; dificilmente a orquestra tem condições de se entrosar com o canto e vice-versa. Lembro de anos atrás, quando Mario Del Monaco fazia três, quatro ensaios com a orquestra, mandando brasa na sua poderosa e brilhante voz. Na noite do espetáculo, a voz de Monaco não estava "stanca". Pelo contrário: ficava sempre melhor.

Muitos garantem que Puccini se apaixonava pelas mulheres que criava: Tosca, Butterfly, Manon, Mimi. Uma intérprete pucciniana sofre, geme e morre de amor, não por Mario Cavaradossi ("Tosca"), por Rodolfo ("La Bohème"), pelo tenente Benjamim Franklin Pinkerton ("Madama Butterfly") ou por Des Grieux ("Manon Lescaut"). A paixão delas, o "outro", que está invisível, mas presente em cena, é sempre Puccini.

Visitei diversas vezes a sua casa em Torre del Lago, não muito longe da sua Lucca natal, uma das cidades mais típicas da Toscana. Junto com suas armas de caça, estão as fotos de suas grandes intérpretes, com dedicatórias reveladoras de uma paixão nem sempre utópica.

Impressionou-me a da primeira soprano que cantou "Madama Butterfly", uma japonesa que transcreveu, em cima da foto, um dos versos que ela canta no dueto final do primeiro ato: "Rinnegata... e felice" -renegada... e feliz.

Realmente, o compositor era um "homme à femmes". Chegou a ter um problema com a polícia quando uma de suas empregadas suicidou-se por amor a ele. Outras também o fizeram, em Paris, Milão, Viena e Nova York.

Aliás, o sucesso de Puccini nos Estados Unidos foi enorme. Por ocasião de sua primeira visita, o "New York Times" comparou a sua recepção à de Charles Lindbergh, o primeiro aviador a atravessar só o Atlântico, pilotando o Spirit of St. Louis.

Thomas Edison, o maior inventor de seu tempo, deu a Puccini um de seus primeiros gramofones, com a enorme tuba em ouro, na qual mandou gravar: "Outros depois de mim farão inventos melhores, mas ninguém fará melodias mais belas do que Puccini".

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EMPRESÁRIOS.   Movimento Brasil Eficiente tem novas adesões e traça estratégias FOLHA SP 30/03

DE SÃO PAULO - A coordenação do Movimento Brasil Eficiente anuncia hoje, em sua primeira reunião do ano, a adesão do governador Eduardo Campos (PSB-PE) e do publicitário Nizan Guanaes, que cuidará da comunicação do movimento.

Criado em 2010, o movimento reúne empresários e sociedade civil em defesa da simplificação fiscal e da melhor utilização dos recursos públicos.

Eles buscam apoios para abaixo-assinado, hoje com 12 mil assinaturas, em favor de um projeto de simplificação fiscal, a ser enviado ao Congresso.

Também será discutida uma campanha de arrecadação de recursos para realizar eventos pelo país. O encontro será às 8h na Escola de Economia da FGV, em São Paulo.

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RIO+20.  Manifesto de cientistas cobra mais atenção a temas ambientais
Em Londres, grupo de 3.000 acadêmicos pede decisões rápidas FOLHA SP 30/03
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Cientistas ligados à área ambiental do mundo todo lançaram ontem, em Londres, manifesto pedindo mais atenção às questões ambientais na Rio+20, conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável que será realizada em junho.

Com 3.000 signatários, a "Declaração do Estado do Planeta" diz que não basta buscar um "ideal distante" e cobra agilidade dos políticos contra a crise ambiental.

"As questões que estão sendo debatidas na Rio+20 são as mesmas que foram debatidas há 20 anos, mas agora é ainda mais urgente enfrentá-las", afirma o texto do encontro "Planet Under Pressure", última reunião de cientistas antes da Rio+20.

A declaração lembra que a degradação ambiental cresceu nas últimas décadas, a despeito dos acordos feitos na Eco-92, como a convenção de mudanças climáticas.

"O rascunho zero da Rio+20 [esboço do documento final do encontro] joga a solução para o futuro. Já fizemos isso há 20 anos e só o que se viu foi aumento da emissão de CO2, aumento da perda de espécies e 800 milhões de pessoas com fome. Precisamos sair da mesa de negociação para ações práticas", diz o biólogo Fabio Scarano, um dos brasileiros que participaram do encontro.

O governo brasileiro afirma que a Rio+20 tratará dos três pilares do desenvolvimento sustentável (ambiental, social e econômico) e que as críticas da comunidade científica não se justificam.

"Considero uma vitória do ambientalismo promovermos uma conferência baseada nos três pilares, não apenas com foco no ambiental", disse Samyra Crespo, secretária do Ministério do Meio Ambiente. Para ela, os ambientalistas estão ressentidos por não serem as estrelas da Rio+20, como foram na Eco-92.

A falta de discussões sobre ambiente e clima na Rio+20 já tinha sido abordada em outras reuniões de cientistas. No Fórum Mundial da Água, há duas semanas em Marselha, na França, a necessidade de metas sobre água potável e direito à água nas discussões foi destacada."Vou levar o tema para a conferência", disse à Folha na ocasião o francês Brice Lalonde, secretário executivo da Rio+20.

