FERNANDO DE BARROS E SILVA
Fonte: folha.uol.com.br 15/11
Abaixo de R$ 140
SÃO PAULO - Um tanque de gasolina. O preço de dois ou três livros. Um jantar razoável para duas pessoas. Tudo isso pode custar R$ 140. Pense no quanto você gastou nesses dias de feriado. Mais de 30 milhões de pessoas (15,5% da população) ainda vivem com menos de R$ 140 por mês no Brasil. Há dez anos eram 57 milhões de pessoas (33,3% da população) nessa condição.
Seria o caso de comemorar e de ter vergonha ao mesmo tempo. Dos quase 31 milhões de miseráveis, 12,4 milhões ainda são considerados "indigentes". É como são chamados, tecnicamente, aqueles que sobrevivem com renda mensal de até R$ 70. Temos alguma ideia de como é a vida dessas pessoas?
O problema, na verdade, é maior. O próprio governo reconhece, na reportagem publicada ontem pela Folha, que R$ 140 mensais per capita (que define o teto da clientela do Bolsa Família) é um valor ridiculamente baixo. A economista Lena Lavinas, da UFRJ, defende que a definição de pobreza seja reconsiderada: quem vive com menos de 60% da renda familiar média per capita (R$ 465), ou seja, com até R$ 280 mensais. No momento em que Dilma promete erradicar a miséria, seria bom aproximar um pouco a nomenclatura da realidade.
O governo Lula, no entanto, entre tantos erros e acertos, teve o grande mérito histórico de dar visibilidade aos pobres, alargando a percepção do país sobre si mesmo. Lula fez com que os pobres se vissem como portadores de direitos sociais e protagonistas da política.
A questão da miséria está colocada em novos termos no centro do debate nacional -menos do que poderia ter sido, para parte da esquerda; com os vícios do paternalismo e do clientelismo, para outros; de modo incômodo para uma fração das classes médias e altas, inconformadas com "esses nordestinos". As reações, muitas vezes antagônicas ou regressivas, sinalizam que, apesar da pasmaceira da política, algo se mexe na iníqua paisagem social brasileira.
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Editorial
Fonte: folha.uol.com.br 15/11
Erradicar a miséria
Reportagem publicada ontem pela Folha mostra que a promessa de campanha mais ambiciosa da presidente eleita, Dilma Rousseff -erradicar a miséria do país- poderá ser cumprida em seu mandato. Para tanto, será preciso ampliar os gastos com o Bolsa Família e manter o crescimento econômico com expansão do emprego.
No que tange ao programa de transferência de renda, consomem-se hoje R$ 13,4 bilhões ao ano para atender 12,7 milhões de famílias. Segundo cálculos do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, o país precisaria de mais R$ 21,3 bilhões anuais para atingir a meta de retirar da miséria e da indigência todos os brasileiros. O gasto nesse caso iria a 1% do PIB por ano.
É preciso no entanto fazer uma ressalva: no Brasil são considerados pobres os indivíduos com renda mensal abaixo de R$ 140 ao mês (R$ 4,60 ao dia). São classificados como indigentes os que recebem apenas R$ 70. Há quem entenda, com razão, que a linha deveria subir ao patamar do salário mínimo ou não muito abaixo.
Cerca de 30 milhões de pessoas (15,5% da população) vivem hoje com menos de R$ 140 ao mês.
Essa massa de pobres era praticamente o dobro (57 milhões, 33,3% da população) há dez anos. Para que caísse de maneira significativa foi preciso contar também com o fator emprego. Aproximou-se de 14 milhões o número de vagas formais criadas no período de Lula. Mas será difícil o próximo governo manter esse ritmo, já que o aumento da produtividade exigirá crescimento maior do PIB para ampliar a oferta de postos.
O desafio de deixar a pobreza para trás dependerá ainda da melhoria das políticas públicas -em especial da educação, o principal instrumento de democratização do acesso ao mercado de trabalho e de redução de desigualdades.
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Entrando em cena
Fonte: folha.uol.com.br 15/11
Fenômeno cinematográfico representado por "Tropa de Elite 2" , já visto por 9 milhões, promove reinserção do espectador de baixa renda no circuito e impulsiona salas da periferia no ranking dos melhores resultados de público e renda
Toda terça eles fazem tudo sempre igual. Acumulam-se no saguão, compram um pacote pequeno de pipoca e não deixam lugar vazio.
No Cinesystem do shopping Bangu, na zona Oeste do Rio, o cinema, às terças, custa R$ 7. Para ver "Tropa de Elite 2" numa sessão promocional, é preciso comprar ingresso com pelo menos três dias de antecedência.
O público que se senta à frente da tela em Bangu espelha o fenômeno social que o fenômeno cinematográfico do longa de José Padilha abarca: a volta das classes C e D, em massa, à sala escura.
O filme só registrou público de 9 milhões em cinco semanas porque mobilizou um contingente de espectadores que, por anos, foi excluído da conta das bilheterias.
É que, a partir dos anos 1990, com a chegada dos multiplex e o fim das salas de rua, o cinema foi se tornando programa elitista.
Basta dizer que São Paulo, sobretudo nas regiões nobres, concentra 34% das 2,1 mil salas do país. Só 4% dos municípios com menos de 50 mil habitantes têm cinema.
Pois a taxa de ocupação das salas populares em "Tropa de Elite" veio provar que uma nova faixa de consumidores está disposta a pagar para ver um filme no cinema. Mas não qualquer filme.
"É um público novo, que não tem esse hábito e, por isso, vai ver um filme específico", diz Mauricio Sabbag, da rede Cinesystem, pensada para ser popular.
De acordo com Sabbag, esses consumidores pouco se utilizam da carteirinha de estudante e, em geral, gastam de maneira moderada na bonbonnière.
NOVO ALVO
O que se vê hoje ocorrera, em menor escala, com filmes como "Carandiru"(2003) e "Dois Filhos de Francisco" (2005), indicando que títulos nacionais são uma poderosa isca para esse público.
A diferença é que, naquele momento, o bolso da classe C ainda não tinha entrado na mira dos empresários.
Empreendimentos como o Sulacap (seis salas), no Rio, erguido com o apoio do BNDES, e as oito salas abertas neste final de semana no Largo 13 de Maio, em SP, três delas com tecnologia 3D, estão ligados à aposta nos espaços desocupados e na chamada nova classe média.
O cinema do Largo 13 pertence à rede Cinépolis, a maior do México e a quinta maior do mundo.
O presidente do grupo no Brasil, Eduardo Acuña, diz que, apesar de ser "80% mais caro fazer um cinema aqui que no México", dados impostos, custos trabalhistas e regras como meia-entrada, a aposta mostrou-se válida.
"O México tem metade da população e o dobro do número de salas do Brasil", aponta Acuña. "Ao conhecer bairros como Aricanduva e Jardim Anália Franco, fiquei espantado. Não chegamos ao Brasil por causa da classe C, mas as classes C e D são a nossa grande surpresa aqui."
Para Melanie Schroot, da Rentrak, empresa que mede as bilheterias, mais salas houvesse nas regiões periféricas, mais ingressos "Tropa 2" teria vendido.
"Faltaram salas para absorver tanta demanda", diz a executiva. Prova disso foi a explosão de público em cinemas de Duque de Caxias e São João de Meriti que, pela primeira vez, tiveram rendas maiores que endereços voltados para a classe A.
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