segunda-feira, 7 de março de 2011

Acervo de Gilberto Freyre é digitalizado

Fonte: folha.uol.com.br 07/03



Milhares de imagens captadas durante as pesquisas do antropólogo estarão disponíveis na rede a partir de maio

Projeto financiado pelo MinC e coordenado pela Fundação Gilberto Freyre tem registros de viagens à África e à Ásia

O escritor e antropólogo Gilberto Freyre (1900-1987) era um homem de pouco traquejo com a tecnologia. Só escrevia textos à mão, nunca aprendeu a datilografar e nem sequer manejava um telefone. Pelo que se tem registro, jamais usou uma câmera fotográfica.
Isso não o impediu de produzir uma obra extensa, datilografada por terceiros, e de reunir uma farta coleção de fotografias, composta por mais de 17 mil imagens.
São registros de viagens ao exterior, de momentos com amigos, familiares e, sobretudo, de situações sociais usadas como base em suas pesquisas e textos.
Elas foram feitas por pessoas ligadas ao escritor, como o irmão, Ulysses, e o filho, Fernando, doadas a Freyre ao longo dos anos.
A partir de maio, essas imagens estarão disponíveis na internet, no site da Fundação Gilberto Freyre (www. fgf.org.br). O projeto de catalogação e digitalização começou em 2009. Custou R$ 250 mil, bancado pelo Ministério da Cultura.
No escritório onde Freyre trabalhava, até hoje preservado no museu da fundação, em Recife, pilhas de papéis com manuscritos, fotografias e recortes de jornal ficavam espalhados pelo chão.
Cada montanha dizia respeito a um projeto ao qual o escritor se dedicou. "Ele não seguia regras; não costumava usar as mesmas fontes dos acadêmicos. Eram critérios muito pessoais", diz Sônia Freyre Pimentel, filha do antropólogo.
Além das imagens utilizadas na pesquisa do livro "Casa Grande & Senzala", o acervo tem registros da expedição que Freyre fez, na década de 1950, às colônias portuguesas da África e Ásia. As fotos, tiradas sob sua orientação, seriam usadas posteriormente no livro "Aventura e Rotina", de 1953.
A maioria das imagens é inédita; algumas não foram identificadas por falta de referência. A ideia, segundo Jamille Barbosa, coordenadora do projeto, é que o trabalho seja colaborativo: "Vamos disponibilizar tudo, para que os pesquisadores ajudem no processo de descrição".

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Pacotão: há 33 anos botando o bloco na rua

Dissertação de mestrado em História defende que a agremiação brasiliense já é tradição

Fonte: UnB.br 07/03

Em 1977, o então presidente da República Ernesto Geisel, penúltimo general a comandar o país durante a ditadura, lançou um conjunto de leis para alterar as regras das eleições. As mudanças ficaram conhecidas como “Pacote de Abril”. No ano seguinte, saía nas ruas de Brasília, o Pacotão, um bloco de carnaval formado por jornalistas que debochavam do novo ato de força dos militares. Desfilando sempre pela contramão da W3, a Sociedade Armorial, Patafísica e Rusticana – nome oficial do bloco – criticou a distensão lenta, gradual e segura do regime pregada por Geisel.

Os tempos são outros, mas até hoje o bloco não parou de satirizar e ironizar o governo e a política. E nem abriu mão de ocupar a rua no sentido sul-norte, mesmo caminhando no sentido norte-sul. Alisson de Andrade, professor de História da Secretaria Estadual de Goiás, contou como o Pacotão fez história na dissertação Experiências de um carnaval não organizado: a tradição de um bloco de sujos na capital federal, defendida pelo Programa de Pós-graduação em História da UnB, em 2009.

Até 2007, ano em que começou a pesquisa, Alisson só conhecia o bloco pelo nome. Ele nem era nascido quando a agremiação começou a fazer parte do calendário do carnaval da cidade. Mas desde que se uniu ao coro dos brasilienses que criticam a política, não parou mais. Este é o quarto ano em que o folião sairá da 302 norte rumo à Asa Sul pela contramão da W3.

A ideia de fazer uma dissertação sobre o Pacotão surgiu quando Alisson começou a frequentar aulas de História como aluno especial do mestrado. “Me veio a ideia de pesquisar a cultura de Brasília se posicionando contra a ditadura militar”, conta. “Queria ver o que a massa brasiliense fazia para contestar”. Quando começou a levantar dados para a pesquisa, chegou à agremiação carnavalesca. “O princípio gerador da festa lá na década de 1970 tinha um modelo de sátira política, brincadeira, ironia. O bloco é caracterizado por essa dinâmica”, explica o pesquisador.

TRADIÇÃO - Ao longo da pesquisa, ele buscou definir o conceito de tradição. “Muitos teóricos contestam a existência de tradição em Brasília”, explica. Para estes teóricos, a cidade é muito jovem para ter hábitos e costumes considerados tradicionais. Alisson discorda. “Já tem uma geração que é de Brasília. Temos costumes do país inteiro mesclados e Brasília é um pólo agregador de todos”. Sendo assim, o pesquisador concluiu: o Pacotão é tradição.

