sexta-feira, 11 de março de 2011

Distinção de poderes religioso e temporal ficou impraticável

Fonte: folha.uol.com.br 11/03

GOVERNO CHINÊS RECLAMA DIREITO DE OFICIALIZAR A REENCARNAÇÃO DO DALAI-LAMA

Ao anunciar mais uma vez a decisão de transferir seu poder temporal, o dalai-lama responde à pergunta tantas vezes repetida -quando?
Mas deixa outras questões por serem respondidas, entre elas a de como transferir ao sucessor a liderança construída em cinco décadas de eficiente e bem financiada propaganda erigida sobre o alicerce da mística tibetana.
As complicadas negociações entre os exilados tibetanos (hoje provavelmente superados, em número, pelos descendentes) e o governo chinês têm sido marcadas por astúcia, prevaricação e contradições, algumas desconcertantemente bizarras.
Por exemplo, a mera existência de um "Governo Tibetano no Exílio" (GTE) contradiz o reconhecimento da soberania da China sobre o Tibete, reconhecimento esse tantas vezes reiterado pelo dalai-lama nos últimos anos.
De sua parte, o governo chinês, oficialmente ateu, reclama o direito de reconhecer e oficializar possível reencarnação do dalai-lama.
(Tradicionalmente, em razão do celibato, nenhum dalai-lama procria sucessor, mas reencarna nalgum bebê macho nascido logo depois de ele desencarnar; o sucessor é identificado por uma comissão de astrólogos e videntes.)
Antes de a China efetivar a anexação do Tibete, em 1949, o país era governado por uma coalizão de teocratas e aristocratas liderada historicamente pelo dalai-lama, que reunia poderes e títulos de monarca absolutista e sumo sacerdote da religião oficial, o budismo tibetano.
Muito do poder político do dalai-lama, então, sempre foi manipulado por cortesãos que, no estilo da Renascença italiana, muitas vezes recorreram a intrigas e assassinatos para assentar diferenças.
Estas buscavam colocar a serviço delas a aura mística imensamente popular do dalai-lama e sua liderança espiritual do budismo tibetano. Este nada tem a ver com as beatitudes agnósticas do budismo original indiano.
Mas continua sendo convergência sincrética de credos animistas autóctones, chamados de Bon, fundidos com teologias e liturgias hindus e budistas, resultando desse amálgama um fantástico panteão de centenas de divindades nacionais e locais.
Em suma, a distinção presumida entre poder temporal e religioso do dalai-lama pode se revelar impraticável.
Ele tem dito que sua função é espiritual, pois já delega assuntos seculares ao primeiro-ministro do GTE, que hoje é Samdhong Rinpoche.
Já ouviu falar nele?


ALDO PEREIRA é autor do livro "Brumas do Tibete" (Publifolha)

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Mulher pode?

MARTA SUPLICY

Fonte: folha.uol.com.br 11/03

Mulheres começam a ocupar postos aos quais não tinham acesso, mas, ao desempenhar suas ações com firmeza, logo são chamadas de autoritárias


Essa pergunta deveria soar absolutamente absurda na segunda década do século 21. Afinal, conquistamos o cargo político mais importante, que é o de primeira mandatária da nação.
Pela primeira vez, temos vice-presidentes mulheres no Senado e na Câmara, chefiamos nove ministérios e até a Polícia Civil do Rio de Janeiro. Importantes empresas públicas e privadas já há algum tempo têm aberto posições de comando nas suas estruturas.
Por outro lado, segundo o Dieese, na região metropolitana de São Paulo ganhamos 76% do salário dos homens para fazer as mesmas tarefas. Uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo aponta que cinco de nós apanham a cada dois minutos no país. Outra, do DataSenado, que ouviu apenas mulheres, mostra que somente 6% das entrevistadas consideram que a mulher é tratada com respeito no Brasil. Segundo essa mesma pesquisa, 81% delas denunciariam se presenciassem um caso de agressão.
São exatamente essas contradições entre ocupação de espaços, mudança de disposição ao enfrentamento da violência e baixa autoestima que indicam que algo mudou. O momento é de transformação e transição, mas este é um país de paradoxos.
Gay e travesti são bem-vindos na vida "real" da novela e no Carnaval, mas não podem ter direitos de cidadania elementares. Mulheres começam a ocupar postos aos quais não tinham acesso, mas, quando desempenham suas ações com firmeza, não importa o cargo, logo são chamadas de autoritárias.
Entretanto, acredito que sairemos desse período, irreversível, com espaços mais amplos para as mulheres do que na maioria dos países, inclusive de Primeiro Mundo. A rapidez da abertura da porta para isso, com a eleição da presidente Dilma, já ficou demonstrada com as primeiras nomeações.
Como constatamos, as consequências mais aparentes foram rapidíssimas. As do mundo cognitivo, pelas quais passa o simbólico de ter uma mulher como presidente da República, vamos demorar mais para avaliar.
Mas tenho certeza de que, na cabecinha das meninas, o "mulher pode" já tem um futuro melhor do que na das mulheres entrevistadas pelo DataSenado, que não se veem tratadas com respeito no Brasil.
Para superarmos a violência de gênero e a cultura machista, que ainda impõe tantos obstáculos para a mulher, principalmente na entrada em uma carreira política, os esforços deverão ser prioritariamente em creches, em educação e em projetos que propiciem a independência econômica.
Enquanto a mulher não tiver condição de se manter, ganhar o mesmo que os homens pelo desempenho de funções similares e ter os filhos cuidados, o avanço será a passos tímidos. A possibilidade de identificação com uma imagem forte de mulher já está bem encarnada na figura de nossa presidente.
O caminho para que essa ideia se concretize vai depender de políticas públicas voltadas para a mulher. Para nossa sorte e alegria, Dilma tem a total percepção dos caminhos. E por isso acredito que esse momento pelo qual passa a mulher brasileira supera, com ela, a primeira fase. Mulher pode, sim.


