domingo, 18 de março de 2012


LITERATURA »  Academia brasiliense comemora 30 anos.   Brasília precisa ser um centro cultural, além de político Correio BSB 17.03
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José Carlos Gentili, atual presidente da Academia de Letras de Brasília, cargo que ocupa desde 2008, não esteve na reunião de fundação da instituição, que celebra, segunda e terça, no Parlamundi (Legião da Boa Vontade), 30 anos de existência. Mas ele consegue descrever, em alguns detalhes, os primeiros movimentos da organização. Evolução do Círculo Literário de Brasília, a Academia foi germinada em 20 de março de 1982, na casa do poeta Clairê de Souza Pires, num apartamento da 102 Sul. Entre os 18 presentes, que guiaram o início dos trabalhos da casa literária, estiveram Maria de Lourdes Reis, presidente do Movimento Poético Nacional e outras figuras importantes, como o poeta Almeida Vítor, que empresta seu nome à medalha cultural entregue pela ordem.

Nesses anos todos, Gentili verifica, infelizmente, um certo desinteresse de governos brasilienses na Academia. “Em vários estados, os governadores proporcionam às academias prédios tombados pela municipalidade, pelo estado, dando um recanto de trabalho. Mas em Brasília isso nunca aconteceu, apesar de a Academia sempre ter pleiteado um terreno para fixar sua sede. Os governos, de maneira geral, sempre foram insensíveis para com a cultura e a literatura”, elabora o advogado gaúcho, que vive na cidade desde a mudança da capital.

Em 2011, porém, a instituição ganhou casa própria, doada por Argemiro José Cardoso. Ele foi duplamente pioneiro: dono da cadeira de nº1 e um dos primeiros engenheiros de Brasília. A sede fica no Varjão (Mansão Carolina, Lt. 1). Foi instalada há cerca de um ano, num terreno elevado, com vista privilegiada para o Lago Paranoá. Antes, a Academia geralmente funcionava na residência do presidente em exercício ou provisoriamente em salões de hotéis.

Do teto da mansão, descreve Gentili, descem obras dos ocupantes de cadeiras da Academia — um total de 40, seguindo a tradição francesa. “Temos não só acervo (500 títulos), mas os Pingos de Luz, com trabalhos deles dependurados por fios”, continua. As paredes do espaço também abrigam uma pinacoteca, com peças de artistas brasilienses e outros estados. Nos encontros, agendados mensalmente — a diretoria reúne-se semanalmente —, os membros planejam atividades futuras. A principal delas, para o presidente, envolve a comunidade local. “Nós temos que trabalhar especialmente com as crianças. Elas têm que receber educação, a base de tudo. Neste aspecto, o Varjão é privilegiado. Porque a criança vem e encontra, por exemplo, Adilson Vasconcelos, historiador de Brasília”, explica.

Diante da proximidade da 1ª Bienal Brasil do Livro e da Leitura (14 a 23 de abril), Gentili espera que a capital, finalmente, receba reconhecimento como centro não apenas do poder, mas também das letras. Por enquanto, ele, com 72 anos, dirige a Academia com esmero. E, sempre que possível, mantém contato com a Academia Brasileira e a produção literária regional e nacional. “No ano que se passou, oferecemos a comenda Almeida Vitor ao presidente, Marcos Vilaça, presidente de 2010 a 2011. Fomos ao Rio de Janeiro numa comitiva muito bonita. Há integração interessante no mundo literário. Os escritores se reúnem pela sua qualificação: conto, poesia, romance. E nós interagimos com eles”, conta.

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Biografia questiona suicídio de Van Gogh.  Polêmica, obra que sustenta assassinato do pintor holandês ganhará edição em português no segundo semestreSegundo os autores, disparos fatais teriam sido feitos por um adolescente chamado René Secrétan FOLHA SP 18.03
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Vincent van Gogh (1853-1890) não se matou. Ele foi assassinado, provavelmente por acidente, afirmam Steven Naifeh e Gregory White Smith, autores de "Van Gogh: The Life" (Random House, US$ 40; cerca de R$ 72), considerada pelo museu Van Gogh de Amsterdã a biografia definitiva do pintor.