Um dos organizadores do bloco, José Antonio filho – conhecido como Joanfi – acredita que o bloco é a manifestação carnavalesca mais legítima de Brasília. “Em uma cidade de 50 anos, uma manifestação que tem 33 está, logicamente, enraizada no imaginário das pessoas”, diz. Para ele, a cultura muda e, com isso, muda o Pacotão também. “Nós não temos um inimigo comum como na época da ditadura. O Brasil vive em plena democracia. Antes da anistia, o Pacotão era o único desaguadouro”.

O orientador da pesquisa, José Walter Nunes, afirma que Alisson mostra que é possível falar de política a partir de uma manifestação cultural. “O Pacotão é uma tradição que se reiventa com o passar dos anos. É uma tradição que se transforma de acordo com as condições sociais e políticas do país”, explica. Para o professor, os foliões do bloco incorporam as contradições vividas pela sociedade. “A alegria e a crítica são permanentes. Isso é o substrato do bloco. Não se pode falar de algo estanque”.

Alisson acredita que o bloco continua até hoje pelo fato de não assumir uma ideologia política específica. “O Pacotão sobrevive porque conseguiu superar esse desejo de aparelhagem ideológica. Cada um chega com sua fantasia e vai brincar de acordo com suas convicções ideológicas”, afirma. Mas reforça: não há neutralidade. “É claro que a crítica à direita é mais forte, só que não significa que não exista crítica à esquerda”, diz. O pesquisador defende que o Pacotão não está nem à esquerda, nem à direita nem ao centro. “É uma espécie de catalizador do sentimento da população de Brasília”.

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Pernambuco vive sua revolução industrial

Fonte: folha.uol.com.br 06/03



Com um pacote de R$ 46 bi em investimentos, Estado vira locomotiva do Nordeste; PIB cresceu 16% em 2010

Estaleiros, refinarias, petroquímicas e ferrovia começam a mudar a economia que viveu séculos do açúcar

O helicóptero decola do heliponto do Centro Administrativo de Suape. A 200 metros do chão, é possível ter a dimensão da revolução econômica que a injeção de R$ 46 bilhões em investimentos públicos e privados previstos até 2014 está promovendo em Pernambuco, a nova locomotiva do Nordeste.
Não é o único canto do Estado que avança ligeiro e que tem mudado não só a vida dos 8,7 milhões de pernambucanos, mas sobretudo permitido a volta dos retirantes que um dia caíram no mundo atrás de uma vida melhor.
No interior, duas obras gigantes (a transposição do rio São Francisco e a construção da Ferrovia Transnordestina) ajudam a desenhar uma nova paisagem na vida do morador do agreste e do sertão.

LITORAL
No litoral, onde pode-se observar a síntese da nova dinâmica econômica, o complexo industrial-portuário de Suape, erguido a 40 quilômetros ao sul do Recife, brota a velocidade impressionante.
"Cento e vinte empresas já estão instaladas, outras 30 estão em construção e mais 20 irão surgir até 2014", enumera Frederico Amâncio, vice-presidente de Suape. Do alto é possível avistar obras em todos os cantos dos 13,5 mil hectares do complexo.
Justo ali, onde há 380 anos invasores holandeses -que acharam de tomar uma fatia do Brasil colônia- indicaram como ponto mais propício à criação de um porto.
E foi nessa região, após romperem pequena porção da parede dos arrecifes que protege o litoral do Atlântico, que os holandeses criaram uma passagem para que os barcos de açúcar alcançassem os navios em alto-mar.
A visão dos invasores ganhou forma quase quatro séculos depois. Investimentos de mais de US$ 3 bilhões nos últimos dez anos criaram a infraestrutura básica para o atual ciclo de expansão do porto de Suape, e converteram a região no principal polo de atração de negócios do Nordeste brasileiro.

A APOSTA PRIVADA
Agora, o PIB pernambucano demonstra vigor e o combustível é Suape. Em 2010, o PIB estadual foi de R$ 87 bilhões -expansão de 15,78% num só ano. Os velhos engenhos de cana e as usinas de açúcar e álcool pouco a pouco deixam de ser predominantes na matriz econômica de Pernambuco.
A aposta do poder público em Suape ao longo de 40 anos -desde o plano original de 1960- começou a seduzir o capital privado. O complexo industrial-portuário, um modelo inédito no Brasil, está fazendo surgir um novo Estado industrial no país.
"Não tínhamos indústria de petróleo e gás, nem indústria naval ou automobilística. Agora há uma nova perspectiva para o Estado", diz Geraldo Júlio, presidente de Suape e secretário de Desenvolvimento Econômico.

ACIMA DO NORDESTE
A forte expansão econômica elevou a renda per capita do Estado a quase R$ 10 mil, acima da média do Nordeste, de R$ 7.488, mas ainda inferior à renda nacional, de R$ 15.990.
A criminalidade caiu 25% em quatro anos, mas ainda é de 40 homicídios por 100 mil habitantes, quatro vezes mais que no Estado de São Paulo, e superior à média nacional, de 24,5 por 100 mil.

