segunda-feira, 16 de abril de 2012


Brasileiros estão próximos do limite de endividamento.  O Estado de S. Paulo - 16/04/2012

 -
Crescimento do crédito se aproxima da variação da massa de salários, indicando riscos para o modelo de crescimento


O endividamento do brasileiro está chegando perto do limite, por causa do ritmo de crescimento da procura por novos empréstimos em relação à massa salarial.

Em 12 meses, até fevereiro, o ritmo de procura por crédito ao consumidor aumentou 8,2%, já descontada a inflação do período. Também até fevereiro, o acréscimo real em 12 meses da massa de salários foi de 5,8%.

Os índices são de uma análise feita pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP), com base em dados de crédito do Banco Central (BC) e da massa de salarial pesquisada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

"O fato de a taxa de crescimento do crédito ter se aproximado da variação da massa de salários indica que o modelo atual de endividamento do consumidor está esgotado", diz o economista da ACSP, Emílio Alfieri, responsável pela análise.

Ele destaca que o crescimento do consumo dos brasileiros daqui para a frente dependerá muito mais da evolução da massa salarial do que do crédito, se não houver redução de juros e alongamento de prazos de financiamento, o que já está sendo testado pelas grandes redes.

O que se pode observar hoje na relação entre a massa salarial e o crédito é exatamente o oposto do que ocorria 12 meses atrás. Em fevereiro de 2011, o crédito era grande alavanca do consumo e crescia a uma taxa real acumulada em 12 meses de 12,2%, que era praticamente o dobro da variação da massa salarial no mesmo período (6,4%).

Não foi sem motivos que, na semana passada, o governo decidiu usar os bancos oficiais para forçar a redução das taxas de juros ao consumidor. Por pressão da presidente Dilma Rousseff, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal passaram a oferecer juros mais baixos que os bancos privados.

Marcelo Carvalho, economista-chefe para América Latina do BNP Paribas, acredita que todas as medidas tomadas pelo governo para impulsionar o consumo, como corte dos juros básicos, do IPI dos eletrodomésticos, além do pacote de estímulo à indústria, vão funcionar. "O risco é que essas medidas funcionem bem de mais e elevem o ritmo de crescimento da economia no segundo semestre deste ano acima do seu potencial, gerando inflação em 2013", alerta.

Segundo ele, os efeitos das medidas de estímulo à atividade não devem aparecer de forma clara neste trimestre. "O segundo trimestre será de transição", diz ele, que projeta crescimento fraco do PIB, de 0,7% entre abril e junho em relação ao trimestre anterior, estimado em 0,8%. Já no terceiro e no último trimestres, a alta deve ser maior, de 1,2% e 1,4%, respectivamente.

>>> 

Entre versos e lembranças. CORREIO BSB 16.04
-
Antes do encontro com o público brasileiro, no sábado, o poeta argentino Juan Gelman aproveitou um pouco o ar fresco do lado de fora do auditório Nelson Rodrigues. Era início de noite, e uma brisa fria já invadia os corredores da Bienal — no dia de abertura da megafesta do livro, cerca de 20 mil pessoas estiveram na Esplanada dos Ministérios. Talvez para se aquecer um pouco, acendeu um cigarro. O escritor, de 81 anos, fala baixinho, é comedido, e conseguiu fazer do bate-papo com o mediador Eric Nepomuceno, que intermedeia todas as mesas de literatura da América hispânica, um diálogo de observações belas e, claro, poéticas. “Gelman é meu amigo há 38 anos. A gente já debateu tudo que tinha para debater”, disse Nepomuceno. “Esta conversa, a gente não preparou. Para o bem ou para o mal, vocês vão poder presenciar uma conversa de dois velhos camaradas.”

O autor teve muito a dizer sobre inspirações criativas e agruras políticas do seu país — ele vive no México há mais de duas décadas e opina com franqueza sobre ditadura e repressão. Mas a mediação foi rarefeita: pouco informativa, às vezes indecisa entre o diálogo e a leitura de obras do convidado. Falando para um auditório ocupado quase pela metade, Gelman contou que os versos chegam até ele de maneira espontânea. Por isso, não acredita em rotina profissional e horário para escrever: a poesia é incontrolável. “Escrevo quando tenho alguma coisa que gira na minha cabeça, que chamo de obsessão. Então, chega um momento em que preciso escrever para saber do que se trata”, revelou.

