quarta-feira, 25 de abril de 2012


GGG.  Direitos Humanos.   O 'Schindler' italiano que salvou centenas de vidas na Argentina.  CARTA MAIOR  17/04/2012
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O diplomata italiano Enrico Calamai foi um herói silencioso que atuou no Consulado em Buenos Aires durante a ditadura, quando arriscou sua vida e sua carreira para facilitar a fuga de centenas de dissidentes políticos e partidários que pegaram em armas contra o experimento neonazista dos generais argentinos. Em conversa com a Carta Maior, em Roma, Calamai fala sobre a Operação Condor, sobre o envolvimento de diplomatas e da ditadura brasileira em assassinatos e sobre a cumplicidade do Vaticano com a ditadura argentina.

Darío Pignotti - Especial para a Carta Maior

Roma - Se a Itália fosse uma Meca do cinema político como o era nos anos 60 e 70, seguramente os estúdios romanos de Cinecittá teriam filmado algo parecido à Lista de Schindler, aquela produção de Hollywood sobre um magnata alemão que resgatou cerca de mil judeus condenados a morrer em Auschwitz. O protagonista do filme que nunca se realizou seria o diplomata italiano Enrico Calamai, um herói silencioso que atuou no Consulado em Buenos Aires durante a ditadura, quando arriscou sua vida e sua carreira para facilitar a fuga de centenas de dissidentes políticos e partidários que pegaram em armas contra o experimento neonazista dos generais argentinos.

"Nunca me detive a contar as pessoas que passaram pelo Consulado. Em um programa da RAI (TV italiana) disseram que foram mais de 400, sinceramente não sei se esse número é correto, não sei quantos receberam nossa ajuda para poder sair com vida da Argentina".

A b iografia de Calamai é a de um diplomata incomum no outono portenho de 1976 quando a chegada ao poder do general Videla era bem acolhida pela maioria das embaixadas ocidentais e comemorada secretamente pela do Brasil, como consta na intensa comunicação gerada pelo então embaixador João Batista Pinheiro.

DESAFIANDO A OPERAÇÃO CONDOR
"Nós sabíamos que a Operação Condor estava atuando, ainda não a conhecíamos por esse nome, mas tínhamos notícias de que os militares brasileiros e argentinos estavam articulados para deter quem fugia da matança em Buenos Aires, por isso decidi viajar com dois ítalo-argentinos, Piero Carmelutti e Santiago Camarda, até o Rio de Janeiro. Era arriscado que fossem sozinhos. Foi no carnaval de 1977".

“Estes rapazes estiveram um tempo ocultos no Consulado, um deles tinha uma destreza artesanal para falsificar documentos e confeccionou uns que de autênticos tinham apenas as fotos”.
“Fez isso com meu auxílio, utilizando alguns carimbos que lhe facilitei, era um método não formal de fazer documentação para sair do país, não tínhamos apoio institucional, fizemos tudo às costas da Embaixada, que não me apoiava nisto”.

“Também não obtive apoio de um funcionário da Alitalia a quem propus que fizesse vista grossa e nos desse passagens diretas até Roma, o que ele recusou, escandalizando-se. Finalmente conseguimos as passagens diretas, graças ao representante da Varig na Argentina, um ítalo-brasileiro robusto e cordial".

"Nossa premissa era evitar que fossem interrogados no Rio, porque ali possivelmente havia gente do aparato de inteligência militar, e minha função era estar junto a eles para fazer valer minha condição de diplomata denunciando um eventual sequestro, como ocorreria em 1980 com o ítalo-argentino Domingo Campiglia, capturado precisamente no Rio de Janeiro" conta Calamai, com o rigor próprio d e um historiador.

"Eles não podiam permanecer em Buenos Aires, mas por sua vez tinham que atravessar o cerco da Operação Condor no Rio, a única forma para que chegassem com vida à Itália".

A resistência à ditadura havia sido fraturada militarmente em 1977, ano de intenso intercâmbio entre os serviços de inteligência dos ditadores Ernesto Geisel e Jorge Videla.

Documentos a que Carta Maior teve acesso, datados daquele ano, confirmam a prioridade dada por Brasília à localização e detenção de "elementos Montoneros e do ERP (Exército Revolucionário do Povo)", para serem entregues à Buenos Aires.

Os aparelhos repressivos trabalhavam em notável sintonia. Tanto que as agências de inteligência brasileiras recebiam informações sobre as atividades da resistência argentina na Itália.