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GOVERNO »
Fim das barreiras no MRE
Após denúncia do Correio, Itamaraty acaba com a regra que obrigava estagiários a entrarem no ministério por uma porta no subsolo. (…) O Sinditamaraty criticou o fato de duas comissões criadas recentemente pelo ministério serem compostas apenas por diplomatas: a Comissão de Ética e uma comissão encarregada de coordenar o sistema de controle de acesso.(…) Tenho medo de que haja represálias contra alguns colegas. Não representamos os estagiários, mas estaremos atentos" Helder Nozima Pereira, presidente da Associação Nacional dos Oficiais de Chancelaria. CORREIO BSB 31.03
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Carta de protesto
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O Sindicato dos Servidores do Ministério das Relações Exteriores (Sinditamaraty) vai entregar hoje uma carta ao gabinete do chanceler Antonio Patriota criticando a discriminação que os estagiários, contínuos e funcionários terceirizados vêm sofrendo ao serem obrigados a entrar no prédio pela garagem. CORREIO BSB 30.03
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GOVERNO »   Restringir acessos é prática na Esplanada
Alegando segurança, ministérios reservam portaria para convidados e funcionários com salário superior a R$ 6,8 mil CORREIO BSB 30.03
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No Ministério do Esporte, as faxineiras precisam apresentar o crachá ao usar a entrada principal: no acesso privativo, o documento não é obrigatório

A discriminação enfrentada por estagiários, contínuos e terceirizados do Itamaraty se repete em toda a Esplanada dos Ministérios, com a existência de entradas privativas a ministros e funcionários em cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS) de nível 4, ou seja, com salários acima de R$ 6.843,76. Todos os demais servidores que recebem abaixo desse patamar são proibidos por seus ministérios de entrar pela portaria especial e devem se dirigir à entrada principal do prédio. A medida, na prática, cria duas castas de funcionários: uma composta pela maioria, que geralmente enfrenta filas para entrar no trabalho e é obrigada a se identificar; e outra especial, dos que ganham salários mais altos e entram e saem dos ministérios sem grandes impedimentos.

Cada ministério tem autonomia para criar as regras sobre o procedimento de acesso ao prédio. No entanto, todos acabam adotando normas muito parecidas, que separam as duas categorias de funcionários. Pela entrada privativa, só entram os que ganham acima de DAS 4, o ministro, o secretário executivo e os convidados do ministro, desde que tenham seu nome identificado. Nesse grupo, estão deputados, senadores, magistrados e membros do alto clero. Empresários e profissionais liberais, desde que autorizados pelo gabinete do ministro, também podem usar essa porta especial. No Supremo Tribunal Federal, no Superior Tribunal de Justiça e no Congresso Nacional não há distinção de acesso.

Servidores da Esplanada ouvidos pelo Correio trataram com naturalidade a diferenciação que é feita. “Eu acho adequado que existam elevadores específicos para esse grupo de funcionários para que não haja filas enormes. Na entrada privativa, o ministro tem o elevador exclusivo dele e os funcionários acima de DAS 4 têm o deles”, defendeu o servidor Sidney Oliveira, que trabalha na Secretaria de Comunicação, no Bloco A da Esplanada, e usa a entrada privativa.

O principal argumento usado pelos ministérios para justificar as duas entradas é de que o ministro não pode esperar o elevador para chegar a seu gabinete, tampouco deve, por motivos de segurança, ter a mesma entrada que os demais funcionários. As justificativas perdem sentido, porém, quando aplicadas aos funcionários de salários mais altos. No dia a dia, a entrada privativa acaba servindo também para aqueles que não querem identificar sua entrada no prédio, como lobistas. O mesmo ocorre com políticos que não querem ter o registro de suas entradas na portaria principal do prédio. Ontem, o amigo de um funcionário do gabinete do ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, tentou entrar pelo acesso especial. Queria presentear o amigo com uma camisa do Internacional. Ao ser abordado pelo Correio, recuou e decidiu usar o acesso normal.

Embora essa discriminação ocorra em toda a Esplanada, o clima entre servidores ontem era de revolta com a medida do Itamaraty. Um grupo de faxineiras, na porta do Ministério do Esporte, criticou a discriminação. “É claro que é preconceito. Querem separar os funcionários mais simples dos outros”, afirmou uma delas, que pediu para não ser identificada.
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EDUCAÇÃO »  Aluno especial paga mais
Escolas particulares cobram ilegalmente taxas extras para matricular estudantes com síndrome de Down. A prática é condenada pelo Conselho Nacional de Educação e pela Secretaria de Educação, que pregam o respeito à inclusão CORREIO BSB 30.03

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Lourdes Lima, mãe de Lia: "Em uma delas (escolas) queriam me cobrar quatro mensalidades a mais"

Acabar com a discriminação e incluir pessoas com distúrbios genéticos na sociedade. O discurso aparece em leis, em decretos, em organizações públicas ou privadas, na boca de políticos, além de ser um direito garantido pela Constituição Federal. Para os portadores da síndrome de Down do DF, no entanto, as dificuldades começam na escola e pesam no bolso dos pais. Estabelecimentos particulares cobram taxas extras para matricular esse tipo de aluno. A prática é ilegal, segundo o Conselho Nacional de Educação (CNE), e a Secretaria de Educação. Ambos consideram a cobrança discriminação.

O Correio visitou seis escolas e constatou que três delas exigem a contratação de um acompanhante no ato da matrícula para fazer companhia à criança especial. O Colégio Santa Rosa (602 Sul), a Escola Renascença (914 Norte) e a Escola Nossa Senhora de Fátima (906 Sul) são enfáticos ao ressaltar que o aprendizado só é garantido com a presença desse profissional. Um docente auxiliar custa, em média, R$ 600, se sugerido pela instituição; e R$ 1 mil, se contratado por fora.