Baseada no livro "Vincent van Gogh - The Complete Letters", a obra, de 2011, será lançada no Brasil no segundo semestre, pela Companhia das Letras.

"A hipótese do assassinato é mais plausível do que a do suicídio", afirmou Naifeh à Folha. "Até agora, nenhum especialista se opôs a ela."

Leo Jansen, curador do museu, diz, no entanto, que ainda há questões a serem elucidadas, como as circunstâncias do possível acidente e o paradeiro da arma.

MITO

A versão do suicídio foi crucial para a fama de Van Gogh, morto em 1890, aos 37 anos. A partir dela se estruturou a narrativa de um fim trágico para uma vida infeliz.

Os biógrafos não sabem se o homicídio foi acidental ou intencional. "O tiro teria ocorrido após uma discussão, afetada por bebedeira, entre o pintor e René Secrétan, um estudante de 16 anos", disse Naifeh.

Segundo os autores, Van Gogh foi atingido numa estrada perto de Auvers-sur-Oise, na França, a 1,5 km da Ravoux, pousada onde se hospedara e à qual voltou ferido. A versão consagrada é a de que ele disparou no próprio abdome em um campo de trigo, a 6,5 km de Ravoux.

"Os médicos concluíram que a bala entrou por um ângulo oblíquo, portanto, sem fazer uma trajetória direta como se esperaria de um suicídio. E o disparo ocorreu a certa distância do corpo."

Nenhum dos apetrechos de Van Gogh foi localizado. Não houve autópsia, testemunhas ou bilhete de despedida. Mas, em 1956, René Secrétan contou ao escritor Victor Doiteau detalhes da sua relação com o artista holandês. Apresentado a ele por seu irmão Gaston, Secrétan o azucrinava.

Além da fantasia de caubói, Secrétan andava com um revólver, usado para acertar pássaros e esquilos. Gustave Ravoux, dono da pousada, teria emprestado a arma ao jovem e espalhado o boato do suicídio, registrado pelo pintor Émile Bernard em carta para o crítico Albert Aurier.

Essa versão se transformou em mito com o best-seller "Sede de Viver" (ed. Record), escrito por Irving Stone em 1934 e adaptado para o cinema por Vincente Minnelli em 1956, com o ator Kirk Douglas.

"Van Gogh: The Life" é um trabalho de dez anos, baseado em mais de mil cartas do pintor. As mais de 28 mil notas explicativas estão no site vangoghbiography.com.
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Literatura do bem-estar
Escritor e psiquiatra Augusto Cury atrai milhões de leitores interessados em sua obra, que oferece o controle das emoções, mas também desperta desconfiança da comunidade científica FOLHA SP 18.03
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O escritor e psiquiatra Augusto Cury, na abertura da Academia da Inteligência, em Ribeirão
No segundo ano da faculdade de medicina, em São José do Rio Preto (SP), Augusto Jorge Cury, 53, entrou em tristeza profunda.

O hoje escritor e psicanalista, que já vendeu cerca de 16,5 milhões de livros no país falando sobre superação e controle de sentimentos, afirma que aquela "dor emocional" foi o estopim para se tornar quem é atualmente.

Ele descreve aquela depressão como um momento de "miserabilidade do ser". Desde então, foram 25 livros lançados em 60 países, cinco compilações e uma teoria inédita -conforme o médico, a inteligência multifocal.

Para o autor, o mundo está no apogeu do desenvolvimento científico e tecnológico, mas atingiu esse nível sem que as pessoas tenham acompanhado a evolução porque não controlam suas emoções.

O resultado é a proliferação de transtornos mentais em todo o mundo, disse Cury.