Gelman admitiu não ser capaz de se sentar, como um operário esforçado das letras, às 7h de um dia qualquer e redigir poemas. “Ninguém pode se propor a escrever poesia. Ela chega quando quer, bate à porta. Ela já deve ter visitado outros amantes. E é preciso recebê-la. Quando ela não quer mais, vai embora”, descreveu. E é sempre a poesia que comanda, dirige, manipula o poeta. Nunca o contrário. “O poema acaba quando abandona o poeta”, explicou.

Ainda sobre a relação vital entre arte e artista, citou Marina Tsvetaeva, autora russa massacrada pelo regime stalinista. Certa vez, ela disse que escrevia para viver, para viver escrevendo. “Existem os poetas que vivem para escrever porque têm grande cultura. E os que escrevem para viver porque não têm outro remédio”, emendou o argentino.

Resistência
O escritor discursou sobre memória e atualidades políticas como um militante contido, mas contundente. “O movimento mais importante da resistência na ditadura foi o das mães da Praça de Maio. Foi a mais sólida, permanente, valente. E esse movimento nunca acabou. As mães que buscam seus filhos têm mudado muitas coisas. Começaram julgamentos que foram congelados durante muito tempo, e os responsáveis ainda estão sendo processados. Aproximadamente 300 estão presos e serão tratados pela Justiça com todos os direitos. Como eles não fizeram”, destacou ele, que também trabalha como colunista em veículos da Argentina e do México.

No país onde nasceu, poesia brasileira e latino-americana andam um pouco esquecidas por leitores e editoras. “Sem demagogia, digo que, infelizmente, se lê muito pouca poesia brasileira. Alguns livros de antologia devem ter sido publicados, há muitos anos. De Drummond, por exemplo. Por que se traduz tantos poetas ingleses, franceses e alemães? Acho que é consequência de um tipo de balcanização na América Latina. É difícil conhecer um poeta chileno ou uruguaio, que está mais próximo. E isso acontece em toda a América Latina. Festivais como esse vêm ajudando a quebrar esse desconhecimento mútuo, penoso”, destacou.

Numa declaração especialmente sensível, Gelman narrou breves histórias sobre o tango. Aos 15, 16 anos, dançava milonga em clubes noturnos, quase todas as noites. “É claro que isso influi em mim de um jeito que não sei definir. Por exemplo, Borges diz que o tango é uma forma de andar. E eu tenho certeza de que é uma forma de conversar corpo a corpo”, contou. Se a moça aceitava, havia dança. Na segunda vez, o contato permanecia silencioso. Apenas no terceiro convite — se aceito —, os dois podiam trocar nomes. “Só na terceira vez, quando os corpos já tinham conversado e entrado em acordo”, complementou.

>>> 

A poesia contra a intolerância.  O nigeriano Wole Soyinka, primeiro negro a receber o Nobel de literatura, critica as nações que travam guerras em nomes de suas crenças. CORREIO BSB 16.04
-
Foi com elegância e uma bela leitura da cultura iorubá que o nigeriano Wole Soyinka, 77 anos, se apropriou do microfone na noite de sábado na 1ª Bienal Brasil do Livro e da Leitura. Depois de uma rápida sessão de autógrafos no Pavilhão da Bienal, na qual lançou a tradução da peça O leão e a joia (Geração Editorial, 152 páginas), o escritor atravessou a pé o Eixo Monumental em direção ao Museu Nacional seguido de membros da Embaixada da Nigéria e conterrâneos vestidos com as tradicionais roupas africanas. Após ser homenageado em ato solene com performance do compositor Renato Matos e do bailarino Júlio César, Soyinka falou durante quase uma hora sobre religião e espiritualidade no mundo contemporâneo.