O Dromos (Sudoeste) afirmou fazer uma avaliação prévia da criança para analisar as reais necessidades de um supervisor. Na instituição, três portadores de síndrome de Down estão matriculados. Um não precisa de acompanhante, e os outros dois estão em fase de teste. O colégio permite que os pais escolham o tutor e paguem diretamente ao profissional. Entre as visitadas, as escolas La Salle (906 Sul) e Sigma (912 Sul) afirmaram não cobrar nada a mais para receber as crianças portadoras de necessidades.

O presidente da Câmara de Educação Básica do CNE, Francisco Aparecido Cordão, afirma que as estruturas física e de ensino das instituições devem receber a todos, com qualidade. “Não há qualquer legalidade nesta cobrança. Escolas públicas e privadas devem ser inclusivas e ter condições para receber os ditos normais e os especiais. A escola tem que dar tratamento adequado e não diferenciar quem tem deficiência x ou y.” A educação especial para todos está prevista na Resolução nº 4 de 2009, do CNE, na Resolução nº 2 de 2001, no Decreto nº 3.956 de 2001 e em outras normas.

Acompanhante
A posição do CNE converge com a da Secretaria de Educação. Segundo o chefe da Coordenação de Supervisão Institucional e Normas de Ensino (Cosine), Marcos Silvio Pinheiro, órgão que supervisiona e orienta as escolas, a maioria das instituições não têm condições de receber alunos especiais. “O ideal seria que todas conseguissem atender bem essas pessoas, realmente educar. A princípio, esta cobrança é ilegal. Mas teremos que investigar todas elas para dizer o que pode acontecer.” Segundo ele, é preciso haver apuração de cada caso. “A escola pública tem os profissionais treinados para ensinar, mas as particulares enxergam a questão econômica. Temos processos de instituições que rejeitaram alunos.”

Apesar da cobrança, nenhuma das escolas visitadas mentiu ou tentou fazer um contrato com cláusulas obscuras. “Toda vez que a criança precisa de um atendimento especial, há um aumento no valor. Se ela necessita de um tutor, não posso dissolver isso nas outras mensalidades. A situação é, sim, legal, tem uma relação contratual clara”, disse a presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), Amábile Pacios, também proprietária da Dromos. Ela ressalta que o tutor garante a integridade da criança. “Com a contratação, garantimos a real inclusão, pois o acompanhante mostra os limites e direciona o estudo.”

O Correio ouviu funcionários de três colégios durante as visitas. Na Escola Nossa Senhora de Fátima, a atendente informou que é uma prática cobrar a mais dos pais pela contratação de um pedagogo em casos especiais (leia diálogo ao lado). Apesar disso, a psicóloga da instituição, Rosana Paranhos, afirmou que não há cobrança de taxa extra. O que há, segundo ela, é um “trabalho diferenciado”. “Tudo o que fazemos é conversado com os pais. Temos resultados ótimos e somos referência. As pessoas pedem indicação. Inclusive atendemos a primeira pedagoga que se formou com síndrome de Down”, disse.

A reportagem também gravou uma conversa na Escola Santa Rosa.Uma funcionária admitiu a cobrança de uma matrícula mais para o acompanhamento de alunos portadores de necessidades. A diretoria do colégio informou, por telefone, que só daria entrevista pessoalmente. Já o diretor da Renascença, César Augusto Peixoto, alegou que não cobra nada. “Temos alunos com síndrome de Down e nunca exigimos acompanhante.” Mas, segundo gravação feita pelo Correio, uma secretária afirmou não estar preparada para atender alunos com Down e disse exigir um profissional, escolhido pela família.


Conceito
O Decreto nº 3.956, que promulga a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, cita que o termo discriminação significa “toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, antecedente de deficiência, consequência de deficiência anterior ou percepção de deficiência presente ou passada”.

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Os idos de março e os vindos de abril .  Hélio Rocha é jornalista e escritor e colunista do POPULAR
O POPULAR 30.03
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Tristes idos de março, tristes vindos de abril. Há exatamente 48 anos, 30 de março de 1964, no Palácio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro, o então presidente João Goulart acabava de se vestir, no começo da noite, para ir a um evento que se realizaria no Automóvel Clube. O evento era uma inusitada assembleia rebelde promovida pelos sargentos das forças armadas, abrindo choque hierárquico que irritaria profundamente os chefes militares, já em conflito acentuado com o chefe do governo.

Um comício que havia se realizado em frente à Central do Brasil, também no Rio, no dia 13 de março, e manifestações como a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em São Paulo, que reuniu 500 mil pessoas, indicavam riscos que Goulart parecia ignorar.

Ainda no quarto do Palácio onde se aprontou, Goulart conversou com três pessoas de sua confiança: Tancredo Neves, o secretário de Imprensa Raul Riff e o general Assis Brasil, chefe do Gabinete Militar da Presidência. Os três aconselharam João Goulart a não comparecer à reunião dos sargentos rebeldes. Ele insistiu e foi.

No dia seguinte ao evento do Automóvel Clube, ou seja, 31 de março, o general Mourão Filho movimentaria tropas em Minas Gerais contra o governo de João Goulart. Foi o suficiente para que os chefes de todas as regiões militares tomassem semelhante posição. E assim cairia o governo, imprevidente e imprudente, e sem a força que ingenuamente supunha ter.

