segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

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POLÍTICA CULTURAL

A conquista de Praga

Fonte: correioweb.com.br 27/12

Quatro projetos de cenografia e figurino concebidos por alunos da Universidade de Brasília (UnB) são selecionados para a Quadrienal, na República Tcheca

Em uma encenação, a plateia acompanha o espetáculo às margens de uma via subterrânea e sombria, como se estivesse diante do leito de um rio. Em outro cenário, o público se acomoda dentro de uma enorme panela, sendo cozido como prato principal de uma refeição. Essas são algumas das ideias inusitadas presentes em quatro projetos de cenografia e figurino concebidos por alunos da Universidade de Brasília (UnB) e selecionados para um dos principais festivais de teatro do mundo, a Quadrienal de Praga, na República Tcheca.

No evento, que será realizado entre os dias 16 e 26 de junho de 2011, os projetos vão ser expostos, por meio de maquetes e ilustrações, em uma das seções competitivas, a Mostra das Escolas. O espaço vai abrigar trabalhos nas áreas de cenografia e figurino originários de centros educacionais de 62 países. Para o processo seletivo do Brasil, sete universidades e cinco escolas inscreveram 50 projetos, dos quais 30 conquistaram vaga na Quadrienal.

Um projeto da UnB, A terceira margem do rio, foi considerado o melhor pelo júri, enquanto outro da mesma instituição, Família à moda da casa, ficou em terceiro lugar. A segunda posição foi dada a Infinito particular, realizado por uma equipe da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Essas colocações não foram divulgadas oficialmente. Elas foram informadas ao Correio pelo professor da USP Fausto Viana, responsável por definir o corpo de jurados e integrante da curadoria da etapa nacional da mostra. No entanto, ele não quis revelar as demais colocações. “Isso só estimularia a competição boba”, justifica.

Foi Viana quem convidou para participar da seleção a orientadora dos trabalhos da UnB, a professora do departamento de artes cênicas Sonia Paiva. Ela buscou seguir a recomendação da organização da Quadrienal e conseguiu reunir grupos interdisciplinares, formados por 17 alunos de cinco cursos diferentes: artes cênicas, artes plásticas, arquitetura, desenho industrial e audiovisual. “Foi muito difícil juntar esse pessoal”, recorda. “A interdisciplinaridade é uma batalha cada vez maior na universidade. Cada departamento fica no seu buraco.”

A UnB foi a única instituição do DF que inscreveu projetos. A ida a Praga e, ademais, as boas colocações na disputa surpreenderam a equipe. “Acho que eles (da organização nacional) não esperavam que Brasília fosse se destacar tanto”, comemora Sonia. “O melhor de tudo é poder estar lá (na Quadrienal) vendo o que se produz atualmente em cenografia. E lá tem workshops e oficinas de tudo que é jeito. Vai ser uma oportunidade única”, complementa. “E se alimentar de todo esse caldo cultural, conversar com criadores do mundo todo”, acrescenta a aluna de artes plásticas Maria Eugênia Matricardi.

Paisagens mirabolantes
Na criação de projetos de cenografia e figurino, os universitários não precisavam escrever peças de teatro, mas construir cenas e situá-las em espaços não convencionais dentro do campus da UnB. Eles deveriam esquecer os modelos de palco tradicionais, como o italiano. Também foram orientados a escolher motivos locais. “Como é uma mostra competitiva internacional, Fausto (Viana) falou que trabalhássemos uma coisa nossa, dando preferência a temas regionais”, observa a estudante de artes cênicas Marcela Siqueira.

O já citado A terceira margem do rio, baseado no conto homônimo de Guimarães Rosa, inicia-se no térreo do Instituto Central de Ciências (ICC), o popular Minhocão, e avança por 275 metros do subsolo do mesmo prédio. O público teria que caminhar conforme o andamento do espetáculo. O rio da história seria simulado pelo vão de uma via de trânsito subterrânea. O projeto foi criado pelos estudantes de artes cênicas Hugo Cabral, de artes plásticas Julia Gonzales e de arquitetura Raquel Moraes.

O projeto Família à moda da casa, adaptado da peça homônima de Flávio Márcio, é situado no fosso do Teatro Helena Barcelos, do departamento de artes cênicas. A plateia ficaria acomodada em uma panela gigante, que se chega por um escorregador. A ação dos personagens se daria na parte de fora da panela e seria acompanhado pelos espectadores por meio de espelhos colados ao teto. O trabalho foi elaborado pelos estudantes de cênicas Marítissa Arantes, de desenho industrial Patrícia Meschick e de arquitetura Ana Luiza de Oliveira.