PROTEGER EMOÇÕES

Para embasar seu raciocínio, o autor cita percentuais de pesquisas internacionais sobre saúde mental.

Entre uma frase e outra dita à Folha, incluiu dados como "70% a 80% dos jovens apresentam sintomas de timidez ou insegurança".

Morador de Colina, Cury adotou recentemente Ribeirão, onde tem um apartamento, e inaugurou a Academia da Inteligência. Por ela, tem se dividido entre as duas cidades e as muitas viagens.

Ele dá conferências em diversos países -acabou de voltar de um ciclo de palestras na Espanha e Romênia.

Para manter o leitor ou ouvinte atento, cita muitas metáforas -como "a vida é bela e breve como gotas de orvalho que num instante aparecem e logo se dissipam"- e usa técnicas de oratória.

Segundo ele, a linguagem simples e com metáforas serve para atingir o público e perpetuar suas ideias.

Um dos seus livros de maior sucesso é "O Vendedor de Sonhos". Mesmo com os resultados de um best-seller, é categórico: "Não escrevo para fazer sucesso".

Para ele, seus romances trazem ferramentas para os leitores terem "consciência crítica" de si. "O livro é uma oportunidade de ouro para que as pessoas entendam que a sociedade está adoecendo."

O primeiro livro de Cury, "Inteligência Multifocal", publicado em 1998, foi resultado de 17 anos de pesquisa.

Na obra, para explicar sua teoria, Cury descreve o funcionamento da mente como se a memória estivesse fundamentada em "janelas": as "killer" (assassinas), onde estão os traumas, as lights (leves), onde estão as boas lembranças, e as neutras, com informações do dia a dia.

O foco da teoria, diz Cury, é gerenciar as janelas "killer" para ter o autocontrole.

SEM PARES

Embora Cury diga, "com muita humildade", que é "um dos poucos autores da atualidade com mestrado e doutorado em sua própria teoria", a Associação Brasileira de Psiquiatria afirma que a inteligência multifocal não é oficialmente reconhecida.

Para o professor de psiquiatria e diretor do Laboratório de Neurociências da USP (Universidade de São Paulo) na capital paulista, Wagner Gattaz, "publicações de teorias em livros não são publicações científicas".

No portal da Biblioteca Nacional do Congresso Americano, referência da área, não há citações nem ao nome nem aos estudos de Cury.

Sobre os críticos em geral, ele recusa o rótulo "autoajuda" e afirma: "Eles não leram profundamente minha obra".
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Affonso Romano de Sant,Anna
Me contaram de um cemitério onde há muitos cães vagando. Eles mudaram para o cemitério para ficar com os donos que morreram. >> www.affonsoromano.com.br CORREIO BSB 18.03
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Procura-me uma jornalista para saber de minhas reações diante da seguinte estória real: uma arara Canindé, todos os dias, sai da Floresta da Tijuca, lugar onde vive, e, há uns 15 anos, voa uns cinco quilômetros para visitar outras ararinhas, que estão presas nas gaiolas do zoológico. Ela chega lá, pousa, fica um tempão conversando com suas iguais (com uma de preferência) e depois volta para sua morada lá na floresta.

Há a suspeita de que ela esteja apaixonada; que atrás das grades existe alguém que roubou o coraçãozinho da pequena ave. Surgem especulações. É macho ou fêmea? Em certas aves o sexo é tão velado que só o exame de sangue pode revelar. Já foram pedir ao veterinário que solte logo todas as ararinhas. Ele explica que não pode fazer isso, pois, embora pareça carcereiro, é o guardião delas, é apenas um funcionário dessa cadeia de aves. Cadeia, vejam, até no duplo sentido: não só da gaiola onde estão, mas por estar zelando pela “cadeia” genética, pela sobrevivência da espécie, posto que a ararinha é uma ave em extinção.

