terça-feira, 3 de abril de 2012


Uma saga imperial.    Equilibrado entre ficção e história, livro do espanhol Javier Moro narra trajetória política e pessoal de Dom Pedro I em tom de romance CORREIO BSB 02.04
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É talvez inspirado pelo brado revolucionário de Dom Pedro I — “independência ou morte!” — que o espanhol Javier Moro defende seu novo livro, O império é você. Não é nem romance histórico, nem biografia. Um pouco dos dois — um relato independente. A jornada épica do imperador casanova é contada com floreios de ficção, mas baseada em fatos. Margem para polêmica? Para o autor, que recebeu o prêmio Planeta em outubro do ano passado pelo trabalho (agrado de 600 mil euros, apenas abaixo do Nobel, que supera o um milhão de euros), as fronteiras entre os gêneros estão, de fato, enevoadas. “Você não pode criticar uma história romanceada como se fosse livro de história. É como falar de um automóvel quando o veículo em questão é um avião. O importante é ser fiel aos personagens. Quis contar o interior que os historiadores contavam de fora”, justificou, em conversa com o Correio. Na Espanha, mais de 400 mil exemplares foram vendidos em menos de um ano.
           
O IMPÉRIO É VOCÊ
De Javier Moro. Tradução: Clene Salles. Planeta do Brasil, 496 páginas. R$ 49.

De repente, o imperador metade brasileiro, metade português tornou-se best-seller: como um personagem “imaginado”, atraiu leitores na Europa, onde não é tão popular quanto aqui. A caminhada de boas vendas inspirou tradução francesa, com tiragem de 100 mil exemplares, planejada para chegar às livrarias daqui a dois meses. No Brasil, historiadores, pesquisadores e outros escritores já se manifestaram contra o romance, por suposta “falta de precisão histórica”.

A intenção, ele explica, foi retomar bastidores da história do Brasil e revelá-los a leitores internacionais. “Fiz mise-en-scène, dramatizei a história épica da família real portuguesa para que seja lida como um romance. A história do Brasil não pertence a ninguém, pertence ao mundo. E este livro contribui ao fazê-la ser conhecida no mundo inteiro”, argumenta.

Sentimental
Dono de registros sobre outros personagens históricos, como o ativista brasileiro Chico Mendes (Caminhos da liberdade) e a política indiana Sonia Gandhi (O sari vermelho), Moro retornou na última sexta-feira à Espanha, depois de divulgar o livro em Brasília e mais cinco cidades brasileiras. Acredita que deixou para os leitores — brasileiros e estrangeiros — um perfil sentimental e particular de um homem que carregava no peito insígnias, condecorações e um coração atravessado de paixões. Esposas à parte (Leopoldina e Amélia), teve casos com a aristocrata Domitila de Castro (a Marquesa de Santos), a dançarina francesa Noemie Thierry e, obviamente, outras mais.

O affair com a artista, considera Moro, deveria ter mais espaço nas narrativas sobre Dom Pedro. “Pela primeira vez, enfrenta um conflito que permeará toda sua vida, entre ser um homem normal e um herdeiro do império. No final, cede ao pedido do pai (que estava arranjando o casamento com Leopoldina) e sacrifica seu amor por Noemie. Mas quando fica sabendo que o filho de Noemie morreu ao nascer, Pedro chama o capitão geral de Pernambuco e pede que lhe mande o caixão com o corpo do pequeno. E Pedro guarda o caixão em seu escritório durante 20 anos”, descreve o autor.


Duas perguntas - Javier Moro

Houve dificuldade na recriação de diálogos e cenas?
Você não pode se permitir o luxo de inventar um personagem que não tenha existido ou de criar cenas completamente imaginadas, sem base real. É preciso moldar a história, torná-la interessante do ponto de vista literário com o material que existe. Não se trata de inventar, trata-se de interpretar. Quanto aos diálogos e cenas, se os personagens estão bem desenhados, se o perfil psicológico está correto, se é fiel à personalidade deles, os diálogos saem quase sozinhos.

Como funcionou o seu procedimento de pesquisa e coleta de material para a composição do livro?
Não foi demasiado difícil porque contei com a colaboração de amigos como Pedro Correa, que me abriu algumas portas, e porque existe muito material já escrito. Estive em Lisboa, Queluz (onde D. Pedro nasceu), São Paulo e Rio. Passei dias na Biblioteca Nacional e no Instituto Histórico e Geográfico, no Rio. Minha prioridade não era buscar fontes primárias, refazer o trabalho que historiadores como Octávio Tarquínio de Sousa, Oliveira Lima ou Tobias Monteiro já fizeram. Minha meta era contar essa história para o mundo, não para os brasileiros. E o fato de ser estrangeiro, creio eu, me deu essa perspectiva necessária para escrever uma história que interessa ao mundo inteiro. Minha meta era contar essa história como um romance, sem ser inteiramente um romance.


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Cultura: propriedade comum ou mercadoria. CARTA MAIOR 02.04
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No momento em que se avança no processo de privatização na que já foi um marco na TV pública brasileira – a TV Cultura de São Paulo – e ainda persiste um mandato no Minc que promoveu graves retrocessos na política de propriedade comum e convive de forma promíscua com o Ecad, vale a pena recordar que um dos mais importantes debates contemporâneos se deu justamente sobre a natureza da cultura: propriedade comum ou mercadoria.

Foi uma longa e tensa discussão no âmbito da Unesco, em que os Estados Unidos defendiam a inespecificidade da cultura, como uma mercadoria a mais, que deveria ser submetida às normas do livre comércio e estar no âmbito da Organização Mundial do Comércio. Não poderia haver visão mais mercantilizada da cultura, que aceleraria ainda mais o achatamento da diversidade cultural em beneficio dos modelos de consumo das potências centrais do capitalismo.

