quarta-feira, 21 de março de 2012
Especialista em arbitragem diz que Justiça
brasileira se tornou exemplo para o mundo stj.jus.br 20.03
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"Vocês
podem se surpreender, mas eu afirmo que o Brasil se tornou um modelo judiciário
para os outros países, pela eficiência e pela transparência”, enfatizou o
professor-doutor holandês Albert Jan Van Den Berg ao apresentar a conferência
“Arbitragem no Âmbito Internacional – Convenção de Nova Iorque”, na sala de
conferências do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O evento, promovido pela
Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), foi
realizado na manhã de hoje, terça-feira (20).
Van
Den Berg é um dos mais renomados especialistas sobre a Convenção de Nova Iorque
em todo o mundo e foi recebido, antes de proferir sua aula, pelo presidente do
STJ, ministro Ari Pargendler. “É uma honra tê-lo conosco. A arbitragem é
essencial para o Judiciário brasileiro”, saudou o ministro, que ficou surpreso
com o conhecimento do professor sobre as decisões do Tribunal da Cidadania.
“Estou impressionado com o número de decisões do STJ envolvendo a Convenção de
Nova Iorque. Pela quantidade e também pela qualidade dessas decisões”,
salientou o professor.
A
Convenção de Nova Iorque, assinada naquela cidade em junho de 1958, reconhece e
executa sentenças arbitrais estrangeiras. É considerado o instrumento
multilateral de maior sucesso no campo do direito comercial internacional. Para
os especialistas, a convenção é a peça central no cenário de tratados e leis de
arbitragem, garantindo sua validação em vários países e favorecendo os negócios
e comércios internacionais, pois fornece segurança adicional às partes que
celebram transações mundiais.
Atualmente,
a Convenção de Nova Iorque vigora em mais de 145 nações. O Brasil assinou o
documento há dez anos e, de lá para cá, de acordo com Van Den Berg, tornou-se o
“melhor aluno da classe”. Tudo porque, pela Constituição brasileira, as
sentenças estrangeiras são de competência do STJ, que centraliza as decisões
arbitrais que em outros países precisam subir os degraus da jurisdição para
chegar ao resultado final. “A centralização e uniformização das questões sobre
sentenças estrangeiras pelo STJ facilitam o entendimento das decisões, pois o
juízo é muito especializado. Por isso os investidores estrangeiros já confiam
nas decisões tomadas aqui”, enfatizou Van Den Berg.
Julgados
no site
Van
Den Berg também salientou: “A produção do STJ é muito boa, mas seria ainda mais
relevante se os juízes passassem a citar a Convenção de Nova Iorque nas
decisões que envolvem o tema. Assim criaríamos um índex mais abrangente do que
é feito aqui em termos de arbitragem.” Hoje, o site da Convenção de Nova Iorque
relaciona 40 julgados do Brasil que abordam o documento, para consulta dos
juízes ao redor do mundo.
A
aula do professor Van Den Berg foi aberta pelo diretor-geral da Enfam, ministro
Cesar Asfor Rocha, e contou com a presença dos ministros Sidnei Beneti, Nancy
Andrighi, Napoleão Nunes Maia Filho, Castro Meira, Massami Uyeda, Humberto
Martins e Paulo de Tarso Sanseverino, todos do STJ, assim como o desembargador
convocado Adilson Macabu; da representante da embaixada dos Países Baixos,
Sarah Cohen; da presidenta do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr), Adriana
Braghetta; da coordenadora do CBAr, Ana Carolina Beneti, e do presidente da
Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Gabriel Wedy.
A
palestra de Van Den Berg traçou um estudo comparado da Convenção de Nova Iorque
com a Lei Brasileira de Arbitragem, mostrando as semelhanças entre elas em
diversos artigos. Na oportunidade, Van Den Berg, juntamente com o CBAr,
lançaram o Guia do International Council for Commercial Arbitration (ICCA)
sobre a Interpretação da Convenção de Nova Iorque de 1958 traduzido para o
português.
“Foi
a primeira língua escolhida para ser traduzido e vai auxiliar juízes do mundo
todo, pois oferece um sumário da convenção, orientando os magistrados ao
determinar a aplicação do documento de acordo com seu escopo e interpretação. É
esperado que o guia tenha um papel de colaboração para que os juízes ao redor
do mundo participem do processo contínuo de harmonização das leis de arbitragem
internacional e usem a convenção de maneira consistente com a sua redação e
espírito”, explicou Van Den Berg.
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Doença brasileira. O
Estado de S. Paulo - 21/03/2012
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Não
há doença holandesa por aqui. A indústria do Brasil está sendo corroída por uma
doença inequivocamente brasileira. Longe de ser uma praga, como em outros
países dotados de recursos naturais, a exportação de produtos básicos tem sido
uma bênção para um país assolado por uma combinação de paralisia política,
fisiologismo, populismo e incompetência governamental.
Exemplo
de entrave político: se tivesse o apoio de uma base decente e confiável, o
governo federal conseguiria facilmente, por exemplo, encerrar a guerra dos
portos, uma versão degenerada do conflito fiscal entre Estados. Essa guerra é
movida por meio de incentivos à importação, um estúpido protecionismo às
avessas. Resultado: concorrência predatória e exportação de empregos.
Para
renunciar a essa aberração, governadores cobram, com apoio de suas bancadas,
compensação do poder central, como se estivessem negociando um direito. Essa é
uma boa ilustração dos problemas enfrentados pelo Executivo no lodaçal político
de Brasília - ampliado e aprofundado pelo próprio governo federal com sua
estratégia de alianças com os piores.