Dentro da documentação até agora secreta, obtida por Carta Maior, consta um dossiê do Estado Maior do Exército brasi leiro, originado na Itália em junho de 1978, intitulado como “Movimento Peronista Montonero no exterior, Acionar, Contatos, Conexões com Grupos Terroristas, Antecedentes”.

CONSPIRAÇÃO DIPLOMATICA
As centenas de argentinos que escaparam do genocídio graças ao trabalho de Calamai não lhe valeram muito para obter uma promoção em sua carreira diplomática, dado que após haver trabalhado cinco anos na Argentina, um destino considerado de relativa importância, foi enviado a outro considerado irrelevante: o Nepal.

Diferente foi a sorte do embaixador brasileiro João Batista Pinheiro que, após seus bons ofícios diante da Junta Militar portenha, foi promovido a chefe da missão diplomática em Washington.

Pouco depois da derrubada do governo civil argentino, Pinheiro trabalhou para que Geisel enviasse, em abril de 1977, um representante a Buenos Aires, um gesto crucial para Videla, que temia sofrer o isolamento d iplomático do qual padecia seu colega chileno Augusto Pinochet.

"Até agora não se estudou a fundo como atuaram os serviços diplomáticos em geral frente à ditadura", afirma Calamai durante a conversa com a Carta Maior em Roma.

E amplia: "não digo só pela Itália, me refiro à maioria dos países ocidentais, que foram completamente omissos ante as violações dos direitos humanos na Argentina".

Como nos pactos mafiosos, o grosso dos diplomáticos instalados em Buenos Aires, salvo os da embaixada do México, onde o ex-presidente democrático Héctor Cámpora recebeu refúgio durante anos, optou por omitir-se.

"Direta ou indiretamente, as principais embaixadas, inclusive aqui as da Itália, e acho lógico que também a do Brasil, embora não tenho informação concreta, foram informadas de que viria o golpe de Estado".

"Estes avisos sobre a eminente derrubada do governo civil eram também uma forma de advertir que não aceitariam que as embaixadas recebessem refugiados, como havia feito nossa embaixada e outras depois do golpe do Chile. E quase todos os países que receberam o aviso dos militares argentinos, pelo visto, entenderam o recado e o aceitaram".

"Agora, com o passar do tempo, compreendo que em torno da Operação Condor havia uma colaboração estreita das embaixadas e dos militares argentinos, e das embaixadas e seus próprios agregados militares. A diplomacia é algo muito próximo ao poder, e o foi durante as ditaduras, os diplomatas sabem que se se opuserem ao poder serão ou marginalizados, ou eliminados. Nessa época isto era um risco real".

SANTA CUMPLICIDADE
Antes da entrevista, Calamai nos mostra o Antico Café do Brasile, a poucos metros de sua casa: "antes de ser papa, João Paulo II, quando era seminarista, vinha habitualmente a este café, é um lugar simples, como podem ver".

As exéquias de João Paulo I, antecessor do papa polaco que frequentava o bairro de Calamai, foram um pretexto para estreitar as relações entre o Vaticano e Videla, que foi um dos chefes de Estado convidados. As gestões para a viagem de Videla e seu encontro com o então primeiro ministro italiano, foram realizadas pela loja maçônica Propaganda Due (P2), segundo consta em um livro lançado este ano na Universidade Roma Três.

"A loja P2 se movia como um poder oculto e gozava de uma notável influência no serviço exterior italiano e no Vaticano, e um de seus principais homens, Licio Gelli, mantinha boas relações na Igreja".

"O Vaticano esteve muito próximo do regime argentino, não só porque coincidia com seu anticomunismo, mas porque contribuía na decisão de Roma de terminar com a teologia da liberação na América Latina. Dizia-se que o núncio apostólico jogava tênis com o almirante (Emilio) Massera", um dos membros da Junta, a quem correspondia o controle do Minis tério do Exterior argentino.

"Mas também é preciso lembrar que os motivos ideológicos que levaram o Vaticano a apoiar os militares eram tão importantes como os interesses econômicos de empresas ligadas à Igreja que estavam radicadas na Argentina".

Estas razões contribuem para explicar, segundo Calamai, porque o Estado do Vaticano omitiu-se durante anos em denunciar o genocídio argentino e negou ajuda aos familiares dos desaparecidos e prisioneiros.

