terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Vigilância privada

Fonte: folha.uol.com.br 10/02 (EDITORIAL)



Proposta de disciplinar ação de vigilantes ressalta falhas do poder público na área de segurança, apesar de avanços registrados nos últimos anos

Há tempos que vigilantes de rua, com suas guaritas, motocicletas, automóveis ou simples cadeiras sobre as calçadas, tornaram-se personagens comuns na paisagem urbana.
É preciso regulamentá-los e conectá-los à polícia, diz o delegado paulista, que parece ter visto no episódio uma oportunidade para terceirizar a ampliação da rede "pública" de vigilância.
Conceitualmente, trata-se de uma impotência sobreposta a outra. Incapaz de garantir a segurança aos cidadãos, o Estado convive com a proliferação de serviços privados; num segundo momento, desperta e dispõe-se a oficializar o que não deveria existir, caso os impostos pagos pelos contribuintes tivessem sido usados com a necessária eficiência.

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Oposição no Brasil é "pobre", diz CNI

Fonte: folha.uol.com.br 14/02



Robson Andrade, presidente da confederação da indústria, critica políticos que pedem salário mínimo de R$ 600

Alinhado com a gestão Dilma, empresário diz que insistência por salário mínimo maior não beneficia o país

O presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Robson Braga de Andrade, disse que a oposição no Brasil é "pobre" e que "não é responsável". Andrade aceitou fugir de temas como câmbio, juros e tributos ao ver o embate no Congresso Nacional em relação ao novo salário mínimo.
De acordo com ele, a exigência da oposição para um mínimo maior do que R$ 545 não é benéfica para o país e representa impacto direto no gasto público. Andrade avalia que a oposição tem usado o tema para criar "embaraços" ao novo governo.
"Vejo, muitas vezes, uma oposição pobre, querendo apenas criar embaraços e dificultar a implantação de projetos que são importantes para o país", disse durante entrevista exclusiva à Folha.
Andrade também falou sobre inflação e risco de desindustrialização.


Folha - A CNI está preocupada com a volta da inflação?
Robson Andrade - Acho que o país tem mecanismos de controle da inflação. Mas esse controle tem sido só de responsabilidade do Banco Central, cuja única ferramenta é a alta de juros. Funciona, mas contrai crescimento. A outra forma é a redução do gasto público. É o que tenho ouvido do ministro [da Fazenda] Guido Mantega e da presidente Dilma [Rousseff].

Os governos têm prometido cortes de gasto há muito, sem êxito. O sr. acredita que agora conseguirá?
Acredito, mas não ouvi isso muitas vezes. No governo passado, não lembro ter ouvido. No governo anterior, ouvi, mas não foi feito. Agora há uma indicação de mudanças. O governo disse que não vai aceitar salário mínimo maior do que R$ 545. O Congresso precisa ser responsável e aprová-lo. Não faz sentido a oposição ficar discutindo um mínimo de R$ 600, que vai lembrar o [José] Serra. [No 2º turno, Serra prometeu R$ 600 se eleito].

Um mínimo maior afeta a indústria?
A indústria já paga salário mais do que o mínimo. O impacto do salário mínimo é sobre a Previdência e as prefeituras. O governo não vai aceitar um salário mínimo maior do que esse. Por que o Congresso Nacional, que deveria estar defendendo a economia brasileira, está falando em salário mínimo de R$ 600?

Por quê?
Porque a oposição no Brasil não é uma oposição responsável.

O sr. classifica a oposição como irresponsável?
Não vou dizer irresponsável. Vou classificar assim: essa postura da oposição não é benéfica para o país. Eu acho que o papel de uma oposição é a de apoiar os bons projetos e de criticar de maneira positiva aqueles que não são bons para o país, mas apresentar propostas que sejam adequadas. Vou dar um exemplo. O governo FHC fez força e aprovou o fator previdenciário. No governo Lula, o PSDB foi contra o fator previdenciário. Ora, o fator previdenciário é bom ou não? É bom no governo FHC e não é bom no governo Lula?

Falta coerência?
Faltou coerência. Vejo, muitas vezes, uma oposição pobre, querendo apenas criar embaraços e dificultar a implantação de projetos que são importantes para o país. Enquanto ela deveria estar numa altura muito mais elevada para discutir profundamente o que é necessário para o país, e não ficar apenas criando obstáculos.

A indústria tem reclamado de juros, tributos e câmbio. No entanto, cresceu 10,4% em 2010. A indústria não está exagerando nas queixas?
Não, não estamos exagerando. Temos problemas de juros, tributos e câmbio e temos problemas de competitividade do país. Basta olhar o Brasil no ranking internacional. Sob qualquer critério, você vai ver que o Brasil ocupa posição além da 50ª.

