quinta-feira, 29 de março de 2012

Sem indignação, sem Aziz Ab´Saber. Sem graça, sem Millor.  Professores analisam impacto das mortes de Aziz Ab'Saber e Millôr Fernandes para a intelectualidade brasileira   www.unb.br
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Viver é desenhar sem borracha.
Millôr Fernandes
Eu tenho para comigo que o cientista só fala da região e dos aspectos que ele conhece e, no caso de um cientista que tem preocupações com o panorama desgraçado das desigualdades sociais e dos problemas do Terceiro Mundo, o cientista tem que ter um olho na ciência e um olho na aplicação da ciência.
Aziz Ab'Saber
O Brasil perdeu parte de sua inteligência. Uma parte que não só acumulava grande bagagem intelectual, mas que usava esse conhecimento para combater injustiças e denunciar abusos de poder. As mortes do geógrafo Aziz Ab'Saber e do jornalista Millôr Fernandes, ocorridas nos últimos 12 dias, empobrecem o debate público no Brasil. Na academia e na imprensa, Aziz e Millôr deixaram contribuições fundamentais de conhecimento, espírito crítico e atuação política.
Aziz foi um dos principais pesquisadores do relevo brasileiro. Descobriu que a chamada "planície amazônica" não existe, revelando as cachoeiras e a variedade de relevos que compõem a região. Verificou que os solos amazônicos são frágeis e sujeitos à erosão. Também foi um dos autores que batizou a região entre a Serra da Mantiqueira e a Serra no Mar, localizada na intersecção entre os estados de Sâo Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, de "mar de morros".
"Foi um grande defensor da Amazônia", lembra o colega geógrafo Aldo Paviani, professor emérito da UnB. "Ele combateu a turma do agronegócio, era uma referência na defesa da população ribeirinha e dos pequenos agricultores". Aziz também combateu a transposição do Rio São Francisco, que para ele só traria benefício aos grandes empreendimentos, e denunciou erros em pesquisas sobre o aquecimento global, mas suas palavras não encontraram ecos nos governantes. Manteve até o fim da vida essa postura crítica, combativa. "O geógrafo que quer merecer esse nome, tem que se engajar nas coisas que lhe parecem mais corretas", avalia Paviani.
Para professor da UnB, no entanto, Aziz merece ser mais reconhecido pela sua atuação acadêmica do que pelas lutas sociais. "Na área científica, ele foi muito vitorioso. Foi o maior geomorfólogo brasileiro", afirma.
Sobre Millôr, o pesquisador José Luís Braga, ex-professor da Faculdade de Comunicação da UnB, também prefere destacar sua contribuição intelectual. "Era uma dos humoristas mais sérios do país, por mais paradoxal que isso pareça", afirma. "Temos tendência de minimizar o humor, como uma coisa mais trivial, mas ele era um intelectual seríissimo em diversas áreas, não só no humor, mas também na dramaturgia, na crítica e na tradução. Era uma sumidade, lia em seis, sete línguas, fez traduções de obras complexas, inclusive de Shakespeare no original".
No jornalismo, Millôr trouxe reflexões arrebatadoras sobre a vida, os costumes e o Brasil. Inimigo do formalismo, da linguagem empertigada, renovou a imprensa brasileira participando do Pasquim, jornal alternativo que fez enorme sucesso com críticas ácidas ao regime militar. "As entrevistas coletivas do Pasquim eram de uma originalidade extraordinária. As pessoas se expunham abertamente e isso era conseguido graças ao clima de informalidade adotado", lembra Braga, cuja tese de doutorado foi sobre a publicação. Ele lembra que o material era impresso sem edição, e não foram poucas as vezes que palavrões eram cortados já na gráfica. Segundo Braga, as tiradas de Millôr ajudavam o país "a respirar".