"Existem muitas coisas que escaparam da minha memória, mas o que lembro é que, quando falava com diplomatas de outros países sobre as violações dos direitos humanos, praticamente todo mundo dizia que ninguém ia à Nunciatura porque não os recebiam".
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MEIO AMBIENTE »   Técnica indígena para preservar a Amazônia. CORREIO BSB 18.04
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Queimada na Amazônia atualmente: técnica nociva à qualidade do solo

O desmatamento da Amazônia é um tema cercado de polêmicas. Enquanto alguns lutam pela preservação da floresta, há quem defenda que a ocupação é inevitável, visto o crescimento populacional e a maior demanda por alimentos. No meio do fogo cruzado, algumas iniciativas buscam formas de utilizar a floresta de maneira sustentável. Um estudo feito por arqueólogos e paleontologistas da Universidade de Exeter, no Reino Unido, encontra no passado uma alternativa para o futuro: segundo os pesquisadores, técnicas antigas usadas por índios antes da chegada dos europeus podem ser a resposta para produzir e criar animais sem a necessidade de usar o fogo para preparar a terra — método que faz com que os compostos orgânicos, necessários para a manutenção da região, virem pó.

A pesquisa, publicada na edição deste mês da revista especializada Proceedings of National Academy of Sciences (PNAS), analisou registros de carvão vegetal, pólen e fitólitos (pedras que apresentam vestígios de plantas) com mais de 2 mil anos de idade para mostrar como tribos indígenas que ocupavam as savanas amazônicas da Guiana Francesa plantavam sem comprometer a terra. Isso era possível graças à técnica de campos elevados, usada no cultivo de terrenos alagadiços.

Os índios faziam montes de terra de tamanhos e formas diferentes e construíam pequenos canais ao redor deles. Quando acontecia uma cheia, a água era drenada pelas depressões, impedindo que as plantações ficassem submersas. Uma vez preenchido o canal, a água se elevava apenas o suficiente para a irrigação das plantas. Ao mesmo tempo, nutriente e vegetais aquáticos em decomposição transformam-se em um “adubo verde”. O estudo sugere que, ao contrário do que se imaginava, o uso do fogo para limpar a mata pode ter sido adotado apenas após a chegada dos europeus, em 1492.

Tendência
Eleazar Volpato, professor do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade de Brasília (UnB), diz que, apesar de parecer primitiva, a técnica incorpora vários elementos modernos. “O que se vê hoje em dia são agriculturas voltadas para incorporar material orgânico no solo, como o plantio direto e agricultura de baixo carbono”, enumera. Além de conservar os nutrientes da terra, essas modalidades de plantio visam a aproveitar a biomassa e incorporá-la no ambiente. Apesar de mais sustentáveis e produtivos, os processos naturais são mais demorados. “Hoje em dia, tudo se analisa do ponto de vista econômico, então, teríamos que estudar a viabilidade desses métodos em grande escala”, pondera Volpato.

Para Ciro Rosolem, professor titular da Faculdade de Ciência Agronômica da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Botucatu, antes de se discutir métodos para a preservação da Floresta Amazônica, é necessário analisar se o espaço deve mesmo ser preservado a todo custo. “Ninguém tem certeza se a floresta precisa ser preservada ou como fazer isso, o que existe são conjecturas”, afirma. Rosolem, que também é membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), defende que, com o crescimento populacional, deve-se pensar em formas de produzir mais alimentos da melhor forma possível. “A diferença para a época dos índios é que temos mais gente com hábitos alimentares diferentes. Precisamos estudar qual o mínimo a ser preservado, fazer um esforço mundial de zoneamento ecológico.”
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50 anos de liberdade e clandestinidade na UnB: A primeira assembleia, a gente nunca esquece
Luiz Motta. www.unb.br 17/04
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-No final da década de 70, o país vivia sob forte repressão da ditadura militar. Na UnB havia um clima de medo e tensão. As reuniões no campus estavam proibidas. Havia espiões espreitando corredores e salas de aula, prontos para denunciar. Todos suspeitavam de todos. Só nos abríamos com pessoas de muita confiança. Professor denunciado respondia a IPM, podia ser demitido e teria dificuldade para encontrar novo trabalho. Todo cuidado era pouco. Na UnB, os professores eram permanentemente vigiados. O medo estava impregnado em cada um. A face mais cruel da repressão era a desconfiança generalizada. Nessas circunstâncias, era quase impossível se organizar resistência fora da clandestinidade.  