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ANÁLISE

Expansão econômica de PE cria contradições e desafios

Fonte: folha.uol.com.br 06/03


Pernambuco apresenta altas taxas de crescimento econômico, de consumo, de investimento e de emprego formal, aliadas à redução do desemprego e da pobreza absoluta, o que diminui a frequência com que se tratam as contradições inerentes a momentos transformadores como esses.
Mesmo sendo otimista em relação ao futuro do Estado, creio que se contribui mais apresentando as contradições e desafios que esse processo tem aberto do que apenas ficar reforçando os aspectos positivos.
A mobilidade urbana é o aspecto mais visível dos desafios ligados à infra- estrutura, tendo em vista a ocorrência cada vez mais intensa de enormes engarrafamentos nas maiores cidades do Estado.
Já estão em curso investimentos que tentam atacar tal problema. Contudo, a velocidade com que os mes- mos estão se efetivando é insuficiente para resolver o problema.
Ao mesmo tempo, pouca discussão tem sido feita sobre o descompasso existen- te entre a localização dos novos polos produtivos e a da população sem emprego. Isso gera pressão por fluxos migratórios definitivos ou pendulares.
Tais fluxos estrangulam a infraestrutura também na área da saúde, da educação e do saneamento e não podem ser enfrentados apenas pelo poder local.
No tocante à educação, o poder público já está fazen- do grande esforço no au- mento da oferta interiorizada de educação técnica e superior, bem como na qualificação profissional.
Nesse ponto, os desafios estão em fazer com que os conteúdos dos cursos foquem necessidades locais, mas, mais ainda, em fixar o corpo docente e gerar pesquisa aplicada que possa ser rapidamente transferida ao setor privado.
Ao mesmo tempo, a melhoria do ensino deve buscar a rápida ampliação do capital social, alicerce maior do desenvolvimento.
Os desequilíbrios econômicos intraestaduais intensificam-se devido à centralização dos investimentos privados em Suape.
Apesar de saber-se da existência de tendência natural na centralização da atividade econômica em certos locais, que deve ser contrabalançada pelo poder público, a estratégia que vem sendo tomada pelos governos estaduais desde o início do sé- culo é aproveitar-se do a- pelo de Suape para atrair as empresas, reforçando a concentração econômica na RMR (Região Metropolitana do Recife).

PROBLEMA AMBIENTAL
A velocidade dos investimentos em Pernambuco tem colocado em último plano a questão ambiental. Foram reduzidas áreas de preservação e realizados investimentos que estão longe de ter consenso entre os cientistas.
Com isso, estamos repetindo os erros cometidos no passado, de buscar o crescimento a qualquer custo.
Os bons números da economia devem gerar otimismo, mas não desviar a atenção das contradições inerentes ao crescimento.
Somente debatendo e criando saídas para essas contradições é que se con- seguirá o desenvolvimento, ou, quem sabe, com gran- des mudanças nas políti- cas públicas, o desenvolvimento sustentável.


LUÍS HENRIQUE CAMPOS é coordenador-geral de estudos econômicos e populacionais da Fundação Joaquim Nabuco.

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CARLOS HEITOR CONY

Fonte: folha.uol.com.br 07/03


Negros e brancos

RIO DE JANEIRO - Fernando Pamplona tinha razão ao pedir uma cota de negros, não para as universidades, mas para as escolas de samba do Rio de Janeiro. Nos últimos Carnavais, mais da metade dos integrantes eram brancos, alguns deles bronzeados pelo sol deste verão acachapante, outros artificialmente, como a maioria dos destaques.
Pouco a pouco, a fixação do Carnaval num único eixo (o desfile em si), transformou a festa popular, que nasceu espontânea e livre, num episódio da mídia, sujeito às leis do mercado, aos patrocínios. Neste particular, igualando-se às campanhas eleitorais e ao lobby dos produtores de shows, peças e filmes para promover seus espetáculos.
Ano passado, encontrei um carnavalesco e perguntei sobre seu trabalho, o que estava bolando para o desfile de 2011. Ele tinha mil ideias (os carnavalescos são pródigos em ideias), mas não se fixara em nenhuma porque nada combinara com os patrocinadores.
Somente mais tarde, definidos os parâmetros de cada escola, é que os cenógrafos poderiam começar a trabalhar. É aquela piada de Garrincha sobre os russos, mas às avessas. Primeiro é preciso combinar com os russos, os adversários. No terreno deixado livre, aí é que o pessoal da base, cenógrafos, músicos, destaques etc. poderiam começar o trabalho.
A cota de negros reclamada por Pamplona é consequência desta mercantilização do desfile carioca. Não sou entendido no assunto, acho que em outras praças, sobretudo nas do Norte e Nordeste, a festa mais popular do Brasil não sofre desse mal. Mas no Rio de Janeiro, com o apelo cada vez maior do mercado, haverá necessidade de uma cota mínima de negros -aos quais devemos tanto em nossa formação econômica, cultural e artística.

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