"Foi um trabalho singular. Embora compartilhe um mesmo momento político com outros, como Jaguar, Henfil, Ivan Lessa e Ziraldo, compartilhando posturas, nunca tivemos alguém com esse perfil, com essa personalidade crítica, no elenco de atividades que realizava, no tipo de humor", diz o pesquisador. "Millôr é irrepetível".
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LEI SECA SÓ VALE SE MOTORISTA PASSAR POR BAFÔMETRO, DIZ STJ.  STJ EXIGE BAFÔMETRO OU EXAME DE SANGUE PARA PROVAR EMBRIAGUEZ E ESVAZIA LEI SECAO Estado de S. Paulo - 29/03
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Decisão deverá ser adotada por todos os tribunais do País; Supremo Tribunal Federal (STF) poderá alterar esse entendimento quando julgar o assunto


BRASÍLIA - O motorista parado em blitz da lei seca que se recusar a fazer o teste do bafômetro ou o exame de sangue não poderá ser acusado nem punido pelo crime de dirigir embriagado, mesmo que haja sinais evidentes de que está embriagado. Por decisão da 3.ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, só é possível processar criminalmente o motorista se houver comprovação de que ele dirigia tendo concentração de álcool no sangue superior a 0,6 grama por litro. E isso só poderia ser feito com os exames que estão previstos na lei - bafômetro ou exame de sangue. Na prática, a decisão esvazia a lei seca, embora não cancele as penas administrativas (como suspensão da CNH), porque o motorista não é obrigado a produzir provas contra si e pode recusar-se a fazer os exames.

A decisão do STJ deverá ser adotada por todos os tribunais do País, uma vez que o recurso julgado foi escolhido pelos ministros para pacificar a matéria e evitar decisões contraditórias pelos tribunais. Somente o Supremo Tribunal Federal (STF), quando julgar o assunto, poderá alterar esse entendimento.

Testemunhas. No julgamento desta quarta-feira, 28, quatro dos nove ministros julgavam ser possível identificar a embriaguez do motorista e processá-lo criminalmente por meio de outros exames clínicos ou por intermédio de outras provas, como depoimentos de testemunhas. Outros quatro ministros julgaram que somente exames precisos permitiriam a abertura de processo penal contra o motorista embriagado. Esses argumentaram que a lei estipulou um limite preciso de concentração de álcool no sangue para configurar a prática de crime. Portanto, para processar o motorista criminalmente, seria necessário saber se o limite determinado pela lei foi ou não superado.

A ministra Laurita Vaz não se manifestou expressamente sobre a necessidade do exame de sangue ou do teste do bafômetro. Na opinião dela, seria possível decidir o caso que estava sob julgamento sem entrar nessa discussão, por ser anterior à lei seca. Os demais ministros, porém, consideraram que o caso serviria como base para as futuras sentenças sobre lei seca.

Dessa maneira, ao fim da sessão, o STJ confirmou a necessidade de teste do bafômetro para provar a prática do crime de dirigir sob efeito de álcool, mas o tribunal não decidiu o que fazer caso o motorista não queira se submeter aos exames previstos na lei - bafômetro ou exame de sangue. Para parte dos ministros, somente uma mudança na lei resolveria o problema.

De acordo com os integrantes da Corte, se a lei não especificasse a concentração de álcool no sangue para a configuração do crime, seria possível abrir processos criminais contra motoristas embriagados mesmo que se recusassem a fazer os exames.
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CNJ estuda uso de parcerias público-privadas na Justiça. Valor Econômico - 29/03
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O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou uma comissão para analisar a possibilidade de parcerias público-privadas (PPPs) no Poder Judiciário. A portaria foi assinada esta semana pelo presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso. Atualmente, as PPPs são usadas pelo Poder Executivo, mas não há norma autorizando os tribunais a fazerem uso delas. Cortes de Estados como São Paulo e Maranhão já anunciaram que pretendem recorrer às PPPs para melhorar sua estrutura física e apresentaram projetos nesse sentido.

A comissão será presidida pelo conselheiro do CNJ Bruno Dantas e contará com a participação dos conselheiros Jorge Hélio e Silvio Rocha. Eles terão 30 dias para analisar o assunto, ouvir especialistas e levar um parecer ao plenário do Conselho.