Receoso, eu caminhava pelo corredor superior do mezanino do ICC-Su. De onde estava, podia observar o Anfiteatro 11 e avaliar o clima político no local. Ali deveria acontecer a primeira reunião de docentes no campus da Universidade de Brasília, a fim de criar uma associação de docentes, até então proibida. Todos os pedidos de um local no ICC para fazer a reunião  haviam sido negados pela reitoria. O reitor era um capitão-de-fragata da Marinha brasileira, assessorado por um coronel do Exército. Sozinhos, administravam a UnB com mão de ferro, decidiam tudo. Órgãos colegiados não funcionavam. Quando existiam, era só fachada, não detinham nenhum poder. Entidades de classe estavam proibidas, greves eram violentamente reprimidas. Eleições no campus, nem pensar.

Eu acabara de defender meu doutorado nos Estados Unidos e fui indicado pelos colegas diretor de minha faculdade. Isso me deixava na corda bamba. Meu ativismo político poderia prejudicar minha unidade. O reitor-capitão era senhor absoluto do campus, apoiado por forte serviço de informação. Ele não tinha nenhum pudor em perseguir quem o contrariava. Sabia de tudo, acompanhava cada passo dos professores, alunos e funcionários. Tinha informações até sobre nossas vidas privadas. Arapongas travestidos de alunos eram misteriosamente ‘transferidos’ para todas as unidades, sem passar pelo vestibular ou colegiados. A presença deles constrangia o ambiente acadêmico.

Era difícil organizar entidades de resistência política. As pessoas evitavam contatos, se fechavam. A paúra se generalizara. Discretamente, um grupo mais determinado distribuiu panfletos convocando a primeira assembleia de professores no campus. Não tínhamos ideia se haveria número suficiente para legitimar a nova entidade. Na USP, os professores haviam recém criado uma associação docente. Isso nos animava. Era imperativo criar uma entidade similar na UnB. Mas, em outras universidades federais, iniciativas semelhantes fracassaram. Professores foram perseguidos e demitidos. Era preciso coragem para dar o primeiro passo.

Havíamos nos reunidos clandestinamente em casas de alguns de nós. Sempre à noite, para não chamar a atenção. Éramos apenas dez ou doze, em uma universidade que naquela época tinha menos de 500 professores. Uma turma corajosa. A primeira reunião foi na casa do prof. João Hirson, da Geologia. A segunda, do pintor Douglas Marques de Sá, do Desenho. A seguinte, na casa do Leandro Amaral, da Economia. E assim as reuniões foram se sucedendo. Combinávamos estacionar nossos carros em quadras diferentes e seguir a pé até o local do encontro, para não deixar pistas.1 Contando hoje, parece lenda.

Naquela manhã, passei assoviando no mezanino sul, fingindo olhar para o céu. Mas, com o canto dos olhos, verifiquei que outros professores se aproximavam. Na porta do anfiteatro havia um aglomerado de funcionários. Eram todos informantes. Nós conhecíamos alguns, déramos até apelidos a eles: tinha o Arroz de festa, o Aqui agora e outros. A presença ostensiva deles nos intimidava. Percebi que, como eu, outros professores espiavam disfarçadamente, como quem não quer nada.

Alguém tomou coragem e se dirigiu ao Anf 11. Como uma palavra de ordem, outros fizeram o mesmo gesto. Fomos chegando, nos cumprimentando. Os que espreitavam de longe tomaram coragem. Gente que ninguém esperava, apareceu. Logo, éramos 20, 30, 50 determinados. Como num passe de mágica, aquele ato simples nos revelou que a UnB era nossa casa, nos pertencia. Vencendo o medo, demos então início à primeira assembleia de docentes no campus da UnB, desafiando abertamente o autoritarismo.

Havíamos dado um passo importante para conquistar a liberdade no campus. A partir daquela assembleia, não tínhamos mais receio de mostrar a cara. Da clandestinidade para a liberdade. A associação docente foi criada dois meses depois, em uma assembleia histórica, com mais de 100 professores, na Associação Comercial do Distrito Federal. O colega Fausto Alvim, da Matemática, foi escolhido primeiro presidente.

Mas, na UnB, a repressão continuou ainda por muitos anos conforme mostrou reportagem recente. A minha vida acadêmica se tornou um inferno. Fui impedido de comparecer a eventos no exterior e realizar aqui dois congressos internacionais. Minha unidade passou a ser sistematicamente boicotada. Minha situação acadêmica na UnB ficou insustentável. Acabei me demitindo em 1981 e viajando para o exterior. Outros ficaram e seguiram resistindo. Poucos anos depois, Cristovam Buarque foi o primeiro reitor livremente eleito.

