sábado, 10 de março de 2012
CIBERATIVISMO. Revolta
egípcia, com ou sem twitter
http://www.diplomatique.org.br/ ( 06/03)
O
argumento de que as redes sociais têm influência no incitamento à rebelião
costuma se basear na seguinte premissa: as mobilizações dependem da
disponibilidade de informação que traga à tona uma verdade até então oculta.
Portanto, as mídias on-line teriam um papel na tomada de consciência da
população
-
Em
janeiro de 2011, o planeta acompanhou pelas telas o desenvolvimento da
revolução egípcia. O levante foi transmitido ao vivo, como se câmeras, tweets e
páginas do Facebook houvessem captado um thriller político protagonizado por
milhões de atores. De estandartes em punho, tais atores organizaram
manifestações para alertar as mídias e, através delas, a “comunidade
internacional”. Não é de admirar que Wael Ghonim, jovem executivo do Google
preso por um breve período durante as manifestações, tenha lançado a seguinte
frase: “Se você quer uma sociedade livre, basta lhe dar acesso à internet”.1
Os
acontecimentos no Egito oferecem um terreno ímpar para a verificação da
validade dessa máxima: uma decisão de Hosni Mubarak, ainda no poder, foi uma
experiência em escala natural para medir o peso político das mídias sociais.
Na
manhã de 28 de janeiro de 2011, as autoridades do país decidiram interromper
completamente as comunicações via internet e redes de telefonia móvel. Foi
precisamente a partir desse momento que a mobilização popular decolou de
verdade. A Praça Tahrir continuou coalhada de gente, enquanto outras cidades,
como Alexandria e Suez, passaram a exibir manifestações. No Cairo, nossa
análise de diferentes pontos de manifestação durante os dezoito dias do levante
mostrou um aumento pronunciado e repentino de sua dispersão espacial:2 enquanto
nos dias 25, 26 e 27 de janeiro de 2011 havia um local único de manifestação (a
Praça Tahrir), no dia 28 eles saltaram para oito pontos. Ao cair da noite,
nessa data, a multiplicação dos focos de protesto dificultou a tarefa da
ordem.3 Por volta das 19 horas, o Exército foi chamado a colaborar, mas se
recusou a intervir. Alguns dias depois, o regime de Mubarak, que durava trinta
anos, ruiu.
O
argumento de que as redes sociais têm influência no incitamento à rebelião
costuma se basear na seguinte premissa: as mobilizações dependem da
disponibilidade de informação que traga à tona uma verdade até então oculta.
Portanto, as mídias on-line teriam um papel na tomada de consciência da
população. No caso do Egito, elas teriam revelado a amplitude da opressão,
levando as pessoas recém-informadas a passar para a ação.
Mas
ocorre que as comunicações verdadeiramente insurgentes costumam permanecer
invisíveis. Quando não é assim, a elite dominante as detecta e proíbe, em geral
de maneira imediata. Aliás, a informação “revolucionária” nem sempre é
confiável. Um exemplo disso pode ser buscado na Revolução de Veludo em Praga,4
quando falsos rumores sobre a morte brutal de um estudante de 19 anos colocaram
lenha na fogueira. Outro, na queda do Muro de Berlim: pelo menos em parte, ela
se deveu a uma declaração deturpada em uma coletiva de imprensa que, indo ao ar
na Alemanha Oriental, incitou os manifestantes a passar livremente para Berlim
Ocidental.5
Em
tempos de agitação popular, portanto, o exagero e a falta de informação podem
ser mais eficazes que detalhados relatórios dos abusos do poder. Se as mídias
sociais favorecem a mobilização política, não é porque contribuem para a
emergência da verdade.
A
propaganda centralizada do Estado costuma ser chamada de “ópio do povo”. Mas,
de maneira mais sutil, as novas mídias sociais também podem desencorajar a
tomada coletiva de riscos. O que assegura a manutenção da ordem são menos o
controle e a vigilância que o poder exerce sobre os indivíduos do que sua
visibilidade aos olhos dos outros. Assim, o status quo não deriva
necessariamente de uma coerção efetiva, mas da certeza de que ela ocorre.
Quando esse conhecimento comum desaparece, a população é capaz de forjar uma
concepção de risco independente do Estado.
Em
um grupo composto de uma maioria que se opõe à tomada de riscos e uma minoria
radical, injetar mais informação – mesmo não censurada – no interior da maioria
não intensifica necessariamente a mobilização. Já a interrupção dos meios de
comunicação habituais fissura a unidade dos grupos de cidadãos que se opõem à
tomada de riscos. Novos laços se formam, o que dá mais peso aos radicais e lhes
proporciona novas oportunidades de organizar as pessoas mobilizadas e
descentralizar as manifestações, complicando o trabalho das forças da ordem.
O
mundo “real”
No
Cairo, em 28 de janeiro de 2011, o bloqueio dos meios de comunicação pelo
regime forçou os egípcios a encontrar novas formas de propagar, coletar e
talvez até produzir informação. Um exemplo: as pessoas que estavam preocupadas
com seus entes queridos não tinham outra escolha a não ser sair para tentar
obter notícias. Fazendo isso, engrossaram a multidão nas ruas. Durante os
confrontos que eclodiram na cidade, muitos centros locais – praças públicas,
prédios estratégicos, mesquitas – foram transformados em pontos de aglomeração.
Nos
dias seguintes, apesar da fragilização do regime e do crescimento da multidão
na Praça Tahrir, o retorno das redes de comunicação não levou a um novo aumento
da dispersão das manifestações. Assim, podemos estimar que a interrupção dessas
redes ajuda a explicar um fenômeno: o governo egípcio foi privado de um meio de
intimidação eficaz, a possibilidade de sugerir que uma repressão mais dura
responderia à mobilização. As informações sobre a possibilidade de tal
repressão não poderiam proliferar nas redes sociais e dissuadir os
manifestantes.
