quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O fim do Café da Rua 8, em Brasília

Julinho Bittencourt

Em Brasília, em meados de setembro, fechou as suas portas de vez o Café da Rua 8. (...)

O nome é este por conta da sua localização. O dito ficava na quadra 408 norte, num daqueles endereços da capital que só quem passa uns tempos por lá entende como é.

Eva, a sua proprietária, é de São Vicente. Viveu, amou e morou na Baixada Santista, estudou no Ginásio Independência, que também já não existe mais e daí se mandou. Foi para o Planalto Central, se não falha a memória, na década de 70. Virou local. Como milhares de outros brasileiros, ela se apaixonou por Brasília. Mais do que isso, ajudou a fazer da cidade o que ela é hoje. Tatuou na pele o traço do Plano Piloto de Lúcio Costa – o que lhe rendeu as costas mais fotografadas do Distrito Federal – e abriu por lá uma catedral da música e da cultura.

Destes 50 e tantos anos de existência da capital, quase 30 contaram com o Café da Rua 8. A cidade quase não sabe ser o que é sem ele. O local sempre foi o ponto preferido dos artistas, poetas, pintores e, sobretudo, músicos de Brasília. Foi o quartel general do lendário grupo Liga Tripa, uma trupe de rua que, com seus instrumentos e cantores, corriam (e correm ainda) as superquadras residenciais e comerciais a cantar canções inesquecíveis entre as mesas e cadeiras, sem equipamento nenhum.

Uma dessas canções, a “Travessia do Eixão”, de Nonato Veras e Nicolas Behr, foi gravada pelo também saudoso Legião Urbana. Outra, a “Juriti” (Meu coração tem um desejo imenso de ver o dia nascer pelo avesso), de Aldo Justo e Paulo Tovar, é uma espécie de hino daquela Brasília que nunca aparece nos postais. No triste dia da morte de Tovar, o Café parou para homenageá-lo. Amigos vários, naquela noite, choraram versos em uníssono, quase prevendo uma época de bambas que se esvaia.

E sempre foi assim, de dias comuns e datas extraordinárias que foi feito o dia a dia do Café. Em algumas noites com poucos amigos, uma mesa aqui e outra ali, a conversa ao pé do ouvido e em outras memoráveis, explodindo de gente. Como nos vários lançamentos do samba do bloco pacotão; na apresentação do enredo da Escola de Samba Unidos da Asa Norte; na semana do sete de setembro, quando era fechada a rua com a memorável festa Salve a Pátria; na comemoração dos 50 anos da revolução cubana – quando Eva vestiu a sua casa com as cores de Ogum e São Jorge – enfim, como tantas e tantas outras.

Muitas das pessoas que conhecem a capital de passagem cometem a injustiça da estranheza, a repulsa ao concreto e à frieza. Brasília, de fato, não é dessas que se entrega num primeiro encontro. É preciso cortejá-la, explorá-la com cuidado e carinho. Só assim, depois de muitas flores e jantares nos é permitida a paixão, a sem razão de suas esquinas, os seus segredos.

E um desses segredos mais encantadores sempre foi o Café da Rua 8. Ele próprio, para surpresa dos incautos, situado numa das inúmeras quase esquinas do Plano Piloto. Ele próprio, um desses lugares que humaniza e nos predispõe à cidade. Lá nos foi dado conhecer um tanto da história e da glória que se transformou no sonho mais inusitado de Dom Bosco. Nele, onde os deputados viram gente e aonde, certa noite, vimos um ministro cantar um samba, aprendemos que grande cidade é esta outra Brasília.

E é um pouco desta outra cidade, alegre e efusiva, comovida, criativa e um tanto barulhenta que hoje fecha as suas portas. Deixa de existir por conta da outra, aquela que gosta do silêncio e age em silêncio.

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Literatura >>>> Nova estreia

Miguel Jorge lança hoje a tradução em italiano de seu romance Veias e Vinhos. É a primeira da carreira do autor O popular / GO 28.09

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Miguel Jorge é um escritor conhecido e reconhecido por sua vasta obra em diversos gêneros, como romances, contos, poesia, teatro e até infanto-juvenil. Com muitos anos de carreira, o autor vive hoje à noite uma emoção ainda inédita em sua carreira. Ao lado do professor italiano Salvatore Solimeno, ele autografa a primeira edição de um livro seu em outro idioma, às 20 horas, no Restaurante Da Giovanni, no Setor Marista. O título escolhido é um dos de maior destaque que já escreveu, o romance Veias e Vinhos , que reconta o massacre da família Matteucci em Goiânia, no final de 1957.

"É uma surpresa e uma emoção", afirma Miguel. "Eu não imaginava que havia tanta gente na Itália interessada em minha literatura", comemora. O tradutor do livro, que em italiano ficou com o título Vino e Sangue , fez questão de vir a Goiânia participar do evento.

Miguel e Salvatore começaram a conversar sobre o trabalho há pouco tempo. "Ele me informou que estava trabalhando na tradução e me pediu ajuda em alguns trechos, principalmente quando a linguagem se apoia em gírias", relata o escritor. Desse contato, surgiram outros. Miguel ficou sabendo que há mais professores na Itália interessados em sua produção literária e novas traduções para o idioma de Dante não estão descartadas.