A posição - que finalmente triunfou - considera a especificidade da cultura como forma de definir as distintas identidades dos países, dos povos, das nações, que requer tratamento e proteção especifica. Por detrás do debate estava a contraposição entre a cultura como mercadoria e a cultura como patrimônio da humanidade, como propriedade comum. É a forma particular de refletir os grandes debates e dilemas contemporâneos entre esfera mercantil e esfera pública, entre neoliberalismo e pós-neoliberalismo, no plano da cultura.

Até o governo Lula predominou essa visão mercantil da cultura, de que um dos reflexos mais claros foi a Lei Rouanet de incentivo à cultura, em que o governo renuncia a seu papel de fomento da cultura e permite que empresas privadas deixem de pagar impostos para financiar atividades de propaganda das empresas, sem nenhum critério artístico. Ao invés de pagar seus impostos, as empresas privadas promovem sua imagem, em lugar do governo definir os critérios públicos de repartição de recursos.

O mandato do Gil e do Juca havia proposto reformulação da Lei de incentivo à cultura, que não avançou neste mandato, foi revista com os critérios que presidem esse mandato, de menor intervenção do poder público e de favorecimento dos mesmos mecanismos que presidem a lei ainda vigente.

A promiscuidade com o Ecad e a retirada do selo da propriedade comum vão na mesma direção, de ruptura com todos os avanços do mandato anterior, que fortaleceram o Minc no governo Lula e que projetaram uma imagem de governo dos mais avançados no mundo em termos de políticas culturais. A presença de um ministério fraco e sem apoio tem feito com que ressurjam teses de que os temas de propriedade e a própria Ancine deveriam estar subordinadas ao Ministério de Indústria e Comércio, formalizando os retrocessos sobre o caráter público da cultura.

É a mesma lógica de privatização da cultura que tem feito com que os tucanos destruam a melhor TV que o Brasil chegou a fazer, no auge da TV Cultura. Nas programações informativas, de debate politico, nas programações infantis, culturais – ela vai chegado a disputar audiência com a TV Globo em São Paulo. Os tucanos retiraram recursos e jogaram a TV Cultura na lógica de buscar recursos privados e, assim, ter que se submeter aos critérios das agências de publicidade e das empresas privadas, tirando paulatinamente o caráter diferenciado, público, da TV Cultura, até se chegar à desagregação de uma TV totalmente subordinada aos desígnios – e conflitos – internos do PSDB.

A luta pela eleição de um candidato alternativo em São Paulo, assim como por uma substituição no Minc que permita o resgate das políticas culturais de caráter público, é a mesma luta pela democratização da cultura e dos meios de comunicação no Brasil hoje.
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CADASTRO NEGATIVO.  Seccionais da OAB querem lista de violadores de prerrogativas.   Presidentes de seccionais da OAB aprovam criação de banco de dados que incluirá nomes de pessoas, empresas e instituições que violarem direitos dos advogados. Conselho Federal precisa chancelar criação. www.conjur.com.br
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88 assassinatos em um mês. Balanço trágico é referente a março, que teve uma média de quase três homicídios por dia. Correio Braziliense – 03/04.  
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-Somente no último fim de semana, pelo menos 14 pessoas foram mortas no Distrito Federal. Maioria dos casos tem relação com o tráfico de drogas

O último fim de semana foi o mais violento de 2012 no Distrito Federal. A Polícia Civil registrou pelo menos 14 assassinatos nas 48 horas de sábado e domingo. Em março, ocorreram 88 homicídios, quase três por dia. A média do ano passado, quando 722 acabaram assassinadas, foi de duas mortes a cada 24 horas. Investigadores acreditam que a maioria dos casos esteja ligada ao tráfico e ao uso de drogas. Na edição de domingo, o Correio mostrou que 63% das vítimas de arma de fogo em 2010 usaram algum tipo de entorpecente antes de serem executadas.

O subsecretário de Operações da Secretaria de Segurança Pública do DF, coronel Jooziel Freire de Melo, admite que os números do fim de semana são atípicos. "Realmente, estão fora do padrão, mas não temos condições de avaliar, neste momento, qual o fenômeno ocorrido. Precisamos estudar o perfil das vítimas e dos autores para conseguir fazer uma interpretação mais precisa", afirmou.

De acordo com Jooziel, as operações envolvendo todos os órgãos vinculados à segurança pública devem trazer resultados significativos para a cidade. "O secretário (Sandro Avelar) atua na direção de fomentar uma força-tarefa que conta com a participação da Polícia Militar, da Polícia Civil e do Detran para o enfrentamento da violência. Acreditamos que essas novas ações trarão resultados positivos para a cidade", frisou.

Nem uma das áreas mais nobres da capital do país ficou imune à violência dos últimos dias. Na madrugada de domingo para segunda-feira, um homem foi morto a facadas no acesso para as quadras 109 e 110 Sul. (leia mais na matéria abaixo). Na maior e mais populosa cidade do DF, Ceilândia, foram computadas três execuções. Na QNM 7, área norte da região administrativa, o jovem José Júnior Moura da Silva, 22 anos, foi atingido por dois disparos na cabeça em plena luz do dia, no domingo. Ele conversava com amigos numa esquina, quando um homem dentro de um Honda Fit atirou contra o grupo. José Júnior morreu na hora. Outro rapaz ficou ferido na perna, mas não corre risco de morte.

No setor P Norte, a polícia também investiga o homicídio de um rapaz de 30 anos, na noite de domingo. Ele voltava para casa, por volta das 20h30, quando foi surpreendido por um homem armado. O rapaz foi baleado duas vezes. No Setor Oeste do Gama, Jaderson dos Santos, 33 anos, também acabou assassinado com dois tiros, na manhã de sábado. Casado e com dois filhos, ele foi encontrado morto em um chalé.