Mas
o governo tropeça e escorrega mesmo sem a colaboração de seus aliados e de um
Congresso pouco envolvido com as questões de interesse nacional. Peca, em
primeiro lugar, pela demora em reconhecer os problemas importantes. Erra, em
seguida, quando tenta contornar a agenda necessária para tornar o País mais
eficiente. Pressionado pelos fatos, acaba agindo. Age na direção certa, mas de
forma incompleta, como quando se dispõe a eliminar os encargos sobre a folha de
salários. Age também na direção errada, quando amplia o protecionismo e quando
negocia, por exemplo, cotas para a importação de veículos mexicanos. É grotesco
impor ao México um acordo semelhante àqueles impostos pelo governo argentino ao
Brasil. Isso nunca melhorou a indústria argentina, nem tornará mais eficiente a
indústria brasileira. É apenas malandragem barata, uma forma de contemporizar e
evitar um trabalho mais sério.
Enquanto
o governo, sob pressão, tenta resolver com ações de pequeno varejo problemas do
atacado, os sinais de alerta se acumulam, cada vez mais assustadores. Do começo
do ano até 18 de março, o valor exportado, US$ 45,6 bilhões, foi apenas 6,4%
maior que o de um ano antes, enquanto o gasto com a importação, US$ 44,4
bilhões, foi 9,7% superior ao de igual período de 2011. Embora os consumidores
se mostrem mais cautelosos, a demanda interna continua avançando mais
velozmente que a oferta de bens industriais.
A
diferença, como no ano passado, continua sendo compensada pela importação. Sem
isso - é sempre bom lembrar -, a pressão inflacionária seria muito mais forte.
O Banco Central teria maior dificuldade para proporcionar a redução de juros
desejada pela presidente da República e cobrada com insistência por dirigentes
da indústria e seus aliados do neopeleguismo trabalhista.
Mas
atribuir os males da produção brasileira principalmente à taxa Selic e ao
câmbio é quase uma demonstração de fetichismo. O câmbio é relevante, sem
dúvida, mas há informações mais que suficientes sobre o descompasso entre a
produtividade brasileira e a de países tanto emergentes quanto desenvolvidos.
No ano passado, a economia brasileira cresceu menos que a alemã, a indonésia, a
coreana, a mexicana, a turca e, obviamente, a chinesa e a indiana. O Brasil
também cresceu menos que todos os países da América do Sul e da América
Central, com exceção de El Salvador, segundo estimativa preliminar da Comissão
Econômica para América Latina e Caribe (Cepal). Vários desses países também
foram afetados pela valorização cambial.
A
Confederação Nacional da Indústria (CNI) acaba de fornecer novos dados sobre o
desempenho comercial do setor em 2011. Segundo o levantamento, as importações
supriram 19,8% dos bens industriais comercializados no mercado interno. Esse
coeficiente, um recorde, foi 2 pontos porcentuais superior ao de 2010. Também o
coeficiente de exportação aumentou 2 pontos e chegou a 19,8%, mas esse avanço
resultou principalmente do bom desempenho do setor extrativo. No caso da
indústria de transformação, o peso das exportações ficou em apenas 15%, 6,6
pontos abaixo do nível atingido em 2004.
Atribuir
o enfraquecimento da indústria ao bom desempenho do agronegócio e da mineração,
como se isso explicasse o problema cambial e toda a perda de competitividade
das manufaturas, é uma evidente fantasia. Não tem sentido falar de doença
holandesa. A mineração e o agronegócio acumularam competitividade durante anos
e são relevantes na cadeia produtiva da indústria. A doença econômica é
brasileira, mesmo, e seu foco principal é Brasília.
>>>
O incentivo da impunidade à corrupção. O Globo
- 21/03/2012
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As
cenas de corrupção explícita mostradas pelo último "Fantástico", da
TV Globo, têm lugar garantido na seleção dos piores momentos - ou melhores, a
depender do ponto de vista - das reportagens publicadas nos últimos anos pela
imprensa profissional de denúncia do roubo do dinheiro do contribuinte tramado
no setor público.
As
tratativas de representantes de quatro empresas interessadas em contratos de
fornecimento a um hospital da UFRJ, no Rio, feitas com um repórter da emissora
passando-se por burocrata responsável pelas compras do estabelecimento, são um
mergulho no escabroso cotidiano de um Estado que avança cada vez mais sobre o
bolso do contribuinte e sem maiores zelos com o destino do dinheiro alheio.
As
cenas já fazem parte da mesma galeria de vídeos em que está um empregado dos
Correios, Maurício Marinho, no ato de embolsar um maço de dinheiro oferecido
por um empresário, uma espécie de fio da meada que levou Roberto Jefferson
(PTB), "padrinho" do funcionário, a denunciar o mensalão. Juntam-se
também ao registro do patético pedido de propina feito sem rodeios por
Waldomiro Diniz, ainda assessor do chefe da Casa Civil José Dirceu, ao bicheiro
Carlinhos Cachoeira. E à farta distribuição de dinheiro vivo no governo de José
Roberto Arruda, no caso do "Mensalão do DEM".
Uma
das peculiaridades do material mostrado pelo "Fantástico", e ampliado
no "Jornal Nacional" de segunda-feira, é registrar a tranquilidade e
destreza com que representantes de empresas com tradição em negócios com o
poder público - Locanty Soluções, Toesa Service, Bella Vista Refeições
Industriais e Rufolo Serviços Técnicos e Construções - articulam o pagamento de
propinas, falam sobre superfaturamento para financiar o "por fora" do
funcionário público sentado do outro lado da mesa, e fraudam uma concorrência.