Desse
modo, a perturbação das comunicações por internet e telefonia móvel no dia 28
de janeiro de 2011 teria exacerbado a agitação popular de três maneiras
distintas. Em primeiro lugar, permitindo a mobilização de cidadãos que até
então não acompanhavam os eventos com particular interesse ou não se importavam
muito com isso. Em segundo lugar, reforçando os contatos “em carne e osso”,
favorecendo a ocupação do espaço público. Por fim, levando à descentralização
dos locais de revolta, por meio de táticas de comunicação híbridas, produzindo
um atoleiro bem mais difícil de controlar do que uma multidão concentrada
apenas na Praça Tahrir.
Um
processo semelhante parece ter se dado em Damasco, em 3 de junho de 2011. Após
várias semanas de repressão violenta, o governo sírio decidiu utilizar a mesma
tática do regime de Mubarak. Na sexta-feira, 3 de junho, a internet foi cortada
em todo o país por 24 horas, com o objetivo de impedir uma mobilização em
massa. “As manifestações de sexta-feira parecem ser as maiores das dez semanas
de revolta”, escreveu um correspondente da Associated Press que estava em
Beirute. “Um grande número de pessoas se reuniu em cidades e aldeias que até
então não tinham essa mobilização. Manifestantes também se reuniram em diversos
subúrbios de Damasco, onde as manifestações se concentraram nas últimas
semanas.”6 Proliferação das manifestações e aumento de sua dispersão espacial:
mesmo cenário do Egito.
Devemos
então concluir que a censura do Twitter é mais revolucionária que o Twitter?
Navid
Hassanpour
Doutorando
em Ciência Política na Universidade de Yale, Estados Unidos
>>>>>
Cultura vai distribuir R$ 133 milhões até abril. O
Estado de S. Paulo - 09/03/2012
-
O
Ministério da Cultura anunciou ontem que distribuirá R$ 133 milhões, cerca 50%
das verbas do Fundo Nacional de Cultura, até abril. A maior parte dos recursos
será usada para financiar ações em convênios com Estados e municípios, como os
chamados Pontos de Cultura - oficinas, cursos, produção de espetáculos e
eventos culturais selecionados pelos governos locais -, que receberão R$ 48
milhões.
As
12 cidades que serão sede da Copa do Mundo de 2014 também serão beneficiadas. A
intenção é financiar iniciativas de pequenas empresas que trabalhem com
cultura.
A
região da Bacia do São Francisco e o Pelourinho, em Salvador, vão receber R$ 16
milhões cada. No primeiro caso, para projetos culturais em 500 cidades; no
segundo, para restauração de imóveis. Há recursos ainda para a criação de
museus em cidades com até 50 mil habitantes, instalação de núcleos de cultura
negra e incentivos a feiras do livro.
>>>
DIREITO AMBIENTAL
Livro esclarece Lei dos Crimes Ambientais
Escrita
pela advogada Gina Copola, a obra “A Lei dos Crimes Ambientais comentada artigo
por artigo: Jurisprudência sobre a matéria” esmiúça a norma brasileira que
define o que é considerado crime contra o meio ambiente no Brasil e quais as
suas punições. O lançamento do livro acontece nesta terça-feira, 06/03, na
cidade de São Paulo. http://planetasustentavel.abril.com.br/
06/03/2012
-
Sancionada
em 1998 pelo então presidente da República Fernando Henrique Cardoso, a Lei nº
9.605, conhecida popularmente como a Lei dos Crimes Ambientais, é o tema do
livro A Lei dos Crimes Ambientais comentada artigo por artigo: Jurisprudência
sobre a matéria, escrito pela advogada Gina Copola.
A
obra, que já está em sua segunda edição, reúne comentários explicativos da
autora a respeito de cada um dos artigos que constituem a Lei, que define o que
é considerado crime contra o meio ambiente no Brasil e quais as punições
cabíveis para cada uma dessas infrações.
Entre
as práticas consideradas criminais na Lei estão:
-
comercializar, aprisionar, transportar e matar animais silvestres, nativos ou
em rota migratória;
-
maltratar ou abusar de qualquer espécie de animal;
-
realizar experiências dolorosas ou cruéis em animais vivos, ainda que para fins
didáticos ou científicos, caso exista recursos alternativos;
-
destruir ou maltratar plantas ornamentais;
-
fabricar, vender, transportar ou soltar balões;
-
pichar, grafitar ou sujar, de alguma outra forma, edificações ou monumentos
urbanos e
-
dificultar ou impedir o uso público das praias do país.
O
lançamento da obra acontece nesta terça-feira, 06/03, às 19h, na Livraria da
Vila, em São Paulo, com presença da autora, Gina Copola. Os interessados podem
comprar o livro nas lojas especializadas de todo o país e, também, no portal da
Editora Fórum, responsável pela publicação da obra.
A
Lei dos Crimes Ambientais comentada artigo por artigo: Jurisprudência sobre a
matéria
Autor:
Gina Copola
Editora
Fórum
2ª
edição
205
páginas
Lançamento
Data:
06/03
Horário:
19h
Local:
Livraria da Vila
Endereço:
Alameda Lorena, nº 1731, Jardim Paulista - São Paulo/SP
>>>
Instituto Chico Mendes
sem comando. O
Globo - 10/03/2012
-
Presidente
do órgão pediu demissão por divergências com a ministra Izabella BRASÍLIA. Como
se não bastasse o Supremo Tribunal Federal (STF) considerar inconstitucional a
criação do Instituto Chico Mendes (decisão que durou apenas 24 horas), o órgão
está acéfalo. Desde o carnaval, o presidente do instituto, Rômulo Mello,
entregou sua carta de demissão à ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira,
que a aceitou. A ministra entrega à presidente Dilma Rousseff uma lista com
três nomes para substituí-lo na próxima semana. Até que a troca seja feita, a
gestão das 310 unidades de conservação federais está nas mãos da interina de
Rômulo, Silvana Canutto. A saída de Rômulo, que é funcionário de carreira do
Ibama há mais de 20 anos, se deve a um desgaste na relação dele com Izabella. Desde
que o órgão foi criado, em 2007, coube a ele a coordenação de um ninho de
problemas incrustado nos parques, florestas e reservas ambientais do governo,
que, somadas chegam a 75 milhões de hectares, 8,8% do território do país.