João Goulart, certamente que mal aconselhado, acreditava que um chamado forte dispositivo militar, chefiado pelo general Assis Brasil, sufocaria qualquer levante. E, no entanto, na hora H se viu indefeso, teve de se refugiar no Uruguai e aconteceu o famoso golpe militar de 31 de março. O presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzili, assumiria interinamente a Presidência da República e a seguir o Congresso fantasiava, diga-se assim, uma eleição presidencial indireta, colocando o marechal Humberto Castelo Branco no cargo do qual Goulart fora deposto. Sob pressão dos militares mais duros, Castelo baixou atos institucionais, na verdade inconstitucionais, e assim abria caminho para a longa ditadura que durou mais de 20 anos, produzindo retrocessos cujas muitas decorrências o País sofre até hoje.

João Goulart, ou Jango, como também o chamavam, fez concessões ao que se designava de peleguismo, ou seja, a líderes ou, na maioria, supostos líderes sindicais aproveitadores, mas certamente era sincero em relação ao compromisso com reformas de base, como agrária, urbana, fiscal, educacional e política. Alguns supunham que ele alimentava intenções de continuísmo. Era ingênuo, como no caso do dispositivo militar que se revelou furado – e isto lhe custou caro.

Um traço muito forte no perfil de João Goulart era o do humanismo. Duas pequenas histórias mostram isso. Hélio de Almeida, figura luminar da engenharia brasileira, presidente do respeitado Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, foi ministro da Viação de Goulart. Ele enfrentou uma greve em sua área, foi duro, teve inicialmente todo o apoio presidencial, mas eis que um dia, chegando de Brasília ao Rio, o presidente assiste a uma manifestação de mulheres dos grevistas nas proximidades do Palácio das Laranjeiras, elas portando cartazes indicando que as famílias já estavam passando necessidades. Goulart convoca o ministro e determina que atendesse os grevistas.

Jovem, no Rio, vindo do Rio Grande do Sul, (foi ministro do Trabalho aos 34 anos), ainda solteiro, João Goulart era boêmio. Entre seus companheiros de boemia, incluía-se o jornalista Luiz Alípio de Barros. Quando chegou à Presidência, Goulart ficou sabendo que Luiz Alípio estava casado mas não tinha casa própria. Certo dia, Alípio recebe um telefonema: era a secretária do presidente da Caixa Econômica Federal, Elói Dutra, pedindo para ele ir ao gabinete dele. Alípio foi. O presidente da Caixa lhe entrega uma lista de documentos dizendo: “traga-me estes documentos com muita urgência. Tenho ordem do presidente João Goulart Lara para resolver imediatamente o seu problema de casa própria.”

A exemplo do Brasil, os outros três países do Cone Sul, Chile, Argentina e Uruguai, igualmente sofreram a dura experiência de ditaduras sob mando militar. Recuperaram o primado do poder civil e restabeleceram as instituições democráticas, mas até hoje ainda sofrem vestígios dos efeitos perversos do regime de exceção.
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Criador do frescobol, escritor Millôr Fernandes morre no RJ
Escritor e cartunista sofreu um acidente vascular cerebral. Mestre do humor tinha ligação com o esporte e era amante do frescobol UOL 28.03
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Morreu na madrugada desta quarta-feira, em sua residência, em Ipanema, Zona Sul do Rio, o escritor, jornalista e cartunista Millôr Fernandes, aos 88 anos. Millôr sofreu um acidente vascular cerebral e teve falência múltipla dos órgãos, de acordo com familiares. O velório será nesta quinta-feira, das 10h às 15h, no Memorial do Carmo, no Caju. O corpo será cremado em seguida.
Millôr foi também ilustrador, dramaturgo, fabulista, calígrafo e tradutor. E foi sempre ligado ao esporte. Ele se gabava de ter sido um dos idealizadores do frescobol, esporte muito praticado nas praias cariocas que não tem um vencedor - o objetivo é bater bola com seu companheiro pelo maior tempo possível. Millôr, inclusive, criou um painel em homenagem ao frescobol na Praça Sarah Kubitschek, em Copacabana.