A entrada da ala norte do ICC, também conhecida como Ceubinho, foi o local escolhido para o projeto Carolina ou a vida das meras obscuras. Ele se baseou em poemas da goiana Cora Coralina e em sua biografia. O cenário começa simulando, por meio de uma vasta cortina, a fachada da Casa Velha da Ponte, onde Cora viveu grande parte da vida, na Cidade de Goiás. Em um espaço seguinte, o interior da residência é disposto com móveis coloniais. O grupo é composto pelos alunos de arquitetura Luiz Eduardo Sarmento, de artes plásticas Maria Eugênia Matricardi, de audiovisual Maria Vitória Canesin e de cênicas Rogério Luiz.

O projeto Simplicidade: o imaginário de um grande coração vermelho, também se baseia em poemas de Cora e é alojado em dois andares do Edifício Multiuso 2. O espaço, que deveria ser percorrido pelo público durante a encenação, foi definido por apresentar parentescos com a estrutura das casas da Cidade de Goiás. O prédio privilegia, por exemplo, a visão do espaço exterior por meio de vedações vazadas ou translúcidas, circulações abertas e varandas. Os mesmos recursos são utilizados no casario colonial daquela cidade. A equipe responsável pelo projeto é formada por Eric Costa, graduando de artes cênicas, Marcela Siqueira, do mesmo curso, Pedro Moura, de arquitetura, e Pedro Vianna, de plásticas.

O desenvolvimento dos projetos foi feito durante dois meses, em laboratório iniciado em setembro e ministrado pela professora Sonia. “Mostrei a metodologia de trabalho, mas cada um pirou do jeito que quis. Apenas vinham com perguntas e eu sugeria soluções”, explica. Ela pretende transformar o laboratório em um projeto de extensão permanente da universidade. “No Brasil inteiro, essas áreas (cenografia e figurino) são pouco desenvolvidas. Há poucas pessoas trabalhando com isso”, justifica. “Quero abrir as aulas para outros projetos da cidade e tentar melhorar o teatro de Brasília.”


EU, ESTUDANTES
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Usina de ideias

Entre os 30 projetos brasileiros selecionados para a Quadrienal de Praga, 20 foram criados por instituições do estado de São Paulo. Em seguida, vem o Distrito Federal, com os quatro trabalhos da UnB, Rio de Janeiro (dois), Rio Grande do Norte (dois), Pará (um) e Santa Catarina (um). Todos os trabalhos inscritos na seleção nacional foram expostos na USP no começo deste mês. Em 2011, antes de irem à República Tcheca, os selecionados vão ser novamente expostos em local ainda não determinado.

O numero de centros de ensino, 12, quase dobrou em relação à última seletiva, em 2007, quando havia sete dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Pará. “Demos um salto qualitativo muito grande, foi um resultado surpreendente”, elogia Fausto Viana, membro da curadoria. Segundo ele, a ideia é que a seletiva seja um processo pedagógico, mais que competitivo. “Em todo o país, os professores de cenografia são um grupo muito pequeno. Temos que estimular em nossos alunos a colaboração, não a competição.”

A participação na Quadrienal reforça o currículo dos alunos. “Ter sido selecionado para uma mostra internacional faz com que você seja visto e comentado por muita gente. Além disso, é uma chance de o próprio aluno ver o nível de escolas do mundo todo e aprender com isso”, avalia Viana

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POLÍTICA CULTURAL

A conquista de Praga

Fonte: correioweb.com.br 27/12

Quatro projetos de cenografia e figurino concebidos por alunos da Universidade de Brasília (UnB) são selecionados para a Quadrienal, na República Tcheca

Carroça encantada de histórias

Fonte: correioweb.com.br 27/12

Professora de Olhos D'Água (GO) cria projeto visando atrair as crianças para a leitura, cantando pelas ruas em cima de um carro puxado por uma égua

“Tombei, tombei, tombei, tombá. A história já vai começar”, anuncia a professora Nilva Belo pelas ruas de Olhos D’Água (GO). Com livros gigantes, uma égua cheia de laços e uma carroça toda enfeitada, a professora canta o hino para atrair as crianças da região. Ao ouvir a música e o trote do cavalo, crianças vão aparecendo nas janelas e saindo de suas casas para acompanhar a “mulher da carroça”, como eles a chamam. O som do pandeiro e o apito avisam que vem história por aí. Nilva conta que, quando está à paisana e passa pelas ruas, as crianças cochicham umas para as outras se ela seria a mulher da carroça. “Eles se perguntam: ‘É ela?, ’ e começam a cantar o hino da leiturégua e eu respondo ‘a história já vai começar’”, orgulha-se .

Nascida em Olhos D’Água — cidade conhecida por sua Feira do Troca— , distrito de Alexânia, Goiás, Nilva Belo é funcionária da prefeitura e sentiu a carência de leitura nas crianças da cidade. Arregaçou as mangas e propôs a criação de um novo cargo: contadora de histórias. Mas só contar histórias seria muito vago para a determinada professora. Aos 34 anos, mãe de duas filhas e familiarizada com ritos culturais, Nilva teve a ideia de criar a carroça literária, a Leiturégua.