Grande parte das unidades de conservação não conta com uma estrutura mínima,
como fiscais e administrações, e sequer estão demarcadas. Além disso, o próprio
Instituto Chico Mendes estima que metade das unidades está ocupada por
posseiros que têm de ser retirados e indenizados, o que custaria aos cofres
públicos R$ 30 bilhões, dez vezes o orçamento do órgão. O problema vem se
acumulando desde que a primeira unidade de conservação foi criada, em 1937. O
Parque Nacional de Itatiaia (RJ), o mais antigo do Brasil, foi criado naquele
ano, e até hoje, tem dentro de seus limites gado e cerca de 150 colonos.
Izabella já manifestou sua insatisfação com esse problema. Ela reclamava em
público de Rômulo e cobrava mais criatividade para resolver a situação, que
passa pela carência de recursos e pessoal. Outro ponto que contribuiu para a
saída de Rômulo foi a dificuldade que o órgão enfrenta para gastar recursos da
Compensação Ambiental, percentual que todo empreendimento que afeta unidades de
conservação é obrigado a pagar ao governo. A cobrança foi parar na Justiça e só
no final do ano passado o imbróglio foi resolvido, mas até hoje o gasto efetivo
da verba é irrisório.
>>>
Literatura: Popvest.
Um malandro nacional
Memórias
de um Sargento de Milícias é uma espécie de certidão de nascimento literária do
jeitinho brasileiro
Manoel
Antônio de Almeida: escritor morreu jovem, em um naufrágio
LIVRO:
Memórias
de Um Sargento de Milícias
Ano
de publicação em livro – 1854
Escola
literária a que costuma ser vinculado – Romantismo O POPULAR/GO 09.03
-
O
ano de 1881 marca o início do realismo na literatura brasileira, com a
publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Se o marco
fosse recuado em quase 30 anos, mais precisamente para 1855, com o aparecimento
de um outro Memórias..., não estaria de todo errado – em que pese a opinião
contrária de Mário de Andrade –, pois expressaria o embate em torno de uma obra
que divide a opinião de críticos literários como Antonio Cândido, José
Veríssimo, Darcy Damasceno, Josué Montello e o próprio Andrade. Assim, Memórias
de Um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida, é uma dessas obras
temporãs em relação às classificações dos estilos de época e escola literária,
que evidenciam como essas fronteiras são diáfanas.
Curiosidades
históricas envolvendo autor e obra não faltam. Nascido em 1831, no Rio de
Janeiro, Manoel Antônio de Almeida é o segundo dos quatro filhos de um modesto
casal de portugueses. Apesar das dificuldades financeiras da família, Almeida
obteve êxito nos estudos, formando-se médico, profissão que não chegou a
exercer. Aos 20 anos de idade estreava na imprensa, atividade que se revelaria
uma grande vocação, escrevendo o artigo Civilização dos Indígenas. Neste
trabalho, ataca rispidamente o projeto do historiador Francisco Adolfo
Varnhagen, que propunha restabelecer o movimento das bandeiras para ocupar a
terra dos índios e escravizá-los. Era a veia romântica do escritor, voltada
para o indianismo que marcou importante segmento estético do romantismo
brasileiro.
Em
A Pacotilha, suplemento dominical do Correio Mercantil, Antônio de Almeida
publica Memórias de Um Sargento de Milícias em capítulos que não são assinados.
Isto ocorre no período que vai de 27 de junho de 1852 a 31 de julho de 1853. Em
1855, sairia pela Typografia Brasiliense de Maximiano Gomes Ribeiro o volume da
obra, assinado ainda sob o pseudônimo de Um Brasileiro. Em 1858, é nomeado
administrador da Tipografia Nacional, cargo em que deu oportunidade de trabalho
a um tímido mulato, desconhecido à época, um certo Joaquim Maria Machado de
Assis, que se tornaria o maior escritor brasileiro de todos os tempos na
opinião de parcela significativa da crítica literária nacional.
Na
manhã de 28 de novembro de 1861, Almeida morre no naufrágio do vapor Hermes,
acidente ocorrido a algumas milhas da costa. Há quem afirme que antes de
embarcar o escritor tivera um mau agouro em relação à viagem ao cruzar pelo
caminho com um sacerdote católico.
Estudos
clássicos
A
narrativa de Memórias de Um Sargento de Milícias se passa à época de d. João
VI, no começo do século 19 (que o vestibulando deverá grafar em algarismo
romano). Leonardo Pataca e Maria das Hortaliças, pais de Leonardo Filho, o
protagonista, se conhecem e passam a viver juntos a partir de uma viagem de
navio para o Brasil. Já em terra, após o nascimento e o batizado do menino,
“filho de uma pisadela e de um beliscão”, Pataca flagra a mulher com outro
homem. Os amantes fogem para Portugal. Com a separação, o menino é criado por
um padrinho.
Da
infância à fase adulta, Leonardo desenvolverá um caráter totalmente
despreocupado e voltado às travessuras, acabando por se dar bem na maioria das
vezes. A sua malandragem atrai a simpatia de outras personagens. Sua
experiência no mundo da vadiagem faz com que, finalmente, seja escolhido por
Vidigal, o temido chefe de polícia da cidade, para ocupar o cargo na tropa de
soldados. Ao final, Pataca Filho se tornará sargento de milícias por conta da
influência de Maria-Regalada junto a Vidigal, com a promessa de uma futura
união caso o major se mostrasse complacente com as faltas de Pataca.