Vínculos que ficarão ainda mais fortes. Em outubro Miguel embarca para a Itália onde lançará Vino e Sangue em Roma, Nápoles, Milão e Padova, esta última a cidade da editora Casa dei Libri, selo pelo qual a tradução está saindo. Miguel diz que Veias e Vinhos ganhou outra tradução, esta em inglês, há cerca de dez anos, mas que o projeto de publicá-la teve de ser adiado. "Está na gaveta este tempo todo."

O escritor acredita que a forma como elaborou o enredo facilitou a tradução. "Mesmo falando de um assunto tão triste e pesado, como a chacina de uma família, acho que consegui fazer isso com delicadeza. Na tradução, Salvatore deu ênfase a um personagem que traz essa mensagem consigo. É um livro que me custou muito escrever mas que considero, antes de tudo, bonito."

A história pesada a que se refere o autor é o assassinato, a sangue frio, com golpes de machado e pauladas, do casal Wanderley e Lourdes Matteucci e de quatro de seus cinco filhos, tendo o mais velho apenas 6 anos e sendo a caçula um bebê de berço com 8 meses de idade. Apenas uma das filhas, que então tinha 2 anos, conseguiu escapar porque se escondeu debaixo da cama. O caso ficou conhecido como o Crime da Rua 74 e a história foi adaptada para o cinema num filme de João Bastista de Andrade.

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Felicidade de Nicolas

O poeta Nicolas Behr (foto) foi um dos que viajaram no documentário de Vladimir Carvalho. Feliz com o que viu, agarrou-se à imagem de Renato Russo e declarou: "Túnel do tempo, volta ao tempo, páginas de um livro bom. Esse filme mostra um pouco do milagre que os 20 anos fazem. Vejo a maravilha que é ser jovem. Isso tudo é uma outra Brasília. Foi a primeira revolução, a primeira geração que assumiu Brasília. É história e vai ficar registrado na história da capital". CorreioBsB 28.09

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Virou hype

O rock’n’roll oitentista está em alta. Primeiro foi o filme Rock Brasília — Era de ouro, que abriu o Festival de Cinema deste ano — e agora é o anúncio da apresentação de Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá no segundo fim de semana do Rock in Rio, dia 29. Os ex-Legião Urbana vão tocar com 60 músicos da Orquestra Sinfônica Brasileira, com regência de Roberto Minczuck. CorreioBsB 28.09

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Assombros do cotidiano. Exibido em Cannes, Trabalhar cansa mistura drama social e história de mistério, na segunda noite da mostra competitiva no Cine Brasília CorreioBsB 28.09

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Um gene híbrido foi inserido no DNA de Trabalhar cansa, longa-metragem de ficção da segunda noite da mostra competitiva do 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. O primeiro filme de longa duração assinado pela dupla paulistana Marco Dutra e Juliana Rojas comporta-se como um mutante. Trafega do realismo ao fantástico. Inclui trama de fundo social, sem apresentar qualquer sintoma de crise de identidade. “É da natureza deste filme não se enquadrar numa categoria de gênero. É um drama social, com relações de família e uma história de mistério. Tudo isso articulado com o mesmo peso. É um filme que funciona se você não tem nenhuma expectativa sobre o que vai ver. Por isso, pode ser uma jornada prazerosa. Mas, claro, envolve risco”, comenta Juliana.

Na trama, o cotidiano de um casal paulistano de classe média é afetado por elementos reais e outros que habitam a imaginação (a da plateia inclusive). O marido, Otávio (Marat Descartes), é demitido após anos de trabalho numa mesma empresa. O sustento da casa passa a ser responsabilidade da esposa, Helena (Helena Albergaria), inserida no mercado de trabalho ao se transformar em dona de um mercadinho na região central de São Paulo. Inicia-se aí um processo de transformação dos personagens.

A culpa dessa curva, segundo os diretores, pode ser explicada na herança cinematográfica brasileira. “Ao mesmo tempo em que admiramos Joaquim Pedro de Andrade e vários diretores do cinema novo, gostamos de José Mojica Marins e Walter Hugo Cury. Eles são diretores consolidados historicamente e entraram no universo do fantástico. Não são artistas que desapareceram na história. Existe uma tradição no cinema brasileiro que talvez não seja muito reconhecida. A gente gosta dessa linhagem”, afirma Dutra.

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O hibridismo brasileiro de Trabalhar cansa desfilou pelo tapete vermelho da mostra Um Certo Olhar no último Festival de Cannes. O frenesi da Croisette não é exatamente novo para a dupla de diretores. Eles participaram em edições anteriores com os curtas-metragens O lençol branco e O ramo. “Deu para perceber que o filme não é hermético. Ele estabelece comunicação com a plateia”, analisa a diretora sobre a sessão estrangeira.

Sessão de casa

Na casa dos 30 anos, Marco e Juliana fazem parte da geração de realizadores brasileiros formados pela chamada “cinefilia de apartamento”. Além dos estudos formais nos bancos da ECA — a Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP), onde começaram a produzir juntos o curta-metragem Notívago —, eles acompanham pela internet cinematografias de outros países, antes inacessíveis no Brasil. E não negam a influência dessa miscelânea no que produzem. “Não trabalhamos com referência direta. Apreciamos vários tipos de filme e somos contaminados por elementos muito diversos. Na verdade, o que sempre manda é a história. Temos um prazer até meio lúdico para contar histórias”, reflete Juliana.