Duas horas depois, o monitor de transporte escolar Lucas Rodrigues, 21 anos, foi executado dentro do próprio carro, na Quadra 3 de Sobradinho.

Droga e morte
O estudo, produzido pelo Instituto de Medicina Legal (IML), ainda revela o poder devastador do entorpecente na juventude. O levantamento aponta que 73% das vítimas de homicídio doloso com idade entre 15 e 22 anos tinham consumido algum alucinógeno antes da morte.
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Educação, pilar da economia.    O Estado de S. Paulo - 03/04/2012

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Sabe-se que, para o Brasil ser realmente competitivo, é preciso que se façam as reformas estruturais. Mas, se o País realizá-las e não investir pesadamente na educação, elas se tornarão, a médio e a longo prazos, meros paliativos na tentativa de fazer uma nação desenvolvida. Na condição em que se encontram os nossos recursos humanos, o País não consegue crescer a taxas superiores a 4,5% do PIB, em termos constantes. Temos hoje uma baixíssima produtividade por causa da escassez de trabalhadores qualificados em praticamente todos os setores da economia.

Foco, como exemplo, o caso da nossa engenharia, pois nenhum país cresce desprovido dela. O Brasil forma em média 40 mil engenheiros por ano, enquanto a Coreia do Sul, mais de 80 mil ao ano, tendo menos da metade da nossa população. Quanto aos países emergentes, a China forma 650 mil engenheiros/ano; a Índia, 220 mil; e a Rússia, 190 mil.

O fato é que, pela quantidade de vagas oferecidas nas universidades públicas e privadas brasileiras, poderiam se formar aqui quase o dobro dos engenheiros que se graduam por ano. Mas isso não ocorre porque, além de as vagas para alguns desses cursos não serem preenchidas, há um elevado nível de evasão nas escolas de engenharia, girando em torno de 54%, considerando as universidades públicas e privadas. E há, também, o problema da retenção. O curso de engenharia tem cinco anos de duração, mas, em média, o aluno leva seis anos para se formar.

O esforço para solucionar o problema não deve ser realizado com a criação de mais e mais escolas de engenharia. Tal esforço deve ser para um segundo momento. O foco, agora, deveria estar centrado em preencher adequadamente as vagas existentes desses cursos e reduzir o elevado índice de evasão e retenção dos estudantes. Para isso são necessárias políticas públicas voltadas para uma reforma profunda, com investimentos de recursos maciços, nos ensinos fundamental e médio.

Esses níveis de educação, em geral, não estimulam adequadamente o ensino das ciências exatas, dificultando a assimilação de conhecimentos futuros para a engenharia, fundamentais na Física, na Matemática e na Química. O resultado é a falta de base para acompanhar a faculdade de engenharia. Esse é o principal motivo que gera tanto a evasão quanto a retenção.

Além disso, não são muitos os jovens que procuram ingressar nas escolas de engenharia, pois nos níveis fundamental e médio, com raras exceções, não se ensinam as matérias de exatas de forma a estimular os estudantes a seguirem carreira na área de tecnologia. As vocações para os campos da engenharia não são despertadas, como deveriam ser, mediante novas técnicas de ensino, com didáticas apropriadas a um mundo pós-moderno.

As vocações vão sendo formadas, mediante as condições que se apresentam para os estudantes, durante seu processo de amadurecimento intelectual. E é isso que precisa ser levado em conta, e com uma visão de longo prazo. Fazer trabalhos e projetos com as crianças e os adolescentes para que eles gostem de Física, Química e Matemática.

Pouco adianta criar mais escolas de engenharia, mais vagas, se o País não conta com uma quantidade realmente expressiva de jovens interessados nelas. Ou se tiver ingressantes nos cursos que não conseguem aprender as disciplinas porque não tiveram base para isso nos cursos fundamental e médio. Continuarão, nesse caso, a ter vagas não preenchidas, elevados níveis de evasão e uma média alta de retenção.

Há quem defenda, numa visão imediatista, a criação de cursos de engenharia de curta duração, visando a ofertar mais profissionais da área para o mercado de trabalho. Ora, elevaríamos o número de engenheiros no Brasil, porém com o risco de serem construídas "pontes que caem".

Para o País crescer e um dia ser realmente desenvolvido, seria preciso que as estratégias voltadas para a educação fossem de longo prazo. Aí, sim, teríamos uma engenharia que, em vez de minguar, proliferaria no Brasil.
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Economia sustentável divide OCDE e emergentes.   Economia verde opõe países ricos aos emergentes
Valor Econômico - 03/04/2012
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A divergência entre dar prioridade ao crescimento econômico ou à proteção ambiental marcou a reunião ministerial da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na semana passada, e ilustrou um confronto entre países desenvolvidos e emergentes que deverá persistir na conferência Rio+20, em junho, no Brasil.

A OCDE reuniu ministros de meio ambiente para definir a mensagem a levar ao Rio e convidou alguns países emergentes - Brasil, China, Indonésia, Rússia, África do Sul e Colômbia - para a discussão. No fim, os emergentes não endossaram a declaração ministerial, com exceção da Rússia.


A divergência entre priorizar crescimento econômico ou proteção ambiental marcou a reunião ministerial da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na semana passada, e ilustrou um confronto entre países ricos e emergentes que deve ter continuidade na conferência Rio+20, em junho, no Rio.

A OCDE reuniu ministros de Meio Ambiente para definir a mensagem que seus países-membros, ditos os mais desenvolvidos, vão levar ao Rio, e convidaram alguns emergentes - Brasil, China, Indonésia, Rússia, África do Sul e Colômbia - para a discussão. No final, os emergentes não endossaram a declaração ministerial, com exceção da Rússia, que está em processo de adesão à entidade e aceita tudo pelo momento.