Este
enredo insólito para a estética romântica da época, com a presença do
anti-herói que nega as qualidades do herói do romantismo tradicional, leva
Mário de Andrade a concluir pela definição da obra como um romance picaresco,
que se caracteriza pela presença do pícaro (malandro, bufão) que narra suas
aventuras repletas de malandragens pelas diversas camadas da sociedade. Segundo
Andrade, a verdadeira filiação de Memórias... é essa. Em seu ensaio sobre o romance
de Manuel Antônio de Almeida, afirma Andrade de maneira até certo ponto
contraditória: “Apesar desta preocupação antirromântica, não creio acertada a
crítica nacional, ao repetir que o romance é realista e naturalista, não lembra
obra estrangeira nenhuma anterior a ele, e é precursor do realismo e do
naturalismo francês.”
Se
a obra é precursora do realismo e do naturalismo francês, não há muita razão
para que não possa ser considerada como sendo vinculada a estas estéticas,
entendidas aqui como a representação artística própria dos movimentos realistas
e naturalistas, que guardam relativa afinidade entre si. Mais que isto. A
literatura brasileira novecentista andou sempre a reboque do que se fazia na
Europa, principalmente na França, a grande matriz cultural do século 19. Mário
de Andrade parece subestimar esse dado em seu estudo, uma vez que Manoel
Antônio de Almeida, como precursor das estéticas realistas e naturalistas,
representa um feito notável para as letras nacionais. De uma só pena, Almeida revela-se
precursor não só do magistral Machado de Assis como também das duas importantes
escolas literárias francesas.
Mais
adiante, Andrade concluirá o seu estudo sobre Memórias... afirmando: “O seu
falso realismo sarcástico é a consequência de uma concepção pessimista da vida,
revoltada e individualista.” Em História Concisa da Literatura Brasileira, o
crítico literário Alfredo Bosi endossará a filiação do romance almeidiano à
escola realista, concluindo a sua análise nestes termos: “As Memórias... nos dão,
na verdade, um corte sincrônico da vida familiar brasileira nos meios urbanos
em uma fase em que já se esboçava uma estrutura não mais puramente colonial,
mas ainda longe do quadro industrial-burguês.”
Um
contraponto à posição de Mário de Andrade, escrita em 1941, é apresentada por
Darcy Damasceno em 1956, que prefere classificar o romance de Almeida como de
costume. A síntese da tese de Andrade, e da antítese de Damasceno, é
apresentada por Antonio Cândido num clássico ensaio intitulado Dialética da Malandragem,
publicado originalmente em 1970. Nesse trabalho que evoca a dialética hegeliana
em sua metodologia expositiva, Cândido aponta o que é pertinente ou não nas
análises de Mário de Andrade e Darcy Damasceno. E conclui que o romance de
Manuel Antônio de Almeida, apesar de seus traços picarescos e realistas, está
mais para uma “fábula realista composta em tempo de allegro vivace (animação)”.
Acerca
do romance picaresco, de origem espanhola, Cândido assevera em Dialética da
Malandragem que ele é narrado em primeira pessoa, o que não é o caso de
Memórias de Um Sargento de Milícias, cujo foco narrativo é em terceira pessoa.
O crítico aponta em seu estudo o contexto cultural em que Memórias... foi
produzido: “De fato, para compreender um livro como as Memórias..., convém
lembrar a sua afinidade com a produção cômica e satírica da Regência e
primeiros anos do Segundo Reinado – no jornalismo, na poesia, no desenho, no
teatro. Escritas de 1852 a 1853, elas seguem uma tendência manifestada desde o
decênio de 1830, quando começam a florescer jornalzinhos cômicos e satíricos,
como O Carapuceiro, do padre Lopes Gama (1832-34; 1837-43; 1847), e O Novo
Carapuceiro, de Gama e Castro (1841-42). Ambos se ocupavam de análise política
e moral por meio da sátira dos costumes e retratos de tipos característicos,
dissolvendo a individualidade na categoria, como tende a fazer Manuel Antônio.”
Um
consenso entre os críticos é que a obra de Almeida não se preocupa em apontar
importantes fatores sociais da época, como a violência e o problema da
escravidão, contextos fundamentais para a vida da então capital federal. Numa
contextualização atual da obra, mesmo que correndo o risco da superficialidade,
não dá para deixar de pensar em Memórias de Um Sargento de Milícias como uma espécie
de certidão de nascimento literária do famoso “jeitinho brasileiro”, com todas
as implicações desse malfadado jeito de ser tupiniquim. Neste particular, a
saga com matizes picarescos de Pataca lembra em muito a vida política dos
nossos dias, quando indivíduos totalmente despreparados para desempenhar
funções públicas em qualquer escalão são guindados a postos-chaves por um
repulsivo processo de apadrinhamento que atropela princípios civilizatórios
básicos como o da meritocracia.
Assim,
tanto no plano formal quanto no plano estético da historiografia literária, uma
conclusão possível para Memórias de Um Sargento de Milícias – que está mais
para uma confirmação – é que, de fato, as fronteiras que demarcam as escolas e
os movimentos literários são mesmo muito fluidas.
Gismair
Martins Teixeira é doutorando em Estudos Literários pela UFG e professor
licenciado da Secretaria de Educação do Goiás, lotado no Colégio Estadual
Waldemar Mundim
O
autor
Manuel
Antônio de Almeida (1931-1961) morreu antes de completar 30 anos. Mesmo com uma
vida tão curta, ainda se formou em medicina, trabalhou na Tipografia Nacional e
teve destaque na imprensa da época, sendo redator no jornal Correio Mercantil.