O painel de Millôr em Copacabana, uma homenagem ao frescobol

"O Frescobol foi um esporte que cheguei a jogar bastante bem. Esporte maravilhoso, praticado à beira mar - os participantes quase nus - de tempo em tempo interrompido por um mergulho refrescante, o Frescobol é elegante e dinâmico o tempo todo, beneficiando-se ainda da sorte inaudita de nunca nenhum idiota ter tido a ideia de lhe traçar normas, aferir pontos - permanece até hoje uma atividade pura. Há competição, mas não formalizada, pontificada. Não há vencidos nem vencedores. Portanto sem possibilidade de violência. Segue meu princípio; "O importante é nem competir.", diferente do conceito hipócrita do Conde de Coubertin: "O importante é competir"", escreveu Millôr.
O escritor, mestre do gênero do humor, sempre mostrava ligação com o esporte. Torcedor do Fluminense, não foram poucas as frases que ficaram famosas sobre o futebol. Frasista assumido, ele participou também de transformações na imprensa brasileira no século XX e teve passagens por "O Cruzeiro", "O Pasquim" e "Jornal do Brasil". Ele deixa mulher e dois filhos.
Confira uma seleção de frases de Millôr sobre o esporte:
"E no oitavo dia Deus fez o Milagre Brasileiro: um país todo de jogadores e técnicos de futebol."
"O futebol é o ópio do povo e o narcotráfico da mídia."
"Futebol não tem lógica. Mas, se a gente tivesse Garrincha, Pelé, Paulo César, Nilton Santos, Domingos da Guia e Rivellino de um lado só, a zebra ia ter que rebolar."
"Chute de longe é como tirar cara e coroa - dá sempre mais cara do que coroa."
"Há os que são Flamengo doente. Eu sou Fluminense saudável."
"Mal comparando, Platão era o Pelé da filosofia."
"Em 1978, lembram?, o Brasil, já na técnica da retranca, perdeu a copa invicto. Empatou todas. Inventamos uma coisa extraordinária: a Invictória."
"Ninguém joga futebol tão bem quanto o brasileiro. Isso porque o futebol e o Brasil são iguaizinhos; não têm lógica."
"Me autoproclamei campeão de frescobol do posto 9. Quando alguém jogava melhor, eu provava que ele era do posto 8. Assim vai a glória do mundo." (1971)
"O futebol se compõe de jogadores, juiz, bandeirinhas, bicheiros, cartolas - e cem mil não-combatentes."
"Todo homem tem o sagrado direito de torcer pelo Vasco na arquibancada do Flamengo."
"O futebol chega ao máximo do descrédito - é decidido nos pênaltis, com exigência de tempo ditada pela tevê. Vai acabar sendo disputado na porrinha."
"Segundo um observador de Marte - depois de examinar os fenômenos Madonna, Michael Jackson, Ayrton Senna e o Campeonato Mundial de Futebol -, a Terra sofre permanentemente de histeria coletiva."
"Natação e Automobilismo: Tenho absoluta incapacidade de admirar um homem apenas porque ele é melhor do que o outro um centésimo de segundo."
"[Sobre o Xadrez] Jogo chinês que aumenta a capacidade de jogar xadrez."

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Sexualidade ampliada
Historiadora americana defende que a realidade humana vai muito além dos conceitos de heterossexual, homossexual e bissexual CORREIO BSB 31.03

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“Ele é um gay muito feminino, mas abriu uma exceção para ela”, a mulher segredou para a amiga, acreditando não ser ouvida. Na mesma festa, outras pessoas deviam ter teorias diferentes sobre o estranho casal composto por uma mulher e um homem feminino — ou seria uma mulher masculina? Uma corriqueira suposição das pessoas sobre aquela dupla era a de que ela costumava ser lésbica, mas havia criado gosto por homens afeminados.

Outra, a de que ele era uma transexual, no início do processo de mudança de gênero. Qual seria a verdade? Seriam eles hétero ou homossexuais? Nem mesmo o casal sabia dizer. Aliás, não sabe até hoje.

A historiadora Hanne Blank, a mulher que integra o casal em questão, explica que seu companheiro foi “diagnosticado” como homem ao nascer. A definição pareceu, por muitos anos, adequada, já que ele tinha um pênis perfeitamente funcional. O passar do tempo foi mostrando, contudo, que a verdade era mais complexa. Ele carecia de pelos pelo corpo e desenvolveu traços andróginos, como um rosto delicado, curvas na região do quadril e seios discretamente rotundos. Então, os médicos descobriram que, ao contrário da maioria das pessoas “diagnosticadas” como homens, ele não tinha o par de cromossomos XY. Nem sequer o par das mulheres, o XX. Ele tinha, isso sim, um pouco dos dois: o menos comum trio XXY.

“Os conceitos de ‘heterossexual’, ‘homossexual’ e ‘bissexual’ partem da ideia de que há dois, e somente dois, sexos biológicos. O que acontece quando a biologia se recusa a entrar nesse esquema?”, questiona Hanne, depois de quase duas décadas de relacionamento, em seu novo livro, não lançado no Brasil, Straight: The surprisingly short history of heterosexuality (Hétero: a surpreendentemente curta história da heterossexualidade). “Eu não me sinto hétero, homossexual ou nada além de um ser humano que ama e deseja outros seres humanos”, completa a feminista.

Historiadora renomada, frequentemente convidada para palestras em universidades como Harvard, Hanne coloca uma questão curiosa: afinal, sabemos o que é a heterossexualidade? Mais que isso: a heterossexualidade pura existe? Em entrevista ao Correio, ela discute esses temas.


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1964 2012 »  A ditadura segundo o general
testemunho de ernesto Geisel integra o passado a ser revisto pela comissão da verdade. Ex-presidente confirma que o Exército matou o operário Manuel Fiel Filho e teve participação decisiva na morte de vladimir herzog CORREIO BSB 31.03

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Comissão da Verdade em Pernambuco e São Paulo
O Governo de Pernambuco encaminhou, na tarde de ontem, projeto de lei à Assembleia Legislativa para criar a Comissão Estadual da Memória e Verdade. De acordo com o texto da matéria, o colegiado, formado por nove integrantes, pelo menos seis deles da sociedade civil, vai investigar violações aos direitos humanos ocorridas no estado entre os anos de 1946 e 1988. O projeto determina que a investigação se estenda por, no mínimo, dois anos. A proposta deve tramitar em regime de urgência. A expectativa é de que, em 15 dias, seja votada no plenário da Casa. Em São Paulo, uma comissão semelhante foi aprovada e já deu início aos trabalhos de resgate da memória.     