No Google, como sempre, encontro filmes sobre ararinhas de todas as espécies e até cenas comoventes de como elas saem do ovo. É só ver, e chorar. Em mim, isso suscitou várias coisas. Primeiro me lembrei de um livro que narrava como as mais diferentes espécies animais fazem amor. Hoje, a gente pode ver isso nesses canais de tevê tipo Animal Planet. É ver, e se emocionar diante do mistério da reprodução, da vida caçando a vida, a vida casando com a vida.

Vocês se lembram daquele filme com o Richard Gere, em que o cão continuava indo todos os dias à estação esperar por seu dono, apesar de o dono já ter morrido? Me contaram de um cemitério onde há muitos cães vagando. Eles mudaram para o cemitério para ficar com os donos que morreram. Bom, da fidelidade canina, já sabíamos.

Mas outro dia, na tevê, vi uma coisa ao contrário: um indivíduo que foi viver com os lobos. Aprendeu o código deles e com eles disputa a carne da caça. Além dessas, tem várias estórias e filmes, como a da menina e do pai que ensinaram os gansos a voar e os guiaram em ultraleve para um lugar de migração. Outro dia, lá em São Pedro de Atacama, no Chile, vi os flamingos chegando, se acasalando e indo embora.

E as ararinhas?

A jornalista me pergunta, o que um poeta acha dessa estória? Ponho-me a pensar nessa coisa humana e animal que é a liberdade e a prisão amorosa. O que essa ararinha está nos sugerindo? Então, anoto:
   
Liberta-me
de minha liberdade
diz a arara Canindé
ao seu amado
                          preso
na gaiola do zoológico.

Aprisiona-me contigo
pois enclausurada
                                ao teu lado
enfim
         serei livre.

O amor aprisiona?
O amor liberta?
O melhor amor é aquele
em que a gaiola
              está aberta.
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Dicas de português.   Por Dad Squarisi .  CORREIO BSB 18.03

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Tropeços vira-latas

Luciana adorou as dicas de domingo passado. Disse que aprendeu muito com os comentários dos erros nossos de todos os dias. Fez, então, um pedido. “Diga quais são os sete escorregões mais comuns e fáceis de evitar. Nada sofisticado. Só os que estão ao alcance de qualquer mortal deixá-los pra lá.” Leitor manda. Vamos a eles.

Cadê “meu” óculos?

Existem as palavras óculo e óculos. Óculo significa luneta. Tem uma lente. Binóculo é filhote dele. Bi quer dizer dois. O danadinho tem duas lunetas.

Óculos, sempre com s, tem duas lentes — uma para cada olho. Daí o plural obrigatório: óculos mágicos, óculos escuros, meus óculos. Onde estão meus óculos dourados?

“Feliz” férias

Féria ou férias? Depende. No singular, a palavra tem a ver com o bolso. (O comerciante recolhe a féria do dia. Ele junta o dinheiro das vendas do dia.) No plural, o vocábulo joga no time da sombra e água fresca. Xô, trabalho! Xô, seriedade! Xô, compromissos! Artigos, adjetivos, pronomes e verbos a ele relacionados vão atrás. Concordam com o boa-vida — sempre no plural: Minhas férias escolares estão cada vez mais curtas. Vão longe as férias que passei no Rio. Felizes férias, amigos.

Fiquei fora “de si”

“Eu fiquei fora de si”, diz a criatura desavisada. Bobeia. Os pronomes jogam no time do lé com lé, cré com cré. Primeira pessoa combina com primeira pessoa (eu, mim; nós, nos), segunda pessoa com segunda pessoa (tu, ti; vós, vos), terceira pessoa com terceira pessoa (ele, eles, si). Assim: Eu fiquei fora de mim. Tu ficaste fora de ti. Ele ficou fora de si. Você ficou fora de si. Nós ficamos fora de nós. Eles ficaram fora de si. O pior foi eu ter ficado fora de mim, não acha?