Também deu aulas no Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro. No momento em
que se preparava para ingressar na política, morreu no naufrágio do navio
Hermes. Órfão desde os 13 anos de idade, passou por dificuldades financeiras e
não chegou a exercer a profissão de médico. Sua única obra, além do romance
Memórias de Um Sargento de Milícias, é a peça teatral Dois Amores, que veio a
público no ano de sua morte.
>>>
Presídios e hospitais Circe Cunha // circecunha.df@dabr.com.br CORREIO BSB 10.03
-
Hospitais
dão pouca importância ao doente. Primeiro a papelada e o questionário.
Garantias de pagamento. A internação exige dinheiro ou cheque. Assinaturas em
diversos documentos. Cartão de crédito, cheque caução. Consultam sobre fundos.
Planos de saúde, mais trabalho. Fax, e-mail, telefonemas, formulários,
aprovações. Há os hospitais com profissionais despreparados. Não informam o
próximo passo fazendo com que o tempo para as soluções triplique. Atendem
mascando chiclete ou discutem a escala enquanto a família aguarda notícias. Há
os generosos e gentis. Chamam pelo nome e não “tio” ou “mãe”. Mas não dispensam
que o paciente redobre a atenção e leia tudo o que assina, exija laudos,
recibos e carimbos. Esse é o problema. Só quem sabe quanto vai custar o
atendimento é quem está do lado de lá do balcão. Eles têm uma tabela
particular. O doente só vai saber quanto tudo custou quando a conta chega. Pior
de toda essa história é que os hospitais contam com a vulnerabilidade dos
familiares em não falar em dinheiro quando o que está em jogo é a vida de um
ente querido. (Circe Cunha)
>>
A
cabeça de Salman Rushdie
Dois
livros do controverso autor britânico são reeditados no Brasil e trazem sua
leitura particular sobre a Índia CORREIO BSB 10.03
-
Por
uns bons anos, Salman Rushdie andou mais sumido que Salinger. Sua segurança era
assunto de Estado no Reino Unido. Ele não dava entrevistas, não aparecia em
público. Mesmo assim, seus livros ganhavam traduções e edições mil pelo mundo.
Quer
dizer, pelo mundo ocidental. Claro. No mundo oriental, àquela altura, Salman
Rushdie era um autor, no mínimo, controverso. Seu terceiro romance, Versos
satânicos (1988), foi lido como blasfemo por importantes líderes muçulmanos.
Rushdie teria tomado liberdades demais em cima de algumas passagens do Alcorão.
O
aiatolá Khomeini, líder político-religioso do Irã, chamou para si a bronca e
expediu uma sentença de morte contra Rushdie em fevereiro de 1989. A fatwa de
Khomeini lançou o escritor em uma espécie de clandestinidade. Rushdie mudava de
casa a cada par de semanas na Inglaterra e trocou a companhia da família pela
de agentes do serviço secreto britânico.
O
último suspiro do mouro De Salman Rushdie. Tradução de Paulo Henriques Britto.
Editora Companhia das Letras, 504 páginas. R$ 29.
Outros
líderes religiosos aproveitaram a fatwa e deram um gás na estória: uma
recompensa de US$ 3 milhões pela cabeça de Rushdie. De modo que nem mesmo a
morte de Khomeini, pouco depois, maio de 1989, fez com que a caçada sossegasse.
Rushdie
parece já ter passado pelo pior. Aos poucos, foi deixando os abrigos. Hoje ele
frequenta o jet set internacional, é amigo do Bono, faz pontinhas descoladas em
filmes e séries de tevê, namora atrizes e modelos. Hoje é recebido por reis e
rainhas, atende por Sir Salman Rushdie e se tornou um defensor internacional da
arte e da liberdade de expressão.
Seu
tradutor para o japonês não teve a mesma sorte: Hitoshi Igarashi foi esfaqueado
à morte dentro da faculdade em que dava aulas de literatura.
Enfim.
Salman Rushdie também não está livre de ainda ser tomado como alvo por um
maluco qualquer. Por via das dúvidas, em janeiro cancelou sua participação em
uma feira literária em Jaipur, na região do Rajastão, Índia. Informes da
inteligência britânica alertaram que aquela não seria uma viagem segura.
Oriente,
ocidente De Salman Rushdie. Tradução de Melina R. de Moura. Editora Companhia
das Letras, 168 páginas. R$ 21.
Cidadão
inglês de origem indiana, Salman Rushdie vive na Inglaterra desde jovem. Mas
faz da Índia, e daquela mistura de etnias e culturas, o verdadeiro centro de
sua obra. Como se pode ver em dois livros recém-relançados no Brasil.
Justamente os dois livros por ele publicados ainda no momento de maior
turbulência da fatwa.
O
último suspiro do mouro (1995) foi o quarto romance de Rushdie, o primeiro após
Versos satânicos. É uma aventura surpreendente, uma alegoria de fundo histórico
e político e cultural que pode ser entendida de várias maneiras, inclusive como
uma resposta à intolerância da qual foi vítima.
Oriente,
ocidente (1994) é bem parecido, ainda que seja de outra ordem. Esta é uma
coletânea de contos, a primeira da bibliografia de Rushdie. Todos foram
escritos nos anos anteriores. Ou seja, escritos em subterrâneos, em bunkers da
Scotland Yard, em endereços que não podem ser revelados.
Muitos
desses contos foram feitos sob encomenda para revistas como Atlantic Monthly,
New Yorker, Granta e London Review of Books. Ou seja, podem tanto ser lidos
como mensagens lançadas ao mar quanto como demonstrações do enorme prestígio
que este náufrago já alcançara, um prestígio que seguia intocado mesmo após uma
polêmica religiosa sem precedentes.
Esses
dois livros estão sendo reeditados pela Companhia das Letras a preços camaradas
em sua coleção de bolso. A mesma coleção já contava com Versos satânicos em seu
catálogo. Eles podem manter o leitor brasileiro ocupado enquanto Rushdie não
libera seu aguardado livro de memórias, previsto para este ano ainda.