A instalação do grupo foi motivada por uma consulta feita ao CNJ pelo Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ-MA). "A Justiça brasileira, principalmente a nordestina estadual, está muito pobre, não tem recursos para quase nada", disse ao Valor o presidente do TJ-MA, desembargador Antonio Guerreiro Júnior. De acordo com ele, a legislação federal das PPPs permitiria ao Judiciário construir novos prédios e melhorar o atendimento. "Não queremos ficar com um pires na mão pedindo dinheiro ao governo."

O TJ-MA já tem proposta de uma PPP de R$ 600 milhões, para construir uma nova sede da segunda instância e 60 fóruns, além de custear o processo de virtualização dos processos e integração on-line. A sede atual do tribunal, implantada em 1948, é a terceira mais antiga do país, localizada na praça central do Centro histórico de São Luís. "Ela não suporta mais clientela física e não tem para onde crescer ou fazer reforma. Nem estacionamento tem", diz o presidente do TJ-MA. "Fico praticamente engessado." De acordo com ele, a nova sede custaria R$ 250 milhões e abrigaria 52 desembargadores.

A ideia de Guerreiro é comprometer de 30% a 40% de recursos do Fundo Especial de Modernização e Reaparelhamento do Poder Judiciário (Ferj), formado pela arrecadação de custas judiciais, para pagar as obras durante um período de 30 a 35 anos. O TJ-MA arrecada mensalmente cerca de R$ 7 milhões com o fundo. O desembargador também propõe que a PPP tenha um conselho gestor, com a participação de um integrante do CNJ e outros patrocinadores.

O julgamento da consulta do TJ-MA começou em 12 de março, mas está suspenso para aguardar os trabalhos da comissão. O relator é o conselheiro do CNJ José Guilherme Vasi Werner. O conselheiro Fernando Tourinho Neto havia pedido vista regimental. O conselheiro Bruno Dantas sugeriu uma audiência pública para avaliar melhor o assunto. O relator propôs criar a comissão e a ideia prevaleceu.
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TRABALHO »  R$ 25 bi é a fatura do servidor.  Funcionalismo público pressiona governo por reajuste linear de 22,08% e ameaça greve depois de 30 abril CORREIO BSB 29.03

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Negociações por aumento linear de 22,08% nos salários ainda não tiveram avanço. Governo acena com reajuste de benefícios como vale-alimentação

As negociações entre governo e servidores seguiram sem avanço após a reunião de ontem entre representantes das centrais sindicais e o secretário de Relações do Trabalho, Sérgio Mendonça. Os sindicalistas querem reajuste linear de 22,08%, mas o governo não está disposto a pagar esta fatura, que resultaria em um impacto aos cofres públicos de, aproximadamente, R$ 25 bilhões ou 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. As 31 entidades envolvidas na campanha salarial de 2012 prometem deflagrar uma greve generalizada caso não seja alcançado um acordo até 30 de abril. Uma nova reunião foi agendada para 24 de abril.

Um dos únicos pontos que o governo aceitou discutir foi o do reajuste de benefícios, entre eles, o vale-alimentação. “ Esse aumento, entretanto, só deverá ser pago em 2013”, disse Pedro Armengol, vice-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), após o encontro. Na avaliação de Josemilton Costa, secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), o resultado da reunião “foi o pior possível”. “Até mesmo na questão dos benefícios houve retrocesso, porque o secretário anterior já havia sinalizado para o aumento em 2012”, disparou.

Indignação
A definição de uma data-base em 1º de maio — outro dos principais pleitos dos servidores — também foi rechaçada pelo governo, sob alegação de que o assunto será discutido no âmbito da regulamentação da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o que, segundo Sérgio Mendonça, dificilmente ocorrerá este ano. Os sindicalistas ficaram indignados ainda com a relutância do governo em retirar os artigos que preveem a desvinculação dos adicionais de periculosidade e de insalubridade dos salários, do Projeto de Lei nº 2203/2011, em tramitação no Congresso.

