quinta-feira, 30 de setembro de 2010

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Uma democracia sem adjetivos vai às urnas

Fonte: valoronline.com.br 30/09

"Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa." Esta é uma das mais repetidas afirmações do filósofo alemão Karl Marx, que abre "O 18 Brumário", talvez porque a realidade sempre se confronte com formas de farsas saudosas de tragédias.

O clima criado nestas eleições foi uma farsa inspirada na tragédia de 1964. Chegou-se ao grotesco. A guerra eleitoral ressuscitou de um passado que merece ser deixado para trás teses paranoicas de implantação de uma república sindicalista ou do comunismo totalitário, e acusou e pintou de tintas fortes supostos algozes da democracia. É uma situação irreal, pois o cenário dessa batalha é uma campanha eleitoral onde todas as instituições democráticas estão a postos e operantes: partidos legalmente constituídos apresentam seus candidatos aos eleitores e pedem seus votos; o acesso ao eleitor é democraticamente garantido por leis estáveis; uma Justiça que bate a cabeça, mas julga, mantém-se como poder independente; um governo eleito e reeleito pelo voto direto governa; o Congresso faz leis; a polícia investiga, criminosos vão para a cadeia. O país tem um presidente que, a despeito da alta popularidade, rejeitou artifícios constitucionais comuns no continente para concorrer a um terceiro mandato, afastando os exemplos de Hugo Chávez, da Venezuela, e Álvaro Uribe, da Colômbia. A oposição fala o que quer - e raras vezes na história falou tantos desaforos contra autoridades elevadas ao poder pelo voto popular. Aliás, não disse um centésimo deles a militares eleitos por Colégios Eleitorais, na ditadura militar.

Enfrentar a candidata de um presidente com 79,4% de aprovação, segundo o CNT/Sensus divulgado ontem, não é uma tarefa fácil, mas a disputa democrática em nenhum momento deve usar de qualquer meio para chegar a um fim. A mobilização de setores conservadores, a ida à caserna com discursos de "denúncia" de supostos atentados à democracia, o insuflamento do clima de Guerra Fria 20 anos depois da queda do Muro de Berlim, o terror à mobilidade social - tudo isso traz do passado o que o Brasil não gostaria de recriar para o seu futuro. Os velhos medos conservadores não cabem no novo mundo. Nem no Brasil de 2010. E são eles que estão sendo chamados às urnas, na impossibilidade de interlocução com setores que fogem ao controle da política tradicional.

Clima de Guerra Fria tirou os programas do debate eleitoral

Esse clima tirou do eleitor oportunidades preciosas. Como, por exemplo, a de ouvir do candidato do PSDB, José Serra, algum projeto coerente de Brasil para um eventual governo tucano. A campanha de Serra voltou ao período pré-governos FHC, onde as promessas surgiam do nada e visavam atingir um público sem discernimento. As campanhas eleitorais pós-Collor - que deram dois governos a Fernando Henrique Cardoso e dois a Luiz Inácio Lula da Silva - introduziram no linguajar de campanha a promessa responsável, que tinha que vir com a devida prova de que o Orçamento permitiria seu cumprimento. Serra vai asfaltar a Transamazônica, aumentar o salário mínimo para R$ 600 e dar 10% de aumento para os aposentados no ano que vem - e vai prometer o que mais vier à cabeça com o fim de suplantar o apelo popular de Dilma Rousseff (PT), a candidata que vem com o carimbo de Lula.

Dilma, por sua vez, ao se colocar na defensiva e grudar a sua imagem no governo de Lula, deixou de dizer muito. "Estamos no meio de uma guerra cambial internacional", constatou o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Os EUA e a China protagonizam a guerra. "Quando dois elefantes deste porte lutam, os espectadores podem ser pisoteados", alerta Martin Wolf, do Financial Times, no artigo "Guerras cambiais e demanda fraca", publicado no Valor de ontem. O eleitor vai para as urnas sem saber o que a candidata favorita da disputa fará para desarmar a armadilha cambial, como ela vê a política de juros de Lula e como conduziria a política monetária, antes que as patas dos elefantes repousem num país que vive o seu maior período de estabilidade, e gostaria de aproveitá-lo para vencer a desigualdade e a pobreza.

Do debate eleitoral, também escapou o que pensa Marina Silva (PV), que cresceu nos últimos dias de campanha e tende a se consolidar como uma nova e bem-vinda liderança no cenário nacional. Para não ser acusada de candidata de uma nota só, engrossou o seu programa com vários outros temas, mas sem conseguir vencer a contradição de ser uma candidata que veio da esquerda e se encontrou no centro com outras pessoas - pessoas de bem, que se diga. Um programa bem intencionado não revela, todavia, uma proposta que transcenda a ideia central da sustentabilidade.