Setores da indústria indicam haver desindustrialização. O sr. também acha isso?
Não. Pode acontecer, mas ainda não estamos num processo de desindustrialização. Mas corremos um risco muito grande com as importações de manufaturados. A indústria de commodities, que tem tecnologia, exporta muito mais do que a indústria de manufaturados. Em compensação, a importação de produtos manufaturados é muito maior do que a de commodities.

Isso pode deteriorar o setor industrial?
Essa relação está fazendo com que alguns setores da indústria percam capacidade de investimento, de inovação tecnológica, de participação do mercado nacional. Uma pesquisa recente mostrou que 45% das empresas brasileiras estão perdendo mercado interno para produtos chineses. Isso vai fazer com que setores como têxteis, calçados, máquinas e equipamentos eletroeletrônicos percam mercado.

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Empresas percebem o potencial idoso

Novas maneiras de atender uma população mais velha

Fonte: folha.uol.com.br 14/02
O número de pessoas com 65 anos ou mais deverá mais que duplicar em todo o mundo, de 523 milhões no ano passado para cerca de 1,5 bilhão até 2050, segundo estimativas das Nações Unidas. Isso significa que, em breve, as pessoas com 65 anos ou mais vão superar pela primeira vez o número de crianças com menos de cinco anos.
Muitos economistas veem essa explosão populacional de idosos não como uma vantagem, mas como uma provável crise orçamentária.
Uma análise da Standard & Poor's adverte que muitos países não estão preparados para cobrir os custos de aposentadoria e saúde de tantos novos aposentados; as dívidas nacionais poderão crescer e chegar ao dobro de seu PIB. Afinal, segundo uma estimativa, tratar a senilidade em todo o mundo já custa mais de US$ 600 bilhões por ano.
Mas os pesquisadores estão apostando que a geração baby boom, ao contrário das anteriores, não aceitará tranquilamente a vida reclusa em lares para idosos. Cenário alternativo: adultos mais velhos vivendo independentemente por muito tempo, potencialmente criando um enorme mercado para tecnologias e serviços que promovam o bem-estar, a mobilidade, a autonomia e a conectividade social.
No AgeLab do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), pesquisadores que tentam ajudar designers de produtos e marqueteiros a compreender melhor os idosos criaram o Sistema de Empatia Ganho para a Idade Agora, ou Agnes, na sigla em inglês.
À primeira vista, pode parecer um macacão elaborado. Um capacete, preso por cordões a um arreio pélvico, comprime o pescoço e a coluna do usuário. Óculos de lentes amarelas turvam a visão. Faixas plásticas que vão do arreio para cada braço reduzem a envergadura. Faixas de compressão nos joelhos impedem que eles dobrem. Sapatos plásticos com solas desiguais tiram o usuário do centro de gravidade. Camadas de luvas cirúrgicas dão aos dedos uma sensação estranha.
"O envelhecimento é um fenômeno multidisciplinar e exige novos instrumentos para examiná-lo", diz Joseph F. Coughlin, diretor do AgeLab. "Agnes é uma dessas ferramentas."
Muitas indústrias evitaram o marketing para pessoas com 65 anos ou mais por considerá-las um grupo demográfico fora de moda que poderia prejudicar seu produto entre os consumidores jovens e modernos. Agora que os americanos vivem mais e de modo mais ativo, as empresas admitem o poder de permanência desse mercado.
Empresas procuram o AgeLab para entender esse novo público-alvo e aprendem verdades duras: muitos adultos mais velhos não gostam de produtos como telefones com botões grandes, que simbolizam a idade avançada. "A realidade é tal que você não pode produzir um produto para velhos porque um velho não o comprará", diz o professor Coughlin.