MARTA SUPLICY, senadora pelo PT-SP, é vice-presidente do Senado Federal.

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Engenho onde viveu Nabuco é restaurado

Fonte: folha.uol.com.br 11/03


Reforma feita por fundação demorou dois anos, custou R$ 500 mil e seguiu descrições de livro do abolicionista

Infância passada na fazenda descortinou para ele a realidade do regime escravocrata que ele viria a combater

"A escravidão para mim cabe toda em um quadro inesquecido da infância, em uma primeira impressão, que decidiu, estou certo, do emprego ulterior de minha vida."
As palavras do abolicionista Joaquim Nabuco (1849-1910) estão no livro "Minha Formação", de 1900.
Nelas, ele se refere a um episódio que viveu no engenho Massangana, no interior de Pernambuco, onde morou até os oito anos, e cujas casa grande e capela foram recentemente restaurados.
Nabuco estava sentado na entrada do casarão quando um negro desconhecido caiu de joelhos implorando que fosse comprado. Dizia que seu dono o maltratava e que corria risco de vida.
A cena descortinou para Nabuco o regime escravocrata com o qual convivia no engenho sem conhecer sua face mais dolorosa.
Nabuco teve as primeiras impressões do mundo nesta propriedade, onde foi criado pela madrinha, já que seus pais se mudaram para o Rio.
Ali, cresceu entre negros num ambiente em que senhores e escravos conviviam em relação amistosa.
Mais tarde, dedicou a vida a combater esse regime como político, jurista e escritor.
O restauro das edificações, empreendido pela Fundação Joaquim Nabuco, demorou dois anos e custou R$ 500 mil. A obra obedeceu às descrições que o próprio abolicionista fez no livro de 1900.
"Localizamos onde havia janelas na casa e onde foi enterrada a madrinha dele", diz o arquiteto Antônio Montenegro, que coordenou o trabalho de restauro.
Foram colocados móveis da época e uma exposição permanente descreve como era a fazenda e sua rotina. Em fotos e vídeos é possível conhecer um pouco mais da vida e da formação moral de Nabuco.
Mas muita coisa sucumbiu com o tempo. Não existe mais o antigo engenho que moía a cana, a senzala, nem o cemitério onde eram enterrados os escravos.

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Brasil é o único entre os emergentes sem universidades "top"


Fonte: folha.uol.com.br 10/03


Ranking da THE (Times Higher Education) aponta as cem melhores instituições do mundo; Harvard é a primeira

Rússia, Índia e China têm representantes na lista internacional; EUA se destacam com sete entre as dez primeiras