Aquela reunião heroica não sai de minha memória. Lembro-me dela toda vez que busco o fato que mais me marcou nos 40 anos de vida dedicados à UnB. É possível que nomes, dados e datas não sejam precisos, faz muitos anos. Além disso, tudo era primeiro. Como na música de Adoniran Barbosa, ou o anúncio do sutiã, a primeira assembleia, a gente nunca esquece.



1. Além dos citados, frequentavam as primeiras reuniões clandestinas os professores Vladimir Carvalho, José Caruso Moresco Danni, J. Onildo Marini, Luiz Carlos Coutinho, Mauricio Azeredo, José Carlos Balthazar e mais alguns poucos. Muitos se aposentaram, mas outros continuam até hoje dando aulas na UnB.
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 “A UnB é uma obra coletiva”, diz Lauro Morhy.    Ex-dirigente da UnB afirma em entrevista que quer celebração dos 50 anos com consciência e resgate da autonomia. UNB.BR

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Reitor eleito que mais tempo ficou no cargo na Universidade de Brasília, de 1997 a 2005, Lauro Morhy é um apaixonado por livros. Chegou a ter 19 mil volumes no apartamento onde recebeu a UnB Agência para entrevista que integra série de conversas com ex-reitores com reflexões sobre o cinquentenário da Universidade. 
Durante quase duas horas, o professor emérito relatou momentos dos mais de 40 anos vividos na UnB e falou da atmosfera que envolve o jubileu da instituição. Lauro Morhy implantou o Programa de Avaliação Seriada da UnB, forma de ingresso pioneira e que foi difundida no país. Em sua gestão, deu início também à política de cotas para negros e índios e projetou e iniciou a expansão do campus para além do Plano Piloto, começando por Planaltina. “Você não pode fazer planos apenas com sonhos e intenções, sem conhecer os números”, disse. 
UnB Agência: Em sua página na internet, o senhor exibe o pensamento de que “o destino de todo vendaval é o mesmo: passar”. O senhor presenciou muitos vendavais na universidade?
Lauro Morhy: Essa é uma frase de sabedoria da humanidade. Não recordo o nome do autor. Uma instituição como a UnB sempre passa por muitas situações difíceis. A gente se esforça por superá-las. Acho que todos os reitores atravessaram alguma dificuldade. Considero que a UnB é uma obra coletiva e cada um deu a sua contribuição.
UnB Agência: O golpe e a ditadura militar foram os momentos mais tristes da história da UnB?
Lauro Morhy: Acho que sim, embora tivéssemos outras crises políticas que não precisávamos ter passado. Ainda não é hora de conversar sobre esse assunto, mas em algum momento ele será retomado, em alto nível de paz e construção.
UnB Agência: A gestão do senhor foi marcada pela transição política entre o último mandato de Fernando Henrique Cardoso e o primeiro de Luís Inácio Lula da Silva. As mudanças trouxeram impacto para a administração?
Lauro Morhy: Sim. Quando um governo está de saída, ele procura não se envolver com muita coisa. E o governo que está entrando está em período de aprendizagem, montando equipes. Esses foram pontos negativos para nós nos dois governos. Mesmo assim, conseguimos fazer muito.
UnB Agência: O que destacaria como legado de sua administração?
Lauro Morhy: Tivemos a preocupação especial em cultivar e aplicar um pensamento político-estratégico de longo prazo, não com uma gestão pessoal, e sim com o futuro da universidade e da sociedade brasileira. É aquela história: há o gestor público que trabalha como governista e aquele que trabalha como estadista. Sem maiores pretensões, diria que nos esforçamos para trabalhar mais como estadistas.
UnB Agência: Quais foram as principais resistências para a implantação do programa de cotas?
Lauro Morhy: Havia dificuldades políticas internas e externas de todos os lados. Levei chumbo e até hoje levo. A decisão foi da comunidade, dos conselhos. Só penso que o pessoal deve administrar essa experiência como foi inicialmente prometido: cientificamente. Não deixar que isso vire apenas uma bandeira sentimental ou político-partidária. É um assunto que requer atenção especial e respeito.
UnB Agência: Nos últimos anos a Universidade cresceu muito e tornou-se multicampi. Para o senhor, agora, qual é o desafio?
Lauro Morhy: Para mim, o grande foco sempre foi aliar o crescimento à qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão. Não há sentido apenas em levantar paredes, edificações e comprar aparelhos. Tudo isso é para viabilizar a pesquisa e o ensino. É muito importante que as pessoas priorizem essa questão. Qualidade é a preocupação número um, o que inclui docentes com espírito de cidadania elevada, preparados não somente para o ensino, mas para a criação e a inovação.
UnB Agência: A expansão da UnB está no caminho certo?
Lauro Morhy: Para se pensar realmente na democratização e deselitização da universidade, a expansão é importante. Comecei a expansão com o pé no chão. O plano de implantação previa menos cursos, com aulas por videoconferência, e um esquema de apoio até que os cursos fossem se consolidando. Depois, houve uma aceleração grande demais, a qual supus fosse ser acompanhada de grandes recursos. Parece que não vieram tantos assim. Acho que houve certo descuido com uma expansão rápida demais. Confio que tudo entrará no ritmo e com os resultados devidos.
UnB Agência: O que o senhor vislumbra para o futuro da Universidade?
Lauro Morhy: A universidade são as pessoas que estão nela. Se as pessoas que estão nela hoje são negativas ou negativistas, a universidade infelizmente ficará assim por um tempo. Até que apareçam pessoas otimistas e que trabalhem com afinco. Nada resiste à vontade e ao trabalho. Sempre disse isso aos meus alunos.
UnB Agência: O que representa o cinquentenário da UnB para o senhor?
Lauro Morhy: É um momento festivo, sobretudo de reflexão. É um momento que exige de cada um de nós uma análise do quadro local, nacional e mundial. Requer também um repensar sobre o que seja uma universidade localizada na capital da República, no centro da América do Sul e com influência sobre países vizinhos. Todos esses fatores devem ser considerados neste período. Isso inclui uma verdadeira autonomia universitária, perdida ao longo das últimas décadas por imposição de leis, decretos e por uma parafernália de decisões burocráticas.
UnB Agência: Como o senhor diria parabéns à universidade, caso ela se personificasse?
Lauro Morhy: Eu diria parabéns e desejo que conquiste autonomia, ao menos aquela que lhe foi tirada. Diria que renove a esperança, o otimismo e reflita sobre o que foi, o que é e o que deve ser, pensando estrategicamente. Que haja uma reflexão profunda sobre tudo isso. Se possível, de modo unificado, suprapartidário e com grande coalizão de pessoas e idéias. Acho que as pessoas devem buscar a unificação e remar para o mesmo lado.
UnB Agência: Que lado é esse?
Lauro Morhy: O caminho da inovação e da realidade, que é dura. A realidade da vida é dura e temos que enfrentá-la. Não é possível que uma instituição fique voltada para ela mesma. A Universidade só tem sentido se pensar grande e estrategicamente, com a inteligência que cria e soma. Além dos sonhos, com uma renovada Alma Mater. Esse termo latino significa literalmente mãe que alimenta e é muito utilizado no meio acadêmico e está ligado ao papel da universidade.