A ideia é ajudar as empresas a projetar e vender produtos adequados à idade do mesmo modo que fizeram com produtos adequados ao meio ambiente. Isso significa oferecer características e embalagens interessantes para atrair grupo demográfico, sem alienar outros consumidores.
Produtos que vão de caixas de pílulas sem fio que transmitem o uso da medicação pelo paciente a novos serviços financeiros que ajudam as pessoas a planejar vidas mais longas já constituem um mercado de muitos bilhões de dólares, segundo analistas do setor. Mas ainda existe muito espaço para crescimento. "Há enorme oportunidade de mercado para produzir tecnologia e serviços que permitam o bem-estar, prevenção e aperfeiçoamento do estilo de vida", diz Eric Dishman, diretor-global de inovação de saúde da Intel. "Sejam quais forem os países ou as empresas que estiverem na vanguarda, eles vão dominar a categoria."
Em seu escritório em Beaverton, Oregon, Dishman demonstra alguns protótipos, como um sistema de rede social para lares de idosos, que já está em testes.
No mês passado, um grupo que incluía Bank of America Merrill Lynch, Pfizer, Johnson & Johnson e Aegon disse que havia formado a Coalizão Global sobre Envelhecimento, para ajudar governos e indústrias a lidar melhor com o aumento do número de idosos.
"As companhias começam a pensar em como podem ser amigas dos mais velhos do mesmo modo que pensaram como poderiam ser amigas do meio ambiente nas últimas décadas", diz Andy Sieg, diretor de serviços de aposentadoria do Bank of America.
A Intel e a General Electric estão desenvolvendo conjuntamente tecnologias para ajudar adultos mais velhos a manter-se independentes. Elas já vendem o Guia de Saúde Intel, um sistema de monitoramento doméstico que ajuda médicos a administrar remotamente os tratamentos. Existe apenas um obstáculo: por causa do preconceito de idade, segundo Dishman, muitos comerciantes não se dispõem a dar espaço para produtos "amigos" dos idosos, e muitas empresas não querem sequer desenvolvê-los.
Dishman vem tentando fazer o Congresso dos Estados Unidos colocar a questão na agenda nacional. A União Europeia, segundo ele, dedicou mais de 1 bilhão de euros ao estudo da tecnologia e do envelhecimento.
"O que precisamos fazer para que o envelhecimento e a tecnologia 'cinza' tenham a mesma urgência e os investimentos que o aquecimento global e a tecnologia verde?", pergunta Dishman.
Ken Dychtwald, presidente da AgeWave, uma organização de consultoria, vem tentando atualizar a "marca" envelhecimento. Ele cunhou a palavra "middlescence" -algo como "mediadolescência"- para representar a vida avançada como uma etapa de transformação, como a adolescência, em que as pessoas têm tempo livre e um maior interesse por novas experiências.
A primeira das cerca de 76 milhões pessoas da geração baby boom nos Estados Unidos completou 65 anos em janeiro. Seus meros números podem atrair indústrias que antes haviam recuado, disse Dychtwald.
Em 2009, por exemplo, os lares de baby-boomers nos EUA gastaram cerca de US$ 2,6 trilhões, segundo estimativas do AgeWave com base em uma pesquisa de gastos de consumo do Departamento de Estatísticas do Trabalho.
Até agora, poucas companhias aplicaram a inteligência criativa para compreender os adultos mais velhos e desenvolver tecnologias, serviços, experiências e até novas carreiras para eles.
"Em vez de ver a maturidade como uma oportunidade para vender às pessoas um título de clube de golfe ou um remédio para artrite", ele diz, "como uma pessoa que faz 60 anos ainda tem mais 20, por que não criar programas educacionais em que as pessoas sejam motivadas a sair, aprender novas capacidades e ter uma nova vida?"