Professor da Universidade de Loyola, em Los Angeles (EUA), e primeiro negro a receber o Nobel de Literatura, em 1986, o escritor iniciou a palestra com um exemplo poético de como a intolerância religiosa pode cercear a liberdade humana. Soyinka contou como precisou modificar a encenação de um de seus poemas na universidade católica na qual dá aulas porque o canto de um mulá muçulmano fazia parte do roteiro. O escritor convidou representantes de várias religiões para entoarem cantos religiosos típicos e o mulá deveria subir numa torre para realizar as preces a Alá. A universidade não permitiu e o mulá fez a prece do chão mesmo.

O nigeriano fez ainda um paralelo com a Missa dos Quilombos, de autoria de Hamilton Pereira, secretário de Cultura do DF, e Pedro Casaldáliga, proibida pelo Vaticano por conta das divindades africanas representadas no espetáculo. “O orixá representa, para mim, o espírito ecumênico”, afirmou Soyinka. “Costumo olhar a religião de maneira a incluir seu impacto na humanidade. Intolerância dizima nossa humanidade e identidades seculares nos distanciam de nossas identidades.”

Expansão involuntária
As religiões africanas, nas quais o contato direto entre o crente e as divindades é algo presumido, poderiam servir de modelo, segundo o Nobel, para os povos que travam guerras em nomes de suas crenças. “A noção de cruzada ou jihad é inconcebível nessa fé”, disse, lembrando que a expansão das religiões africanas se deu de maneira involuntária, especialmente com as migrações em consequência da escravidão. “Esse exemplo de expansão involuntária oferece a religião como um modelo potencial para as necessidades espirituais daqueles que se perguntam por que tantas estruturas religiosas — principalmente as três que têm primazia (judaísmo, cristianismo e islamismo) — estão impregnadas de intolerância, sangue, ódio e insegurança, evidenciando toda forma de mortalidade como condição básica para sua sobrevivência.”

Antes do discurso, Soyinka foi homenageado com a Medalha da Ordem do Mérito do Legislativo, entregue pelo deputado Patrício (PT-DF), presidente da Câmara Legislativa, que acabou vaiado pelo auditório lotado ao pedir aos brasilienses que se orgulhassem do Legislativo local. O Nobel também recebeu escultura da artista Fátima Bueno, realizada especialmente para presentear os homenageados da Bienal Brasil.

Problemas com a tradução simultânea da palestra de Soyinka levaram parte do púbico a abandonar o auditório. Como o tradutor não completava as frases e as ideias do nigeriano, quem dependia da tradução não conseguiu compreender o discurso. “Foi péssimo”, lamentou a bióloga Claudia Santos. “Uma falta de vergonha trazer um cara tão bom com uma tradução tão ruim.” A engenheira Ana Lucia Moreira só conseguiu entender a fala de Soyinka quando abandonou os fones da tradução. “É inadmissível. Estava pior ouvir a tradução do que ouvir o escritor”, reclamou a moça, que entende um pouco de inglês. Segundo a assessoria do evento, a empresa que fornece os tradutores é nova no mercado e já providenciou outro profissional para fazer a tradução do inglês nas próximas palestras.
>>>> 
PAU BRASIL.  Índios invadem cinco fazendas na Bahia e fazem cerca de 20 reféns. FOLHA SP 16.04
-
DE SÃO PAULO - Índios da tribo pataxó-hã-hã-hãe invadiram cinco fazendas do município de Pau Brasil (sul da Bahia) na manhã de ontem, fazendo cerca de 20 funcionários reféns, segundo a Polícia Civil.

Algumas pessoas foram amarradas a árvores e houve troca de tiros entre índios e seguranças das propriedades, de acordo com o delegado Francesco da Silva Santana. Não há registro de feridos.

Santana afirmou que os índios da tribo cobram que o STF (Supremo Tribunal Federal) determine a retirada de fazendeiros da área.

O caso está no STF desde 1983. Os índios pedem a nulidade dos títulos de proprietários de terras em Pau Brasil e outros municípios.

"Aqui existe uma guerra agrária", disse o delegado. De acordo com ele, outras duas fazendas foram invadidas no último sábado no município vizinho de Itaju do Colônia (546 km de Salvador).

