terça-feira, 10 de janeiro de 2012


O amado rei do livro.   Arnaldo Niskier
Doutor em educação, membro da Academia Brasileira de Letras e presidente do CIEE/Rio. CORREIO BSB 08.01 

-
Teremos um ano bastante rico em matéria de cultura. Haverá, em 2012, a comemoração de dois significativos centenários: o do Barão do Rio Branco e o de Jorge Amado, ambos pertencentes à galeria de imortais da Academia Brasileira de Letras. O escritor baiano, pela grande aceitação popular de seus livros, ultrapassou as fronteiras da literatura, tornando-se um dos autores brasileiros que mais tiveram a obra vertida para a televisão e o cinema.

É difícil compreender o estilo de Jorge Amado por meio de interpretações sociológicas ou teorias afins: corre-se o risco de não se ter a exata definição da arte do escritor baiano. Também não terá sucesso quem fizer um paralelo entre seus livros e os fatos históricos ocorridos nos períodos em que foram escritos. Esses estudos críticos não levam em conta a liberdade de criação. Jorge Amado criou um estilo jorgeamadiano, totalmente pessoal, indo muito além de fundamentações teóricas, legando-nos obras inesquecíveis.

Cabe aqui um parêntese para falar do crítico Antônio Cândido, cujo livro Formação da literatura brasileira é considerado fonte de referência das mais confiáveis. Apesar de usar os acontecimentos históricos e sociais localizados nos períodos em que as obras foram escritas como critérios críticos para emitir suas opiniões, sobre Jorge Amado ele procurou realçar a força poética dos romances analisados.

O que vemos a seguir é uma declaração de amor de Antonio Candido, entusiasmado pela simplicidade do estilo do autor de Jubiabá: “Na nossa literatura moderna, Jorge Amado é o maior romancista do amor, força de carne e de sangue que arrasta os seus personagens para um extraordinário clima lírico. Amor dos ricos e dos pobres; amor dos pretos, dos operários, que antes não tinha estado de literatura senão edulcorado pelo bucolismo ou bestializado pelos naturalistas”.

Como se vê, trata-se de uma obra que consegue conquistar leitores e críticos com a mesma intensidade. Para Alfredo Bosi, a criação de Jorge Amado teve uma caminhada multifacetada no decorrer dos anos: iniciou com tintas de “romance proletário”, passou por depoimentos líricos, seguiu a cartilha da pregação partidária, se especializou na valorização da região cacaueira e, por fim, se estabilizou na produção de crônicas de costumes provincianos.

A obra do escritor baiano, adaptada para a televisão, obteve imenso sucesso de audiência. E um fato adicional engrandece ainda mais essa façanha: depois da exibição de cada uma das novelas, as edições dos livros se sucederam, revelando sinergia muito forte entre as duas mídias. Graças à transposição de seus livros para a televisão, foi revisto o mito, sustentado na época por alguns intelectuais, de que a televisão estragava o gosto pela leitura ou impedia a sua propagação.

Comprovei esse fato em 1995 quando, a pedido do então presidente da ABL, Austregésilo de Athayde, falei pela primeira vez na Casa de Machado sobre a existência de uma nascente literatura eletrônica, fato que hoje se tornou realidade, com a multiplicação de e-books, tablets, Kindles e outros recursos digitais.

Nas muitas viagens que fiz ao longo da vida, visitei bibliotecas de várias universidades, onde sempre encontrei versões dos seus romances. Não necessariamente dos 37 livros, mas a maioria deles, nas línguas locais. Foi assim em Seul, em Berkley, em Estocolmo, em Tóquio e em Telavive.

Ao lado de Pelé, Amado foi o brasileiro que mais trabalhou pela imagem do país no exterior. Se um é o rei do futebol, o outro pode ser considerado o rei do livro ou da palavra escrita. Um incomparável contador de histórias.


