quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012
Moda e
preservação de museus serão contemplados na Rouanet
Novas categorias entram na lei de incentivo fiscal a
patrocínios FOLHA SP 01.02
-
O guarda-chuva da Lei Rouanet cresceu: os setores de
moda e preservação de museus, agora, têm sinal verde para usar o incentivo
fiscal -que permite deduzir patrocínios à cultura do imposto.
A criação das novas categorias foi publicada anteontem
no "Diário Oficial da União", com assinatura da ministra Ana de
Hollanda.
Música gospel e jogos eletrônicos foram outros
"sócios" recentemente convidados para o "clube" Rouanet.
Na prática, já era possível encaixar propostas desses
gêneros em outras brechas da lei. Mas nem sempre era fácil.
O estilista Ronaldo Fraga bem que tentou aprovar um
projeto. Era sobre a cultura popular ao redor do "Velho Chico", o rio
São Francisco, com participação de Maria Bethânia e Wagner Moura.
Matéria-prima: a pesquisa feita para uma coleção na São Paulo Fashion Week de
2008.
Da primeira vez, nada feito. Até pouco, o Ministério
da Cultura não entendia a moda como manifestação cultural.
Fraga tentou de novo e, em 2010, conseguiu usar o
incentivo fiscal. Com algumas condições. "Tinha que sair qualquer coisa
que o relacionasse à moda. Tive que tirar as palavras 'estilista',
'coleção'..."
A exposição, segundo Fraga, foi o "marco
zero" da moda na Rouanet. Naquele ano, o MinC criou um colegiado para o
setor. Entre os membros estão o próprio estilista, Jum Nakao e Paulo Borges
(SPFW).
Fraga afirma que a diretriz é aprovar projetos em
sintonia com memória, pesquisa, tecnologia e formação de profissionais na moda.
"Não há museu que registre a nossa história. Pergunta para a nova geração
o que ela sabe do [estilista] Dener [1937-1978]."
Ele concorda que, em tese, é possível investir
dinheiro de imposto em pesquisas que sejam depois aplicadas em coleções caras
-suas próprias peças, em lojas, podem sair por centenas de reais.
Fraga ressalta que uma banca vai priorizar propostas
com contrapartidas sociais. Não bastaria pegar um "shape" da Prada,
somar ao trabalho de uma bordadeira local e pôr nas lojas, por exemplo.
museus
Segundo José do Nascimento Júnior, presidente do Ibram
(Instituto Brasileiro dos Museus), a Rouanet agora "reconhece um conceito
mais amplo de museu".
Não que o segmento não aprovasse projetos para
preservação de seu patrimônio. Até conseguia. "Mas agora fica mais claro
que envolve acervos, coleções e edifícios."
Isso beneficia "museus comunitários, que poderiam
achar que a Rouanet não é da sua alçada", ele exemplifica. Também serve ao
Museu Nacional de Belas Artes, que precisa terminar seu restauro.
Em 2011, o TCU (Tribunal de Contas da União) finalizou
auditoria que detectou lentidão e falhas na gerência da Rouanet dentro do MinC.
As recentes mudanças na lei vêm de exigência do TCU, "que determina o
detalhamento dos segmentos a serem entendidos como culturais", segundo o
advogado Fábio Cesnik.
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Cineastas divergem
sobre relevância do filme nacional
Em debate,
Eduardo Escorel afirmou que o cinema brasileiro é 'irrelevante'
O produtor Luiz Carlos Barreto discorda e diz que
produção recente têm importância 'cultural e comercial'. FOLHA SP 01.02
-
A atual produção do cinema brasileiro é
"irrelevante". A opinião é do cineasta e crítico Eduardo Escorel, que
montou filmes como "Santiago" (2007), de João Moreira Salles, e
"Terra em Transe" (1967), de Glauber Rocha.
A declaração foi feita durante um debate na 15ª Mostra
de Cinema de Tiradentes, na semana passada. Após o evento, Escorel afirmou à
Folha que a irrelevância se dá porque "ninguém assiste ou se interessa por
esses filmes".
No ano passado, as 98 estreias brasileiras renderam R$
164 milhões nas bilheterias, o segundo melhor resultado dos últimos 20 anos.
Sete filmes nacionais superaram um milhão de
espectadores. "Cilada.com", o campeão, fez o triplo disso. A cada
ano, cresce a presença de filmes brasileiros em festivais internacionais, como
os de Cannes, Veneza e Berlim.
Para Luiz Carlos Barreto, produtor de "Dona Flor
e Seus Dois Maridos" (1976), filme que levou dez milhões de pessoas aos
cinemas, Escorel pode ter tido "uma momentânea privação de sentidos"
ou "amargura pelo fato de não estar fazendo cinema".
"Só posso atribuir a isso. Porque é evidente que
não é o mesmo cinema brasileiro dos anos 60 e 70. É outro cinema, mas de grande
relevância cultural e comercial."
Para o cineasta Beto Brant ("O Invasor" e
"Cão Sem Dono"), a declaração de Escorel é desprezível e saudosista.
Já o crítico e ensaísta José Carlos Avellar diz que a
discussão não deve se focar nos resultados comerciais, já que ninguém reclama
que o livro "Grande Sertão: Veredas", de João Guimarães Rosa, não
tenha vendido tanto quanto um livro de Paulo Coelho.
"Irrelevância não é uma coisa pejorativa, mas
algo que fala sobre uma nota muito acentuada da produção brasileira que se
relaciona mais com a forma do que com o enfrentamento das questões diretas do
país", disse.
A diretora Eliane Caffé, de "Narradores de
Javé", diz concordar em parte com Escorel porque os novos filmes
brasileiros de ficção, salvo algumas exceções, parecem "estar fora do eixo
principal daquilo que realmente está nos tomando" como dilemas.
Para Cao Hamburger, diretor de "O Ano em que Meus
Pais Saíram de Férias", o cinema brasileiro tem conseguido aumentar sua
importância na cultura nacional.
"Filmes como 'Cidade de Deus' e 'Tropa de Elite'
levaram a questão das favelas para o resto do país e para o exterior. E mesmo
filmes menores, que tem repercutido muito, ajudam na formação de uma cultura
audiovisual."
O cineasta Carlos Reichenbach, de "Garotas do
ABC" (2004), diz que Escorel talvez tenha exagerado, mas mesmo assim é
preciso que o país repense os modelos da produção atual, como filmes para
públicos segmentados.
"O público-alvo talvez seja a salvação dessa
produção média", afirmou. Reichenbach cita o exemplo de filmes para
espíritas, surfistas ou estudantes que cumprem as demandas dos segmentos.
Para um dos expoentes do cinema brasileiro
independente, Guto Parente, codiretor de "Estrada para Ythaca", a
relevância não deve ser medida a partir de efeitos imediatos na sociedade.
"A reverberação desses filmes pode ser muito
grande daqui a 20, 30 anos", disse.
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