No entender de Pedro Armengol, da CUT, a insistência do governo em tratar das questões setoriais, não passa de uma estratégia para esgotar os prazos legais de inclusão de eventuais mudanças no orçamento. O Planejamento rebate, contudo, que atender uma reivindicação geral, como o reajuste linear, irá manter as distorções existentes dentro do funcionalismo. As centrais sindicais não querem repetir o erro do ano passado, quando a negociação ficou muito focada em itens de categorias específicas e, no fim, não houver qualquer reajuste. “As duas pautas não se sobrepõem. O governo tenta fugir da pauta geral, mas este ano os servidores estão unidos e, se houver greve, será de todas as categorias”, disse afirma
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Washington Novaes, jornalista.   Esconder a cara não basta O POPULAR 20.03

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É assustador o cenário desenhado por especialistas do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para a capital goiana até 2050 (O POPULAR, 26/3), que prevê triplicar o espaço urbano da cidade, configurando uma região metropolitana conurbada e formando, com as atuais vizinhas, uma cidade única, das dimensões territoriais da São Paulo atual. Ao mesmo tempo, atormentada pelos problemas de drenagem urbana, disposição do lixo, violência, trânsito caótico, mananciais ameaçados. E com 67 novos bairros, embora a cidade já disponha hoje de pelo menos 100 mil lotes vagos.

Não é o caminho de Goiânia apenas, e sim de quase todas as cidades maiores do País, seguidoras do modelo da capital paulista (11 milhões de habitantes) e de sua região metropolitana (20 milhões), ditado pela prevalência do transporte individual, do automóvel (7,22 milhões ali). Ainda há poucos dias, o jornal O Estado de S. Paulo (21/3) publicou estudo da Escola Politécnica da USP, segundo quem hoje 25% da área construída na cidade de São Paulo já se destinam a garagens. E há anos a Associação Nacional de Transportes Públicos já dissera que, somando a esse espaço das garagens o de ruas, praças etc., o espaço destinado aos veículos em São Paulo chegava a mais de 50% do total. E perguntavam os especialistas: que racionalidade tem ocupar mais de metade do espaço com equipamentos caros, que permanecem ociosos em média mais de 80% do tempo – e ainda deixando no desconforto a maioria da população espremida em transportes públicos deficientes?

Outro especialista calculou – e o tema já foi comentado neste espaço – que ali na capital de São Paulo as 5 milhões de pessoas que se deslocavam diariamente gastavam em média 2 horas diárias para isso, ou 10 milhões de horas. Tomando o valor médio da hora de trabalho ali (em torno de 10 reais), isso significaria R$100 milhões por dia ou, com 250 horas mensais por pessoa, R$ 2,5 bilhões/mês; ou ainda R$ 30 bilhões anuais – valor suficiente para, em uma década, dotar toda a cidade de metrô. Sem esquecer que a implantação e manutenção da rede viária impermeabiliza progressivamente todo o solo urbano. E hoje São Paulo precisa (OESP, 24/3) de mais 44 piscinões para reter água de chuvas, ao custo de muitos bilhões de reais (a região metropolitana já tem 51 piscinões). Na verdade, o programa de macrodrenagem de toda a região metropolitana prevê 143 piscinões, capazes de reter 35 milhões de metros cúbicos de água.

Mas que se espera numa cidade que já tem 7,22 milhões de veículos? De áreas urbanas em todo o País onde já estão mais de 37 milhões de veículos e se espera chegar ao fim da década com 70 milhões? Só no ano passado foram comercializados 3,7 milhões de veículos, e ainda com os governos concedendo incentivos fiscais aos produtores. E para completar, um candidato a prefeito do município da capital, Gabriel Chalita, propõe isentar os automóveis de inspeção veicular – quando eles são os maiores responsáveis pela poluição urbana, dezenas de milhares de internações de pessoas a cada ano, milhares de mortes, custos de saúde astronômicos.