A divergência de enfoque ficou patente. Os países desenvolvidos estão muito centrados no princípio de "economia verde", que consideram um dos meios para alcançar desenvolvimento sustentável, econômico, comercial e ambiental. Só que o social fica um pouco a reboque e não tem a mesma ênfase, segundo países como o Brasil.

Para vários ministros, instrumentos econômicos - taxação, encargos, imposto sobre poluição, eliminação de subsídios que prejudicam o meio ambiente - são importantes, mas os países precisam de regulação mais efetiva para acelerar a mudança de comportamento. Uma ideia que volta é a da cobrança do custo real do uso de recursos naturais, por exemplo, da água, que ficaria bem mais cara.

O "Policy Statement" dos países da OCDE para a Rio+20, destaca ainda que comércio e investimento não devem ser barreiras ao crescimento verde ou desenvolvimento sustentável. Nas discussões, na semana passada, a Coreia do Sul mostrou uma visão mais mercantilista que a europeia, por exemplo. O objetivo parece ser a derrubada de barreiras para vender equipamentos modernos que ajudariam a adaptação industrial.

Para os emergentes, o problema é que a OCDE quer atrelar demais a expansão econômica à proteção ambiental, o que exige priorizar investimentos enormes em equipamentos, pesquisas, renovação de indústrias, filtrar tudo, fechar usinas sujas e substitui-las por novas. "Não é o ambiental que puxa o desenvolvimento, é o desenvolvimento que puxa o ambiental", diz um negociador emergente.

A avaliação é que a receita dos desenvolvidos, que já tem capacidade instalada, regras ambientais e crescimento limitado, provocaria crescimento menor e a um custo muito maior para os países em desenvolvimento. Os emergentes voltaram a pedir que a OCDE demonstre quanto custaria a adaptação ao "crescimento verde". A entidade diz que isso é difícil, mas que no longo prazo todos ganham com economia forte e limpa.

Os emergentes concordam, mas insistem que a prioridade no contexto atual é continuar crescendo para aumentar a inclusão social, criar mais empregos, entre outras ações. "Isso passa à frente, não adianta falar de tecnologia sofisticada se for nos custar demais ou desacelerar o processo de inclusão social, distribuição de renda", diz uma fonte dos emergentes.

Embora sem endossar o texto da OCDE, o Brasil conseguiu incluir no texto uma menção à "economia verde inclusiva", numa nuance em relação ao "crescimento verde".
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VISãO DO CORREIO »  Incluir crianças com Down é obrigação. CORREIO BSB 03.04
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Conviver com diferentes faz parte da educação. A escola constitui microcosmo da sociedade. Deve, por isso, ser representativa da variedade existente no meio. Não se admitem colégios que fechem as portas para esta ou aquela etnia, para este ou aquele sexo, para esta ou aquela religião. Tampouco se aceita instituição de ensino que recusa crianças por apresentarem distúrbio genético.

Choca, pois, a notícia de que escolas particulares do Distrito Federal não aceitam meninos e meninas com síndrome de Down. Ou que condicionam a matrícula a pagamento de taxa extra. O Conselho Nacional de Educação (CNE) e a Secretaria de Educação consideram discriminatória a cobrança pelo acompanhamento. O direito está consagrado na Constituição Federal e na legislação específica da matéria.

A prática, que chega a dobrar a despesa dos pais, funciona como muro intransponível para a maioria dos estudantes. A barreira afugenta os postulantes a vaga, privando-os do direito de escolher onde estudar. É verdade que crianças com Down necessitam de cuidados especiais. Tutores as acompanham para evitar defasagens na aprendizagem. Mas não é legal cobrar da família o salário do profissional.

A remuneração deve constar da planilha de custos, que define o valor da mensalidade. Assim diluído, o montante não sobrecarrega ninguém. É justo que assim seja. O convívio heterogêneo beneficia a todos. Vale lembrar que a responsabilidade social constitui exigência da sociedade. Nenhuma instituição pode ignorar que se beneficia do meio e ao meio deve retornar parcela das vantagens auferidas.

Antigamente ações solidárias eram consideradas favor. Hoje são dever. As escolas, que se comprometem com o Estado a desempenhar função educadora, têm a obrigação de incluir. Classes especiais destinadas a alunos com deficiência são lembranças do passado. Colégios que não se deram conta da transformação de mentalidade que se operou no país pertencem também ao passado.

São da época em que os pais escondiam os filhos que apresentassem qualquer característica que os diferenciava da maioria. Isoladas, eram pessoas sem visibilidade e sem direitos. Os tempos mudaram. Incluir é a ordem. Escolas que ignoram o mandamento privam os alunos da necessária convivência com o diferente. Em vez de formar cidadãos, correm o risco de criar intolerantes.
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Comissão discute necessidades dos surdos usuários de língua portuguesa.A reunião será realizada às 14h30, no Plenário 7. www.camara.gov.br
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A Comissão de Seguridade Social e Família realiza hoje audiência pública para discutir o direito à comunicação e à informação, o universo da surdez e as soluções em acessibilidade necessárias à plena inclusão social das pessoas usuárias de língua portuguesa com deficiência auditiva.

O debate foi proposto pelos deputados Rosinha da Adefal (PTdoB-AL) e Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP).

Os surdos usuários da língua portuguesa (Sulp) são os que utilizam a língua portuguesa – e não a Língua Brasileira de Sinais (Libras) – para se comunicar, por meio das modalidades oral, oro-facial (ou leitura labial) e da escrita.

“O objetivo da audiência é revelar a diversidade existente no universo da surdez e apresentar as necessidades desse primeiro grupo, ainda ignoradas quando da adoção de soluções em acessibilidade nos ambientes”, disse a deputada.