Parece fazer parte do trabalho diário de todos. E deve fazer.
Existem
indicações de que há uma roubalheira disseminada e institucionalizada do
dinheiro do contribuinte, sob patrocínio de maus servidores, com ramificações
no mundo da política. Para ficar no bilionário universo da saúde pública,
apenas 2,5% dos enormes repasses federais a estados e municípios, feitos no
âmbito do SUS, são auditados. Assim, entre 2007 e 2010, R$ 154 bilhões fluíram
de Brasília para o resto do Brasil sem qualquer controle. Quanto deve ter sido
desviado? Fiscalizações feitas por inspetores da Controladoria Geral da União
(CGU), por amostragem, em municípios, apontam a possibilidade de desaparecerem
30% dos repasses federais, apenas entre prefeituras.
A
denúncia da falcatrua arquitetada no hospital da UFRJ atraiu declarações fortes
contra a corrupção. Mas, como sempre, nada deverá ocorrer. O Ministério Público
investigará e, quando o caso chegar à Justiça, há um amplo arsenal de recursos
à disposição dos advogados das firmas para mantê-las em operação como
fornecedoras do estado. Estas mesmas empresas já haviam sido
"punidas" em 2010, por iniciativa do MP estadual. Como se viu, nada
foi para valer. A faceta grave em todas estas histórias de corrupção é a
impunidade, um eficiente incentivo para o crime continuado. Tanto que agentes
de empresas negociam assaltos ao contribuinte como se fosse um negócio normal.
No dia em que corruptores e corrompidos forem mesmo condenados a penas
condizentes, este cenário mudará. Caso contrário, novos vídeos virão.
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DIREITOS HUMANOS.
Instituição
argentina resgata memória para conscientizar juventude.
Em
encontro na UnB, presidente da Associação Avós da Plaza de Mayo, Estela Barnes,
lembra período sangrento e estimula reflexão sobre o futuro unb.br 20.03
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Nos
anos 70, Estela Barnes de Carlotto era uma diretora de escola primária e mãe de
uma família de classe média, na Argentina. Laura, sua filha, estava grávida
quando foi presa. O regime militar manteve Laura viva durante a gestação e
entregou o bebê a uma família adotiva após o nascimento. Situações como essa
aconteceram com cerca de 500 crianças. Hoje presidente das Associação Avós da
Plaza de Mayo, Estela esteve em Brasília, onde proferiu uma palestra emocionante,
na noite de segunda-feira 19, no auditório Dois Candangos da Universidade de
Brasília.
De
acordo com relatos de ex-companheiros de cela de sua filha, exilados no Brasil,
Estela tem um neto. “Quando falo para jovens, penso que um deles poderia ser
meu neto. Ele tem 33 anos”, disse durante o encontro.
A
Associação Avós da Plaza de Mayo estão entre os movimentos mais importantes
para rever filhos e netos desaparecidos durante a ditadura militar argentina,
que durou de 1976 a 1983, quando cerca de 30 mil pessoas de todas as idades e
classes sociais desapareceram. “Esse não é um tema da Argentina. É um tema
mundial. Nossos filhos ousaram pensar diferente. Desde então temos que lidar
com a burocracia e com mentiras para encontrar nossos parentes”, lamentou. Até
hoje, 105 casos como o de Estela já foram resolvidos com testes de DNA, graças
à iniciativa das avós.
Estela
explica que a série de palestras que está proferindo pela América do Sul tem a
intenção de incentivar a juventude a questionar e fortalecer as mulheres. As
atividade foram viabilizadas em conjunto pela Universidade de Brasília, a
Embaixada da Argentina, a Secretaria de Direitos Humanos do Governo Federal e a
Secretaria de Cultura do Distrito Federal. O reitor, José Geraldo de Sousa
Junior, esteve representado pela decana de Assuntos Comunitários, Carolina
Santos.
Segundo
Juan Antonio Barreto, segundo secretário da Embaixada da Argentina, o encontro
é muito importante. “A sociedade argentina tem total disposição para ajudar no
processo de revisão do passado, que começa a acontecer no Brasil. A entidades
da sociedade civil argentinas estão ansiosas para contribuir, desde que o
governo brasileiro nos solicite”, analisou.
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Entrevista | Ana Maria Machado. ‘A
palavra continua imbatível’ O POPULAR/GO 23.03
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O nome da escritora Ana Maria Machado, já bem
presente nas livrarias de todo o País, ficou ainda mais assíduo a partir do
segundo semestre do ano passado. Nos últimos meses, em mais de um selo
editorial, ela lançou livros inéditos e relançou obras premiadas, mas que há
muito não ganhavam novas edições. O interessante é que a nova presidente da
Academia Brasileira de Letras (ABL) – ela tomou posse no cargo no final de 2011
– não chegou com novidades apenas na literatura infanto-juvenil, em que é uma
referência mundial, já tendo ganhado o prêmio Hans Christian Andersen, espécie
de Nobel do gênero. Romances adultos e livros de ensaios de sua autoria estão
entre os lançamentos recentes. Claro que também há novas histórias para
crianças e adolescentes e até a reedição de adaptações e traduções de contos
dos Irmãos Grimm. Mesmo com tanta atividade, a escritora reservou um tempinho
para conversar com O POPULAR e nesta entrevista exclusiva fala da criação
literária, de sua gestão à frente da ABL e opina sobre outros assuntos, como a
criação da Comissão da Verdade, que vai apurar os acontecimentos do regime
militar – a autora foi uma das vítimas da ditadura do período.