>>>> 



Bairros de classe média abrigam cracolândias privês
Traficantes alugam apartamentos e casas na Vila Mariana, Paraíso e Bela Vista para receber viciados
-
Em um espaço do tamanho de uma perua Kombi, seis homens dividem três cachimbos de crack feitos com antenas de TV e latinhas de alumínio. FOLHA SP 09/01


Cinco deles estão sentados no chão. São iluminados por um lampião que contrasta com a janela de vidros escurecidos. O outro está em pé. Observa a cena ao lado da porta. Ali, não há móveis, tapetes, tampouco cortinas.

Passa das 16h de uma sexta-feira nublada em São Paulo. O ambiente descrito acima poderia ser em uma rua da cracolândia, na região central da cidade, mas não é.

Trata-se do interior de um apartamento de classe média na Bela Vista, a poucas quadras de um dos mais famosos corredores gastronômicos da metrópole, a rua Avanhandava. Lá, usuários de crack alugam a sala, o quarto e a cozinha com um único propósito: fumar a droga.

Com três celulares no bolso, um senhor cabisbaixo, aparentando ter 60 anos, era o responsável pela venda das pedras e também pelo aluguel do imóvel. Preço: R$ 10 (a pedra), mais R$ 10 pelo espaço usado para o consumo.

Antes mesmo da operação da Polícia Militar, que cercou a cracolândia na semana passada, a Folha percorreu, nos últimos seis meses, bairros como Vila Mariana, Bixiga, Paraíso, Penha e Bela Vista.

Nesses locais, a reportagem encontrou casas e apartamentos onde funciona um esquema até então desconhecido das autoridades, as cracolândias privês.

Dentro do apartamento da Bela Vista, o cheiro, uma mistura de tabaco, fumaça, óleo de lampião queimado e suor, é forte. Dois jovens estão alucinados. Acabaram de fumar a terceira pedra do dia. Entreolham-se e parecem apavorados, sem motivo aparente.

Um acaba de dar seu primeiro trago. Os outros três observam. Eles fumam cigarros. Esperam a vez para terem a sensação que tanto aguardaram após uma manhã inteira de trabalho em uma loja de informática ali perto.

As cracolândias privês são extremamente lucrativas e seguras para o criminoso. Ele ganha duas vezes: na venda da droga e na locação da área.

Para o usuário, a maioria homens de classes baixa e média, com idades entre 18 e 35 anos, de diferentes profissões, é algo discretíssimo.

Nesses ambientes, ele consegue fugir dos olhares de reprovação de moradores e também do controle policial.

Para entrar nesse submundo, é preciso ser apresentado por algum conhecido do traficante. Deve-se seguir a principal exigência do local, só consumir a droga vendida ali.

"Fique esperto, aqui não entra pedra [de crack] de outro lugar", alerta o traficante.

LUZ DE LAMPIÃO

A Folha visitou cinco imóveis, entre casas e apartamentos. Em dois deles, a reportagem entrou acompanhada de um usuário, em tratamento, que conheceu na cracolândia enquanto apurava outra história. Ele só aceitou apresentar o repórter às cracolândias privês porque diz estar indignado com a quantidade de jovens viciados na cidade.

À primeira vista, por fora, não é possível perceber que em qualquer um desses cinco lugares haja venda e consumo de drogas lá dentro.

Os apartamentos, na Bela Vista e no Bixiga, são iluminados por lampiões. Possuem pequenas brechas nas janelas, para não intoxicar quem está trancado lá. As portas permanecem quase o tempo inteiro fechadas.

Para ter acesso a eles, é preciso subir dois lances de escadas. Na sequência, deve-se comprar a "pê" (pedra de crack) vendida na própria escadaria e pedir que o vendedor autorize a entrada -vale registrar que o repórter não comprou a droga.

Já as casas, ou estavam abandonadas e foram invadidas ou haviam sido alugadas pelos traficantes por preços baixíssimos por conta de seu mau estado de conservação.

Elas estão na Vila Mariana, Paraíso e Penha. Os muros têm mais de três metros de altura. Os portões não têm brechas, o que impossibilita que alguém, do lado de fora, observe o que acontece ali.

A casa da Vila Mariana não é imunda como os cortiços fechados pela operação da polícia no centro paulistano.