Assim como os cariocas Marina Meliande e Felipe Bragança, que participaram do Festival de Brasília de 2010 com o filme de super-heróis A alegria (o segundo da trilogia Coração no fogo), os paulistanos gostam da narrativa do tailandês Apichatpong Weerasethakul consagrado com a Palma de Ouro em Cannes por Tio Boonmee que pode recordar vidas passadas. As duas duplas se arriscam num tipo de cinema incômodo e autoral, sem negar influências mainstream e filmes de Sessão da tarde dos anos 1980 e 1990.

TRAJETÓRIA DO FILME 3 Finalista do prêmio Sundance/NHK 3 Mostra Un Certain Regard, Festival de Cannes 2011 3 Melhor som no 4º Paulínia Festival de Cinema

Crítica // Trabalhar cansa ****

O mal dentro de nós

O casal de classe média de São Paulo protagonista de Trabalhar cansa poderia residir no apartamento do andar de baixo. Mesmo assim, os vizinhos não desconfiariam das mudanças operadas na vida de Helena e Otávio depois que ele foi demitido da empresa onde trabalhava havia 10 anos. Quando ela entra no mercado de trabalho, ao adquirir um mercadinho na zona central da cidade, a inversão de papéis é suavemente incômoda. Enquanto o mal-estar de ex-provedor atormenta Otávio, a doce Helena demonstra perturbação ante o mistério que se materializa numa infiltração inexplicável nas paredes do imóvel alugado.

O mal que invade lentamente a tubulação do prédio se aloja no interior dos personagens e revela abismos antes mantidos em segredo. Embrutece o casal de conduta insuspeita. Na condução da dupla de diretores, a sutileza do discurso é uma aliada para contar uma história sobre mistério. O título de gênero híbrido mistura elementos de um thriller sul-coreano com a bruteza daquele comercial de produto de limpeza estrelado por mulheres de gravata. Nunca perde as estribeiras durante a investigação da natureza humana refletida, aqui, em questões sociais bem brasileiras.

A dupla de diretores Juliana Rojas e Marco Dutra faz parte da nova geração de cineastas ligados umbilicalmente à política de filme de autor. Exemplos do vigor de realizadores como eles estão nos títulos da produtora cearense Alumbramento, na trilogia Coração no fogo, de Marina Meliande e Felipe Bragança, ou nas investigações formais dos documentários produzidos pela produtora mineira Teia.

No momento em que o insipiente circuito de cinema da cidade ignora os principais títulos realizados por diretores jovens, a única chance de conhecermos os lançamentos dessa geração é durante o Festival de Brasília. É uma pena que o público cinéfilo brasiliense tenha apenas os dias da mostra para conhecer as inquietações desta geração de cineastas promissores.

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Pena Capital "Se o brasileiro desvia dinheiro do Dnit ou da Valec rouba seus patrícios talqualmente o assaltante das calçadas e das residências. E mata, ainda que indiretamente, porque está desviando recursos que poderiam ser aplicados na saúde, salvando vidas em Brasília, nas Alagoas, em Santa Catarina." CorreioBsB 28.09

Tema quente

O assunto de hoje, de ontem e de amanhã é a ladroeira pública, a corrupção, uma forma de violência como outra qualquer. Se o brasileiro desvia dinheiro do Dnit ou da Valec rouba seus patrícios talqualmente o assaltante das calçadas e das residências. E mata, ainda que indiretamente, porque está desviando recursos que poderiam ser aplicados na saúde, salvando vidas em Brasília, nas Alagoas, em Santa Catarina.

Há quem diga que a corrupção sempre existiu, o que é meia verdade. Meu avô foi político. Menino, rapazola e adulto frequentei sua casa e sua mesa. Ai daquele que brincasse com o assunto malversação dos dinheiros públicos. Refiro-me às décadas de 1940, 1950 e 1960. De 1945 a 1964, tivemos imprensa livre: os escândalos não representaram 10% dos atuais.

Desde sempre o mundo conheceu grandes comandantes que lideravam suas tropas no saque, no roubo, na pilhagem. Portugal, nosso avozinho, não fez mais que imitar as potências do seu tempo. O Império de Portugal no Oriente foi um feio monumento de ignomínia, como aprendemos com Oliveira Martins, historiador português.

Que dizer de Martim Afonso de Souza, cuja mulher, dona Ana Pimentel, introduziu os primeiros gados no Brasil? Martim andou pela Índia e relatou por escrito os dinheiros e as jóias que roubou por lá. Texto transcrito por Oliveira Martins, que agora não consigo encontrar, porque seu livro, para variar, repousa em estante incerta e não sabida. Explico: a biblioteconomista que contratei terminou, anteontem, seu belo trabalho e ainda não aprendi a localizar, no computador, meus poucos livrinhos. E olhem que não chegam a três mil. Apiado-me das pessoas que têm 30 mil volumes em casa.

Corrupção sempre houve e sempre haverá, mas a impressão que tenho, e que é também a dos leitores do Correio Braziliense, é a de que, no momento, o negócio passou da conta. Que fazer? Não sei e acredito que o leitor não saiba.