Vamos para as urnas no domingo. Faltou informação relevante para a decisão do voto, sobraram boatos e vitupérios. Ainda assim, vamos votar num país governado por um presidente eleito pelo voto popular, com um Congresso funcionando e uma Justiça atuante. Nosso voto será direto e secreto. Os eleitos serão empossados. Os derrotados à Presidência farão oposição; os vencedores serão legítimos governantes. Assim é a democracia. Que o bom senso dos atores políticos não a levem de novo para dentro dos quartéis. Deixem o país fora disso. O voto direto e secreto tem que ser capaz de resolver as diferenças políticas entre os brasileiros.

Maria Inês Nassif é repórter especial de Política.

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Morre Arthur Penn, diretor de "Uma Rajada de Balas", aos 88

Fonte: folha.uol.com.br 30/09

Diretor levou Emmy e Tony por "O Milagre de Anna Sullivan"

Morreu anteontem à noite, um dia após completar 88 anos, o diretor norte-americano Arthur Penn, segundo informou seu empresário Evan Bell. O cineasta fez "Bonnie e Clyde - Uma Rajada de Balas" (67) e "Caçada Humana" (66), entre outros.
Nascido na Filadélfia, ele estava doente havia um ano, quando foi internado em Nova York com pneumonia. Ele teve complicações cardíacas, segundo sua filha.
Penn primeiro ficou famoso em 1957, com a montagem para a TV de "O Milagre de Anna Sullivan" para a série "Playhouse 90", que ganhou um Emmy de direção, roteiro e atriz (Teresa Wright).
Em 1959, ele reencenou o texto para a Broadway e levou o Tony de melhor diretor dramático, autor e atriz (Anne Bancroft).
Fez outra versão do texto de William Gibson para o cinema, que levou os Oscars de melhor atriz (de novo para Bancroft) e atriz coadjuvante (Patty Duke).
No cinema fez nove filmes em 25 anos. O primeiro deles foi "Um de Nós Morrerá", com Paul Newman, em 1958.
"O Pequeno Grande Homem", de 1970, trazia Dustin Hoffman no papel principal. Em seguida, trabalhou com Marlon Brando e Jack Nicholson no faroeste "Duelo de Gigantes" (1976). "Caçada Humana" trazia Brando ao lado de um jovem Robert Redford.
Mais foi com "Uma Rajada de Balas" que o levou ao grande público e o transformou em mestre para muitos cineastas. O diretor Paul Schrader disse que "ele pavimentou o caminho para uma geração de novos diretores".
O projeto inicial da história de amor entre dois ladrões de banco (vividos por Faye Dunaway e Warren Beatty) nem era de Penn.
Ele aceitou o convite após ser convencido por Beatty, que também era produtor do longa, a filmar o roteiro de dois novatos, Robert Benton e David Newman.
A lendária crítica Pauline Kael, em sua primeira resenha para a revista "New Yorker", o descreveu como "um filme americano excitante", apesar de ter criticado a performance de Dunaway. O filme foi indicado a dez Oscar, mas venceu apenas em fotografia e atriz coadjuvante (Estelle Parson).
Seu irmão mais velho, o também famoso fotógrafo Irving Penn, morreu em outubro do ano passado.
Deixa mulher, Peggy Maureen, e dois filhos.

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Escritor satiriza discurso de cientistas e de ambientalistas

Fonte: folha.uol.com.br 30/09

Ao construir personagem principal, McEwan quis retratar lado estúpido das pessoas muito inteligentes

Para autor, tragédia por aquecimento global é questão de tempo e Brasil pode ajudar a propor soluções

O protagonista de "Solar" é Michael Beard, um cientista cinquentão, premiado já há muito tempo por um trabalho relacionado a Einstein, quando o romance principia.
Pouco incomodado com o aquecimento global e a perspectiva de o mundo acabar, ainda assim ele integra uma comissão do governo britânico -gestão Tony Blair- dedicada a desenhar saídas para o momento crítico. Apesar de viver conquistando mulheres, o personagem é um fracassado do ponto de vista afetivo. Glutão e desleixado, vê sua quinta mulher traí-lo com um pedreiro, no melhor estilo "O Amante de Lady Chatterley".

Depois, será levado a ter uma filha à sua revelia. O que muda sua trajetória é um acontecimento inusitado. Um jovem aprendiz, que também estava tendo um caso com sua mulher, morre em um acidente em sua casa.

Beard não só faz com que a tragédia pareça um crime para incriminar o pedreiro, como rouba uma ideia do rapaz relacionada ao aproveitamento de energia solar por fotossíntese artificial.

A trama se estende até 2009, quando Beard se instala no Novo México, num empreendimento de uso da luz solar.