O investigador Sagro de Morais Bonfim disse que os índios já invadiram 55 fazendas da região desde fevereiro.

A Polícia Civil e a Polícia Militar afirmaram que não podem ir à área de conflito até a chegada da Polícia Federal. A PF em Ilhéus foi acionada, mas até a noite de ontem não havia chegado ao local.

Até o fechamento desta edição, reportagem não havia conseguido localizar representantes dos índios.
>>> 
Portinari e uma corrente familiar de fãs.  “Meus avós e também meu pai, pelo visto, eram fãs do pintor”. O POPULAR/GO  16.04
-
Guerra e Paz, de Portinari, está viajando pelo Brasil. Tomara que passe por Goiânia e ninguém perca a chance de ver essa obra-prima. Doada pelo governo brasileiro à ONU, em 1957, ela agora está de volta ao País para ser apresentada em várias capitais, aproveitando a reforma do salão onde está alojada em Nova York.

São dois enormes painéis: um sobre a guerra, o outro sobre a paz, nos quais Portinari trabalhou por quatro anos. Na exposição – aliás, muito bem montada –, os painéis são acompanhados por um pequeno filme e cerca de uma centena de estudos, alguns praticamente quadros prontos. Esse, que é um dos nossos maiores artistas, paulista do interior, começou a pintar desde jovem e dedicou sua pintura as grandes temas sociais. Morreu intoxicado pelo chumbo das tintas que usava.

Portinari foi o primeiro pintor do qual eu soube o nome.

Havia duas reproduções de suas gravuras na sala de jantar de minha avó, em Jaraguá. Ficavam penduradas na parede branca atrás da grande mesa das refeições das férias, e eu as via no almoço e no jantar: uma, a reprodução de seu célebre quadro dos colhedores de café, e a outra, do mestiço. Eram figuras fortes, robustas, em cores que me pareciam tender mais para o escuro. Guardei-as na lembrança, embora a casa hoje não exista mais e muito menos, suponho, essas reproduções emolduradas da maneira mais simples possível por um fio de madeira escura, e que nunca soube de onde vieram, provavelmente de alguma viagem dos meus avós a São Paulo.

Também ainda menina, quando meu pai levou a família pela primeira vez a Belo Horizonte, um dos nossos passeios foi conhecer a igreja azul da Pampulha, e outras obras de Portinari pela cidade. Meus avós e também meu pai, pelo visto, eram fãs do pintor. E não tardei a me tornar também outra fã: seus trabalhadores, cafezais, retirantes, suas crianças, sua visão colorida do nosso País fizeram desse pintor genial um dos meus preferidos.

Agora vejo com gosto que a corrente de admiração por Portinari continua na família, e minha filha também é fã: foi ela que, passando uns dias conosco em São Paulo, nos chamou para ver a exposição e nos salvou do sério risco causada por uma estranha inércia que às vezes se abate sobre uma metrópole, criando a ilusão em seus moradores de que suas maravilhosas atrações ficarão ad aeternum à espera (já perdemos coisas imperdíveis atacada por essa síndrome). A exposição em São Paulo estava nos seus últimos dias – e não havíamos percebido isso. Felizmente, desta vez, evitamos o crime de perder a oportunidade de ver esses emocionantes painéis. E pude ler no folheto da exposição, essa declaração de um gênio brasileiro:

“... uma pintura que não fala ao coração não é arte, porque só ele a entende. Só o coração nos poderá tornar melhores e é essa a grande função da Arte. Não conheço nenhuma grande Arte que não esteja intimamente ligada ao povo.”
>> 
Literatura e cinema  » PEDRO JORGE DE CASTRO.  Doutor em comunicação e artes, é cineasta e diretor do Instituto Animatógrafo de Comunicação CORREIO BSB 16.04


-
Estabelecer vínculos entre cinema e literatura não é difícil — o processo de ambos é idêntico, um processo criativo que envolve a intuição, a imaginação e a expressão de determinadas cargas significativas cuja apresentação do real se dá pela via estética. As diferenças são formais, estão nas possibilidades e natureza técnica dos dois processos.