Prestes
a romper
O
último suspiro do mouro é uma aventura delirante. Como só poderia ser delirante
uma estória que começa com os navegantes portugueses dando com os costados em
terras da Índia. Lá acompanharemos quatro gerações de uma família portuguesa,
descendente dos colonizadores, que conhecerá ascensão, declínio e uma mágica
redenção ao longo das turbulências do século 20 na Índia.
Nosso
guia por essa epopeia luso-indiana é Moraes Zogoiby, o tal mouro do título.
Zogoiby tem sangue português, árabe e judeu. Zogoiby é filho de uma linda
artista plástica. Mas ele é feio e defeituoso. Não tem a mão direita, a mão que
sua mãe usa pra pintar. E envelhece com o dobro da velocidade que uma pessoa
normal.
Aos
vinte e poucos anos, Zogoiby já é um édipo quarentão que entra em conflito com
os pais e acaba posto para fora de casa. Mas ele é também o último varão da
dinastia Da Gama-Menezes...
Zogoiby
assume a narração de O último suspiro do mouro para desenrolar o novelo. E não
é pequeno esse novelo: são quase 500 páginas de cobiça & traição que se
abrem com os tataravós de Zogoiby, prósperos comerciantes de especiarias. A
primeira das quatro partes do livro é levada em um saboroso tom farsesco e dá
conta da briga na família, que se divide ao meio, e divide suas terras ao meio,
enquanto os britânicos e os estrangeiros seus aliados são gentilmente
convidados a se retirarem da Índia.
Do
surgimento de Mahatma Gandhi ao assassinato de Indira Gandhi, as convulsões
políticas sacodem a estória. Quando ela passa da zona rural de Cochin para a
cidade de Bombain, se torna menos tropical e mais cinzenta. Com um novo
elemento: o convívio de artistas e intelectuais com o submundo corrupto da
política.
O
último suspiro do mouro, nesse ponto, assume um ar de palimpsesto — para aqui
usar uma imagem trazida pelo próprio Salman. Um palimpsesto era um pergaminho
que fora lavado ou raspado até que o texto que nele estava escrito fosse
apagado, e ele pudesse ser utilizado novamente. Mas o texto nunca se apagava
por completo.
E
aqui é como se Rushdie escrevesse O último suspiro do mouro num palimpsesto. Um
texto escrito sobre outro texto sobre outro texto. A narrativa de Zogoiby é
verborrágica e digressiva, e se torna ainda mais caudalosa à medida que avança,
dando a impressão de estar em ebulição, estar prestes a se romper.
Como
um palimpsesto raspado até se tornar tão fino, tão frágil que se rompe no leve
encostar do bico da pena. Quando a narrativa que lentamente ia caducando enfim
se rompe, Salman Rushdie atinge uma excelência à Thomas Pynchon. E soa como uma
versão anglo-indiana de Mario de Andrade, na qual o Zogoiby seria o Macunaíma
de uma terra em permanente desassossego.
Entre
dois mundos
É
uma tentação, para muitos leitores, analisar uma obra a partir da vida pessoal
de seu autor. No caso de uma vida como a de Salman Rushdie, então, a tentação
passa dos limites do suportável. Por isso, a leitura que ainda hoje se faz de O
último suspiro do mouro como um ensaio sobre a intolerância. E talvez seja
mesmo por aí.
Pois
O último suspiro do mouro pode ser pensado como uma alegoria sobre a Índia, uma
nação dividida em várias. Apenas a harmonia e a tolerância podem desarmar essa
bomba-relógio à indiana. Uma bomba que é biológica em Zogoiby e que avança num
tique-taque acelerado demais.
Uma
leitura assim, no entanto, pode dizer mais sobre quem lê do que sobre o que é
lido. Uma leitura assim acaba por reduzir a obra a um só entendimento, e seria
um crime empobrecer O último suspiro do mouro desse tanto.
Vale
notar ainda que nesse livro Salman Rushdie estava a reafirmar, em larga escala,
um sentido que Os filhos da meia-noite (1981) já trazia. Os dois romances
compõem um mural, entre o fantástico e o real, da Índia segundo Rushdie. Seus
personagens em igual medida belos e malditos, mergulhados num momento histórico
mais forte que eles. Um mural que já começara a ser pintado bons anos antes da
fatwa.
Oriente,
ocidente confirma esse olhar humanista da literatura de Rushdie. O curioso
deste pequeno e inspirado livrinho — nove contos em 160 páginas — é justamente
sua aparência inofensiva e mesmo modesta diante de catataus como Os filhos da
meia-noite, O último suspiro do mouro e Versos satânicos, todos alentados e
ambiciosos.
Oriente,
ocidente concentra a verve de Rushdie em tiros curtos e o efeito é por vezes
sensacional, ainda que o resultado seja variável, como é costumeiro em
compilações. Com a sem-cerimônia de quem cita Shakespeare e Maomé no mesmo
fôlego, o ocidental/oriental Rushdie traz pequenas estórias em que os
personagens estão em conflito no mundinho que lhes cabe.
Assim
temos uma indiana feliz por não conseguir visto para o Reino Unido (“Bom
conselho é mais raro que rubis”), um pobretão que sonha com Bollywood (“A rádio
livre”), um escritor que descobre a trairagem do amigo suicida (“A harmonia das
esferas”)... E voltamos até o século das grandes navegações para “Cristóvão
Colombo e a rainha Isabel de Espanha consumam seu relacionamento”. Ali
descobrimos com que espécie de argumentos o galanteador Colombo convenceu Sua
Majestade a liberar aquelas caravelas...