PROTAGONISTA
McEwan concorda com as semelhanças entre Beard e Henry Perowne, o protagonista de "Sábado", mas também vê diferenças.

"Perowne via o mundo desde o alto. Beard é fraco em suas emoções. De certo modo, representa a todos nós. Tem o grande atributo de ser muito inteligente e de agir de modo muito estúpido, como muita gente", explica.

O personagem de Beard é patético até comover e a narrativa anda pontuada de cenas engraçadas. Como a que relata como o pênis do personagem quase congela quando ele tem de urinar na neve.

McEwan, ainda, satiriza todo o tempo os discursos dos cientistas e dos defensores do ambiente.


TRAGÉDIA
O escritor diz não ter dúvidas de que uma tragédia se avizinha como consequência do aquecimento global.

"Não mudaremos nada apenas por sermos bonzinhos. Para isso é preciso lidar com gente ruim e ambiciosa.

Comprar um carro menor não resolverá nada, apenas adiará o problema."

Apesar de ter críticas quanto ao modo como o governo britânico trata o tema, acha que o Reino Unido lidera as iniciativas na Europa.

"Mas todos contamos com o poder do Brasil, que está surgindo como nova potência mundial, para ajudar nessa questão", completa.

(SYLVIA COLOMBO)


SOLAR

AUTOR Ian McEwan
TRADUÇÃO Jorio Dauster
LANÇAMENTO Companhia das Letras
PREÇO R$ 48 (344 págs.)

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BNDES investe em cinema para classe C

Fonte: folha.uol.com.br 30/09

Operação de R$ 3,7 mi em Sulacap, no Rio, é nova ação do banco, principal financiador do cinema brasileiro

Inauguração de seis salas no complexo Cine 10 no final de semana é primeira fase do projeto Cinema Perto de Você

O Jardim Sulacap, no subúrbio do Rio de Janeiro, integrava, até hoje, a larga estatística dos sem-tela espalhados pelo Brasil. Habitado, sobretudo, por moradores de classe média e média baixa, o bairro nunca atraiu os donos de salas de cinema. O negócio, segundo os empresários, seria inviável.
Pois a partir deste final de semana seis salas funcionarão ali. O complexo Cine 10 é a primeira operação do programa Cinema Perto de Você a ser colocada de pé. É, também, mais uma das pontas da indústria do audiovisual brasileiro na qual o BNDES coloca recursos e carimba seu logo governamental.
Desde que criou o departamento de economia da cultura, em 2006, o banco injetou R$ 142,2 milhões na indústria audiovisual. Apenas no edital de produção de filmes, beneficiou, em 2009, 25 longas.

Somados os recursos distribuídos por concursos públicos -com utilização de incentivo fiscal- e a participação em fundos de investimento, o BNDES já ultrapassa a Petrobras, histórica financiadora do cinema nacional: foram, ao longo de 2009, R$ 31,3 milhões do banco contra R$ 26,6 milhões da petrolífera.


INDÚSTRIA
"Desde 2006, adotamos um enfoque econômico", diz Luciane Gorgulho, chefe do Departamento de Economia da Cultura. "Entendemos que, como banco de desenvolvimento, deveríamos ser mais do que meros patrocinadores. Queremos desenvolver os vários elos da cadeia produtiva."

Explica-se assim a chegada do BNDES ao novo circuito voltado à classe C. O banco entrou na operação, de R$ 3,7 milhões, com recursos próprios, concedendo empréstimos em condições favoráveis aos empresários e também como agente financeiro do Fundo Setorial do Audiovisual.

"Os planos de financiamento nos permitiram cobrar ingressos mais baixos", diz Adhemar Oliveira, um dos sócios. O ingresso mais barato será R$ 2 e o mais caro, na sala 3D, no sábado, R$ 18.

Também tem a ver com a tentativa de fazer a engrenagem da indústria rodar o apoio do BNDES ao Rio Market, a rodada de negócios que acontece dentro do Festival do Rio.

Foi durante o Rio Market que Manoel Rangel, presidente da Agência Nacional do Cinema (Ancine), divulgou, anteontem, os resultados do prêmio adicional de renda, destinado às produtoras que mais se destacaram nas bilheterias ou nos festivais de cinema.

"O BNDES entendeu que o segmento audiovisual tem, além do valor simbólico, um valor econômico", diz Rangel. Dos 15 longas premiados pelo bom desempenho -de acordo com um sistema de pontuação elaborado pela Ancine- oito tiveram algum tipo de recurso do BNDES.

"Nosso foco são filmes com potencial no mercado interno ou externo", diz Gorgulho. "Para isso, nos baseamos nos planos de negócio apresentados pelas empresas produtoras."

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