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Literatura.  Em berço esplêndido
Marcada por superlativos, 1ª Bienal Brasil do Livro e da Leitura, encerrada na segunda-feira, se credencia entre os maiores eventos literários do País. O POPULAR GO 25.04

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Nunca a expressão festa literária fez tanto sentido. A 1ª Bienal Brasil do Livro e da Leitura, encerrada na noite de segunda-feira em Brasília, foi a principal atração do aniversário de 52 anos da capital do País, celebrado no sábado, dia 21. Durante dez dias, o evento reuniu mais de 100 autores de todos os continentes para discutir literatura e contemporaneidade. O escritor nigeriano Wole Soyinka, Prêmio Nobel de Literatura 1986, e o cartunista Ziraldo foram os grandes homenageados do evento.

No sábado, dia principal do evento, as atrações literárias disputaram a atenção dos visitantes com mais de cem eventos simultâneos, entre eles campeonato de balonismo e shows musicais – Caetano Veloso conseguiu lotar a Esplanada dos Ministérios na noite de domingo. Mas o cardápio tão variado do aniversário de Brasília não conseguiu tirar a atenção da Bienal. O público atendeu ao chamado dos organizadores – governo do Distrito Federal, uma entidade não governamental, o Instituto Terceiro Setor, e empresas privadas – e participou ativamente das palestras, lançamentos de livros, conferências e apresentações culturais.

Pelo menos 500 mil pessoas visitaram a Bienal, montada numa área de 15 mil metros quadrados, no vão entre o Museu da República e a Biblioteca Nacional. Para Luiz Fernando Emediato, coordenador literário da Bienal, era injustificável que Brasília ainda não tivesse uma feira de grande porte, como as de São Paulo, Rio de Janeiro, Londres e Frankfurt. Para ele, o evento em Brasília teve um caráter diferenciado por ter todas as atrações com entrada franca.