Foram convidados:
- a procuradora da República de São Paulo Eugênia Augusta Gonzaga Fávero;
- o secretário nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Antônio José Ferreira;
- a integrante do Grupo de Pesquisa em Acessibilidade e Tecnologias do Laboratório de
Experimentação Remota da Universidade Federal de Santa Catarina Anahi Guedes;
- a socióloga, ativista e articulista do Blog Surdos Usuários da Língua Portuguesa, Sônia
Ramires de Almeida.
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JUSTIÇA TRIBUTÁRIA.  Reforma tributária não é só reduzir impostos
Por Raul Haidar www.conjur.com.br 02/04
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A presidente Dilma já reconheceu a necessidade de uma reforma tributária e anunciou que pretende reduzir impostos. Ótimo! É isso que todos queremos e tais mudanças são urgentes. Redução de impostos em vários casos se faz com uma canetada. Para reduzir o IPI, por exemplo, não há necessidade de consulta ao Congresso, bastando simples portaria ministerial. O imposto de importação também. Mas reforma tributária não é só reduzir este ou aquele imposto. Trata-se de dar novas regras a todo o sistema tributário, corrigindo os defeitos que nele hoje encontramos.

Em todas as pesquisas já feitas sobre a questão tributária constata-se que os três maiores problemas são: a) carga tributária elevada; b) burocracia excessiva; e c) insegurança jurídica inclusive nas questões já julgadas.

Claro está que uma redução em todos os impostos ainda que seja viável pode gerar injustiças e criar problemas especialmente para os municípios e mesmo para os estados. Tal questão — carga tributária — deve levar em conta o quadro atual de arrecadação, onde se verifica que a União recebe quase 60% dos impostos, ficando cerca de 25% com os Estados e mais ou menos 15% com os municípios. A arrecadação deve ser proporcional às necessidades de cada entre tributante. A União arrecada mais porque tem a seu cargo um volume maior de responsabilidades.

Apesar disso, na prática verifica-se que Estados e Municípios dependem cada vez mais do repasse de verbas federais para fazer funcionar os serviços que lhes estão afetos. Cortar impostos no nível federal é realmente fundamental e fica evidente que já passou da hora de fundir o IPI com o ICMS, transformando-se num IVA de competência estadual. Ou seja: é necessário acabar com o IPI, o que implicaria em tirar cerca de 20 bilhões de reais da receita federal ou um pouco menos, se considerarmos de quase metade do IPI é distribuído entre estados e municípios.

A lei de responsabilidade fiscal deve também ser revista, para criminalizar o uso indevido de verbas públicas, com mais rigor. Por exemplo: recentemente discutia-se proibição de custeio público de bandas musicais cujo repertório contivesse músicas pornográficas. Parece-nos que essa não é a questão. Deve-se, pura e simplesmente, proibir que dinheiro público, que falta na saúde, na educação, na segurança, etc., seja utilizado em festas ditas populares, onde o povo se dedica quase sempre a bebedeiras e coisas piores.

Se a festa é folclórica, que a comunidade cuide de festejar com a ajuda da população. Se é religiosa, que a igreja arrecade recursos junto aos fiéis. Dinheiro público que vem de impostos só pode ser usado no que estiver no orçamento. E este não pode desviá-lo para o que não seja de interesse de todos, mediante aprovação pelo legislativo. Neste momento da nossa história, a reforma tributária é fundamental. Nosso sistema está ruim e cria inúmeros problemas para a economia. Examinando-se os artigos 170 a 181 da Constituição vemos uma boa indicação do caminho a seguir.

No artigo 170 determina-se a valorização do trabalho e da livre iniciativa. Mas é evidente que com uma carga tributária próxima de 40% do PIB, não existe livre iniciativa que sobreviva, pois nada sobra para investir.

Fala-se em desindustrialização , apontando-se a redução da atividade fabril no país. Mas se as pessoas continuam consumindo, em algum lugar o bem consumido está sendo produzido. Ainda recentemente comentamos neste espaço que uma empresa de alimentos resolveu criar nova fabrica no Uruguai, pois os custos diretos e indiretos no Brasil impediriam a lucratividade desejada. Assim, se não houver queda na carga tributária, a reforma anunciada será apenas mais uma boa conversa. Se isso já funcionou no passado, hoje não funciona mais, pois a economia está internacionalizada. Aqueles industriais que insistem em manter fábricas obsoletas enquanto investem nas suas mansões, iates ou jatinhos, não podem continuar sendo subsidiados com taxas protecionistas que protegem agiotas acomodados.

Se a presidente quer mesmo falar em reforma, que mande preparar um bom projeto de racionalização e simplificação de obrigações acessórias, inclusive eliminando exigências descabidas de agências reguladoras que inventam normas novas a cada minuto. Precisamos também de uma estabilidade nas regras do jogo. Não se pode aceitar que decisões judiciais sejam ignoradas por qualquer burocrata. Quando o Judiciário decide de forma reiterada, chegando mesmo a questão a ser decidida pelo STF, não é razoável que a repartição ignore o fato, pois se trata de verdadeiro desprezo.

O ministro Marco Aurélio (STF) em entrevista ao ConJur registrou a perplexidade de todo operador do direito quando se constata a inobservância dos posicionamentos adotados pacificamente pelo Judiciário, afirmando:

“A ausência de respeito às decisões do Supremo revela a quadra do nosso Estado, que talvez não seja, como se diz na nomenclatura, um Estado Democrático de Direito. É inconcebível que o Supremo decida, e decida de forma reiterada, e o Poder Público — gênero, estados, municípios ou a União — ignore a decisão. O que nós precisamos no Brasil é de ética. É de homens, principalmente homens públicos, que observem a ordem jurídica constitucional.”

