sábado, 23 de outubro de 2010

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"Bach é o início e o fim de toda a música", diz regente

Fonte: folha.uol.com.br 23/10

Georg Christoph Biller, que dirige a Orquestra Gewandhaus, rege no Brasil pela primeira vez e pontua importância do compositor alemão


Bach não daria um filme. Não tem a precocidade e a leveza encantadora que salta aos ouvidos em Mozart nem a potência das massas sonoras e a sina do gênio perturbado de Beethoven.
Mas esse exímio e pacato organista de província de uma provinciana Alemanha, "foi o início e o fim de toda a música". Assim o define Georg Christoph Biller, regente do coro da igreja de St.
Thomas e da Orquestra Gewandhaus, de Leipzig, que se apresenta em São Paulo.
Com 800 anos de existência, ela foi dirigida por 27 anos pelo próprio Bach (1685-1750), até sua morte.
No programa do concerto, promovido pelo Mozarteum e Instituto Goethe-SP, uma só peça: a "Missa em Si Menor" (BWV 232) -"o testamento musical de Bach, no qual reúne toda a força de sua criação", diz Biller.
(MARCOS FLAMÍNIO PERES)

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/images/ep.gif

Folha - Por que Bach é tão importante ainda hoje? A grandiosidade de sua produção seria possível fora do contexto da religião luterana?
Georg Christoph Biller
- Ele é importante porque fascina pessoas dos mais diferentes credos e culturas. De fato, o protestantismo, com sua ideia de "música para honrar a Deus", era uma importante fonte de composições para Johann Sebastian Bach. Mas sua genialidade também teria se desenvolvido dentro de quaisquer outros credos.

A que se deveu o ostracismo de sua obra até a "redescoberta", pelo músico Mendelssohn, no século 19?
Bach foi quase esquecido após a sua morte, porque nesse período não se dava tanto valor ao cultivo da música mais antiga, como hoje. Não somente Mendelssohn, mas também outros de sua época foram, no início do século 19, considerados como música de tempos passados.

Como definiria a importância, para a história da música erudita, dos "três grandes" -Bach, Mozart e Beethoven?
Em cada um deles, alguma coisa sobressai. Mozart tem como ponto alto a leveza do clássico vienense; Beethoven é o marco do período romântico; já Bach é o início e o fim de toda a música.

As gravadoras dizem que música erudita não vende bem. Ela é um gênero em declínio?
Estará em perigo se os jovens não forem atraídos, e só se sentirão atraídos se já tiverem conhecimento prévio.

O que fazer, então, para ampliar seu público?
Para atrair o público jovem, deveria haver, por exemplo, concertos "lounge" -parecidos com "jam sessions", mas que, ao mesmo tempo, mantêm a literatura clássica. Concertos "participativos" também podem levar a aumento de público.

Qual sua maior obra?
No momento, a "Missa em Si Menor".

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Mostra de fotógrafo argentino resgata traumas da ditadura

Fonte: folha.uol.com.br 23/10

Exilado na Espanha desde a década de 1980, o fotógrafo argentino Marcelo Brodsky retornou ao seu país na década seguinte. Foi quando achou uma foto de sua classe, no primeiro colegial, tirada em 1967.
"Depois de 25 anos, reencontrei meus colegas de classe e propus tirar uma foto de cada um, com elementos de sua vida atual, usando como fundo a foto de 1967", diz.
Essa imagem, que funciona como uma espécie de "madeleine", de "Em Busca do Tempo Perdido", de Proust, é o centro da exposição "Buena Memoria, um Ensaio Fotográfico de Marcelo Brodsky", que é inaugurada, hoje, pelo Memorial da Resistência, na Pinacoteca.
A foto realiza, assim, uma triste cartografia sentimental da história recente argentina, que inclui o desaparecimento de Fernando Rúbens Brodsky, irmão de Marcelo, sequestrado em 14/8 de 1979.
"Depois de 20 anos, as autoridades do colégio aceitaram, pela primeira vez, que nos lembrássemos daqueles que desapareceram ou foram assassinados pelo terrorismo de Estado", diz Brodsky.
A mostra traz dois vídeos, "Ponte da Memória"e "Brincando de Morrer", com imagens da infância dos irmãos Brodsky.
Completa a exposição uma documentação do Parque da Memória, local construído para lembrar os sequestrados e desaparecidos durante a ditadura argentina.