Afirmou “de” que

Ninguém sabe a razão. Mas, de repente, não mais que de repente, a conjunção que ganhou companhia indesejável (afirmou “de” que, disse “de” que, julga “de” que e por aí vai). Xô, coisa feia! Vem, criatura leve e fresca: Afirmou que não sabe o porquê da demissão. Disse que fez boa prova. O diretor julga que acabará a exposição em menos de duas horas.

“Fazem” dois anos

Olho vivo! Na contagem de tempo, haver é impessoal. Só se flexiona na 3ª pessoa do singular: Faz dois anos que moro aqui. Faz seis meses que fui ao Rio. Trabalhamos no comércio faz anos e anos.

Ele “interviu” na briga

Eta tropeço doloroso. A pessoa se esquece de que intervir tem pai pra lá de conhecido. É vir. Ambos se conjugam do mesmo jeitinho: eu vim (intervim), ele vem (intervém), nós vimos (intervimos), eles vêm (intervêm); eu vim (intervim), ele veio (interveio), nós viemos (interviemos), eles vieram (intervieram); vindo (intervindo).

Se eu “ver” Maria

Ops! É a cilada do futuro do subjuntivo. Ver, ter e pôr são as vítimas preferenciais do tempo louco pra pegar o bobo na casca do ovo. Não caia na dele. Quer acertar sempre? Siga três passos:

1. Conjugue o verbo no pretérito perfeito: eu vi, ele viu, nós vimos, eles viram; eu tive, ele teve, nós tivemos, eles tiveram; eu pus, ele pôs, nós pusemos, eles puseram

2. Pegue a 3ª pessoa do plural: viram, tiveram, puseram

3. Tire o -am final: vir, tiver, puser
Pronto. Você tem a primeira pessoa do tempo ardiloso. Agora é só prosseguir: se eu vir Maria, se você vir Maria, se nós virmos Maria, se eles virem Maria; se eu tiver saudade, se ele tiver saudade, se nós tivermos saudade, se eles tiverem saudade; se eu puser o dinheiro no banco, se ele puser, se nós pusermos, se eles puserem.

Leitor pergunta

Depois de dois-pontos, uso letra maiúscula ou minúscula?
Arthur Quirino, São Luís

Depende. Use:
1. letra pequenina se a duplinha for seguida de enumeração: Comprei as seguintes frutas no mercado: banana, maçã, uva e abacaxi.

2. letra grandona se o sinal for seguido de citação ou diálogo:
O padre Antônio Vieira escreveu: “Para falar ao vento, bastam palavras; para falar ao coração, são necessárias obras. Palavras sem obras são tiros sem bala: atroam, mas não ferem”.
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“Imagino Irene entrando no c
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QUADRINHOS »  Senhor de sonhos delirantes
Morto na semana passada, o francês Moebius deixa um legado incalculável. A obra Incal acaba de ganhar versão integral no país CORREIO BSB 18.03

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Ilustração de capa de Inside Moebius, na qual Jean Giraud contracena com diversas de suas criações: morte do autor surpreendeu o mundo das HQs

No último dia 10, uma notícia pegou de surpresa o mundo das histórias em quadrinhos. Aos 73 anos, morreu Jean Giraud, desenhista francês também conhecido pela abreviação Gir e pelo pseudônimo Moebius. O obituário do artista correu os meios de comunicação, que trataram de lembrar as principais obras em HQs e colaborações com o cinema.

Ganhador de incontáveis prêmios, tema de diversas exposições e admirado por Federico Fellini, Giraud/Moebius deixa legado incalculável, percebido em praticamente todas as expressões da cultura pop. É influência notória para muitos desenhistas consagrados, como o mexicano José Ladrönn, o brasileiro Watson Portela e o japonês Katsuhiro Otomo. “Talvez um dos maiores artistas que já caminhou na Terra”, escreveu, no Twitter, Joe Quesada, editor da Marvel Comics.