Se a governabilidade implica administrar com a base aliada, tsunami de bandidagem, corja de malfeitores como raramente existiu desde que o mundo é mundo, o problema talvez esteja na democracia nhambiquara. Sim, porque existem outras democracias mais democráticas que a nossa. A alternativa universal seria a ditadura que ninguém deseja, a não ser...

Bem, a não ser que se descubra, por aqui, um cavalheiro aparentado com o doutor Lee Kwan Yew, de Cingapura, sucedido em 2004 por seu filho mais velho, o doutor Lee Sien Loong. Cidade-estado de 710,2 km2, República parlamentarista, por lá as coisas funcionam graças ao Lee pai. Traficante de drogas: mata. Sem essa de “suposto” traficante. Dia desses, em São Paulo, a polícia prendeu dois cavalheiros que transportavam, de carro, 80 quilos de cocaína. Nossa imprensa não se acanhou de dizer que os dois eram supostos traficantes.

Na foz do Rio Cingapura, se um cavalheiro resolve expressar sua arte pichando monumentos públicos, muros, paredes, qualquer coisa, leva 500 chibatadas em praça pública, independentemente de outras penas a que esteja sujeito. Donde se conclui que o mundo tem jeito. Aposto que o Dnit de Cingapura funciona.

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44º FESTIVAL DE BRASíLIA DO CINEMA BRASILEIRO »Rock in Brasília

Documentário de Vladimir Carvalho, atração principal da cerimônia de abertura, comove e entusiasma a plateia, com a presença de ídolos e anônimos da geração 1980 CorreioBsB 28.09

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Curtas de hoje

OVOS DE DINOSSAURO NA SALA DE ESTAR

De Rafael Urban, 12min, Paraná

Documentário sobre Ragnhild Borgomanero (foto). Aos 77 anos, ela procurou estudar fotografia digital para manter viva a memória do marido, Guido, com quem reuniu, ao longo da vida, a maior coleção particular de fósseis da América Latina.

PRA CASA DA VÓ NEYDE

De Caio Cavechini, 20min, São Paulo

Cavechini é jornalista do programa Profissão repórter. Assim como o programa da TV Globo toca em temas espinhosos, este documentário trata do vício em crack acompanhando o drama de uma família em que a internação de um dependente químico acontece de forma dolorosa.

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Dois dias depois de se apresentar para uma multidão de 100 mil pessoas no Rock in Rio, Fê Lemos parecia ter se despido da condição de astro de rock. No foyer do Teatro Nacional, o baterista do Capital Inicial não precisou se preocupar com o assédio de fãs enquanto esperava o início da sessão de Rock Brasília — Era de ouro, o filme de abertura do 44º Festival de Brasília. “No show do Rio, a sensação era de nervosismo mesmo”, explicou. “Aqui é diferente. A emoção é outra. O momento é de rever os amigos e os parentes, lembrar o que aconteceu na nossa juventude”, comparou. Diante de um público de cerca de 1,5 mil espectadores, sala lotada, Fê assumiu um papel diferente daquele a que está acostumado: virou personagem de cinema brasileiro.

A confusão entre o “elenco” do documentário de Vladimir Carvalho e a plateia do teatro se tornou inevitável. Numa noite restrita a convidados, os ilustres e os anônimos da “época dourada” do rock candango se emocionaram com um documentário sobre a trajetória das três bandas brasilienses mais populares dos anos 1980, que se destacaram no cenário nacional: Legião Urbana, Capital Inicial e Plebe Rude. Além de Fê, o irmão Flávio (também do Capital), e os também protagonistas Philippe Seabra e André X (ambos da Plebe) assistiram à projeção do longa-metragem, recebido com aplausos demorados — em dois momentos, foi ovacionado em cena aberta.

Vencedor do prêmio de melhor documentário no Festival de Paulínia de 2011, o filme de Vladimir Carvalho chegou à cidade poupado das pressões de uma estreia típica. Ainda assim, o clima era de apreensão até entre os que já haviam passado pela experiência de assistir ao filme numa sala escura e lotada. “Perto do teatro, no carro, já comecei a tremer um pouquinho. É mais tenso porque é Brasília”, admitiu Carmem Manfredini, irmã de Renato, que viu o filme há três meses, na mostra paulista. “O público daqui é sempre muito exigente. E as pessoas que vieram assistir ao filme viveram um pouco dessa história”, observou, quando já se formava uma longa fila de convidados na entrada da Sala Villa-Lobos.

“Tenho o privilégio de apresentar um filme que já foi premiado em Paulínia. Ele foi feito com afetividade, solidariedade. Estou convicto de que vai ser bem recebido em Brasília, porque essa história começou na sala de jantar de cada um desses roqueiros”, comentou Vladimir, de Conterrâneos velhos de guerra (1991) e O país de São Saruê (1971). O produtor Marcus Logocki também confiava na boa receptividade da plateia. “É algo muito especial exibir este filme na semana em que o Capital Inicial fez um show histórico no Rock in Rio, e pouco antes de uma grande homenagem à Legião Urbana também no Rock in Rio. E, recentemente, a Plebe Rude foi indicada ao Grammy Latino”, apontou, para ressaltar a vitalidade dos veteranos.

