terça-feira, 27 de abril de 2010

Direitos autorais e acesso ao conhecimento FSP 27/04

GUILHERME CARBONI, PABLO ORTELLADO e CAROLINA ROSSINI


O projeto de reforma da lei de direitos autorais, apesar de modernizador, fica a dever ao onerar a cópia de livros nas universidades



O Ministério da Cultura vem, ao longo dos últimos quatro anos, promovendo com a sociedade amplo debate sobre a reforma da lei de direitos autorais (lei nº 9.610/ 98).
Esse debate, que incluiu a realização de seminários temáticos, reuniões setoriais e que, em breve, passará por ampla consulta pública, deve ser saudado como a mais participativa reforma de uma lei de direito autoral de que se tem notícia.
As propostas de alteração da atual lei são muitas, mas aqui destacamos as que visam um melhor balanceamento entre o interesse privado dos titulares de direitos autorais e o interesse público pelo livre acesso ao conhecimento.
O projeto de reforma da lei, divulgado parcialmente em um dos debates promovidos pelo Ministério da Cultura, diz claramente que "a proteção dos direitos autorais deve ser aplicada em harmonia com os princípios e normas relativos à livre iniciativa, à defesa da concorrência e à defesa do consumidor".
Além disso, regula expressamente a sua função social, ao dizer que a lei terá que atender "às finalidades de estimular a criação artística e a diversidade cultural e garantir a liberdade de expressão e o acesso à cultura, à educação, à informação e ao conhecimento, harmonizando-se os interesses dos titulares de direitos autorais e os da sociedade".
O objetivo visto acima pressupõe alargamento das atuais limitações e exceções aos direitos autorais -hipóteses em que as obras protegidas podem ser livremente usadas, sem necessidade de autorização prévia ou pagamento aos titulares de direitos.
Na atual lei, essas hipóteses são restritivas, com a proibição, por exemplo, da "cópia privada", da mudança de suporte e da cópia feita para fins de preservação do patrimônio cultural.
A cópia privada é aquela feita em um único exemplar, sem fins lucrativos, para uso do próprio copista, e é um recurso que permite, por exemplo, que alguém copie um CD legitimamente adquirido para escutar no carro, sem risco de estragar o original.
Além de autorizar a cópia privada, o projeto de lei autoriza também a livre cópia quando há mudança de suporte -ou seja, quando o dono do CD copia suas músicas para um iPod. Por fim, o projeto permite ainda que qualquer obra possa ser copiada para fins de preservação do patrimônio cultural.
Embora todas essas possibilidades sejam de bom senso, hoje não são permitidas pela lei atual. Por esse motivo, em recente comparação entre 16 países, a lei brasileira foi considerada a quarta pior no que diz respeito ao acesso ao conhecimento.
Apesar de o projeto modernizar a nossa lei, buscando torná-la compatível com o mundo digital, ele fica a dever em pelo menos dois pontos: ao onerar a fotocópia de livros nas universidades e ao não reduzir o prazo de proteção dos direitos autorais.
Embora no projeto de lei a cópia feita pelo copista sem fins lucrativos seja livre e sem ônus financeiro, a cópia de livros passa a ser onerada.
Isso não apenas cria distorção injustificada entre a cópia de livros e a cópia de CDs ou fotos como onera desnecessariamente o estudante brasileiro que faz uso de fotocópias simplesmente porque não tem os meios econômicos para adquirir livros ou então porque alguns livros estão esgotados no mercado.
O projeto também não reduz o prazo de proteção dos direitos autorais. A reprodução das obras permanece, assim, monopólio dos detentores de direitos por 70 anos após a morte do autor (embora o direito internacional só obrigue a 50 anos após a morte).
Estamos vivendo uma oportunidade única para reverter essa situação da atual legislação de direitos autorais, que cria barreiras ao acesso ao conhecimento e ao desenvolvimento nacional.