A
senhora vem de uma série de lançamentos, com títulos de literatura adulta,
infanto-juvenil, adaptações. Planejou essa maratona ou houve coincidências?
Não,
foi coincidência mesmo. Escrevo quase todo dia. E, à medida que os livros vão
ficando prontos, negocio os contratos com as editoras e eles entram em
preparação, de acordo com o calendário de cada uma. Os infanto-juvenis vieram
seguindo o ritmo de sempre. Mas é verdade que houve alguns livros que estavam
na fila das editoras para sair há algum tempo e acabaram sendo publicados quase
simultaneamente a outros mais recentes. Por outro lado, aconteceu também uma
coisa ótima: eu estava trocando de editora no caso da obra de adultos, passei
os ensaios para a Companhia das Letras e os de ficção para a Objetiva. Ambas
lançaram inéditos no meio do ano passado – o romance Infâmia e a coletânea de
ensaios Silenciosa Algazarra. Além disso, a Objetiva foi ágil no relançamento
dos títulos de outros catálogos, publicando ainda em 2011 as novas edições de
Para Sempre e de A Audácia Desta Mulher. E este ano está relançando Tropical
Sol da Liberdade e Alice e Ulisses no primeiro semestre e Canteiros de Saturno
no segundo. Mas esses lançamentos estão cobrindo um vasto período, pois foram
publicados inicialmente de 1983 a 2011.
Conheço
várias pessoas que sequer sabiam que a senhora era uma escritora com títulos
voltados para o público adulto. Como percebeu as reações ao lançamento dos
romances Para Sempre, A Audácia Dessa Mulher e Infâmia no segundo semestre do
ano passado?
Você
tem razão em sua percepção. Para algumas pessoas a reação foi de surpresa,
embora fossem livros já editados antes e até já premiados, como A Audácia Dessa
Mulher, que ganhou o Prêmio Machado de Assis ainda no século 20. Mas acho que,
agora, o fato de haver um inédito tão polêmico quanto Infâmia próximo aos
relançamentos dos anteriores criou uma repercussão mais visível e não deu para
ignorar. Ou seja, uma parte da mídia que só me via como autora de infantis de
repente acabou tomando conhecimento de que eu já tinha nove romances publicados
e oito livros de ensaios. Além disso, pelo fato de uma chegada múltipla às
livrarias, aconteceu que muitos leitores que conheciam apenas alguns desses
romances, e gostavam deles, descobriram que havia outros. Isso despertou uma
curiosidade, vontade de ler, de comparar. O maior prêmio de um autor é um
leitor que o entenda e aprecie. A força da literatura para tocar fundo as
pessoas é algo que sempre me comove muito, até mesmo porque como leitora me
reconheço nesse processo e sei o bem intenso que a leitura me faz.
Há
uma diferença tão grande assim entre as histórias que movem o imaginário
infantil e o adulto? Às vezes tenho a impressão de que esse abismo não é tão
grande assim. Lendo os contos dos Irmãos Grimm ou de Hans Christian Andersen,
muitos dos temas abordados ali foram tratados em grandes romances.
Muitas
vezes, não há grandes diferenças entre as histórias em si. As diferenças
aparecem no modo de trabalhar a linguagem, na maneira de narrar, de estruturar
a narrativa, de oferecer desafios de decifração. Enfim, na mediação da forma ao
dar ressonância à sociedade muito mais do que apenas refleti-la. E isso não tem
nada a ver com a eventual idade de um leitor destinatário. São diferenças na
voz narrativa de cada autor em cada texto. Um conto infantil como O Touro Fiel,
de Hemingway, é puro Hemingway. Histórias como Jane Eyre, de Charlotte Brönte,
ou o infantil O Jardim Secreto, de Frances Hodgson Burnett, são quase iguais,
mas os livros são muito diversos um do outro. Anna Karenina, de Tolstoi, Madame
Bovary, de Flaubert, e O Primo Basílio, de Eça de Queirós, são variações em
torno de um mesmo tema ou enredo, na mesma época – mas completamente diferentes
entre si. Depois que publiquei Infâmia me dei conta de que tem razão quem
comentou que vários romancistas contemporâneos, em continentes diversos,
estamos abordando algo semelhante em nossos livros: a dor causada pela calúnia,
pela leviandade e pelas acusações falsas, a impossibilidade de reparação diante
do sofrimento causado pela desonra de inocentes. É o caso de livros como
Desonra, de J.M. Coetzee, Desejo e Reparação, de Ian McEwan, A Mancha Humana,
de Philip Roth. Talvez seja um sinal de nosso tempo de leviandade, impunidade,
instantaneidade na transmissão, irresponsabilidade, que se sobrepõe a cuidados
com a verificação.
Durante
um bom tempo, autores infanto-juvenis no Brasil tinham de desbravar um caminho
de obstáculos. Os empecilhos para publicar têm diminuído?
Acho
que sim. Por vezes até parece que hoje se publica tanto nessa área que a
dificuldade é separar o joio do trigo. Mas os avanços editorial e gráfico foram
fantásticos, os livros estão lindos, nossos ilustradores hoje já são tão bons
quanto os autores e se equivalem aos melhores do mundo. Os cursos de design têm
dado uma contribuição de primeira para isso. E atualmente nossos editores nessa
área são muito profissionais.
Pela
Editora Salamandra, a senhora lançou uma coleção com contos dos Irmãos Grimm.