O Brasil avança na economia, mas tem um longo caminho a percorrer na educação. O país é o único dos BRICs a não ter nenhuma instituição de ensino superior entre as cem mais bem avaliadas por acadêmicos no mundo todo.
É o que mostra o novo ranking divulgado hoje pela THE (Times Higher Education), principal referência no campo das avaliações de universidades no mundo, que é baseada em Londres.
A Rússia aparece com a Universidade Lomonosov, de Moscou, na 33ª posição. A China tem cinco universidades no ranking (duas em Hong Kong e uma em Taiwan). A melhor é a Tsinghua, de Pequim, no 35º lugar. O Instituto Indiano de Ciência está na 91ª colocação.
Foram ouvidos 13.388 acadêmicos de 131 países para chegar à lista das universidades com melhor reputação
São estudiosos com, em média, mais de 16 anos de trabalho em instituições de ensino superior e 50 trabalhos científicos publicados.
Na liderança, mais uma vez, aparece a americana Harvard, que também lidera o ranking geral da THE divulgado em setembro de 2010 e que a Folha publicou com exclusividade no Brasil.
A diferença entre os rankings é que o geral leva em conta 13 critérios- relação estudante/professor, quantidades de alunos e professores estrangeiros, número de trabalhos científicos publicados, ênfase em pesquisa etc.
O índice de reputação, divulgado pela primeira vez pela THE, considera apenas a imagem que as instituições têm entre os acadêmicos.
Foi pedido que apontassem, entre mais de 6.000, até dez universidades como as melhores do mundo em seus campos específicos.

HARVARD
Os Estados Unidos são o grande destaque, com sete universidades entre as dez primeiras e 45 entre as cem.
Em seguida vem o Reino Unido, com duas entre as dez primeiras (Oxford e Cambridge) e 12 no total.
A surpresa é a Universidade de Tóquio, que aparece na oitava posição. No ranking geral, ela está no 26º lugar.
A Rússia também se destaca. A Lomonosov, em Moscou, é a 33ª com melhor reputação, apesar de nem constar do ranking geral da THE.
Com mais de 50 mil alunos, tem 11 ganhadores do Nobel e investe dinheiro público e privado em pesquisas.
Segundos especialistas, é justamente a falta de investimento em pesquisa que deixa as universidades brasileiras fora desses rankings.
Phil Baty, um dos responsáveis pelo estudo, diz que os rankings baseados em critérios objetivos são muito importantes, mas defende também os de reputação.
"Neste momento em que há uma grande disputa global pelo mercado de alunos e professores, uma boa reputação no meio acadêmico é crucial", afirma Baty.
Fora o Reino Unido, a Europa não aparece bem no ranking. A universidade suíça mais bem colocada está em 24º lugar. A alemã, em 48º. Nenhuma francesa está entre as 50 primeiras.
Itália, Espanha e Portugal não figuram no ranking.

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Criar Comissão da Verdade pode gerar tensões, diz Exército

Fonte: folha.uol.com.br 10/03



Ministério da Defesa afirma que texto foi enviado pela Força em setembro e que manifestação já foi "superada"

Segundo o documento, esse tipo de comissão costuma ser criada em períodos de transição, "o que não é o caso"


Em documento enviado ao Ministério da Defesa, o Comando do Exército critica a criação da Comissão da Verdade, alegando que "poderá provocar tensões e sérias desavenças ao trazer fatos superados a nova discussão".
A comissão foi proposta pelo Executivo ao Congresso para reconstituir a história da época da ditadura militar (1964-1985). Está em tramitação e pode ser votada ainda neste semestre.
Segundo o texto, comissões desse tipo "costumam ser criadas em um contexto de transição política, o que não é o caso". Alega que se passaram quase 30 anos do fim do regime e que muitos envolvidos já morreram.
"Testemunhas, documentos e provas praticamente perderam-se no tempo, é improvável chegar-se realmente à verdade dos fatos", acrescenta o texto.
Sendo assim, continua, "o argumento de reconstrução da história parece tão somente pretender abrir feridas na amálgama nacional".
Apesar de defender o direito das famílias dos desaparecidos políticos de buscar seus corpos, o documento do Exército faz críticas: "O que não cabe é se valer de causa nobre para promover retaliações políticas e manter acesa questão superada".

DEFESA
Em nota distribuída ontem, em resposta ao jornal "O Globo", que divulgou a informação, a Defesa informa que o documento não foi redigido no atual governo, mas sim em setembro de 2010.
Foi, segundo a nota, resposta a pedido do ministério às três Forças -"praxe" quando se trata de tema da pasta levado ao Congresso.
A Defesa diz também que "a manifestação do Exército foi superada, ainda no ano de 2010, em face da posição inequívoca do ministro da Defesa [Nelson Jobim] a favor" da criação da comissão.
Acrescenta que "há entendimento perfeito entre ministros da Defesa, da Justiça e da Secretaria de Direitos Humanos no encaminhamento da matéria, com a qual as Forças Armadas estão em absoluta consonância".
As críticas, porém, refletem posição de oficiais e comandos das três Forças, que consideraram necessário "marcar posição", mas não devem bater de frente com a autoridade civil.
A secretária nacional dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, a quem a comissão será subordinada, disse que não comentaria o documento, cuja existência disse conhecer só pela imprensa.

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