GUILHERME CARBONI , mestre e doutor em direito civil pela USP, com pós-doutorado na Escola de Comunicações e Artes da USP, é advogado, professor universitário e autor do livro "Função Social do Direito de Autor". E-mail: carboni@gcarboni.com.br.
PABLO ORTELLADO , doutor em filosofia, é professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, onde coordena o Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação.
CAROLINA ROSSINI , advogada e professora de propriedade intelectual, é "fellow" no Berkman Center for Internet and Society (centro Berkman para internet e sociedade) da Universidade Harvard e coordenadora do projeto Recursos Educacionais no Brasil: Desafios e Perspectivas.

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Incentivo - Mais vigor à cultura negra

Três projetos do Distrito Federal ganham verba da Fundação Palmares para divulgação das artes afro-brasileiras

A cultura afro-brasileira ganhou mais espaço no cenário das artes. Grupos de teatro, de dança e de artes visuais, que antes lutavam para conseguir a proximidade com o grande público, agora começam a traçar um novo caminho na história da cultura negra. A concretização acontece com a entrega, hoje, do 1° Prêmio Nacional de Expressões Culturais Afro-Brasileiras — edital dedicado exclusivamente à arte negra que concederá mais de R$ 1 milhão a 20 projetos de todo o país, apenas este ano.

Três desses projetos são do Distrito Federal. “Companhias de teatro e dança de todo o Brasil realizam um fórum uma vez por ano. E, nesses encontros, buscaram o apoio financeiro do Ministério da Cultura, já que existe essa necessidade da inserção da arte negra a exemplo das cotas nas universidades. Daí surgiu a ideia do edital”, explica Elísio Lopes, diretor de Fomento e Promoção da Cultura Afro-Brasileira da Fundação Cultural Palmares, que incentiva o prêmio ao lado do Centro de Apoio ao Desenvolvimento (Cadon) e com patrocínio da Petrobras.

Mais de mil projetos se inscreveram. Cerca de 600 não se adequaram aos critérios e, portanto, cerca de 400 disputaram as 20 vagas. “Isso prova que ainda existe um grande universo que não conseguimos atender este ano, com o primeiro edital. Mas, no ano que vem, pretendemos repetir”, acrescentou Elísio Lopes.

Do DF, os projetos que venceram fazem parte das três categorias do edital: dança, teatro e artes visuais. O espetáculo de dança Bata-Kotô, apresentado pela Companhia Experimental de Dança Negra Contemporânea Mário Gusmão (Cedancomg) — fundada por Júlio César Pereira em 2007 — foi um deles. Bata-Kotô, que significa tambor de guerra, realizará oficinas profissionalizantes gratuitas de dança e percussão e um espetáculo com mesmo nome do projeto. Para tanto, receberá R$ 80 mil.

Laboratório de ideias
“Queremos construir um pensamento crítico em relação a dança negra. Porque ainda há preconceito. As pessoas ainda pensam que não há técnica, não há estética própria na dança afro-contemporânea”, explica uma das bailarinas e assistente de coreografia, Marianne Lima Martins.

No teatro, o espetáculo No Muro — Ópera Hip-Hop ganhou R$ 80 mil para investir na peça e, também, em oficinas profissionalizantes. “O projeto surgiu em um laboratório de dramaturgia da Universidade de Brasília (UnB), com Marcos Motta. Fizemos oficinas com jovens da periferia para montar a peça. Com o prêmio, vamos ampliar a ideia”, disse um dos idealizadores do espetáculo Plínio Perrú.

O último projeto do DF que receberá verba foi o trabalho fotográfico da jornalista e professora Denise Camargo. Resultado de sua tese de doutorado, as fotografias feitas em terreiros de candomblé Brasil afora vão se tornar agora exposição. Mais do que isso: “Paralelo à exposição, vou realizar oficinas com educadores de escolas públicas, para dar visibilidade à cultura do candomblé, que ainda é visto com preconceito, e tentar fazer com que a lei federal de ensino da história negra nas escolas seja aplicada”, explicou Denise Camargo. A fotógrafa receberá verba pública de R$ 40 mil. “Esse edital é uma novidade boa. Sinal de que a arte negra vem ganhando espaço em função das discussões e demandas da sociedade civil. Estamos abrindo um espaço importante”, avaliou ela. Fonte: correioweb 27/04

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