A repercussão da morte fez eco entre importantes criadores. “Uma grande influência e um autêntico visionário. Perdemos o melhor”, comentou o desenhista Jim Lee. “Jean Giraud mostrou que é possível fazer quadrinhos autorais e agradar, ter público e marcar para sempre. Eu não sei se isso ainda seria possível hoje em dia, quando as coisas são feitas ou por banalidade ou por lucro exorbitante”, argumentou o desenhista mineiro Mozart Couto.

Mesmo com toda a reverência por parte de autores e público, não deixa de ser intrigante um depoimento que Giraud deu ao jornal espanhol El País em 2009: os livros que assina como Moebius, ainda que tenham lhe dado maior reputação artística, vendem bem menos do que os com seu nome de batismo na capa. Ele assinava Giraud para HQs ilustradas em estilo mais realista, como a série do caubói Tentente Blueberry. O pseudônimo (emprestado do matemático alemão August Ferdinand Möbius, criador da fita de a Möbius) era usado para seus quadrinhos e ilustrações mais pessoais e experimentais, de cenários e situações oníricas e delirantes.

Com todo o culto ao seu redor, é curioso notar que os últimos trabalhos do mestre francês (que não parou de produzir até a morte) sejam tão pouco conhecidos, alguns deles, sequer traduzidos para outros idiomas além do original. Um exemplo é Inside Moebius (lançado apenas na França e na Espanha). Aos 65 anos, Giraud decidiu parar com um hábito que o acompanhou por décadas: o consumo de canábis. O uso da erva, como ele afirmou em entrevistas, era uma ferramenta criativa, não uma fuga da realidade. A experiência rendeu essa série autobiográfica, na qual o autor aparece como personagem e interage com várias de suas criações. O último álbum foi Arzak — L’arpenteur, de 2010.

           
INCAL - INTEGRAL
De Alejandro Jodorowsky e Moebius. 308 páginas. Devir Livraria. R$ 95.


Reflexos das visões de mundo podem ser encontrados em todos os seus trabalhos autorais. Mas a melhor maneira de conhecer o artista, além da prancheta de desenho, é o documentário Moebius redux (2007), dirigido por Hasko Baumann. Nele, Giraud comenta a trajetória artística, a infância solitária, as viagens ao México (onde passou experiências que mudariam sua vida), o envolvimento com alucinógenos, contracultura e filosofias pouco ortodoxas.

De volta ao Brasil
Depois de um longo período longe das bancas e livrarias brasileiras, Moebius voltou a ser publicado no país em 2006, com três novos capítulos de Blueberry e a publicação, pela primeira vez em edição nacional, da série Incal, feita entre 1981 e 1988 em parceria com o roteirista chileno Alejandro Jodorowsky (no entanto, com as páginas recoloridas por computador, descaracterizando o trabalho do desenhista).

Desde o ano passado, o selo Nemo tem publicado no Brasil consagrados títulos de fantasia e ficção científica do autor que estavam há anos fora de catálogo por aqui. A recepção do público, conta Wellington Srbek, roteirista de quadrinhos e coordenador da Nemo, reflete o interesse que os leitores têm na obra do francês: “Ele criou todo um universo paralelo, ‘moebiano’, que enriqueceu os quadrinhos, contribuindo para torná-los uma arte ainda mais madura e fascinante”. O homem é bom? será o próximo título da Coleção Moebius.

Coincidentemente, na semana da morte de Giraud, a editora Devir lançou Incal — integral, volume único que reúne toda a série criada por Jodorowsy e Moebius. Com capa dura, 308 páginas e o colorido original, o título, obra-prima da dupla, apresenta a delirante saga de John Difool.

O roteiro de Jodo, bem-humorado e místico, metralha o leitor com uma infinidade de informações e referências a cada página, que vão do tarô ao cinema, passando por sátira social e espiritualidade. Moebius é conhecido pela arte mutante e aqui é possível perceber essa característica nitidamente comparando a primeira com a última parte da saga. Incal é uma história em quadrinhos indispensável e, lançada na semana da morte de Moebius, uma justa e bem-vinda homenagem.

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