Goiânia segue a mesma senda perigosa e previsível. No ano passado (O POPULAR, 15/2) o número de automóveis cresceu aqui 79%; o de motocicletas, 170%; o conjunto de veículos, 101%. Claro que é preciso repensar tudo – basta olhar ao redor para saber disso. Grande parte do mundo já cria restrições à circulação de transporte individual nas partes mais congestionadas da cidade e cria taxas de pedágio urbano, áreas exclusivas para transporte coletivo. Impõe obrigações para quem coloque em circulação um veículo novo (retirar um antigo de circulação). Impõe limitações severas para a expansão da área urbana.

Os especialistas ouvidos por este jornal (27/3) já apresentaram numerosas sugestões e é preciso ouvi-los. Não precisamos seguir de descontrole em descontrole até tornar a cidade insuportável – principalmente para idosos, deficientes físicos, crianças. Nossas obrigações não terminam aqui – temos e teremos descendentes, com os mesmos direitos que nós.

Na Cúpula do Milênio em 2002, em Joanesburgo, o autor ouviu (e reproduziu neste espaço) um discurso emocionado do então presidente da França, Jacques Chirac: “Nossos filhos e netos nos dirão: vocês sabiam de tudo e não fizeram nada.”

E de nada adiantará, então, apenas esconder a cara.



Washington Novaes é jornalista
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LITERATURA.  Ferreira Gullar recebe Prêmio Moacyr Scliar FOLHA SP 29.03

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O poeta Ferreira Gullar foi o vencedor da primeira edição do Prêmio Moacyr Scliar, por "Em Alguma Parte Alguma". A cerimônia de premiação, aberto ao público, acontece hoje às 18h30, no auditório Machado de Assis da Biblioteca Nacional, no Rio (r. México, s/nº, Centro, tel. 0/xx/21/3095-3879).

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CONTARDO CALLIGARIS.   Como é uma vida sexual saudável?    Pelo DSM-5, você sofre de um transtorno se realiza seus desejos sexuais de duas a cinco vezes por semana FOLHA SP 29.03

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Isto, eu lembrei na coluna da semana passada: a ideia de que alguém possa ser viciado em sexo como numa droga nasceu nos anos 1970 -mais como reação moralista contra a liberação sexual do que como categoria clínica.

De fato, a sexo-dependência ("sexual addiction") fez uma rápida aparição no DSM-3 (a terceira edição do "Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais" da Associação Americana de Psiquiatria, publicada em 1980). A categoria sumiu da quarta edição e não estará na quinta, que será publicada em 2013 e já é conhecida, pois o texto está sendo debatido on-line.

Agora, o sumiço da sexo-dependência não significa que o DSM tenha renunciado a nos dizer como é uma vida sexual "saudável".

Em regra, a cada nova edição, o DSM convida psiquiatras e psicólogos a penetrar mais no dia a dia de nossa vida e a encarnar uma nova forma de autoridade, um híbrido de padre com policial.

A maioria das objeções à revisão em curso, justamente, protesta contra as mudanças dos critérios diagnósticos que baixam a barra do patológico, ou seja, que qualificam como doentios (e, portanto, precisando de tratamento) comportamentos e afetos que, até aqui, todos (pacientes e terapeutas) considerávamos banais e benignos.

Parêntese: subestimar o poder do DSM seria uma imprudência. Na grande maioria dos países em que os tratamentos dos transtornos mentais são cobertos pelos seguros de saúde, qualquer clínico, que concorde ou não com o manual, é obrigado a diagnosticar nos termos do DSM.

Voltando: se a categoria de sexo-dependência não está no DSM, será que cada um pode decidir livremente quanto sexo é bom para ele?