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Seminário debate resultados de pesquisa sobre hábito cultural

Fonte: folha.uol.com.br 23/10

Debatedores não chegam a consenso sobre significado de dados

Os números podem até não mentir. Mas que confundem, confundem.
Em seminário realizado anteontem na Estação Pinacoteca, produtores culturais, artistas e gestores se debruçaram sobre os resultados de uma pesquisa realizada pela consultora J.Leiva Cultura & Esporte, em parceria com o Datafolha e a Fundação Getúlio Vargas.
Os resultados, antecipados pela Folha, se baseiam num levantamento que ouviu 2.400 pessoas, acima de 12 anos, em 82 cidades do Estado de São Paulo, entre 25/8 e 15/9.
O objetivo da pesquisa era mapear e compreender os hábitos culturais da população. A primeira mesa, mediada pelo diretor da Pinacoteca, Marcelo Araújo, deteve-se sobre os conceitos de cultura com os quais as pessoas trabalham.
Para 30% dos entrevistados, a pergunta "O que é cultura?" motivou uma resposta genérica, "atividades culturais". Para 22% dos ouvidos, cultura está relacionada a educação e aprendizado e, para 21%, a lazer e entretenimento.
O resultado, complexo em si, foi lido de diferentes maneiras pelos debatedores. Na primeira mesa, a cineasta Laís Bodanzky, o curador do Masp Teixeira Coelho e o psicanalista Tales Ab'Saber mostraram o quanto as interpretações são diversas.
Enquanto Bodanzky enxerga nos dados uma manifestação do desejo de apreensão cultural por parte da população, Ab'Saber pondera que o alto índice de entrevistados que apontam passeios no shopping como sua atividade preferida indica um descolamento da cultura da vida das pessoas.
Teixeira Coelho viu o risco de estarem, todos ali, "afogando em números".

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Nobel choca com postura antirrevolucionária

Fonte: folha.uol.com.br 23/10

Em palestra em Princeton, Mario Vargas Llosa despeja ira contra Michel Foucault e os ideais da geração de 1968

FOI COM APREENSÃO QUE OUVI VARGAS LLOSA EVOCAR AS EXCURSÕES DO FILÓSOFO PELOS ANTROS GAY



Uma virtude do pensamento conservador é lembrar que o discurso é guiado por espectros. Ao falar, tentamos materializar fantasmas.
Há poucas semanas, o Nobel Mario Vargas Llosa proferiu em Princeton (EUA) a palestra "Breve Discurso sobre la Cultura". Seu fantasma era Michel Foucault (1926-1984).
Ao peruano incomoda que a autoridade tenha sido profanada pela geração de 68, que, iludida, teria feito tábula rasa da "cultura" (que ele usa no singular).
O surpreendente não é sua postura conservadora, mas sim a utilização de um velho módulo do pensamento antirrevolucionário.
Ouvindo-o, lembrei-me do Visconde de Cairu (1756-1835), para quem a soltura dos corpos era a própria loucura da massa torpe e ignara.
Delicioso paradoxo: Cairu, que reage aos indivíduos que se deixam tomar pelas paixões, deixa-se tomar pela paixão do discurso, lançando-se a golpes poéticos, comparando as revoltas provinciais no Brasil imperial a uma "explosão" de vontades mal concertadas, mais perdidas e enfurecidas que "os átomos de Epicuro" soltos no espaço.
O velho ranzinza deixava-se tomar pelas mesmas paixões que pretendia controlar, e era pela soltura de sua imaginação que vinham à página seus melhores momentos como escritor. O problema é que Cairu nunca foi um bom escritor.
Guardadas as proporções (Vargas Llosa é um bom escritor), o Nobel deste ano tem também o seu dragão.
Sua ira, derramada contra Foucault, chegou a momentos ousados, como quando o espírito do filósofo francês foi lembrado em paralelo à degradação de seu corpo.

MASTURBAÇÃO
Foi com apreensão que ouvi Vargas Llosa evocar as excursões do filósofo pelos antros gay de San Francisco, para em seguida referir sua morte. Seria a AIDS, então, a justiça poética e maldita a recair sobre aquele que tragicamente negou a dissolução de sua vida moral?
Houve outros momentos de pasmo, como quando suas baterias se voltaram contra toda uma tradição do pensamento crítico no pós-68, até que dissesse que tal pensamento não produziu muitas vezes mais que uma inútil "masturbação" (sic).
Respeito os conservadores, especialmente aqueles que, como Vargas Llosa, têm a dignidade de sustentar publicamente sua voz.
Houve, contudo, pelo menos um grande equívoco em sua fala: ele não se poupou à já usada e cansada gracinha de que, diante de um texto de Jacques Derrida (1930-2004), pouco ou nada se entende. Mas não é verdade que ele nada tenha compreendido.
Ele compreendeu que o gesto de desconfiança em relação ao sentido, que está no coração da aventura desconstrucionista, é o mais perigoso de todos os gestos, porque comporta a aposta no desejo e na possibilidade mesma do desvio.
Mas desvio de quê? Da cultura? Estaríamos todos fugindo dela? Mas cultura de quem? Para quem? Vargas Llosa não crê que, transviados, cheguemos à cultura. Por isso, o seu é o discurso da retenção, da contenção e do recalque em relação aos poderes dissolventes do corpo ou do Corpo, em sua dimensão política.
Como no caso de outros conservadores, talvez o mais importante não seja o que ele propõe, mas sim aquilo de que foge.


PEDRO MEIRA MONTEIRO é professor de literatura brasileira em Princeton, autor de "Um Moralista nos Trópicos" (Boitempo)

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