Era bom demais
Fonte: Correioweb 03/04
Os anos 1980, período de efervescência cultural de Brasília, foram marcados por bares de onde surgiram grandes nomes da música brasileira
Cássia Eller tinha vergonha de encarar o público, vestia-se como um garoto e relutou muito antes de aceitar o convite para cumprir longa temporada de dois anos no Bom Demais. Mas foi no bar existente na 706 Norte que, ao exibir um timbre incomum e impressionante performance cênica, a cantora seria descoberta pelo brasiliense e decolaria para a fama e o sucesso.
O Bom Demais, que funcionou entre 1984 e 1990, ao servir de plataforma de lançamento da futura estrela do pop rock nacional, entrou para a história como um mítico ponto de encontro de artistas, intelectuais e de apreciadores da boa música na cidade. “As pessoas iam ao Bom Demais para curtir, em silêncio, o show dos músicos, cantores e bandas que se apresentavam ali”, lembra-se, nostálgica, Cristina Roberto, dona do espaço e hoje proprietária de requisitado bufê e de bistrô, com o mesmo nome, no Centro Cultural Banco do Brasil.
Ex-produtora artística, Cristina fala com orgulho do palco pelo qual passaram os nomes mais importantes da música em Brasília, naquele período. “Posso passar por saudosista, mas nos anos 1980 vivíamos uma efervescência artístico-cultural impressionante em Brasília, e os bares tinham importância fundamental no processo, ao abrir espaço para músicos de diferentes estilos. De Renato Mattos ao grupo Instrumental e Tal, liderado por Toninho Horta; do forrozeiro Beirão aos roqueiros do Little Quail, muita gente tocou no Bom Demais. Mas foi Cássia quem fez o bar entrar para a história.”
Isso mesmo: bares como Bom Demais têm importante papel na construção da história da música na capital. Como esquecer o Só Kana, no Centro Comercial Gilberto Salomão, um dos lugares preferidos pelo pessoal do punk rock — entre eles o Aborto Elétrico — para plugar seus instrumentos e fazer toscas apresentações de no máximo 15 minutos, na primeira metade da década de 1980. Ou do Chorão (302 Norte), reduto da MPB, mais ou menos na mesma época, assim como o Cavaquinho (405 Sul) e o Camisa Listrada (Galeria Nova Ouvidor, no Setor Comercial Sul).
Palquinho
No Gilbertinho, como se tornou conhecido o conglomerado de bares da praça que havia na QI, destacava-se o Barzinho, por oferecer música ao vivo. Foi lá que surgiu uma certa Zélia Cristina, que hoje ocupa posição de destaque na moderna música popular brasileira como Zélia Duncan (o sobrenome artístico vem da família). “Quando eu cantava no Barzinho, acompanhada pelo grande Nelson Faria, via passar em frente ao palquinho da casa garotos com cabelo tipo moicano e headfones tapando os ouvidos. Ficava espantada com aquela atitude provocadora, agora facilmente compreensível, vinda de quem tinha o punk rock como religião e abominava a MPB”, recorda-se.
Rosa Passos não conviveu com situações como essa. Muito pelo contrário. As pessoas que iam ao Amigos (105 Norte, onde hoje funciona A Tribo, restaurante de comida natural) ouvi-la admiravam seu jeito bossanovista de ser, mesmo interpretando samba ou bolero. “Cantar no Amigos foi uma experiência muito boa para mim. Lá, num ambiente intimista, o contato direto com o público me deu cancha. Eu tinha liberdade para escolher o repertório e era acompanhado por músicos talentosos como Lula Galvão, Jorge Helder, Miranda e Gamela”, conta Rosa, com vitoriosa carreira internacional, aplaudida como diva do jazz.
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No Brasil, há resistência ao formato e ao preço de leitores digitais – FSP 03/04
É preciso digitalizar mais títulos em português; nos EUA, venda é crescente
Editores e livreiros que foram ao 1º Congresso Internacional do Livro Digital, encerrado na quarta,
Além do preço elevado dos leitores eletrônicos, todos importados, e da escassa disponibilidade de títulos em português, não há estatísticas sobre o mercado nacional.
Um tímido passo foi dado com a apresentação de uma pesquisa qualitativa, encomendada pela Câmara Brasileira do Livro e pela Imprensa Oficial de SP ao Observatório do Livro, sobre a expectativa do leitor convencional sobre o livro digital. Em entrevistas com grupos de leitores das classes A e B
O preço tido como aceitável de um e-reader variou de R$ 1.500 (SP) a R$ 300 (Recife). Por um e-book, os grupos disseram topar pagar 1/4 do valor de capa de um livro normal.
Dois convidados americanos (representando a Barnes & Noble e o IDPF, fórum internacional de publicações digitais) apresentaram números do mercado dos EUA, o mais desenvolvido. Segundo dados da associação de editoras, as vendas de livros eletrônicos em 2009 somaram US$ 165,8 milhões, contra US$ 53,5 milhões em 2008, aumento de 213%.
O diretor do IDPF, Michael Smith, avaliou que a negociação de preços que a Kobo (fabricante de um e-reader "popular") fará em breve com editoras americanas "vai mudar para sempre" o mercado. E disse que, para popularizar o modelo no Brasil, é necessário digitalizar mais títulos em português.
Ocorre que, no congresso, quase nada se falou sobre como passar o conteúdo do papel para o meio digital, tema crucial. Em vez disso, convidados internacionais repisaram a tese de que o mercado editorial precisa aproveitar o potencial da internet e das redes sociais.
O presidente da Feira de Frankfurt, Juergen Boos, afirmou que, "com a internet dando a todos a chance de publicar livros, a seleção de conteúdo passa a ser um diferencial maior" e conclamou os empresários a usar a rede para descobrir o perfil dos usuários.
"Não é para ficarmos apavorados. Nesse aspecto, o congresso foi positivo. Mas, quando formos começar a fazer, como vamos operacionalizar? Isso faltou mostrar", resumiu Luís Fernando Araújo, da editora Artes e Ofícios (PA).
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