Antes da sessão, no entanto, o pulso seguro de Vladimir foi amolecido pela emoção. “Sinto meu coração aos pulos, embora não pareça. Sinto o mesmo frio na barriga que a nossa distinta Dilma Rousseff sentiu quando abriu a conferência da ONU”, afirmou, feliz com a chance de contar a história de uma “rapaziada fabulosa, exemplo de crença em um ideal juvenil”. “Essa geração só pode ser motivo de orgulho para Brasília. A cidade foi difamada, maltratada, sofreu as agruras dos poderosos”, comentou, sob aplausos. “No fundo, fiz (esse filme) para poder dizer, em alto e bom som: eu te amo, Brasília”, exclamou. Rock Brasília — Era de ouro está previsto para chegar às salas de cinema em 21 de outubro.

Reações adversas

Suscetíveis ao crivo do crítico público local, tradicionalmente participativo nos festivais de Brasília, os contornos políticos de discursos e observações no palco geraram reação. Um sinal de reprovação da plateia apareceu quando Vladimir Carvalho elogiou a “amiga dileta”, a ministra da Cultura, Ana de Hollanda, que estava presente: ela foi vaiada duas vezes. “Registrar a presença da ministra é motivo de regojizo. Ela é uma amiga que acompanhei à Angola, no início da carreira artística”, lembrou, sem a adesão dos convidados.

Mestre de cerimônias, o ator (filiado ao PT) José de Abreu imprimiu tom quase de palanque, em alguns momentos do evento, iniciado sob alguma pressão do público, com 50 minutos de atraso. O secretário de Cultura do DF, Hamilton Pereira, sob palmas moderadas, ouviu alguns méritos, ao microfone, como a marca de 624 produções inscritas para a competição e a projeção de 150 produções nacionais, ao longo dos oito dias de festejos de cinema.

Exaltando a sanção da Lei nº 12.485 (“um novo marco legal que dinamiza o setor”), José de Abreu puxou as palmas para a medida que dá maior atuação às produtoras brasileiras independentes e estabelece cotas, “em espaço qualificado”, de produtos nacionais a serem respeitados pelos canais de tevê a cabo. “Uma ação que amplia o mercado visual brasileiro só merece palmas”, bradou. Incógnito, o governador Agnelo Queiroz também participou da cerimônia. “O que temos percebido é uma confusão entre o histórico do festival mais politizado do país com vitrine partidária. Estamos tentando vivenciar esta edição do festival para saber como nos posicionar”, acredita o presidente da Associação Brasiliense de Cinema e Vídeo (ABCV), João Paulo Procópio.

Se comparadas as sessões de abertura das edições recentes do festival, a reação do público foi a mais calorosa desde 2006, quando foi exibido o documentário Oscar Niemeyer — A vida é um sopro. Na tela, além de exibir cenas raras da música de Brasília (como o show trágico da Legião Urbana no Mané Garrincha, em 1988), Vladimir reúne pais e filhos da geração de Renato. Briquet de Lemos, pai de Fê e Flávio, toma a palavra em alguns dos momentos mais emocionantes do longa. Dona Carminha, a mãe de Renato, também aparece em cena, tal como Sílvia Seabra, mãe de Philippe. Rock Brasília — Era de ouro será reprisado domingo, às 17h30, no Cine Brasília. O longa integra a mostra paralela Panorama Brasil e concorre ao troféu Câmara Legislativa.

Animações

MOBY DICK

De Alessandro Corrêa, 8min, São Paulo Só Deus sabe o que pode acontecer em um encontro entre um pescador e uma baleia enorme em mar aberto. A narrativa minimalista do paulista Alessandro Corrêa imagina o encontro de forma surrealista em universos inimagináveis. Toca em temas amorosos e trata a solidão com delicadeza nesta narrativa muda.

2004

De Edgard Paiva, 5min48, Minas Gerais Sentado no ponto de ônibus todos os dias, no mesmo horário, um jovem ouve música pelo aparelho mp3 player enquanto faz desenhos dos transeuntes. Nada parece mudar na vida do desenhista até que um dia ele se apaixona pelo reflexo de uma bela mulher sentada ao seu lado. O desafio é tentar registrar a imagem desta bela mulher.

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44º FESTIVAL DE BRASíLIA DO CINEMA BRASILEIRO » Cinema sem preconceito

O diretor de Filmefobia, vencedor do Festival de Brasília em 2008, fala sobre a relação entre filmes comerciais e autorais e destaca a importância dos festivais para os independentes CorreioBsB 28.09

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Conversa com cineasta - Kiko Goifman

O novo filme de Kiko Goifman, Olhe pra mim de novo, dirigido com a mulher dele, Claudia Priscilla, não compete no 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Em agosto, concorreu em Gramado, e, na primeira quinzena de outubro, disputa prêmios no Festival do Rio, na categoria de longas documentários. Por isso, ele prefere não tomar partido nas discussões sobre as mudanças do festival daqui — do qual recebeu cinco prêmios em 2008, pelo seu único longa de ficção, Filmefobia —, mas vê com otimismo a queda do ineditismo e a entrada de filmes digitais na mostra competitiva. Na conversa com o Correio, Goifman também detalha a importância dos festivais (nacionais e internacionais) para a produção alternativa e discute o crescimento do circuito comercial.

No contexto atual do cinema brasileiro, em que filmes comerciais começam a encontrar um público cada vez maior, qual é a importância de um festival?