O cinema abarca várias outras artes, inclusive a literatura desde o início, a partir da forma textual do roteiro escrito, que, por seu turno, tem a base em uma sinopse — que pode ter vindo de um conto, de um romance ou uma ideia esboçada textualmente.

A narrativa cinematográfica incorporou muito dos recursos da literatura ao longo da própria evolução, haja vista o exemplo de Resnais, que fez da descontinuidade e da antilinearidade sua marca de construção narrativa inspirada em Semprun, e Luchino Visconti, que teve 80% de sua obra gerada a partir de matrizes literárias. Mais recentemente os cineastas italianos Paolo e Vittorio Taviani devem sua filmografia mais atual a Tolstoi (O padre Sergio — Noites com sol) e a Pirandello (Kaos — Episódios e A gargalhada). Antes eles fizeram Pai Patrão (Gavino Leda).

E pra nós a literatura, principalmente a de ambientação rural, deu o melhor do nosso cinema. De Graciliano Ramos, Nelson Pereira dos Santos foi buscar Vidas secas e Memórias do cárcere; Walter Lima Júnior foi buscar Menino de engenho em de José Lins do Rêgo, e Inocência, em Visconde de Taunay. Leon Hirszman também se valeu de Graciliano Ramos e fez São Bernardo. Eu mesmo visitei Hermann Lima e fiz Tigipió — Uma história de amor e honra. Em Jorge Amado o cinema também encontrou Dona Flor e seus dois maridos e Gabriela cravo e canela, ambos de Bruno Barreto, além de outros. A televisão também bebeu nessa fonte.

O cinema é caracteristicamente homogêneo e abarcador de outras artes — mas a mais cinematográfica delas talvez seja a arte de construir o tempo. No cinema encontramos a inclusão de música, mímica, teatro etc. A tudo isso se junta a cultura da fala, que, antes de a imagem ser traduzida em representações na tela, foi representada por palavras no papel. É a questão do caminho mais fácil para se expressar.

Esse é o grande desafio da transmutação da literatura para o cinema, que o leigo chama de adaptação. Adaptação permitiria que o livro continuasse sendo livro adaptado, porém adaptado para servir a quê, permanecendo livro? Utilizamos o termo transmutação, pois significa mudança de gênero, passaria a ser cinema. Por tudo isso é que o roteiro é uma obra independente com influências de substâncias e com ensejamentos cinematográficos ainda expressos em termos literários. Roteiro não é cinema. Se fosse, o livro Dona Benta seria um belo banquete. Ambos são literatura, embora com intenções próprias

Ao conjugar diversas artes em função de sua criatividade particular, o cinema dilata as possibilidades do fenômeno literário complementando-o e ampliando-o em sua gama de significações, de possibilidades significativas. Quando nos aproximamos da natureza literária, sem esquecer a literatura, podemos nos indagar: quais as características da prática do diálogo na literatura? Estamos supondo que ela é fundamentalmente construída por palavras, inclusive para a descrição do clima onde se desenvolve o diálogo. Até as intervenções sonoras, extratexto, são descritas ou evocadas pelas palavras.

Quando pensamos na prática dialogal no cinema podemos lançar mão inclusive da “palavra não pronunciada” pela personagem e as interferências sonoras extratexto constroem o espaço dramático.

No cinema o silêncio “fala” e se lhe atribui o sentido da afirmação, da negação, do consentimento do perdão, da culpa, do desejo e de todo um repertório de significados. Podemos recorrer ainda ao artifício da personagem ausente, ainda que ele esteja no mesmo espaço cênico, mas está fora de cena e se torna presente, sem aparecer, pelo olhar no seu rumo, daquele que está em tela. Na gíria do set cinematográfico, dizemos que a fala no cinema tem não só o estado da alma da personagem, mas também os olhos, os lábios e as mãos. O cinema, de arte subalterna, passou para expressão autônoma e foi capaz de inventar códigos e técnicas novas impossíveis para a literatura.

Nenhum comentário: