quarta-feira, 16 de março de 2011

Ministro diz que é "dever" esclarecer atos da ditadura

Fonte: folha.uol.com.br 16/03



Cardozo defende Comissão da Verdade e se opõe à posição de comando militar

Seis mulheres vítimas de perseguição recebem homenagem; duas delas foram companheiras de prisão da presidente

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo rebateu ontem as críticas do comando do Exército à criação da Comissão da Verdade.
Cardozo afirmou que a comissão é um "dever do Estado brasileiro" e a comparou à Comissão da Anistia.
"A Comissão da Verdade, que se discute hoje no Congresso Nacional, é um dever do Estado brasileiro também. O direito ao esclarecimento de fatos é um compromisso histórico, democrático, que tem que estar respaldado na lei", afirmou ontem em cerimônia de homenagem a mulheres perseguidas durante a ditadura militar (1964-1985).
Cardozo reagiu à posição do Comando do Exército, sem citá-lo, que enviou documento ao Ministério da Defesa em setembro criticando a Comissão da Verdade.
O texto alega que "o argumento de reconstrução da história parece tão somente pretender abrir feridas na amálgama nacional".
Os militares alegaram ainda que "é improvável chegar-se realmente à verdade dos fatos" com a comissão.
"A sociedade brasileira hoje quer a verdade. Se alguém é contra, que se expresse", disse o ministro.

HOMENAGEM
A pasta homenageou ontem seis mulheres que foram perseguidas durante a ditadura militar -entre elas, ex-companheiras de prisão da presidente Dilma Rousseff.
Durante a repressão, Dilma foi uma das dirigentes da VAR-Palmares e ficou presa de fevereiro de 1970 até o final de 1972.
"Eu compartilhei [com a presidente Dilma] uma cela no presídio Tiradentes, e o mesmo beliche, ela embaixo e eu em cima", lembrou Sônia Hipólito, militante da UNE (União Nacional dos Estudantes) durante a ditadura.

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Veto a repasse do MinC ameaça Brasil em Veneza

Lei prejudica acordo com a Bienal de SP para representação do país na mostra italiana Fonte: folha.uol.com.br 16/03



Legislação que proíbe repasses inviabiliza convênio que estabelece que Funarte custeie exposição de brasileiro

A representação brasileira na 54ª Bienal de Veneza "encontra-se seriamente ameaçada". A afirmação foi escrita por Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal, em carta à ministra da Cultura, Ana de Hollanda, e ao ministro das Relações Exteriores, Antonio de Aguiar Patriota.
"Não se trata de conflito, mas é um alerta, se em 15 dias o dinheiro não chegar, o catálogo e mesmo a obra do artista podem simplesmente não acontecer", disse Martins, por telefone, de Washington (EUA), à Folha.
Em um convênio com a Funarte e o Ministério das Relações Exteriores, dono do pavilhão brasileiro em Veneza, a Bienal de São Paulo ficou encarregada de organizar a representação nacional.
Desta vez, ela será realizada por Artur Barrio.
Segundo o acordo, a Funarte paga as despesas diretas. No entanto, a lei nº 12.377, de dezembro do ano passado, proibiu o repasse de verbas do MinC para entidades privadas, o que prejudicou o acordo com a Bienal.
O ministério, contudo, estuda medidas para repassar o montante. "Queremos resolver o problema. Estamos tentando achar uma fórmula, que pode ser o Ministério das Relações Exteriores passar o dinheiro ou a alteração da compreensão de evento, que é o que foi proibido de ganhar repasse do MinC", disse à Folha Antonio Grassi, presidente da Funarte.
"Enviamos a carta aos ministros porque creio que possam agilizar o processo. Seria um vexame o pavilhão não estar pronto", diz Martins.
A reportagem tentou, ontem, falar com a ministra, mas, segundo a assessoria, ela estava em uma reunião no Palácio do Planalto.
Martins diz que a Bienal já gastou cerca de R$ 250 mil, que não são parte do convênio, no cachê dos curadores -Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos- e no catálogo.

CONVÊNIO
A 54ª Bienal de Veneza será inaugurada em 4 de junho e, pela primeira vez na década, não terá brasileiros na mostra principal, curada pela alemã Bice Curiger.
A Bienal de São Paulo tem sido a responsável pela indicação do representante brasileiro desde os anos 1990.
Em 2001, o empresário Edemar Cid Ferreira, indicado pela Bienal, pagou não só a representação de Ernesto Neto e Vik Muniz, como também mostras de santos barrocos, fantasias de Carnaval e trajes de Carmem Miranda.
Em outros países, as representações costumam ser indicadas por organismos governamentais. "Nas próximas bienais, podemos rever esse convênio", diz Grassi.
Mesmo sem ter a renovação, contudo, Martins já anunciou que o curador da 30ª Bienal de SP, em 2012, Luiz Pérez-Oramas deve indicar o representante brasileiro em Veneza em 2013.

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LANÇAMENTO

Sivuca e o Recife

Fonte: correioweb.com.br 16/03

Livro resgata os áureos tempos em que o sanfoneiro viveu na capital pernambucana, um período de grande produção

Quando começou a pesquisar e a colher material para a biografia inédita de seu pai, o compositor, arranjador, maestro, e sobretudo, sanfoneiro Sivuca, a socióloga e doutora em ciências humanas Flavia Barreto encontrou um material tão rico que um dos capítulos acabou se transformando em outro livro que acaba de ser lançado: Sivuca e a música do Recife (Publikimagem). Os 10 anos (1945-1955) em que o artista paraibano viveu na capital pernambucana foram intensos e criativos, não só do ponto de vista profissional, como do pessoal, e Flavia não hesitou: “O material era tão vasto que seria um crime se a gente deixasse ele só em um capítulo. Por isso a ideia de outra publicação. Recife foi a cidade onde ele se formou, onde aprendeu tudo. Isso sem falar no aspecto pessoal, pois foi ali que ele conheceu a minha mãe, e onde eu acabei nascendo”, conta Flavia, que escreveu o livro em parceria com o jornalista Fernando Gasparini.

Vários fatos e dados curiosos vieram à tona na garimpagem para o projeto do livro e ambos os autores elegeram a disputa entre a Rádio Jornal e a Rádio Clube pelo “passe” do músico como um dos episódios mais marcantes. A história ficou conhecida como o Caso Sivuca. “Foi uma briga acirrada e acredito que tenha sido um dos primeiros escândalos de um artista sendo disputado publicamente por duas emissoras. E as rádios perderam a compostura mesmo, usaram de artifícios nada legais. O caso teve muita repercussão na época, foi assunto de mesas redondas, ganhou capas de jornal”, comenta Gasparini.


Acervo
Antes de se envolver no projeto, o jornalista e escritor conhecia superficialmente a trajetória do sanfoneiro paraibano, mas mergulhou a fundo na pesquisa, viajando para várias cidades e resgatando um passado que andava esquecido. “Busquei jornais antigos, arquivos públicos em cidades com Recife, João Pessoa, Natal, Rio, São Paulo e até em Brasília. Vasculhei discos dele em todo o país, fotos também. Acredito que, assim como vários artistas de sua época, Sivuca não tinha uma preocupação em arquivar nada e por isso tudo ficou espalhado”, opina Fernando Gasparini.


Boa parte do material colhido faz parte de uma iniciativa maior, coordenada justamente por Flavia Barreto, filha única do artista. O projeto Sivuca – Maestro da sanfona brasileira tem várias ações como a distribuição da discografia digitalizada completa para instituições de pesquisas e escolas de músicas, além da criação do site do sanfoneiro. “Estamos catalogando um vasto acervo e a biografia mesmo será lançado no primeiro semestre e será mais uma opção de informação sobre o meu pai. O nosso compromisso sempre foi ampliar o acesso às fontes, democratizar isso para estudantes, imprensa, pesquisadores. Isso é muito importante”, resume Flavia.