De vez em quando, aparece um filme que faz R$ 1 milhão. Mas também, quase semanalmente, filmes pretensamente comerciais vêm sendo lançados e não cumprem essa expectativa. O cinema comercial está no meio de um caminho. Por outro lado, para o filme mais experimental, radical, autoral — esses rótulos são sempre ruins —, que tem mais a ver com meu tipo de filme, os festivais são espaços fundamentais. Começo a ver um certo interesse por iniciativas de novas distribuidoras ou mesmo de pessoas que começam a achar que esse tipo de cinema, que a princípio não é pensado em mercado como fim útil, pode ter um público. É muito importante essas iniciativas estarem atreladas aos festivais, que são lugares de visibilidade, não só no Brasil, como no mundo. A história já nos mostrou, até os Estados Unidos, o quão importante é você se representar nas suas telas. E a gente vive um momento difícil. Você entra com um filme de 300 cópias num parque que não tem nem 3 mil salas, você está falando de 10%, às vezes 20%, 30% das salas. Querendo ou não, meu tipo de cinema é impactado, sim, pelo Capitão América.

Você acha que o nosso circuito de festivais pode ter o poder de pautar o comércio?

Pautar, não. Os grandes lançamentos acontecem até à revelia dos festivais. Em produções grandes, inclusive, existe a opção de não participar de um festival para não perder. Cabeça de júri, a gente nunca sabe… Muitas vezes, os lançamentos mais comerciais acabam tomando as bordas dos festivais: filme de abertura, de encerramento, para não correr o risco de uma derrota. E você não tem controle nenhum, porque é a organização do festival que define o júri, talvez um júri com olhar menos favorável ao cinema comercial. Eles vão ter que encarar coletiva de imprensa, às vezes uma coletiva agressiva. Como estratégia, eu até entendo.

E os festivais têm cumprido o papel de dar espaço para os independentes e autorais?

Acho que, como esforço, sim. É difícil também generalizar e falar de todos. Vejo um esforço de curadoria, pelo menos de tentar não fixar em certos estilos, porque um filme independente nem sempre vai ser bom. Percebo um certo desejo de ecletismo. O júri é formado por pessoas que têm uma visão diferenciada de cinema. E não acho que o festival tenha que ter uma vocação interna, que seja sempre a Meca do experimental. Essa questão varia de acordo com o que está sendo produzido. Um ano vai ser mais instigante, o outro menos. Esse imponderável tem que existir. É diferente quando você pensa nos festivais europeus. Se você tirar Cannes, Veneza e Berlim, a qualidade também varia em função de safras. São os festivais que os diretores querem muito.

O cinema comercial brasileiro, como você disse, talvez ainda esteja trilhando um caminho. E parte dele passa por gêneros, como a comédia e o policial. Acha que esses estilos podem ficar saturados?

Mesmo se você for pensar em termos de cinema de gênero e público, é engraçado como existem certos preconceitos. Por exemplo: terror é um gênero que não se filma no Brasil. E é um gênero que atrai um público jovem. Você tem uma produção interessante de terror no curta-metragem, que, pela característica dele, não é pensado em primeiro plano dentro do mercado comercial. Temos bons diretores, e em todas as linhas: do trash ao muito bem acabado. A princípio, todo cinema pode ter seu público. Vai depender do olhar, da forma de você divulgar o filme, de estar atento ao circuito, de investir dinheiro em publicidade. Um exemplo ótimo é a Lume Distribuidora, do Frederico (Machado), de São Luís (MA), que é de DVDs, mas está começando a colocar filmes em cartaz. E ele traz filmes — é mais uma expressão difícil — de arte, experimentais. Está conseguindo, e vê isso como negócio.

Sempre se falou de uma influência televisiva e publicitária no cinema comercial. Já temos condições de superar essas referências?

A engenharia do cinema é complexa. Se não fosse, todos os estúdios estariam ricos e não fariam fiascos. E, mesmo filmes que partem desse princípio, que pegam ator da tevê, usam modo de filmar muito próximo da estética da tevê, às vezes não dão certo. Não sei se consigo entender tanto da indústria para dizer que esse formato televisivo será superado. O publicitário também, acho um pouco mais difícil. (Fernando) Meirelles, hoje em dia: parece ingênuo colocá-lo como cineasta-publicitário. Não sou dessa turma que faz um cinema experimental e que considera a publicidade uma doença que não tem cura. Esses paradigmas também devem começar a mudar com uma certa mudança na tecnologia da área.

Como?

Se você tem equipamento mais barato, como já temos hoje em dia a possibilidade de projeção sem passar pelos 35mm, vem uma moçada aí para experimentar que, muitas vezes, terá sido formada em escola de cinema e que, eventualmente, pode, sim, produzir um filme que seja interessante. O nó que eu acho mais difícil é o de como chegar ao público sem ter a parceria concreta de uma grande emissora de televisão. Ela se autoalimenta. Diretores e atores do filme, como fazem parte da emissora, aparecem nos programas jornalísticos. No meu caso, sou chamado para programas de tevê pelo tema e não pelo meu filme. As pessoas querem que eu vá falar de fobia. Querem que eu vá falar de adoção. E não do Filmefobia (risos). Ou não do 33. A gente acaba tendo um espaço marginal que também cresce. Canal Brasil e canais a cabo que precisam de programação acabam chamando a gente. Mas é um resíduo. É um país muito televisivo.