Para seminários e conferências mais concorridas, a organização entregava senhas antecipadamente ao público interessado em participar. Nos quatro enormes pavilhões climatizados, editoras das mais variadas vertentes montaram cerca de 150 estandes. A partir de 50 centavos era possível comprar livros. O governo do Distrito Federal, através de cartões, concedeu R$ 80 para 24 mil professores e R$ 40 para 25 mil alunos da rede pública utilizarem na compra de livros. A literatura infantil e as editoras especializadas em livros para concursos tiveram espaço de destaque nos estandes.

Estrelas

Mas foram eles, os autores, as principais estrelas do evento: de Anne Rice a Thalita Rebouças. Em tardes de autógrafos, seminários, palestras e debates, o público pode conhecer de perto e conversar com seus escritores favoritos. Aspirando ser cosmopolita, o evento focou sua atenção na literatura africana e sul-americana, trazendo autores que ainda não tinham visitado o Brasil como a argentina Samanta Schweblin.

Emocionado com a homenagem, na noite de encerrado, Ziraldo disse ter achado exagerados os elogios feitos por todos os participantes da cerimônia. Mas conjecturou, entre risos: “Acho que se todos concordam, eu devo merecer.” Em seu discurso, ele fez um alerta aos pais. “A grande informação está na escrita. Então, pais, não deixem suas crianças conhecerem o computador antes do livro!”


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STJ mantém condenação de advogado acusado de divulgar pornografia infantil na internet. www.stj.jus.br


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CPI do direito autoral acaba com 15 indiciados.  Apuração sobre direito autoral acaba com 15 indiciadosO Estado de S. Paulo - 25/04/2012
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A CPI do Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), que investigou no Senado, durante um ano, o órgão de controle de direitos autorais, recomendou ontem o indiciamento de 15 pessoas por irregularidades. O dirigente do Ecad, José Antônio Perdomo Correa, encabeça a lista de pessoas apontadas pela CPI por supostas práticas de crimes de falsidade ideológica, apropriação i ndébita, agiotagem e crime contra a ordem econômica. O relator da comissão, senador Lindbergh Farias (PT-RJ), propôs também a criação de um órgão, no Ministério da Justiça, para fiscalizar o Ecad. Pela manhã, a ministra da Cultura, Ana de Hollanda, defendeu em uma audiência pública no Senado a criação de um órgão semelhante, mas ligado à sua pasta. A disputa, no âmbito do próprio governo e entre seus aliados, está deflagrada. Em entrevista após apresentar o relatório final da CPI, o senador Lindbergh Farias disse que a questão é econômica. " O Ecad é uma estrutura poderosa. Não podemos deixar que seja controlado por um ministério com orçamento menor", afirmou. "Vou tentar convencer a ministra Ana de Hollanda e a Casa Civil de que a melhor alternativa é criar esse órgão no âmbito do Ministério da Justiça, que já trata de questões como defesa do consumidor e concorrência." Ana de Hollanda evitou  comentar os indiciamentos da CPI. Ao deixar a audiência, questionada sobre os possíveis pedidos de indiciamento, ela respondeu que não se anteciparia à apresentação do texto, já disponível na internet, e que o assunto era do Senado. Criticada por setores da cultura e do governo, que veem um certo marasmo na pasta, a ministra levou à audiência no Senado pelo menos 30 assessores e funcionários do gabinete, que formaram uma claque para aplaudi-la. O senador Randolph Rodrigues (PPS-AP) tornou-se alvo da claque, por questionar a ministra. "Estou aqui em minoria, não trouxe pessoas para me aplaudir", ironizou o senador.

Cartel. Em 2010, segundo a CPI, o Ecad distribuiu R$ 346,5 milhões para 88 mil autores. Outros 254 mil autores cadastrados pelo órgão, no entanto, nada receberam. Em 2011, a arrecadação do órgão chegou a R$ 540,5 milhões. Os dirigentes do Ecad são ligados a gravadoras, ressalta a CPI. A estrutura do escritório, na avaliação dos senadores, funciona como um cartel, definindo preços. Para o relator, a burocracia na entidade, criada em 1973, favoreceu uma indústria paralela de escritórios de advocacia que atuam principalmente para autores de músicas em busca de direitos. A entidade é controlada por nove associações da área musical, mas só seis têm direito a voto. Ao longo do tempo, o Ecad perdeu a representatividade e passou a ser controlado por poucas pessoas, sem rotatividade, destaca o relatório final da CPI.