Eles ainda são a grande referência para quem se dirige ao público formado por
crianças e adolescentes?
Na
verdade, é também um relançamento de traduções que eu fiz na década de 1980
para a Nova Fronteira. Agora em nova casa e de roupa nova. Não são a grande
referência, mas, como todo clássico, são uma referência importante para todo
mundo. Um adulto que hoje não conheça Cinderela, Chapeuzinho Vermelho, Branca
de Neve, O Pequeno Polegar, histórias de gigantes, príncipes, princesas e
fadas, está excluído de um legado cultural que pertence à humanidade. E a
melhor época para receber essa herança é na infância.
Os
escritores de livros infanto-juvenis têm sido cobrados em aspectos que
praticamente não existiam antes da disseminação dos meios eletrônicos, da
internet, dos jogos virtuais? Como manter a literatura atraente diante de uma
concorrência tão grande e dinâmica?
Jamais
senti essa cobrança. Até mesmo porque sempre achei a literatura muito atraente,
mais do que qualquer jogo virtual, por exemplo. A literatura sempre teve de
concorrer com outras atrações, que podiam ser a televisão, as revistas em
quadrinhos, as brincadeiras na rua, o quintal cheio de amigos correndo. Tem
lugar para tudo e cada coisa tem sua hora. Além disso, nem todo mundo gosta da
mesma coisa com a mesma intensidade. Mas a força da palavra continua imbatível.
A
senhora tomou posse no final de 2011 na presidência da Academia Brasileira de
Letras. É a segunda mulher a dirigir a instituição. Isso tem um significado
especial?
Não
especialmente. Claro que é um cargo que me honra, sobretudo pela confiança dos
meus pares em me delegar essa responsabilidade. Mas é também uma trabalheira e
representa uma solicitação enorme. Passei a dormir menos, para acordar mais
cedo e poder continuar a escrever todas as manhãs, como sempre fiz. A sorte é
que conto com o suporte de uma diretoria excelente. E procuro estar à altura do
apoio dos acadêmicos que votaram em mim – a unanimidade da Casa de Machado de
Assis. O que é muito bom é perceber que há possibilidade de tentar fazer alguma
coisa boa para os outros e para a cultura nacional.
Quais
são suas prioridades à frente da ABL? Há várias críticas de que a instituição
deveria participar mais de alguns debates relacionados à língua, à literatura e
à divulgação de nossa cultura letrada dentro e fora do País. A senhora
concorda?
Nesses
termos genéricos assim, não concordo. Pode ser que algum reparo específico me
faça pensar e dar razão a essa observação, não tenho nenhuma pretensão de achar
que presido uma instituição perfeita. Mas em geral acho que ela está sempre
presente nos debates relacionados à língua, à literatura e à divulgação de
nossa cultura letrada, tanto dentro como fora do País. Não me ocorre um único
caso em que a ABL tenha se omitido em algo importante nessa área – ainda que
ela não costume entrar em bate-boca estéril e emocional. Porém, procuro ter uma
certa clareza sobre as nossas limitações, nossas possibilidades e nossa função.
A academia não é um indivíduo, é uma instituição mais que centenária, formada
por apenas 40 pessoas, todas de idade. Seu papel não é ser de vanguarda e
experimental. Isso fica para os blogueiros, os grafiteiros, os DJs, os rappers,
os jovens autores, a mídia, quem quiser se habilitar. A ABL representa outra
força dentro de um ambiente cultural: a experiência, a tradição, a preservação
de certas permanências e constâncias que vão mudando com o tempo, mas sempre o
fazem lentamente. A expressão criativa de uma sociedade se exerce na energia
nascida das tensões entre polos desses dois tipos. Pessoalmente, como autora,
criadora autônoma e individual, gosto de experimentar, arriscar, correr perigo,
discutir, polemizar. Mas a tensão entre ruptura e continuação estão sempre
presentes. Sempre sei que os grandes autores que me precederam estão ali, num
patrimônio cultural herdado, me desafiando, cobrando que de alguma forma eu os
confronte, os enfrente, tente encarar os riscos. Mais que isso: apostando que
não vou conseguir. E justamente por isso, eu não posso correr da raia. Sem eles
ficaria fácil demais, não haveria frente a quem se medir. Acho que é assim que
funciona, é assim que a criação artística vai seguindo em frente. Em todas as
artes.
Alguns
de seus livros têm como protagonistas mulheres fortes e hoje, com grandes
nações (incluindo o Brasil) sendo comandadas por mulheres, o debate sobre o
papel delas na política, na sociedade, nas instâncias decisórias está em voga.
A igualdade entre gêneros é uma realidade mais próxima?
Até
acho que sim, a situação da mulher tem avançado. Mas não considero que
necessariamente mulher no poder seja indicativo tão poderoso assim. Cleópatra
foi rainha no Egito há 2 mil anos (e antes dela a fantástica Hatsepshut) e ali
por perto ainda é lei que se apedrejem mulheres por insinuações de adultério. O
problema é muito mais complexo do que isso. Em nosso quadro mais contemporâneo,
de nossa sociedade, além de todas as conquistas que tivemos e que devem ser
mantidas e estendidas, parece-me que sem uma escola pública universal em turno
integral e de boa qualidade, e sem um sistema de creches públicas realmente
confiável, os avanços no sentido da igualdade de oportunidades femininas
estarão sempre limitados pelas necessidades de cuidar dos filhos durante boa
parte de sua vida enquanto os homens em faixa etária paralela vão sedimentando
suas carreiras e subindo em seus postos sem ter de se preocupar com isso.