Vamos esperar que se promova um reforma tributária de verdade. E que ela não sirva apenas para dar cinco minutos de holofote a ilustres figuras das nossas academias que não fazem a mínima idéia do que seja o problema tributário, mais preocupados em dar palestras e promover seus infladíssimos egos.

Raul Haidar é advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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Loucos por livros.  Mesmo com as mudanças trazidas pela era da internet, ter uma obsessão pelo objeto que comercializam permanece qualidade essencial dos livreiros CORREIO BSB 03.04
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Quando olham para os anos 1980, Ivan da Silva, Cida Caldas, Íris Borges e Francisco Joaquim de Carvalho esbarram na mesma palavra: romantismo. É um termo que tem outro significado para Alan Santos de Oliveira, Kermerson de Aquino Macedo e Glaidson Medeiros. No século 21, o romantismo pode ser nome de movimento literário do passado, mas não se aplica mais à profissão de livreiro. Hoje, vender livros é, antes de tudo, um negócio e exige habilidades bem específicas. Está longe de carregar aquela aura do sujeito para o qual os sentimentos estão acima da razão.

Vender livros nas últimas décadas do século passado implicava em tornar - se uma referência e um guia para os consumidores. A internet e a informação acessível mudaram o cenário, e os desejos dos clientes ganharam a velocidade da rede. No entanto, apesar da popularidade com a qual a tecnologia se instala na área, uma característica ainda une os livreiros de ontem e os de hoje: são seres aficcionados, obcecados e viciados no objeto que comercializam. E, se não forem, não são livreiros. Nas palavras de Glaidson, 34 anos, são meros “entregadores de livros”.

           
Glaidson Medeiros: "O livreiro não pode ser um mero entregador de livros. A gente precisa sempre tentar oferecer algo mais"


“Naquela época a gente estava crescendo com o aumento da literatura no país. O romantismo dos anos 1980 desapareceu, porém o entusiasmo continua”, admite Íris, proprietária da distribuidora Arco Íris e curadora da 30ª Feira do Livro de Brasília. Glaidson é uma prova de que o arrebatamento provocado pelo objeto livro ainda funciona como ingrediente básico da lábia de um livreiro. Estudante de jornalismo, ele sonhava em trabalhar em uma grande loja de rede.

           
Kemerson e Cida Caldas , do Sebinho: é preciso amor, livro não é tijolo


Depois de ser contratado pela Livraria Cultura, levou junto um grupo de clientes confiantes nas dicas que costumava dar na Kingdom Comics, do Conic, na qual trabalhou durante alguns anos. “Livreiro tem que fazer dever de casa”, ensina. “Senão, pode ser constrangedor. Se o cara quer Astérix, a gente tem que saber mostrar outras opções. E não é uma questão de empurrar as coisas, é o prazer de oferecer algo mais.”

Intimidade
Entregador de livro não vive sem sistema. Se a rede cai e o computador não funciona, encontrar Machado de Assis será tão difícil quanto esbarrar em Paulo Coelho para quem não tem intimidade com o tijolinho de páginas coladas e capa colorida. Nisso, livreiros de ontem e de hoje concordam. Quando Cida abriu o Sebinho, há 26 anos, contava com apenas 50 exemplares arrumados na quitenete da sogra. A loja tem hoje milhares de títulos e encontrar um livro entre as estantes do Sebinho não é problema. Mesmo sem sistema, ela dá conta. “Quando a livraria não estava informatizada, a gente sabia encontrar um livro, falar de um autor. Você pode até não ter lido Shakespeare, mas tem que saber quem é o cara porque, se faltar o sistema, você não vai conseguir nem falar com o cliente”, repara.

           
Alan Santos de Oliveira: "Muitos não suportam entrar em livraria muito grande"


Também é essencial gostar do produto. Ser obcecado, ter intimidade. Vender livros não se assemelha a vender roupas e não há possibilidade de trocar a camiseta laranjada pela preta, caso o tamanho adequado não esteja disponível. É difícil convencer um leitor em busca de um bom João Ubaldo Ribeiro a levar um manual de autoajuda. “A primeira coisa que uma pessoa que trabalha com livros precisa ter é um sentimento de amor, uma paixão pelo que está vendendo. Livro não é um tijolo, é algo que transmite emoções. A segunda coisa é a vontade de aprender”, ensina Kemerson, 24, formado em letras e há cinco anos contratado pelo Sebinho.

Alan tem 35 anos e é vendedor da Dom Quixote do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Também professor de geografia e colecionador de livros, assistiu com desconfiança ao crescimento das livrarias de rede que ameaçam pequenos livreiros, mas hoje está convencido de que há espaço para todos. “Muitos clientes vêm na loja porque dizem que não suportam entrar em livraria grande, onde não encontram nada fácil”, explica. “E porque têm que atravessar milhares de best-sellers para chegar aonde querem.” Cida, 48, também acredita na diversidade de nichos. “Se você tem uma livraria de quadra com bom atendimento, agradável, não é muito melhor do que se deslocar para um shopping?”, pergunta.

Leitores amigos
Para Francisco Joaquim de Carvalho, o Chiquinho, nada disso é muito evidente. “Antes tínhamos o romantismo. Agora, estamos na era da concorrência, da disputa. É mais complexo. Antes tudo era mais maleável”, repara o livreiro mais antigo da Universidade de Brasília (UnB). Chiquinho, 51, começou como jornaleiro e, em 1989, abriu a pequena (amontoada) livraria no ICC Norte. Só ele é capaz de encontrar um título na confusão da loja, mas quem vai atrás do livreiro sabe que, se ele não tiver, ou manda buscar ou conhece algo capaz de satisfazer o cliente. “Consigo me manter porque estou dentro da universidade e pela solidez dos clientes, dos leitores amigos da livraria.”