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A poucos dias do anúncio dos nomes da Comissão da Verdade responsáveis por desvelar os segredos guardados no porões da ditadura militar (1964-1985), um pouco das histórias escondidas pela repressão foi trazido à luz por uma entrevista concedida em 1993 pelo general Ernesto Geisel ao Centro de Documentação e Pesquisa (CPDOC) da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Quarto presidente a ocupar o Palácio do Planalto depois do golpe de 31 de março de 1964, o “Alemão” confirmou que o regime à época não só praticava a tortura, como foi o responsável direto pelas mortes do jornalista Vladimir Herzog, em 1975, e do operário Manuel Fiel Filho, em 1976. Geisel chegou a confirmar aos historiadores Maria Celina D’Araújo e Celso Castro que, ao contrário da versão oficial difundida à época, Fiel Filho foi, sim, morto por militares: “Num fim de semana, ele (o então comandante do Exército em São Paulo, general Ednardo D’Ávila Mello) não estava em São Paulo e mataram o operário”.

           
Vladimir Herzog, 1975


O material recolhido pelos pesquisadores, que deve ser analisado pela Comissão da Verdade, reúne mais de 36 horas de gravações que traçam um panorama da história recente do país. Parte já foi publicada no livro Dossiê Geisel, mas vários trechos permanecem inéditos — como a confissão do assassinato de Fiel Filho pelo Exército. Maria Celina diz ao Correio que, mais importante do que os depoimentos dos comandantes militares coletados pela instituição — que encerram um ciclo até porque muitos morreram —, é avançar na reconstituição dos aparelhos de terror do Estado, que teriam provocado a morte ou desaparecimento de cerca de 500  pessoas (Leia quadro ao lado), segundo dados  do Ministério da Justiça e de ONGs de Direitos Humanos.

           
Manuel Filho, 1976


“Os militares, inclusive Geisel, defenderam a repressão, mas o regime de terror de Estado teve participação ativa da mídia e de empresários. Essa é a história que falta levantar. Espero que a Comissão da Verdade avance nesse sentido”, pressiona Celina. Geisel, explica ela, tentou driblar e desmantelar a esquerda e a extrema direita durante o seu governo. “Teve êxito no primeiro combate, pois a esquerda se desmantelou, mas a extrema direita se manteve ativa e operante até o atentado no RioCentro, em 30 de abril de 1981, durante o show do 1º de maio”, esclarece.

Faltaria ouvir, portanto, empresários que estão vivos e podem esclarecer o funcionamento das masmorras. “A sociedade que participou dessa repressão precisa e deve ser ouvida, como ocorreu na Alemanha pós-Hitler e como ocorre hoje na Espanha em relação à ditadura de Franco.” Celina está convencida de que, assim, a história será resgatada e de que a anistia estará em xeque e poderá ser revista. “O governo do general João Baptista Figueiredo foi o governo dos órgãos de inteligência e o texto da Lei de Anistia levou em conta essa realidade.” A historiadora não vê esse resgate da memória como sinal de revanche, mas como dever de Estado, em nome da verdade histórica.

Maria Celina contou que não se surpreendeu na manhã de 1993, quando Geisel defendeu a tortura, porque “o fez em nome da corporação, do Exército”. Descendente de alemães, o general, que nasceu em Bento Gonçalves (RS) em 3 de agosto de 1907, teve formação luterana e guardava profundo respeito à hierarquia. Ao defender a tortura, tratou de dizer que um grupo de militares aprendeu as táticas na Inglaterra, durante o governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira e que, para evitar mal maior, a tortura se justificava. A confissão, dita em tom seco, tenta justificar a prática ainda negada pelos militares e será alvo da revisão histórica da Comissão da Verdade. “Acho que a tortura em certos casos torna-se necessária, para obter confissões”, defendeu Geisel aos pesquisadores.

Cursos na Inglaterra
O general, apesar de manter a visão corporativa da tropa, disse a historiadora, não se recusou a falar de temas cruciais, como as mortes, durante o seu governo, do jornalista Vladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho. Atribuiu os dois enforcamentos nas dependências da repressão em São Paulo à ausência de comando e diz que o general Ednardo D’Ávila Mello, do II Comando Militar em São Paulo, teria abandonado a tropa para atender a convites da alta sociedade de São Paulo. “Ele ia passear no fim de semana, fazendo vida social, e os subordinados dele, majores, faziam o que queriam. Ele não torturava, mas, por omissão, dava margem à tortura.”

Em outro trecho do longo depoimento, Geisel diz que não se convenceu do resultado do Inquérito Policial Militar (IPM), aberto por determinação do próprio ex-presidente, para apurar a morte de Herzog, mas tinha que aceitar para seguir o rito militar. Naquele momento, porém, suas relações com o general Silvio Frota, comandante do Exército, começaram a ir para o ralo. Geisel não esconde que o clima de desconfiança de que subordinados seus agiam nas sombras, sem seu conhecimento, contaminaram as relações.

Maria Celina ficou, porém, com a impressão de que o general, acostumado a exibir galões na farda militar, se sentia aliviado a cada depoimento, como se tirasse um peso dos ombros. Além dos trechos mais polêmicos, relatou o namoro com Lucy, com quem teve dois filhos, Amália e Orlando, que morreu em acidente de trem em 1957, causando profunda tristeza na família. Divertiu-se dizendo que os jornalistas o procuravam com insistência, desde que deixou o poder, em 15 de março de 1979, passando a Presidência da República ao general João Baptista de Figueiredo, o último militar a presidir o país no ciclo iniciado em 31 de março de 1964. “Atendia, mas não dizia nada.”