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CONGRESSO » Ameaça
ao Código Florestal
Presidente
da Câmara alerta que a aprovação do projeto depende do próprio governo. Votação
do texto está marcada para a próxima terça-feira, mas Planalto precisa atender
demandas represadas da base aliada Circe Cunha // circecunha.df@dabr.com.br CORREIO BSB 10.03
-
Marco
Maia disse ontem no Congresso que o PT também tem perdido espaço na Esplanada,
como é o caso do Ministério da Pesca
Sob
o fogo cruzado do embate entre o Palácio do Planalto e os partidos rebelados da
base aliada, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), sinalizou ontem que a
votação do projeto de lei que cria o novo Código Florestal, prevista para a
próxima terça-feira, só vai caminhar se o governo se dispuser a atender as
demandas represadas. “O próprio governo admite que há problemas de
relacionamento com a base aliada. Quando o governo chega a reconhecer isso, a
expectativa é que faça algo para melhorar essa situação”, disse Maia.
“Nós
estamos acordados para votar o Código Florestal na próxima terça à noite, mas é
público que há um clima ruim nas relações entre o governo e o parlamento. Vamos
ter que avaliar nas próximas semanas quais serão os desdobramentos das decisões
que foram tomadas”, afirmou o presidente da Câmara.
A
rebelião tem como principal nome o PMDB, que chegou a divulgar um manifesto
afirmando que o PT está usando a estrutura do governo federal na tentativa de
superar o número de prefeituras peemedebistas, mas inclui entre os queixosos
PDT, PSB e PR. O próprio Marco Maia protagonizou uma contenda recente com o
Planalto, quando paralisou, no plenário, a votação do projeto que cria a Fundação
de Previdência Complementar dos Servidores Públicos Federais (Funpresp). Ontem,
além de cobrar acenos do governo, o presidente da Câmara saiu em defesa do PT.
“Não
é verdade que o PT ocupa espaços de outros partidos. Nós também perdemos
espaços, como o Ministério de Ciência e Tecnologia e o Ministério da Pesca”,
disse Maia. “Mas é papel do governo construir mecanismos que permitam a
participação dos partidos aliados nas suas decisões.”
Efeito
direto do atrito com a base aliada, a presidente Dilma Rousseff sofreu uma dura
derrota na última quarta-feira, quando o Senado, com a ajuda de governistas,
rejeitou a recondução de Bernardo Figueiredo para o cargo de diretor-geral da
Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Alterações
Agora,
é o Código Florestal que está na mira dos aliados. O governo quer manter sem
grandes alterações o texto que foi aprovado no Senado, mas a resistência já
começa no relator da matéria, o deputado Paulo Piau (PMDB-PR), que propôs 28
alterações ao projeto. Próximo à bancada ruralista, Piau admite, inclusive,
recuperar em parte a notória Emenda nº 164, que promove uma anistia a
desmatamentos ilegais feitos em áreas de proteção permanente (APPs) até 2008.
O
Palácio do Planalto montou uma operação para tentar evitar surpresas na votação
do Código Florestal. Escalou os dois ministros responsáveis diretos pelo debate
do tema — Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e Mendes Ribeiro (Agricultura) —
para atuar na Câmara. Mas não é apenas o lado técnico que será trabalhado —
eles terão também que atuar como militantes partidários para diminuir a tensão
nas relações entre o PT e o PMDB e encontrar um texto equilibrado que não
desagrade ruralistas e ambientalistas.
O
governo sabe os riscos na votação do Código Florestal. A matéria, inclusive,
foi a primeira grande derrota de Dilma, quando os peemedebistas aprovaram a
Emenda nº 164 — que agora, tentam recuperar. “Isso não vai se repetir, o PMDB
não vai apresentar uma emenda nova ao texto”, assegurou o líder do governo na
Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP).
Para
um petista especializado nas relações com o PMDB, votações como essa são uma
ótima oportunidade para expor as insatisfações. “Ninguém vai protestar votando
contra os próprios princípios. No PMDB, a bancada ruralista é uma ótima desculpa
para o PMDB trair o governo”, disse o petista.
Os
entraves
Confira
o que está dificultando a votação do Código Florestal na Câmara
»
Em meio a uma crise com a base aliada, o governo trabalha para aprovar na
íntegra a versão do projeto enviado pelo Senado. O relator da matéria, deputado
Paulo Piau (PMDB-PR), fez 28 modificações no texto, em seu parecer.
»
A bancada ruralista quer recuperar a Emenda nº 164, que permite uma anistia a
desmatamentos ilegais feitos em áreas de proteção permanente (APPs) até 2008. O
Ministério do Meio Ambiente resiste e quer liberar apenas atividades de
utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental.
»
O governo quer retirar a obrigatoriedade de recomposição ambiental de 20 metros
quadrados para cada habitante nas chamadas zonas de expansão urbana, por causa
do impacto da medida no custo de projetos sociais habitacionais. Ambientalistas
defendem o item.
»
Governo e ambientalistas defendem o estabelecimento de metragens variáveis na
recomposição de APPs ao longo das margens do rio. Os ruralistas querem de volta
o texto da Câmara, que estabelece uma metragem mínima para a recomposição, de
15 metros, e deixa limites maiores a critério da União e dos estados.
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Feito de palavras.
Paulo
Henriques Britto, poeta, tradutor e professor, lança sua sexta antologia de
versos
RAIO-X
PAULO HENRIQUES
VIDA
Nasce
no Rio, em 1951
CARREIRA
Estudou
cinema e linguística; é mestre e doutor (por notório saber) pela PUC-RJ, onde
leciona. É autor de um livro de contos e seis de poesia; por "Macau"
(2003), ganhou o Portugal Telecom 2004 FOLHA SP 10.03
-
"A
vida consiste de afirmações sobre a vida."
A
citação, do poema "Men Made Out of Words" -homens feitos de
palavras-, de Wallace Stevens (1879-1955), poderia bem servir como epígrafe a
"Formas do Nada", sexta antologia poética de Paulo Henriques Britto,
60.