Ivan, 63, fechou a Livraria Presença em 1995 e desde então trabalha com a venda de livros usados no Conic. Ele procura não desanimar os jovens, embora encare a profissão de livreiro como algo em extinção. “É que nem alfaiate, quitandeiro, tipógrafo”, brinca. O problema maior, ele insiste, não está nas grandes redes nem nos shoppings, mas na internet. A rede dispensa o livreiro em vários sentidos, da busca pela informação à aquisição do produto. “Antigamente, saía uma notícia que um escritor estava terminando um livro, todo mundo ligava na livraria e me pedia para separar um exemplar quando chegasse”, conta. “Hoje, ninguém sabe quem é o escritor. E ele não precisa nem fazer o livro, é só colocar na internet.”
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O deserto das letras CORREIO BSB 03.04
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O brasileiro lê em média quatro livros por ano, segundo a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, divulgada na semana passada pelo Instituto do Livro. As razões para esse quadro desolador são fartamente conhecidas — baixa qualidade da educação, tradição oral na cultura brasileira, preços proibitivos dos livros, apelo da tecnologia, etc. — e permanecem intocadas por gerações.

A pesquisa sobre nossos parcos hábitos de leitura se associa a outro dado relevante, mais antigo, para diagnosticar a delicada situação nacional. Segundo informações publicadas em 2010, o país ocupa a 88ª posição no Índice de Desenvolvimento de Educação para Todos, ranking elaborado pela Unesco a fim de medir a capacidade e o compromisso das nações com o trabalho desenvolvido nas escolas. A sexta economia mundial está em posição inferior ao Equador, à Bolívia e ao Paraguai; e muito longe de Argentina, Uruguai e Chile, para ficar apenas na América do Sul.

Mais grave do que analisar os antecedentes históricos e fazer estudos comparativos, porém, é verificar a perspectiva do problema. A pouca intimidade do brasileiro com o conhecimento guardado nos livros projeta situações preocupantes. O grave deficit educacional acarreta dificuldades nas escolas, no mercado de trabalho, na economia internacional, nas políticas públicas, no exercício da cidadania. Enquanto o país mantiver indicadores tão precários na formação intelectual dos brasileiros, encontraremos sérios limites para qualificar nossa pauta de exportação, aprofundar o estudo científico, encontrar soluções inovadoras, acelerar o ritmo de crescimento, ser uma sociedade mais justa.

Estatísticas econômicas indicam que o brasileiro demonstra grande interesse em comprar carro, televisão, geladeira, celular. Não se observa, porém, a mesma voracidade no consumo de livros, instrumentos poderosos para alcançarmos um grau de desenvolvimento mais avançado. No mundo pós-industrial, apenas a valorização da leitura permitirá atravessar o deserto das letras.
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O NOVO INCOSCIENTE »  O amor e outros seres invisíveis.  Por habitarem o inconsciente, as emoções são difíceis de compreender. A neurociência tem buscado trazê-las à tona e ajudar as pessoas a dominarem sentimentos que, muitas vezes, não conseguem explicar de onde vêm
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“João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém.” As universais palavras de Carlos Drummond de Andrade têm, mesmo que não fosse esta a intenção do poeta, uma pontinha de sabedoria científica. O amor é o mestre dos desencontros porque não pertence à divisão lógica do cérebro — é um habitante do inconsciente. Recentemente, neurocientistas têm se convencido de que todas as emoções seguem a mesma regra e fazem parte das regiões não racionais da mente humana e, talvez por isso, também estejam entre as maiores causas de os divãs dos psicólogos viverem cheios.

Às vezes, toma conta uma tristeza sem explicação. Em outras ocasiões, entra em cena uma alegria efusiva. E, nos dois casos, ninguém sabe explicar da onde veio tudo aquilo. Quem nunca passou pela experiência? “Isso acontece porque todas as emoções são inconscientes. Quando conseguimos associá-las a coisas concretas, elas se transformam em sentimentos conscientes”, explica Marco Callegaro, presidente do Instituto Brasileiro de Terapias Cognitivas e autor do livro O novo inconsciente (Editora Artmed).

“Em certas situações, entendemos melhor os estímulos desencadeadores das emoções, então podemos imaginar e construir hipóteses sobre o que as causou exatamente. Em outras situações, temos um acesso muito parcial às emoções e percebemos apenas seus resultados em nosso corpo (rubor, desânimo, aperto no peito etc.). Nesses casos, buscamos construir uma teoria explicativa no plano consciente, que nem sempre é fidedigna”, completa o especialista.

O cérebro humano, acreditam os cientistas, obedece a uma hierarquia batizada de “níveis de regulação da vida”. Imaginar a mente como um exército ajuda a compreender o que isso significa. Na base desse batalhão estão os soldados: instintos básicos, reflexos, impulsos e reações metabólicas. Logo acima deles, nessa hierarquia cerebral, estão as emoções. Elas são como instintos mais complexos, por assim dizer. Os sentimentos representariam o papel de tenentes. Eles associam imagens às emoções, conferem sentido a elas e fazem a interface entre processos conscientes e inconscientes. A parte racional do cérebro, por sua vez, seria o marechal de todos esses soldados.

É comum que os oficiais subalternos desse exército se revoltem contra as autoridades. Não se deve esquecer, no entanto, que eles continuam sendo subordinados da razão — e é possível botá-los na linha. Nem sempre, contudo, o marechal consegue controlar seu batalhão, já que é muito difícil disciplinar aquilo que não se conhece. E, como bem sabe qualquer um que tenha coração, as emoções não são assim tão claras ao consciente o tempo todo.