“Eu comecei sendo agente da mala do livro, era muito bom, mas senti que faltava algo”, conta. Segundo ela, é muito mais atraente as crianças aprenderem se divertindo do que aprenderem por obrigação. Este ano, o projeto completa oficialmente dois anos.

Galeria de clássicos
Com o apoio da Secretaria de Cultura de Alexânia, a carroceira conta com o acervo de 10 personagens e muitos livros confeccionados, entre eles, os clássicos Branca de Neve, Cinderela e A Bela Adormecida. “Ela cria os personagens e a gente dá o apoio material”, conta o secretário de Cultura, Demerval Alves. Em relação à quantidade de personagens, Demerval brinca: “Só o Chico Anysio ganha dela”.

A professora pesquisa, concebe e cria fantasias, livros e personagens. O sucesso da carroça literária é tão grande que a égua de Nilva muitas vezes não suporta o ritmo acelerado. Dessa necessidade surgiu então a ideia de criar uma minicarroça. A miniatura reproduz a original e pode ser carregada no carro para possíveis apresentações em lugares distantes . “Às vezes, tenho espetáculos em Alexânia e Olhos D’Água no mesmo dia. Com esse ritmo, a égua ficava muito cansada . Já cheguei a percorrer 30km em um dia.”

Polivalente, Nilva não ostenta apenas o cargo oficial de contadora de histórias; ela também é catireira e participa do grupo Os Mano Bão no Pé desde o ano passado. Nas expedições no meio do mato, o grupo, formado por sete homens e apenas ela de mulher, passa por fazendas realizando shows e disseminando a dança folclórica pelas redondezas. Mas quem pensa que acabou, se engana. Ela participa também do grupo Meninagem. Ao lado de mães e colaboradores o grupo faz encenações com bonecões e fantasias. “O fato de ser catireira me ajuda na hora de cantar músicas e tocar os instrumentos”, explica Nilva.

A satisfação das crianças é clara. “Eu conheço a tia da carroça desde os seis anos. Eu não tinha aprendido a ler e ela foi me ajudando a aprender e gostar de leitura”, conta Elias Costa dos Santos, nove anos. O secretário de Cultura também não esconde o resultado do investimento. “Depois que ela iniciou o projeto, as crianças se interessaram muito mais pela leitura”, confessa Demerval.


A parceria e os personagens

Quando menos esperava, a carroceira se deparou com uma acreana empolgada querendo ser voluntária do Leiturégua. Era hora de expandir o projeto.

Silene Farias é bonequeira e sua aparição aumentou a produtividade da carroça literária. Ela criou, com as crianças, oficinas de montagens de bonecos e instrumentos. “Quando cheguei na cidade e fiquei sabendo da Nilva, eu me apaixonei na hora. Lá no Acre eu mantinha um trabalho muito parecido com esse”, enfatiza. Silene, como seus personagens, chegou a Olhos D’Água para conhecer a Feira do Troca e nunca mais saiu de lá.

De mamulengos a fantoches e marionetes surgem personagens como o David Bag Dubiniquim, em homenagem ao jogador inglês David Beckham. “O nome ficou Dubiniquim porque as crianças não conseguiam pronunciar a palavra certa”, conta a bonequeira. Muito estiloso, o boneco ostenta piercings e cabelo moicano. “Ele veio para trocar os brincos na Feira do Troca e não quis partir”, completa Silene sobre a origem do personagem.

Calango palhaço
Calango é um palhaço que foi confeccionado pelas crianças menores. Ele foi feito com garrafa PET, papel machê, vara e retalhos de roupa. Bem colorido, como um palhaço deve ser, ele demorou um pouco mais no processo de confecção: “Entre histórias e pinturas, as crianças foram aprendendo o valor da leitura”, explica Silene.

De todos os personagens, o que chama mais a atenção — de longe — é a Maria Preta Antônia dos Olhos D’Água. Destaque da apresentação de Nilva e sucesso absoluto entre as crianças, a negra mede 2m de altura. A personagem foi criada em homenagem a uma árvore de Alexânia (da espécie Maria Preta), que colecionou histórias de amantes, brincadeiras e festas na cidade. “Por ser uma figura histórica decidi criar a personagem. A árvore foi destruída pelo tempo. As pessoas também faziam fogueira embaixo dela. Ela não aguentou e morreu”, explica Nilva.

Na hora que a professora veste a fantasia, os gritos de felicidade das crianças são ensurdecedores. “É uma alegria só”, afirma. Quando perguntadas sobre qual personagem é o favorito da meninada, a resposta é em conjunto: “A Maria Preta".

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