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ENTREVISTA JESSÉ SOUZA

É um erro falar que existe nova classe média no Brasil

Fonte: folha.uol.com.br 07/02

PARA SOCIÓLOGO, OS 30 MILHÕES QUE ASCENDERAM NA ERA LULA FORMAM UM GRUPO SOCIAL DIFERENTE, DE "BATALHADORES'

Autor do livro "Os Batalhadores Brasileiros", o sociólogo Jessé Souza afirma que a ascensão social de 30 milhões de pessoas no governo Lula não produziu uma "nova classe média", mas uma classe social diferente, que ele chama provocativamente de "batalhadores". Assim como fizera em seu livro anterior, Souza procura determinar as características dessa classe por um recorte diferente do que ele chama de economicista e quantitativo, fugindo tanto de análises pelo consumo e renda quanto de abordagens marxistas "unidimensionais". Abaixo, trechos da entrevista sobre a classe que, para ele, "parece se constituir, com o resgate social da ralé, na questão social, econômica e política mais importante do Brasil contemporâneo".


Folha - Em seu livro "Os Batalhadores Brasileiros", o senhor questiona a afirmação de que o governo Lula alçou 30 milhões de pessoas à classe média e diz até que se trata de uma mentira. Por quê?
Jessé Souza - Não nego que tenha havido a ascensão social de 30 milhões de brasileiros nem que esse fato seja extremamente importante e digno de alegria. O que questiono é a leitura dessa classe como uma classe média. A classe média é uma das classes dominantes em sociedades como a brasileira porque é constituída pelo acesso privilegiado a um recurso escasso de extrema importância: o capital cultural. Seja sob forma de capital cultural técnico, como na "tropa de choque" do capital (advogados, engenheiros, administradores, economistas etc.), seja pelo capital cultural literário de professores, jornalistas, publicitários etc., esse tipo de conhecimento é fundamental. Tanto a remuneração quanto o prestígio social atrelados a esse tipo de trabalho são consideráveis.

E os batalhadores?
A vida deles é outra. É marcada pela ausência dos privilégios de nascimento que caracterizam as classes médias e altas. Não falo só do dinheiro transmitido por herança. Os privilégios envolvem também o recurso mais valioso das classes médias: o tempo.
Os batalhadores, em sua esmagadora maioria, precisam começar a trabalhar cedo e estudam em escolas públicas de baixa qualidade. Eles compensam a falta do capital cultural e econômico com esforço pessoal, dupla jornada e aceitação de todo tipo de superexploração da mão de obra.
Essa é uma condução de vida típica das classes trabalhadoras, daí nossa hipótese de trabalho desenvolvida no livro que nega e critica o conceito de "nova classe média".

Como surgiu o nome dessa nova classe?
Nesse estudo, o que impressionou foi o esforço de superação de condições adversas. O título foi uma homenagem à luta cotidiana e silenciosa desses brasileiros. O termo "batalhadores" sinaliza o fato de que o que perfaz o cotidiano dessas pessoas é a necessidade de "matar um leão por dia" como forma de vida de toda uma classe social que tem que lutar diariamente contra o peso da própria origem.

Quais são os valores dessa classe batalhadora?
A principal diferença em relação aos excluídos e abandonados sociais é a constituição de uma ética articulada do trabalho duro.
Os batalhadores são quase sempre vindos de famílias pobres, mas bem estruturadas, com os papéis de pais e filhos reciprocamente compreendidos, exemplos de perseverança na família e estímulo consequente para o estudo e para o trabalho.
Temos nas famílias dessa classe a incorporação da tríade disciplina, autocontrole e pensamento prospectivo que sempre está pressuposta em qualquer processo de aprendizado na escola e em qualquer trabalho produtivo. Sem disciplina e autocontrole é impossível, por exemplo, concentrar-se na escola -daí que os membros da ralé diziam repetidamente que "fitavam" o quadro negro por horas sem aprender.
Assim, ainda que falte a essa classe o acesso às formas mais valorizadas de capital cultural -monopólio das "verdadeiras" classes médias-, não lhes falta força de vontade, perseverança e confiança no futuro, apesar de todas as dificuldades.

Uma das características dos batalhadores parece ser a precariedade da situação econômica e social. O que o governo pode fazer?
Eu acho fundamental o aprofundamento mais consequente tanto da política social quanto de políticas de crédito e estímulo.

A religião é mais importante para os batalhadores que para a classe média tradicional?
O tema da religião é tão importante para essa classe que dedicamos toda uma parte do livro a essa temática. Mas é preciso cuidado, pois esse tema pode servir para que se construa uma nuvem de preconceitos contra essa classe. É, sem dúvida, correto que as religiões evangélicas -como, aliás, todas as religiões em alguma medida- exigem o sacrifício do intelecto, o que, efetivamente, não ajuda no exercício da tolerância nem no desenvolvimento das capacidades reflexivas dos seres humanos.
Em troca, no entanto, essas religiões oferecem o que a sociedade como um todo, o Estado ou mesmo algumas das famílias menos estruturadas dessa classe jamais deram a eles: confiança em si mesmos, autoestima, esperança e força de vontade para vencer as enormes adversidades da vida sem privilégios de nascimento.
Nesse sentido, tudo leva a crer que a religião seja mais importante para esses setores do que para as classes médias estabelecidas, ainda que nunca tenhamos feito nenhum estudo sistemático.
E não apenas as religiões evangélicas, que são importantes especialmente nos núcleos urbanos. Também a católica, no interior do Nordeste, ainda forte, cumpre uma função fundamental de baluarte da solidariedade familiar e como fundamento de uma ética do trabalho em muitos aspectos semelhantes à do protestantismo.

A nova classe batalhadora faz surgir um novo tipo de preconceito no Brasil?
Sim, basta olhar as revistas que analisam o padrão de consumo dessa classe sob a égide da visão de mundo da classe média estabelecida. Ela aparece sempre como um tanto vulgar e sem o "bom gosto" que caracterizaria os estratos superiores.

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