Jovens diretores dão o tom em Brasília
Fonte: folha.uol.com.br 30/11
Festival reuniu a produção de cineastas iniciantes, de marca autoral e forjada nos circuitos dos cineclubes
Filmes foram realizados por equipes pequenas e misturam o real com a ficção; o resultado da competição sai hoje
Festival que já reuniu, ao redor da tela e das mesas de chope, figuras como Glauber Rocha (1939-1981), Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988) e Rogério Sganzerla (1946-2004), Brasília guarda ainda, a despeito dos altos e baixos destes 43 anos de existência, aura de espaço da resistência.
E foi com esse espírito que, no correr da última semana, um grupo de jovens diretores tomou de assalto o mais tradicional festival de cinema brasileiro.
Exceção feita ao carioca João Jardim, todos os diretores dos seis longas-metragens selecionados têm menos de 40 anos.
A idade está longe de ser o único ponto a uni-los. A competição deste ano, cujo resultado será anunciado hoje à noite, no Cine Brasília, legitimou uma produção forjada no circuito dos cineclubes e dos festivais menores, voltados ao cinema autoral. Mas que nova turma é essa?
Trata-se, em primeiro lugar, de uma geração que acredita em outros caminhos para o audiovisual.
Sem buscar reproduzir o cinema de alto orçamento, os novos cineastas tendem a trabalhar em sistema cooperativo, com equipes pequenas, a embaçar as fronteiras entre ficção e documentário e a trabalhar com atores não profissionais ou desconhecidos. Têm também a tecnologia como eixo: seja na feitura, na circulação ou no tema.
SEM FETICHE
"Acho que havia um desejo comum de que o universo do longa-metragem perdesse a imagem da grande estrutura e ganhasse uma aura mais leve", diz Felipe Bragança que, com Marina Meliande, fez "A Alegria", selecionado para a Quinzena dos Realizadores de Cannes e único concorrente que se constrói fortemente como fantasia, sem derivações documentais.
"Não temos o fetiche do cinema como algo inalcançável", diz Eryk Rocha.
"Sempre existiu, no cinema brasileiro, um olhar que passa pelo desejo de vencer dentro do capitalismo, dentro da indústria. Esta geração que está aqui acredita num cinema menor, mais democrático", completa Sérgio Borges.
BAIXO ORÇAMENTO
O filme mais caro do festival é "Transeunte", de Rocha, que não chegou a R$ 1,5 milhão. O documentário "Vigias" custou R$ 40 mil.
Nenhum deles mobilizou mais de 25 pessoas na equipe. Vários, como "Amor?", de João Jardim, foram feitos com menos de dez pessoas.
Muitos dos envolvidos nos projetos foram se conhecendo em festivais. E, como sempre acontece quando uma nova geração está sendo forjada, não são poucas as ligações entre os projetos.
O mineiro "O Céu sobre os Seus Ombros" tem o fotógrafo de "Vigias", a roteirista de "Transeunte" e três técnicos de "Os Residentes".
Tanto "O Céu..." quanto "Transeunte" apresentam-se como ficções, mas deixam o real invadir a cena. Isso, porém, não deve ser confundido com improviso.
Todos os filmes são absolutamente rigorosos com o aspecto plástico.
"Meu filme é uma manifestação estética", demarca Tiago Mata Machado, de "Os Residentes", que resvala na videoarte.
"O digital está dando uma volta, está indo buscar uma certa poesia, está recuperando a impureza do cinema."
Impuro e jovem, o festival de Brasília abriu uma nova janela para discutir o cinema brasileiro.
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