Muitos dos filmes que chegam ao circuito brasileiro de festivais geralmente estreiam em mostras nacionais e internacionais. Qual é a importância dessas mostras para os filmes com esse perfil?

Fundamental. Já aconteceu comigo, de estar fora, queria ver um filme, voltar e ele já ter saído de cartaz; entrou com cópia única e ficou duas semanas. Como você vai ver o filme? Acho mostras temáticas importantíssimas, de diretores, de cinema brasileiro e estrangeiro. Até porque, nas mostras, você tem uma visão diferente por causa dos outros títulos que estão em contato. Você começa a perceber que o filme tem relação com o filme “x” do David Lynch, por exemplo. Os centros culturais devem se dedicar a isso. A mostra tem público, tem uma chegada legal com estudantes e também pessoas que não veriam esses filmes. Às vezes, o ingresso é barato ou gratuito. Meu primeiro longa, 33, está vivo. Volta e meia, está em alguma mostra, seja sobre cinema em primeira pessoa ou cinema noir. A mostra dá uma longevidade para os filmes.

Qual é a sua avaliação das mudanças aplicadas à atual edição do Festival de Brasília?

Já chegaram pessoas para mim, principalmente em Gramado, com um recorte muito crítico a essa nova postura do festival, querendo pegar aspas para a gente entrar destruindo. Não quero só estar numa coisa dessas. Dentro do festival, acho que há mudanças saudáveis. Sou favorável que não tenha obrigatoriedade de 35mm. A questão do ineditismo virou uma grande polêmica. Os jornalistas estão a fim de filmes inéditos. Para a gente, que é realizador, é muito bom: meu filme estava em Gramado e agora está no Rio, e tudo bem. O ineditismo está mais relacionado a uma questão de pauta de vocês da imprensa. Para o espectador e para o diretor, o ineditismo não é muito legal. O desejo pelo inédito é uma questão internacional. Você pensa muito em qual festival vai tentar antes, e depois passar em outro país. Sei que teve um aumento grande no valor do prêmio principal. Não sei se é bom ou ruim. Não é segredo para ninguém que a grana é importante para Paulínia, além do fato de ela ter virado um polo cinematográfico. Então, as pessoas querem participar porque filmaram lá ou porque querem filmar lá. Na hora que o seu filme está pronto, normalmente você está devendo. Prêmio é sempre bem-vindo (risos).

O mercado internacional se tornou uma meta cada vez mais frequente entre os filmes de baixo orçamento. Seria uma reação ao domínio do circuito brasileiro por fitas comerciais?

Não acho que seja uma reação. É uma estratégia normal. Alguns festivais de fora querem a première mundial. Isso chama a imprensa. Você passa num festival grande. Se a sessão for bem cheia, bombada, vai ter debate, você pode estar associado a novos projetos, coproduções. É aquela fala do Nelson Rodrigues, o “complexo de vira-lata”. Às vezes, o filme nem vai tão bem em determinado festival, mas o fato de passar lá também cria uma possibilidade. Os festivais daqui também ficam ávidos em pegar. Eu estou no meu quarto longa. Este foi o primeiro que lancei antes em festival brasileiro. Filmefobia e 33 foram em Locarno; Atos dos homens, em Berlim. Esse novo, tive desejo de passar logo no Brasil, porque queria a presença do personagem (Sílvio Lúcio, um transexual masculino, em Pacatuba, no Ceará). Nossa opção foi até mais sentimental.

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LANÇAMENTO. Joca Reiners Terron autografa novo livro

O escritor Joca Reiners Terron lança hoje o seu novo livro, "Não Há Nada Lá" (Companhia das Letras; R$ 24; 160 págs.). O evento acontece na Livraria da Vila (r. Fradique Coutinho, 915, tel. 0/xx/11/3814-5811), na Vila Madalena, às 19h. Haverá um bate-papo entre o autor e seu editor, André Conti. FolhaSP 28.09

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João Ubaldo é personagem recorrente na biografia. Amigo de Glauber, escritor foi valiosa fonte de informação para a pesquisa. Também citado no livro, Caetano teve romance com irmã do cineasta e testemunhou acessos de ciúmes dele FolhaSP 28.09

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Amigo de Glauber Rocha desde a adolescência, quando estudaram no Colégio Central, em Salvador, o escritor João Ubaldo Ribeiro, 70, é figura fácil nas páginas de "A Primavera do Dragão".

Ubaldo se encantaria por Helena Ignez, que não lhe deu bola e se tornou a primeira mulher de Glauber. Cursaram a mesma faculdade de direito, época em que tramaram o fuzilamento do então governador Juracy Magalhães. Ubaldo, à revelia, foi escalado como atirador -o plano, claro, não vingou.

Editaram a revista do centro acadêmico, trabalharam no "Jornal da Bahia" (Glauber como repórter policial). Um dos poucos nominados nos agradecimentos ao fim do livro ("pela generosidade e paciência", assim como Cacá Diegues e Nelson Pereira dos Santos), o autor de "Viva o Povo Brasileiro" foi mais do que uma valiosa fonte de informação para Motta.