Nada disso. O DSM-5 prevê um "transtorno hipersexual", "um dos mais sérios transtornos psiquiátricos contemporâneos". Nele, fantasias e/ou atuações sexuais, por causa de seu simples excesso, teriam consequências adversas na vida de alguém. As adversidades encontradas pelo hipersexual são, além do risco de doenças sexualmente transmissíveis, as disfunções nas relações de casal e no ambiente de trabalho (por causa do uso de pornografia no escritório). Faz sentido, não é? Pois é, considere um exemplo.

Em 2008, Eliot Spitzer, governador do Estado de Nova York, perdeu seu mandato e seu casamento, quando foi revelado que ele era cliente assíduo de prostitutas desde a época em que, como procurador, ele perseguia ativamente as mesmas e seus clientes. Exemplo perfeito de transtorno hipersexual? É o que parece, mas pergunto (seriamente): Spitzer manifestava seu "desvio patológico" quando transava com prostitutas ou quando sentia a necessidade de perseguir e punir as prostitutas e seus clientes? A "doença", para ele, era o desejo sexual excessivo ou era a carreira pública hipócrita, atrás da qual ele escondia seu desejo?

O DSM-5 propõe também critérios quantitativos para o transtorno hipersexual. Seu transtorno é de severidade média, se você passa de 30 minutos a duas horas por dia ocupado por fantasias ou desejos e/ou se você os realiza (masturbando-se ou com um parceiro, tanto faz) entre duas e cinco vezes por semana.

Cá entre nós, tendo a pensar o oposto: se você NÃO for ocupado por fantasias ou desejos sexuais entre 30 minutos e duas horas a cada dia e/ou se você NÃO realizá-los entre duas e cinco vezes por semana, você vai encontrar ao menos uma consequência adversa: sua vida sexual de casal vai apodrecer progressivamente.

Não imagine que o DSM tenha intenções moralizadoras. Nada disso. O DSM é um perfeito exemplo do caráter abstrato do poder moderno: ele não promove valores, mas quer apenas controlar e regular. Por isso, seu ideal é que nada seja "normal", pois tudo o que for "normal" fugiria a seu controle.

No caso do sexo, se você não sofre de transtorno hipersexual, não cante vitória: provavelmente, você sofre de um "transtorno de desejo sexual masculino hipoativo" (ou de seu correspondente feminino).

Se você evitou os "excessos" da hipersexualidade e não quer ser hipoativo, saiba que não há critério fixo de hipoatividade; quem julga é o clínico, "levando em conta fatores (...) como a idade e o contexto da vida da pessoa" -sem mais.

Em suma, quer saber qual seria a quantidade certa e "saudável" de sexo na sua vida? Como não é mais moda perguntar para o padre, pergunte para o psicólogo ou o psiquiatra.Como diria minha avó: "Mamma mia!".
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RIO+20.  Conferência da ONU deve ter metas para a sustentabilidade FOLHA SP 29.03
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Ideia de criar Objetivos de Desenvolvimento Sustentável é 1º consenso nas negociações
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Pelo menos um consenso já existe na conferência Rio+20: diplomatas reunidos nesta semana na sede da ONU, em Nova York, definiram que a cúpula proporá a criação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Trata-se de um conjunto de metas a serem adotadas por todos os países do mundo em áreas como energia limpa, segurança alimentar e preservação dos mares.

A ideia tem sido discutida desde o começo das negociações do texto da conferência, mas alguns países ainda não concordavam com ela.

"Eu não vi ninguém se opondo desta vez", disse à Folha Fernando Lyrio, assessor para a Rio+20 do Ministério do Meio Ambiente. Ele participou do encontro em Nova York, a primeira rodada de negociações em torno do chamado "Rascunho Zero" do texto da Rio+20.

O debate agora é sobre a forma como a conferência abordará os objetivos. Não será possível definir todas as metas no Rio, mas o Brasil quer definir um roteiro com prazos para a sua adoção. Outros países querem que a Rio+20 "lance um processo", ou seja, abra discussões.

Os dissensos não param por aí: na reunião, vários países reclamaram de que "elementos-chave da sustentabilidade" não estão no texto em negociação, que cresceu de 20 páginas para 178 páginas.