O
Brasil está prestes a instalar a Comissão da Verdade, para apurar crimes
cometidos durante a ditadura militar. A senhora foi presa e teve de se exilar
naquele período. Qual a sua avaliação sobre a Comissão da Verdade? É a favor da
revisão da Lei da Anistia?
Especificamente
no caso da Comissão da Verdade, é claro que sou a favor de que se lance luz
sobre toda essa época, integralmente. Que os fatos sejam conhecidos, que os
nomes sejam entregues ao julgamento da história, que não se pretenda apagar a
memória, que os episódios sejam investigados e todos os documentos sejam
trazidos ao exame da sociedade. Quando ainda havia riscos nessas posições, fiz
parte do Movimento Feminino pela Anistia e lutamos todos pela “Anistia Ampla,
Geral e Irrestrita”. A Lei da Anistia, nos termos em que foi promulgada, como
lembrava recentemente em entrevista o ministro Sepúlveda Pertence, foi uma
conquista negociada a partir de uma campanha nacional de mobilização popular
sem precedentes. Não me sinto à vontade para defender sua transformação numa
mera base para reivindicar compensações financeiras. Conhecer a verdade é
indispensável. Temos de saber tudo, identificar responsabilidades e expor os
nomes dos culpados à execração pública. Mas creio que devemos também ter
cuidado para não trair a memória de quem lutou pela liberdade, como se fosse
apenas uma questão de transformar sua coragem numa aposta ou num investimento
para o futuro, a ser pago agora pelos impostos da população brasileira como um
todo. Por vezes tenho a sensação de que alguns pleitos se aproximam
perigosamente disso e esse fato me constrange muito, por mais que procure
entender que podem ser oriundos da dor de quem viu roubado um tempo de sua
vida, de seus sonhos de juventude. O que importa não são indenizações ou
aposentadorias agora, nem fazer avançar carreiras truncadas ou garantir
promoções atrasadas. O fundamental é que todos possamos conhecer a verdade do
que aconteceu. Esse é um direito que temos como cidadãos, todos nós, quem lutou
e quem não lutou. Por isso, defendo intensamente uma Comissão da Verdade, mas
não creio que ela deva ser sinônimo de revisão da Lei da Anistia.
>>>>>>
ELOI FERREIRA DE ARAUJO. O ASSUNTO É RACISMO. Eliminar
a discriminação contra negros Cotas, lei do ensino da história
afro-brasileira nas escolas e o reconhecimento de quilombos foram vitórias, mas
o racismo ainda impede a igualdade. FOLHA
SP 21.03.
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Há
52 anos, em 21 de março de 1960, cerca de vinte mil negros protestavam contra a
lei do passe na cidade de Joanesburgo, na África do Sul. Lutavam contra um
sistema que os obrigava a portar cartões de identificação que especificava os
locais por onde podiam circular. Era uma das lutas contra o apartheid.
No
bairro negro de Shaperville, os manifestantes se defrontaram com tropas de
segurança daquele sistema odioso. O que era para ser uma manifestação pacífica
se transformou em uma tragédia. As forças de segurança atiraram sobre a
multidão, deixando 186 feridos e 69 mortos. Esse episódio ficou conhecido como
o massacre de Shaperville.
Em
memória às vítimas do massacre, em 1976, a ONU (Organização das Nações Unidas)
instituiu o dia 21 de março como o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da
Discriminação Racial.
Destacar
esse acontecimento é importante para que nunca esqueçamos dessa face cruel do
racismo, que não hesita em atirar em pessoas indefesas. Assim, há 36 anos, o
dia 21 de março é um marco para a comunidade negra na luta contra o racismo e
as discriminações. Ainda hoje, a influência do racismo impede que negros vivam
em condições de igualdade com os não negros.
As
ações afirmativas de cotas na universidade para os jovens negros, o Prouni, o
programa de saúde para a população negra, o reconhecimento das terras dos
remanescentes de quilombos, o combate à intolerância religiosa em face das
religiões de matriz africana, entre outras ações, trazem para ordem do dia um
pouco dos desafios que ainda temos de enfrentar para construir uma sociedade
mais igualitária.
Contudo,
podemos nos orgulhar pelos avanços dados nos últimos anos. Um deles foi a lei
10.639/2003, que torna obrigatório o ensino sobre história e cultura
afro-brasileira nos ensinos fundamental e médio das escolas pública e
particular de todo o país.
Outro
foi a lei 12.288, que dispõe sobre o Estatuto da Igualdade Racial. Essa é a
primeira lei desde a abolição da escravidão que reúne inúmeras possibilidades
para que o Estado brasileiro repare, de uma vez por todas, as desigualdades que
são resquícios da escravidão.
A
Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu 2011 como o ano internacional dos
povos afrodescendentes. Buscou com isso que os Estados independentes
concentrassem ações para reparar as desigualdades raciais.
Visto
que foi insuficiente aquele período de tempo, instituiu a década dos
afrodescendentes, que será lançada em dezembro de 2012.
É
a hora do fortalecimento das ações pela igualdade em todos os países que tenham
tido mão de obra escrava como base de seu desenvolvimento capitalista, algo que
originou desigualdades raciais de natureza histórica.
O
mundo é melhor com as diferenças e diversidades. Vamos continuar avançando na
construção da cidadania e do acesso igualitário aos bens econômicos e culturais
para negros, indígenas, ciganos e todos os segmentos minoritários da sociedade.