Genial

Nascido na cidade de Itabaiana, no sertão da Paraíba, Severino Dias de Oliveira, o Sivuca, apelido que ganhou do maestro Nelson Ferreira, mesclou a tradicional base musical popular do instrumento que tocava — a sanfona — com experimentos e inserções na música erudita. Ficou notório não só no Brasil, mas no exterior como instrumentista, maestro, orquestrador, arranjador, compositor e produtor musical. O artista, que era albino, faleceu em 2006 acometido por um câncer.

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Rumos e desafios da revolução egípcia

Fonte: folha.uol.com.br 15/03

NAGIB NASSAR

O país precisa reformar sua Constituição, de forma a refletir os interesses de todos os grupos e permitir evolução democrática mais sólida



Após 18 dias de protestos e gritos de vitória, o ditador Mubarak enfim caiu, mostrando que os egípcios ainda muito podem fazer.
O Egito sofreu durante muitos anos, mas não deixou de se levantar, como um gigante, com o coração, cérebro e nervo do mundo árabe, em exemplo aos seus irmãos.
Assim podemos entender a fala do poeta: uma cabeça levantada e uma mente sem medo! Há uma razão no que foi dito pelo presidente Obama: "O povo do Egito falou alto e sua voz foi bem ouvida. O Egito nunca mais será o mesmo!".
O sucesso da revolução foi a determinação e a firmeza do povo egípcio durante todos os 18 dias. A demonstração dos milhares que tomaram conta da praça Tahrir é testemunha. É um alerta aos militares: estamos atentos vigiando nossa conquista e nossa vitória; eles podem manter a ordem e disciplina, mas não governar por muito tempo.
A queda de Mubarak não é o fim! Termina uma era, mas ainda resta muita luta e muito a realizar para a revolução egípcia. É preciso reconstruir o cenário político, em que todas as forças da oposição afastadas pelo ditador podem contribuir, decidir e participar.
Há, ainda, a reforma da Constituição, para refletir os interesses de todos e para permitir uma evolução democrática mais sólida.
Os temores de revoluções islâmicas que aparecem são totalmente errôneos. A revolta em todos os lugares no mundo árabe é motivada por sentimentos nacionalistas, muito mais do que religiosos.
Os islâmicos da chamada Irmandade Muçulmana não fazem nada mais do que acompanhar os acontecimentos. Na última e única eleição livre nos últimos 30 anos, eles não conseguiram mais de um quinto do Parlamento egípcio.
Não há motivo para temer que a situação se incline na região em benefício do Irã. Há uma mensagem feita pela revolução egípcia dirigida ao Ocidente e aos Estados Unidos, em particular: "A estabilidade não pode ser prioridade da democracia e dos direitos humanos".
Será que eles ouviram essa mensagem? A outra lição é que a generosa ajuda em armas e cereais pouco muda a opinião pública em países onde eles os oferecem. Não é com dinheiro que se compra amor.
Assim, quando o povo se revolta, não adianta essa ajuda para salvar os aliados ditadores!
Diferentemente de 1952, a revolução egípcia de 2011 é feita pelo povo e voltada para o povo, e não por oficiais militares que tomaram o poder por meio de golpe que eles chamaram de revolução.
É verdade que derrubaram o corrupto rei Farouk e aboliram a monarquia -sucesso que inspirou muitos países árabes e africanos a remover os impérios britânico e francês. Apesar disso, quem observa de modo neutro percebe que o movimento de 1952 afastou o Egito da vida democrática e implantou a política monopartidária, dando início ao regime de Mubarak.
Há muitos desafios que aguardam o Egito em 2011. O povo mostrou ser capaz de vencer e de dar exemplo para o mundo árabe. O vento que partiu de Tahrir ainda sopra sobre os irmãos e vizinhos.


NAGIB NASSAR é professor emérito da Universidade de Brasília e pesquisador sênior do CNPq.

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