Na eleição de Tancredo Neves pelo Colégio Eleitoral, em 1984, Paulo Maluf foi o candidato apoiado por militares, à exceção de Geisel, que deixou claro o apoio a Tancredo e também registradas as suas críticas ao político mineiro. Ferino, o general também não poupava críticas ao voto obrigatório, nem aos bancos, porque não investiam em infraestrutura nem no desenvolvimento.

Relatos da caserna
Os depoimentos de generais, almirantes, brigadeiros, coronéis e tenentes tomados pelos pesquisadores do CPDOC/FGV deram origem aos livros Visões do golpe: a memória militar sobre 1964, Os anos de chumbo: a memória militar sobre a repressão e A volta aos quartéis: a memória militar sobre a abertura, todos coordenados e organizados por Maria Celina com Celso Castro e Gláucio Soares. Já trechos do depoimento do general Ernesto Geisel deram origem ao Dossiê Geisel, livro editado pela FGV, que se encontra esgotado. Apenas para pesquisadores, a FGV franqueia o acesso aos depoimentos fonográficos e à transcrição completa do depoimento do general, morto em 1996. O testamento em que fala abertamente da vida pessoal e militar e de suas impressões sobre o Brasil e a política foi revisado, página por página, pelo próprio general até 1996, quando morreu, em 12 de setembro, vítima de câncer. A filha, Amália Lucy Geisel, também historiadora, foi quem deu aval para a FGV divulgar o documento.

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Nobel narra cotidiano pós-apartheid
Escritora sul-africana Nadine Gordimer lança livro sobre reconstrução social no país após regime segregacionista FOLHA SP 30.03
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Aos 88, ela critica a corrupção no país e se diz preocupada com o partido do qual ela e Mandela fazem parte
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Na sala de tamanho modesto de sua casa em estilo colonial, em Johannesburgo, a escritora sul-africana e Nobel de Literatura Nadine Gordimer, 88, se acomoda numa poltrona envolta por desenhos de Auguste Rodin (1840-1917), uma escultura de bronze da cabeça de Balzac -também de Rodin- e livros.

Ao receber a equipe que a filmaria para o documentário "Mulheres Africanas", da produtora Cinevideo (leia quadro ao lado), e a Folha, ela logo afirmou: "Vocês têm sorte de eu ter aceitado, porque não participo de programas sobre mulher, não gosto da separação por gênero".

Diz ainda que não acredita em discursos sobre "literatura feminina".

"A gente não escreve com os órgãos sexuais, a gente escreve com isso", e leva o dedo indicador à têmpora.

O que a preocupou, desde sempre, foi o regime de segregação racial sul-africano (conhecido como apartheid, que durou de 1948 a 1994). Agora, seu olhar se volta à reconstrução social e, acima de tudo, à corrupção que atinge seu país.

"No Time like the Present" (nenhum tempo como o presente; sem previsão no Brasil), livro que Gordimer lançou na última terça-feira, "trata dos problemas de construir uma nova vida num país após anos de opressão".

A trama se desenvolve em torno do casal Steve, um professor branco, e Rebecca Jabulile, uma advogada negra, que se conhecem durante o apartheid, quando as relações inter-raciais eram proibidas na África do Sul. "O que havia de mais terno e íntimo na vida das pessoas era crime", relatou.

Steve e Jabulile haviam sido militantes do ANC -o Congresso Nacional Africano, partido do qual Gordimer e o ex-presidente Nelson Mandela também fazem parte e que hoje detém o poder no país.

Os protagonistas criam os filhos na diferente realidade de reintegração racial, mas têm de lidar o tempo todo com fagulhas, internas e externas, do preconceito.

"A existência desse casal inter-racial apenas complica problemas que são comuns a todo mundo. Se fossem dois sul-africanos da mesma cor, ainda teriam de lidar com a corrupção e com o preconceito." A complicação, no entanto, "é uma realidade deste país", segundo a escritora.

"Você se livra do colonialismo, mas você esteve colonizado por tanto tempo que todo tipo de, digamos, tendência neurótica vai aflorar. A corrupção descontrolada, pelo menos no meu país, vem de um sentimento do tipo 'nosso povo não teve nada disso desde 1652, então agora queremos tudo'."

Antes de se retirar para jantar, na mesa simples preparada pelo funcionário moçambicano Domingos ("ele está aqui há 15 anos, mas o inglês dele é inexistente, e o meu português também"), ela pede espaço para fazer uma pergunta a si mesma.

"O que está me preocupando agora a respeito do meu país?", se questiona.

Responde logo que é a "lei do sigilo", aprovada pelo Congresso sul-africano em novembro passado.

O texto estabelece a criminalização de vazamento, posse e publicação de informações consideradas pelo governo como confidenciais e prevê até 25 anos de prisão para infratores.

"Chamam-na lei para 'proteção da informação' -um outro jeito de dizer censura. Uma espécie de tribunal para a imprensa. Afeta também gente que escreve ficção, pois se você criar personagens que sejam parte do governo pode estar sujeito a uma condenação por supostamente revelar segredos de Estado."

A lei, no entanto, foi aprovada por um congresso com maioria da ANC -o partido de Steve e Jabulile, o partido de Gordimer e Mandela, cuja sigla está inscrita no pôster que adorna a porta do escritório-biblioteca na casa da escritora em Johannesburgo.

"É uma grande decepção para mim, porque o ANC é o meu partido. O poder é algo perigoso mesmo."