Segundo o autor, Ubaldo contou seus causos com Glauber "imitando à perfeição a sua voz e o seu jeito de falar". Uma vantagem adicional: "Como ele é escritor profissional, me dava as respostas já editadas. A água já vem engarrafada da fonte dele". Consultado pela Folha, Ubaldo disse que leu "grande parte do livro do Nelsinho" e acha que ele "se saiu bem".

"Basicamente é aquilo mesmo, com talvez um detalhezinho ou outro, sem importância, diferente do que eu lembrava", contou. "Glauber foi um dos grandes e mais importantes amigos de minha vida -e eu estava em Portugal quando ele se despediu. Fomos ligados até o fim", disse o escritor.

Entre tantas, outra personalidade atual que aparece no livro é Caetano Veloso. Desde jovem, o músico admirava Glauber, mas, pelo relato do livro, o cineasta "apenas estendia sua mão mole, e não o reconhecia". Até que Caetano teve um caso com uma irmã de Glauber, Necy, e conheceu a porção ciumenta do diretor quando ele flagrou o casal enquanto o marido dela viajava (leia trecho nesta página).

O machismo de Glauber, aliás, é um raro traço negativo de sua personalidade a despontar no livro. "Ali tem tudo de melhor e de pior que consegui saber sobre ele, e não tem julgamento. Glauber era mesmo contraditório: um anarquista, mas um primitivo com as mulheres, possessivo", afirma Motta.

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Sem poder para editar normas, CNJ corre risco de se transformar em 'enfeite' FolhaSP 28.09

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A briga é antiga. Ao ser criado, em 2004, O CNJ foi apontado como inconstitucional pela Associação dos Magistrados Brasileiros. Na época, o Supremo rejeitou a alegação e um dos argumentos destacava a "notória deficiência orgânica" de fiscalizar o cumprimento dos deveres funcionais dos juízes.

Recentemente, o conselho editou resolução para uniformizar o processo disciplinar dos magistrados, medida também questionada no STF. A AMB afirma que o CNJ teria extrapolado suas funções.

A reforma que criou o conselho envolveu grande debate e pretendeu reforçar a ligação do Judiciário com os princípios da legalidade, eficiência, publicidade, impessoalidade e moralidade.

No plano da eficiência, o CNJ se notabilizou por estabelecer ações de planejamento e coordenação, como as metas de produção de sentenças e os mutirões carcerários, além de desenvolver medidas inovadoras que trouxessem celeridade à Justiça.

No plano da publicidade, criou ferramentas fundamentais para o acompanhamento do Judiciário, como o Portal da Transparência (com detalhamento das receitas e despesas dos tribunais), o Portal Justiça em Números (com dados como número de processos, juízes e cidadãos atendidos) e o Portal Justiça Plena (que monitora processos de maior repercussão).

No plano da impessoalidade, foi o conselho que tornou viva a proibição do nepotismo. Por fim, no plano da moralidade, o CNJ tem combatido desvios dos magistrados.

Sem poder de editar normas concretas, que não sejam ocas de conteúdo, o CNJ se transformará em apenas um "enfeite". Por outro lado, deve fazê-lo observando a legalidade, sem criar novas formas de punição.

Um ponto, porém, é incontroverso: é preciso um "órgão de dimensão nacional e competências centralizadas" para "responder aos desafios da modernidade e às deficiências oriundas de visões e práticas fragmentárias na administração do Poder", como diz a decisão do Supremo de 2005 favorável ao conselho.

THIAGO BOTTINO é coordenador de graduação da FGV Direito-Rio

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Cine Belas Artes não poderá ser tombado. Dono é quem decide o que fazer com imóvel FolhaSP 28.09

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A Prefeitura de São Paulo decidiu que o Cine Belas Artes não será tombado.

Com a decisão, tomada ontem, nada impede agora que o espaço seja demolido ou transformado em uma loja.

O tombamento nem chegou a ir para votação e foi retirado definitivamente da pauta do Conpresp (órgão do patrimônio histórico), após ter sido considerado inconstitucional pela Procuradoria-Geral do Município.

Segundo a avaliação da procuradoria, o tombamento se limita à preservação das características arquitetônicas do imóvel.

Ainda de acordo com a procuradoria, caso se deseje preservar o uso, o instrumento indicado é a desapropriação, não o tombamento. A prefeitura já declarou que não tem interesse no local.

O cinema, que funcionava desde 1943 na esquina da avenida Paulista com a avenida Consolação (primeiro como cine Trianon), foi fechado em março deste ano após ter havido aumento no valor do aluguel do imóvel, o que teria tornado a atividade inviável.

André Sturm, que era o proprietário do cinema e hoje dirige o MIS (Museu da Imagem e do Som), lamentou a decisão.

"É a vitória da especulação, do que tem de pior no capitalismo contra a memória, a fantasia, a qualidade de vida", declarou.

Segundo ele, o Conpresp teve a chance de ter "feito história com uma compreensão contemporânea sobre preservação, que marcaria a história da cidade".

Beto Pereira, do MBA (Movimento pelo Cine Belas Artes), diz que se surpreendeu pela decisão ter ocorrido ontem, porque na pauta da reunião do Conpresp, publicada no "Diário Oficial" do município na semana passada, a análise do tombamento do cinema não foi citada.

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