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Qualidade dos serviços públicos: qual a agenda?    Valor Econômico - 25/04/2012
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É recorrente a indignação face à baixa qualidade dos serviços públicos sociais no Brasil tendo em vista a elevada carga fiscal - mais de um terço do Produto Interno Bruto (PIB) - do país. No artigo "Esclarecendo o Debate Fiscal" (Valor, 6/2/2012), Mansueto Almeida afirma que esses serviços "estão aquém do desejável". No livro "Brasil: A Nova Agenda Social", de 2011, Edmar Bacha e Alexandre Schwartzman falam em níveis de atendimento do setor "precários do ponto de vista de uma sociedade moderna". Por que os serviços públicos sociais não melhoram apesar da forte pressão da opinião pública? Serão eles estruturalmente imprestáveis? Obviamente que não. Na realidade, as críticas difundem uma visão responsável, porém simplificada das múltiplas e complexas funções do setor social do país que condicionam o seu papel na prestação adequada de serviços públicos.

A maioria das análises não esclarece que os governos têm prioridades e escolhas em relação aos tipos de intervenção social. A literatura da economia do bem-estar social tem o cuidado de separar as instituições de política social em duas grandes modalidades: transferência de renda e prestação de serviços. Aplicando a tipologia ao Brasil, na primeira modalidade ficam as instituições que concentram as despesas governamentais destinadas à previdência social, Bolsa Família, LOAS, seguro-desemprego e abono salarial. Na segunda, as instituições das áreas associadas à prestação direta de serviços em hospitais, ambulatórios, postos de saúde, escolas, universidades, etc. Os dados na tabela mostram que a última década tem consolidado e ampliado o padrão de intervenção social na modalidade "transferência de renda" em detrimento do financiamento relativo às áreas de prestação de serviços públicos, como saúde e educação. Em 2010, a cada R$ 100 destinados às despesas sociais no governo federal, R$ 81 foram para a transferência de renda monetária. Não pode ser ignorado o constrangimento que a opção preferencial em transferir renda em vez de desenvolver a capacidade organizacional da prestação pública produz sobre a qualidade dos serviços sociais.

A escolha pela entrega de renda monetária direta a aposentados, pensionistas ou familiares contemplados pelo Programa Bolsa Família teve um impacto redistributivo virtuoso e inquestionável. Mas não só isso: a intencional centralização da execução financeira da transferência de renda no governo federal possibilita a geração de dividendos políticos relevantes pela identificação entre o benefício específico - o montante de reais na conta individual do cidadão-eleitor - e o executivo. Essa equação explica porque o executivo federal reivindica ferozmente a paternidade da decisão de criação de novos programas e aumento do valor real das intervenções sociais que transferem renda. O interessante texto de Hunter & Power "Rewarding Lula: Executive Power, Social Policy, and the Brazilian Elections of 2006", que demonstra o ganho eleitoral associado ao Programa Bolsa Família, ratifica esta tese.

Não se pode esquecer, portanto, que a prestação de bons serviços sociais públicos não esteve na agenda de prioridades do governo federal nos anos recentes. Um bom exemplo está no campo da saúde pública: volume de recursos federais destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS) foi proporcionalmente declinante nos últimos anos no âmbito da federação. Causa espanto que o governo federal tenha produzido com enorme sucesso a transferência do ônus do financiamento da área para os governos Estaduais e municipais. Entre 2000 e 2008, a participação percentual do governo federal no financiamento da saúde caiu de 60% para 45,5%. Mesmo assim, no período, o governo incentivou a ampliação da Estratégia de Saúde da Família com menos de 10% dos recursos financeiros do Ministério da Saúde. O ônus real da expansão bem sucedida da atenção primária no Brasil ficou para os municípios! A parte do leão do financiamento federal na saúde ainda é destinada aos hospitais e institutos federais de pesquisa de grande porte e complexidade. Estes permanecem operando na zona de conforto, ou seja, à margem de qualquer avaliação de desempenho e responsabilização nas decisões de prestação de serviços e investimento. A demanda de serviços públicos sociais mais eficientes e de qualidade pode ser menos difusa e inespecífica, olhando com mais rigor a trajetória silenciosa e pouco transparente das grandes organizações federais. Feito esse elementar dever de casa, ainda assim será inevitável a demanda por maior responsabilidade financeira do governo federal com os serviços na área social.

Nilson do Rosário Costa é pesquisador da Fiocruz na área de políticas públicas e saúde.

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