Segundo Lyrio, ainda há um longo debate sobre a promoção do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) a uma agência, proposta pelo europeus.

E ninguém falou ainda sobre dinheiro, palavra maldita para os países desenvolvidos, em crise.

"Vai ser um processo árduo", disse o secretário-geral da Rio+20, Zukang Sha.
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PASQUALE CIPRO NETO.    Feriado, jogo do Brasil e cerveja.   No jornal de papel, existe o fator espaço, muitas vezes verdadeiro; na web, esse fator tem peso (quase) zero FOLHA SP 29.03
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ESTAVA NA primeira página de um site, há uma ou duas semanas: "Comissão aprova feriado em dia de jogo do Brasil e cerveja em estádio". Prato cheio para uma das já tradicionais questões de vestibulares (o da Unicamp, por exemplo) que pedem ao candidato que traduza os efeitos "estranhos" que a ordem das palavras dá ao sentido de determinadas frases.

Estruturalmente, a frase em questão pode ser ambígua, já que dela se pode entender que: a) foram dois os itens aprovados pela tal comissão (1 - feriado em dia de jogo do Brasil; 2 - cerveja nos estádios); b) o feriado está condicionado a dois itens (1 - jogo do Brasil; 2 - cerveja no estádio -jogo do Brasil sem cerveja no estádio, nada de feriado).

É claro que com um pouco de boa vontade se chega àquilo que o redator efetivamente quis dizer, ou seja, que a tal comissão aprovou dois itens (cerveja nos estádios e feriado em dia de jogo do Brasil), mas a ordem dada aos termos não nos leva imediatamente a essa compreensão.

Como o caro leitor certamente já pôde perceber, teria sido melhor inverter a ordem dos termos. Vamos lá: "Comissão aprova cerveja em estádio e feriado em dia de jogo do Brasil". A frase cai lisa logo de cara, não?

Na última terça-feira, em sua coluna nesta Folha ("A Língua e o Poeta"), Hélio Schwartsman afirmou que, em determinado contexto (o comentário que ele, Schwartsman, faz a partir da tese de Noam Chomsky de que a capacidade para a linguagem é inata), "uma frase ambígua é mais 'errada' do que uma que fira as caprichosas regras de colocação pronominal". Assino embaixo, o que, para o leitor habitual deste espaço, não é nenhuma novidade.

E por que a referência ao que escreveu Schwartsman? Porque o título jornalístico que comentei hoje é prova viva do que diz o caro articulista. Já perdi a conta de quantas vezes comentei neste espaço trechos e títulos jornalísticos de difícil compreensão ou de compreensão não imediata. A usina vai a mil; a produção não tem fim. No jornal de papel, existe o fator espaço, muitas vezes verdadeiro; na internet, esse fator tem peso zero (ou quase zero), já que a "manobrabilidade" é muito maior. Qual será, então, o motivo de tantos títulos ruins? A pressa? Sabe Deus!

Quer outro? Prepare-se para mais um contorcionismo. Lá vai: "Palmeiras encara primeiro teste para driblar pressão da torcida contra Ajax". Elaiá! O que faz aí a preposição "contra"? Liga "pressão" a "Ajax", ou seja, indica que a pressão é contra o Ajax? Ou será que a pressão é da torcida do Palmeiras contra o próprio time? Sim, sim, já sei, o conhecimento de mundo nos faz entender que o sentido pretendido pelo redator etc., etc., etc., mas... Mas sonhar com a alteração na ordem nos termos e a consequente obtenção da clareza não é exigir muito, é? Vamos lá: "Contra Ajax, Palmeiras encara primeiro teste para driblar pressão da torcida". Viu como é simples? Por que será que muitos dos que escrevem não pensam no fator ordem? Será que isso revela linearidade do pensamento?

Bem, antes que me esqueça, o termo "driblar" não parece o mais adequado à mensagem citada no parágrafo anterior ("aplacar" talvez fosse melhor), mas isso (o vocabulário) é outra história. É isso.

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