Comunicação falha
Srinivasan Pillay, professor de psiquiatria na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, explica que essas desconexões entre razão e emoção acontecem devido a problemas de comunicação. As principais atribuições do hemisfério esquerdo do cérebro são os pensamentos, enquanto as do direito são os sentimentos. Estudos com crianças traumatizadas mostraram que elas apresentavam danos em uma estrutura fibrosa chamada corpo caloso, que faz a ponte entre os dois lados do cérebro. Ou seja, pessoas marcadas por experiências ruins perdem a capacidade de “traduzir” emoções em dados concretos e conscientes. “As consequências de um corpo caloso rompido incluem desconexão entre pensamentos e sentimentos, perda do sentido de individualidade e sensação de que falta alguma coisa”, diz Pillay.

Há ainda o estresse, que tem forte influência nesse processo. Pessoas muito estressadas produzem um hormônio chamado cortisol, que age quase como um veneno, matando os neurônios cerebrais (veja infografia). E, como são os neurônios que transmitem todas as mensagens de um lado a outro da cabeça, pessoas tensas também perdem a capacidade de entender as próprias emoções.

Certo: a comunicação entre emoções e razão já foi rompida por traumas e estresse diversas vezes. O indivíduo sente-se como se estivesse sempre tentando abrir um arquivo emocional que não é compatível com os programas que rodam em seu computador mental. Estará essa pessoa condenada a ser vítima das próprias emoções para sempre, como um laptop desatualizado? Já é possível respirar aliviado, pois a resposta é não.

“Há diversos sistemas de memória que codificam as experiências (e as emoções relacionadas a elas) em uma forma de representação que não temos como ‘abrir’ em nosso ‘sistema consciente’”, esclarece Callegaro. “No entanto, existe sempre um certo grau de acesso a essas memórias. Podemos, por exemplo, observar as reações de nosso corpo a estímulos. Podemos identificar nossa repulsão ou atração por pessoas ou situações, e isso ajuda a gerenciar melhor nossas emoções. A terapia comportamental pode colaborar com a observação desses processos.”

Superação
Uma das técnicas desse tipo de terapia consiste em expor gradualmente a pessoa a situações que lhe causam incômodo. Vamos imaginar que José perdeu um ente querido em um acidente de avião e passou a associar os estímulos relacionados com viagem aérea a reações como elevação do ritmo cardíaco, respiração ofegante, etc. No consultório, José e o terapeuta vão investigar o caso. Há pistas fortes: ele só sente o mal-estar quando está exposto a voos. Depois de relacionar a causa à emoção, ele será lentamente exposto à situação. “Gradualmente, José passa pela experiência de imaginar-se em cenários associados a viagens aéreas. O nível de ansiedade da cena vai aumentando, enquanto o paciente permanece mantendo-se em relaxamento muscular e respiratório, de forma que seu corpo reaprende que os estímulos não são perigosos, em especial quando se expõe na situação real”, conclui Callegaro.

Há diversas outras técnicas que podem ajudar a dominar emoções desbaratadas. Uma delas chama a atenção por estar ao alcance de todos e ser uma sabedoria milenar. Trata-se da meditação em suas diferentes variáveis. Elisa Harumi Kozasa, neurocientista do Instituto do Cérebro do Hospital Israelita Albert Einstein, dedica-se a estudar os efeitos dessa técnica sobre as emoções. Segundo a pesquisadora, investigações sobre o funcionamento do cérebro de monges tibetanos, adeptos da chamada meditação da compaixão, mostraram que eles eram mais bem-sucedidos em ativar áreas do cérebro relacionadas à atenção, como o córtex pré-frontal.

“Existem estudos que indicam uma relação entre o desenvolvimento de habilidades atencionais e emocionais. À medida que desenvolvemos o que se conhece por funções executivas (aquelas que usamos para planejar ações e que são facilitadas pela concentração), vamos ganhando também a habilidade de controlar impulsos emocionais”, afirma Elisa (veja entrevista). E, com o controle de um monge tibetano sobre as próprias emoções, fica mais fácil entrar na história de Carlos Drummond de Andrade como J. Pinto Fernandes, aquele que, nos versos do poeta, casou-se com Lili mesmo sem nunca se envolver com a terrível confusão amorosa…


Três perguntas para - Elisa Harumi Kozasa

Neurocientista do  Hospital Israelita Albert Einstein

A neurociência tem averiguado a eficiência da meditação?
Foram feitos diversos estudos sobre os efeitos da meditação, principalmente a partir da década de 1970. Várias dessas pesquisas avaliaram seus efeitos para redução de estresse, ansiedade, depressão e doenças cardiovasculares, por exemplo. A partir da última década, a neuroimagem tem sido usada para investigar a eficiência do cérebro de pessoas que praticam meditação regularmente comparada a não meditadores em uma tarefa atencional.

E o que esses estudos têm mostrado?
Em uma pesquisa com monges tibetanos, que praticam a meditação para compaixão, e pessoas que começaram a fazer a prática há uma semana, observou-se que os monges tinham uma maior proporção de ondas gama (ondas cerebrais associadas à percepção e à consciência) e eram capazes de mantê-las por vários minutos. Outras têm mostrado que há uma diferença de ativação de áreas relacionadas à atenção, como o córtex pré-frontal, dependendo do tempo de prática de meditação. Existem ainda estudos que indicam uma relação entre o desenvolvimento de habilidades atencionais e emocionais. À medida que desenvolvemos o que se conhece por funções executivas, vamos ganhando a habilidade de controlar impulsos emocionais.

Há outras maneiras de ser senhor das próprias emoções?
Cientistas já mostraram a eficiência das artes marciais para crianças neste quesito. Elas são efetivas especialmente quando as crianças são treinadas no modo tradicional, bem como quando são educadas com métodos pedagógicos como a participação em jogos e treinamentos que envolvam conhecimento e reconhecimento das emoções.

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