O
massacre dos jovens negros de Shaperville será lembrado para sempre. A luta
deles nos inspira a caminhar pela igualdade de oportunidades e por sociedades
livres do racismo e do preconceito.
ELOI
FERREIRA ARAÚJO, 52, é presidente da Fundação Cultural Palmares, órgão
vinculado ao ministério da Cultura
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FERNANDO RODRIGUES. Uma
medida anticorrupção FOLHA SP 21.03.
-
BRASÍLIA
- A esta altura, só quem acaba de chegar de Marte não conhece o caso de
corrupção num hospital universitário do Rio. Como parece não haver políticos
envolvidos, alguns congressistas estão assanhados para criar uma CPI da Saúde.
Outros querem novas leis para punir corruptos. O governo promete ser enérgico.
Enfim, Brasília faz o que mais gosta nessas horas: tenta faturar com a desgraça
alheia.
De
todos os aspectos revelados pelo repórter Eduardo Faustini, um em especial é o
procedimento quase surreal e nunca esclarecido da burocracia brasileira.
Trata-se da exigência, em licitações públicas, para que os interessados retirem
pessoalmente o edital e deixem registrados os nomes de suas empresas.
No
escândalo do hospital do Rio, um corruptor explica a razão de tal sistemática
esdrúxula existir. É que, quando há uma licitação, só é possível montar um
conluio se todos os concorrentes são conhecidos com alguma antecedência. Essa
identificação se dá na retirada dos editais. A partir daí, cada um é abordado para
a montagem de um acordo de divisão prévia do butim.
Se
o governo desejasse ir além da retórica em notas indignadas sobre o ocorrido,
bastaria uma canetada da presidente Dilma Rousseff determinando o fim dessa
prática indefensável. Há relevância e urgência. Uma medida provisória está
plenamente justificada. A partir da alteração, os editais de todas as
licitações federais poderiam muito bem passar a ser publicados na internet. Os
interessados ficariam então anônimos até o momento em que entregassem suas
propostas lacradas.
Essa
providência sozinha, é evidente, não eliminaria a corrupção dentro do governo.
Estados e cidades também teriam de seguir a mesma regra. Ainda assim, seria uma
medida profilática, fácil e a custo zero no plano federal. As máfias levariam
algum tempo até achar outra brecha e voltar a roubar.
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Dicas de português. Por
Dad Squarisi CORREIO
BSB 13.03
-
Emprestar
ou pedir emprestado?
Há
quem divida os filhos de Deus em duas raças distintas. Uma: os que pedem
emprestado. A outra: os que emprestam. Daí o destaque do verbo emprestar.
Pensadores de Europa, França e Bahia falaram sobre ele. Alexandre Dumas Filho
aconselhou: “Dê dinheiro, não empreste. Dar só faz ingratos. Emprestar faz
inimigos”. Shakespeare disse amém: “Não tomes por empréstimo e tampouco
emprestes. O empréstimo nos faz perder dinheiro e amigo”. Simões Lopes Neto foi
categórico: “Mulher, arma e cavalo de andar, nada de emprestar”. O povo,
generoso, ensina: “Quem dá aos pobres empresta a Deus”.
É
tanto emprestar e pedir emprestado, que o verbo provoca confusões e bate-bocas.
Vale o exemplo de Cauã Souza. Ele trabalha na administração pública. Zeloso do
bom português, discutiu com colegas a regência de emprestar. Eles fazem
empréstimos bancários. Ao comentar o fato, dizem “emprestei dinheiro do banco”.
O pobre amante da língua se desespera. Esperneia. Discute. A questão: o
trissílabo pode ser empregado para quem cede e para quem recebe os valiosos
reais?
Toma
lá, dá cá
Quer
acertar sempre? Então entre no time dos que dividem a espécie humana em duas
raças — os que pedem emprestado e os que emprestam. Em outras palavras: só
empresta quem cede. A pessoa beneficiada com o empréstimo pede, toma ou pega
emprestado. Compare:
O
banco emprestou R$ 3 mil a João. João tomou emprestados R$ 3 mil ao banco.
Carlos
emprestou o lápis ao colega. O colega pegou emprestado o lápis a Carlos.
O
diretor me emprestou R$ 100. Pedi R$ 100 emprestados ao diretor.
Superdica
A
gente toma (pede, pega) emprestada alguma coisa a alguém (o “de” alguém pode
gerar ambiguidade). Compare:
Pedi
emprestado o carro a meu pai. (Meu pai é a pessoa a quem pedi o carro.)
Pedi
emprestado o carro do meu pai. (No caso, o carro é do pai.)
Tomou
emprestados os livros ao professor. (O professor emprestou os livros.)
Tomou
emprestados os livros do professor. (O professor é o dono dos livros.)
O
galho do macaco
A
maior qualidade do texto? É a clareza. Como chegar lá? Uma das receitas é a
colocação. Um termo fora do lugar pode comprometer o recado. A gente diz uma
coisa. O leitor entende outra. O verbo emprestar adora criar confusões. Com
ele, todo cuidado é pouco. Abra os dois olhos e afine os dois ouvidos.
Analise:
Pediu
emprestada a bicicleta ao pai. (O pai é a pessoa que empresta a bicicleta.)
Pediu
ao pai a bicicleta emprestada. (A bicicleta é emprestada.)
Resumo
da ópera
Escrever
é mandar recado. Ler, entender o recado. Cabe ao emissor se fazer entender. Se
não conseguir, responde pelo fracasso.
Leitor
pergunta?
Uma
frase usada pelos narradores de partidas de futebol me deixa de cabelos
arrepiados. Ela pode até estar certinha, certinha. Mas soa feinha, feinha.