"Uma
palavra transcrita/ ou vírgula acrescentada:/ a súmula de uma vida/ (que,
afinal, foi mais que nada).", diz "Apêndice", um dos cerca de 60
poemas que o carioca reuniu no volume, lançado nesta semana.
"Formas
do Nada" é uma espécie de tratado sobre a finitude. Seus poemas podem ser
lidos como uma coletânea de afirmações a respeito da vida -ou sobre o que há de
comum à existência de todos.
O
americano Stevens foi o primeiro poeta traduzido por Paulo Henriques, no começo
dos anos 1970, e quase um patrono de sua poesia.
A
atividade de tradutor, iniciada por gosto, se tornaria central na vida de Paulo
Henriques, que é hoje o maior responsável por transpor a obra de autores de
língua inglesa no país, além de ativo professor de seu ofício em cursos de
graduação e pós-graduação da PUC do Rio.
"A
melhor maneira de ler um escritor a sério é traduzindo-o", afirma ele à
Folha, sentado na sala de seu apartamento na Gávea, a poucas quadras da
universidade.
Levado
isso em conta, Paulo Henriques "leu a sério" boa parte da produção
mais relevante em língua inglesa na atualidade (Philip Roth, Ian McEwan e V.S.
Naipaul são só uma minúscula amostra), além de um bom quinhão de anglófonos
consagrados ao longo dos séculos.
A
lista inclui nomes que vão do poeta romântico inglês Lord Byron ao romancista
Henry James, passando por Elizabeth Bishop (ele acaba de ampliar as edições de
prosa e poesia da americana, que viveu por anos no Brasil).
Com
Bishop, Paulo Henriques partilha a fina ironia e o distanciamento, que permitem
abordar com certo humor até a morte, num "trabalho de contenção da
emoção".
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"Poeta não é profissão", afirma escritor
Paulo
Henriques Britto conta que sua vocação se desenhou na infância, mas que se vê
como tradutor e professor FOLHA SP 10.03
-
Tradução
o resgatou para a escrita poética, paralisada porque 'não havia mais o que
escrever' após Cabral
-
"Sempre
tive vontade de escrever, desde garoto bem pequeno", recorda Paulo
Henriques Britto.
Ainda
assim, afirma que não é a poesia a porção da escrita que o define. "Poeta
não é profissão. Tem gente que vive de poesia, acho incrível. Mas minha relação
com a poesia é muito diferente. Sou professor e tradutor."
A
mudança da família para os EUA, graças à transferência do pai, militar, semeou
cedo sua futura profissão. Ele tinha entre nove e dez anos e, numa escola
pública de Washington, tomou contato com o inglês e com a poesia.
"Aqui,
me davam poesia infantil. Lá me deram Shakespeare, pegaram pesado."
Na
volta, dois anos e meio depois, começou a ler "poesia séria, Drummond,
Pessoa". E a escrever versos.
"Quando
chegou por volta de 67, 68, eu ia muito ao Museu de Arte Moderna, àqueles
debates, os concretistas brigando com os neoconcretistas, com o pessoal da
poesia práxis, poema-processo."
O
jovem poeta se viu deslocado no panorama.
"Eu,
ouvindo aquilo tudo e interessado em aprender a escandir, a rimar, me disse: 'O
que estou fazendo já não tem nada a ver'. Desisti. Comecei a escrever prosa e
fui fazer cinema", resume.
O
novo ofício o levou a um curso na Califórnia. Ao lado de roteiros e "uns
dois filminhos", nasceram "dezenas de contos". Data do período
em San Francisco, "por volta de 73, 74", o encontro definitivo com o
poeta Wallace Stevens.
"Um
amigo me deu para ler. Adorei e comecei a traduzir da minha cabeça." Era
um novo recomeço para a poesia de Paulo Henriques Britto.
Os
contos, esses ficariam na gaveta até os anos 2000, conformando, em 2004,
"Paraísos Artificiais", seu único título de ficção, que já assinou
como o reconhecido poeta de "Macau" (Prêmio Portugal Telecom naquele
ano).
A
tradução de Stevens deu cabo da paralisia que ele então sentia pela influência
da obra de João Cabral de Melo Neto, "espécie de superego poético" de
sua geração.
"Quando
li 'Uma Faca Só Lâmina' fiquei achando que não podia escrever mais nada. Foi um
trauma completo. Só voltei depois que comecei a traduzir o Stevens."
MÉTRICA
E RIMA
De
João Cabral, porém, admite ter aprendido o rigor, que se somou ao apreço
notável, em toda a sua produção poética, pelas formas fixas -isto é, aquelas
com esquema métrico e de rimas predeterminado.
"O
que me salvou foi a língua inglesa. Enquanto o pessoal estava matando o verso
aqui, eu estava acompanhando o trabalho de poetas como W.H. Auden, que não
matou verso coisa nenhuma e que sempre foi reverenciado. Isso me ajudou a não
entrar em parafuso com essa questão."
Uma
forma fixa -o soneto, uma das favoritas de Paulo Henriques- "faz uma série
de coisas". "Uma delas é a seguinte: como veta certas soluções e
aponta outras, obriga você a sair do óbvio."
A
metalinguagem é outro elemento constante. "Muito do que geraria poesia
hoje resulta numa canção popular. Então o território que sobrou para a poesia
foi o da reflexão sobre a linguagem" -que, no caso dele, se mantém ligada
à defesa da dicção coloquial.
Tal
reflexão sobre a linguagem demarca seu cotidiano, amarrando suas atividades
numa unidade tripartite.
Na
sala de aula, no dia seguinte à entrevista, o tradutor fluente e o poeta
elegante se reúnem no mestre generoso, mas pragmático, a lembrar os alunos de
graduação de que "não existe solução fácil". Ali, sobre o tablado,
Paulo Henriques Britto é os três e é um. (FRANCESCA ANGIOLILLO)
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