A jornalista ALEXANDRA MORAES viajou a convite da produtora Cinevideo

NO TIME LIKE THE PRESENT
AUTOR Nadine Gordimer
EDITORA Farrar, Straus & Giroux
QUANTO US$ 27 (cerca de R$ 49, 432 págs.), na Amazon
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ENCONTRO.  Evento em SP celebra a cultura indígena
DE SÃO PAULO - Para homenagear a cultura indígena, acontece no parque da Água Branca (r. Ministro Godói, 180; tel. 0/xx/11/2588-5918), durante o mês de abril, o Oca di Versos - Awê de Literatura Indígena. FOLHA SP 30.03
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O evento reúne índios brasileiros de diversas etnias, como guarani, pataxó, munduruku, pankararu e kaingang, através de oficinas de arte e palestras.

Amanhã, às 11h, a antropóloga Luciana Galante discute o papel do índio contemporâneo e promove jogos para as crianças. No dia 14/4, também às 11h, participa o escritor Daniel Munduruku, vencedor do Prêmio Jabuti em 2004.

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ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR.  Tantos anos de MillôrA morte de Millôr tem um significado para além do que ele representava como escritor e humorista FOLHA SP 30.03
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"TRINTA ANOS de Mim Mesmo", de Millôr Fernandes. O livro não está na mão, li há 38 anos, mas tem coisas que não dá para esquecer. Por exemplo, um dos "mandamentos" do decálogo do machão: "Machão que é machão não come mel, come abelha".

Em outro texto, longo e furioso, no mesmo livro, Millôr rebatia um crítico que tinha encrespado com a tradução dele para uma peça, acho, de Harold Pinter. Apelando de novo para a memória, acho que a implicância girava em torno da palavra "tart" ("vagabunda", "piranha"), à qual Millôr deu uma versão, para o crítico, pesada demais. Millôr, claro, espinafrou o infeliz até a última célula.

Aqui, um reparo. Mal comecei o texto e já fui injusto. Disse que Millôr "espinafrou" o crítico. É forte demais. Millôr tratava os assuntos mais sérios de um jeito tão leve, e com tanta clareza, que não se pode dizer que ele espinafrasse ninguém. Podia reduzir um opositor a pó, mas tudo com inabalável bom humor.

Outra inesquecível do polímata (sempre quis usar esta palavra) Millôr Fernandes foi a polêmica sobre os dizeres da bandeira de Minas Gerais. Eu jurava que isso também estava em "Trinta Anos...", mas conferi e não encontrei (o livro acaba de chegar a minhas mãos; ufa, não preciso mais confiar na memória).

A confusão girava em torno do lema "Libertas Quae Sera Tamen". Seria "Liberdade, Ainda Que Tardia", como na tradução oficial? Que nada. Na real, ou pelo menos na real visão milloriana, significa "Liberdade Ainda que Tardia, Todavia", frase que não quer dizer absolutamente nada e foi ridicularizada por ele. Saiu na revista "Veja".

O estado do exemplar de "Trinta Anos de Mim Mesmo" que tenho a minha frente é lamentável. De tanto ser lido e relido, a lombada se esfarelou. A contracapa foi para o espaço há algumas décadas, e a capa está toda carcomida nas beiradas. Uma fita amarela muito pouco adesiva tenta manter junto o que sobrou.

Eu, como tantos de minha geração, li o livro com 11, 12 anos de idade. Hoje, me surpreende que tenha marcado tanto. O motivo é simples: eu não devia entender nem 1% daquilo. Alusões literárias, a artes plásticas, mais política internacional e sacanagens de todo tipo formavam o cardápio. Até uma mulher pelada em nu frontal, tirada (pirateada?) da "Playboy" americana. Isso no Brasil, em 1974!

Também tenho aqui ao meu lado "Um Elefante no Caos", "Papáverum Millôr", "Livro Vermelho dos Pensamentos de Millôr", "Fábulas Fabulosas" (esse, li umas cem vezes também) e "Novas Fábulas Fabulosas". Mas, para mim, é "Trinta Anos de Mim Mesmo" que condensa a essência do autor. São textos publicados entre 1942 e 1973.

"Trinta Anos...", com sua gama tão ampla de temas, explicita por que a morte de Millôr tem um significado para além do que ele representava como escritor, tradutor e humorista. Com ele, morre uma geração de faróis intelectuais não acadêmicos, da qual os maiores exemplos são o próprio Millôr e Paulo Francis (Ivan Lessa também, mas esse há muito escolheu o isolamento londrino).

Para minha geração, Millôr e Francis representavam uma espécie de periscópio, pontificando acima do provincianismo e do isolamento brasileiros.

Com duas vantagens de Millôr sobre Francis. O texto leve e muito engraçado, sem abrir mão do rigor intelectual. E a iconoclastia absoluta, de fazer troça de tudo e todos, não levar nada a sério (exceto a si próprio -e como!-, diriam alguns detratores que conheço).

Os mais jovens podem ter levado de Francis, morto em 1997, a imagem do conservador rabugento ou da figura um tanto exótica da TV.

O que não tinha nada a ver com o Francis "de verdade", mais interessante, a metralhadora giratória da "Senhor", do "Pasquim" e depois da Folha.

Já Millôr foi sempre Millôr. Os jovens que o conheceram recentemente (e não sei se são muitos) tiveram contato com o mesmo Millôr que eu e meus contemporâneos, lá se vão quase 40 anos.

Se comecei a ler Millôr Fernandes aos 11 anos, posso dizer que passei os últimos 20 ou 25 anos sem acompanhar sua produção. Com certeza, perdi muita coisa boa. Mas o autor continua vivo nos livros e na internet, que ele tão precocemente abraçou. Sorte de todos nós.

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