Ei-la: Fulano tinha colega de ataque “mais bem colocado” para o qual poderia
ter passado a bola. Não seria “melhor colocado”?
Altamiro
Fernandes da Cruz, BH
Antes
de particípio (colocado, partido, vendido), o mais bem ganha banda de música e
tapete vermelho. Nos demais casos, cede a vez ao melhor: O jogador tinha colega
de ataque mais bem colocado. Mas, fominha, não lhe passou a bola. Resultado: o
adversário se saiu melhor.
***
A
Casa Bahia adotou na logomarca o desenho de um menino com chapéu de cangaceiro
a que chamou Bahianinho. Pode?
Carmem
Elias, Rio
Quem
nasce na Bahia é baiano. Bahianinho é nome fantasia. Os marqueteiros, sempre
atentos, quiseram marcar o nome da loja no símbolo. O h, surpreendente, remete
à Casa Bahia. Palmas pra eles.
>>>
O Brasil e o futuro da água no mundo. Henrique
Marinho Leite Chaves
Ph.D.
e professor da Universidade de Brasília CORREIO BSB 13.03
-
A
cidade de Marselha, incrustrada entre as falésias calcárias da Provença e o mar
Mediterrâneo, sediou na semana passada a sexta edição do Fórum Mundial da Água.
Durante seis dias, 20 mil pessoas, incluindo governantes, cientistas,
empresários e ONGs, representando 140 países, se reuniram para discutir os
problemas e as soluções para a água no planeta. O Brasil participou com uma
delegação recorde, envolvendo os mais diversos setores do governo e da
sociedade.
Logo
na abertura, feita pelo primeiro ministro da França e pelo presidente do fórum,
professor Benedito Braga (USP), um casal de adolescentes tuaregs do Mali
fizeram, a convite da organização, um discurso comovente, indicando que as
novas gerações não querem soluções para o futuro, mas para hoje. Durante o
restante da semana, mais de 300 seções e mesas redondas, envolvendo os mais
diferentes temas hídricos, foram realizadas. Além das declarações ministeriais
de praxe e das recomendações para a reunião Rio+20, ficaram algumas lições e
reflexões, que descrevo brevemente aqui.
A
água é um recurso básico, abundante em algumas regiões e escassa em outras, que
tem de ser manejada adequadamente para que não ocorram crises ou impactos ao
meio ambiente. Entretanto, com o crescimento exponencial da população planetária
e um crescimento ainda maior no consumo per capita de água, os mananciais de
abastecimento vêm sendo paulatinamente impactados ou esgotados. Isso não vale
apenas para as regiões áridas do mundo, mas também para as úmidas. No caso do
Brasil, apesar de determos 12% de toda a água doce do planeta, ela está
concentrada na bacia amazônica, e é escassa no semiárido nordestino e em
regiões metropolitanas úmidas, como São Paulo e Brasília.
Somado
a esse quadro de má distribuição, as potenciais mudanças climáticas, que se
avizinham, afetarão exatamente as regiões tropicais áridas e semiáridas, onde
já há escassez de água. Para fazer frente a esses impactos, e usando o
princípio da precaução, os planos de recursos hídricos devem incorporar os
cenários de mudanças climáticas, e a água subterrânea, menos sujeita às
flutuações climáticas e à poluição, deve ter seu uso priorizado em situações
críticas.
Um
dos painéis mais interessantes foi a retrospectiva da gestão da água no oeste
americano nos últimos 150 anos. Apesar de ser a região de maior escassez de
água nos EUA, ela é a que mais cresce hoje, em função da divisão equânime da
água entre os estados e as nações indígenas, e a construção de uma vasta
infraestrutura hidráulica, incluindo várias transposições de bacias, recargas
artificiais de aquíferos e plantas de reúso de água. O que poderia ter sido
diferente, segundo os americanos? Um maior cuidado no projeto das barragens,
permitindo maior movimentação de peixes e flutuação de vazões, imitando os
pulsos naturais do rio. Algumas dessas lições têm sido observadas pelo Brasil,
particularmente nos novos empreendimentos hidrelétricos da Amazônia, como é o
caso da usina de Santo Antônio, no Rio Madeira.
Outro
aspecto interessante, discutido no Fórum, é que o recurso água pode e deve ser
usado para impulsionar a tão sonhada “economia verde”, que será fortemente
debatida na reunião Rio+20. Nesse sentido, a água funciona como vetor de
recuperação das matas ciliares e de áreas de recarga das bacias, através do pagamento
por serviços ambientais, gerados pelos proprietários, a montante, beneficiando
os usuários de água, a jusante. No Brasil, programas como o Produtor de Água,
da ANA, são exemplos de que isso é possível e economicamente viável.
Chamaram-me
também a atenção as seções sobre a prevenção de tragédias hídricas, como as
inundações. Apesar de termos no nosso país a tecnologia e os recursos
necessários para evitar perdas humanas e materiais, elas ainda são prevalentes
por aqui. Entretanto, se temos uma lei de responsabilidade fiscal eficaz, por
que não temos ainda uma lei de responsabilidade hídrica, autuando governantes
que, sabendo do perigo da ocupação de áreas de risco, permitem que populações
nelas se instalem?
Ao
final de uma intensa semana de discussões, chego à conclusão que, para uma
gestão sustentável da água, vale ainda o sábio conselho de Confúcio: se
planejas para um ano, plante arroz; para dez anos, plante árvores frutíferas;
mas se planejas para mil anos, eduque as pessoas.
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