A morada é simples. Fica em uma rua bem arborizada, próxima de um posto de gasolina, rodeada por prédios residenciais. Dentro dela, poucos móveis. Uma mesa e duas cadeiras na sala, onde ficam o "patrão" ou seu subordinado. Ao todo, são 11 cômodos improvisados, transformados em quartos, coletivos ou individuais. São divididos por finas paredes de madeira compensada.

Há dois tipos de cracolândia privê. Nos apartamentos, o usuário compra a pedra com o traficante e a consome em um dos cômodos.

Na outra, vive no lugar, chamado "mocó". Pode tomar banho, comer, dormir. O valor varia conforme a forma de pagamento. Adiantado em dinheiro, R$ 210. Se for pagar no fim do mês, R$ 300.

>>> 

Literatura.  O triste espelho da alma
Lançamento de nova edição de O Duplo, de Dostoiévski, é mais uma chance de mergulhar na prosa de um autor que soube como ninguém construir personagens atormentados. O popular/GO 10.01
-
.

Nunca, nunca mesmo subestime a capacidade que certos autores têm de surpreender seus leitores. Não importa que já tenha lido algumas obras desses escritores, que já tenha se dado ao trabalho de tentar entendê-las um pouco mais profundamente, que tenha mantido contato com seus críticos, comentadores e teóricos que se dedicaram a estudá-los. Tudo isso fica diminuto diante do efeito que uma prosa poderosa pode exercer. Fiódor Dostoiévski, o russo que para muitos chegou ao ápice da criação literária quando o assunto é o gênero romanesco, faz parte deste exclusivo clube. O livro O Duplo, relançado agora pela Editora 34 com uma tradução direta do russo feita pelo craque da área Paulo Bezerra, é uma chance inestimável de comprovar isso.

Personagens como o amoral Raskólnikov de Crime e Castigo , o assustador Smerdiakóv ou o dúbio Ivan, de Os Irmãos Karamázov, os seres misteriosos e degradantes de Os Demônios formam um rol de criações literárias monumentais, inseridas em enredos complexos e cheios de reviravoltas, em que Dostoiévski explora meandros obscuros da sociedade e da alma humana. Pois nesta lista, em pé de igualdade com os demais, encontra-se o perturbado funcionário público Golyádkin, protagonista de O Duplo , segundo romance da carreira do escritor russo, apresentado logo após seu livro de estreia, Gente Pobre. Trabalhos que foram recebidos de formas distintas. Enquanto Gente Pobre foi aclamado, O Duplo foi pesadamente criticado. Era um livro incômodo e de difícil digestão.

A história de Golyàdkin é árida e este personagem suscita uma série de sentimentos, muitos deles contraditórios. Daí vem sua grandeza. Ao mesmo tempo em que nos solidarizamos com seus inúmeros infortúnios, é impossível não pensar que ele os merece... todos eles.

A história começa com este "conselheiro titular" - cargo cuja pompa para no nome, uma vez que se trata de uma função de terceira categoria na intrincada burocracia da Rússia czarista - tentando se infiltrar em um meio social que não é o seu, mas que habita todos os seus sonhos. O personagem intenta participar de uma festa dada por um superior seu, homem de respeito na sociedade de São Petersburgo, cuja filha move as paixões desse pobre coitado.

O problema está justamente aí. Golyádkin é um pobre coitado, um homem desprovido de malícia e perícia para conseguir seus objetivos. Na intenção de se fazer aceito em um meio hostil aos mais humildes e ascender socialmente, como diz o próprio narrador dostoievskiano, acaba "metendo os pés pelas mãos". Sua tentativa frustrada de entrar na festa acaba descambando para um pequeno escândalo e uma cena de humilhação, a primeira de muitas pelas quais Golyádkin irá passar.

E nesse ponto específico, Dostoiévski é implacável. Ele faz seu personagem comer o pão que o diabo amassou, com um detalhe que depois ficaria evidente em suas obras seguintes, talvez com a exceção de Crime e Castigo : não há redenção, final feliz ou coisa que o valha.

As atitudes reprováveis e bizarras de Golyádkin são explicadas, em grande parte, pela engrenagem torta de seus raciocínios. Aí está o forte do livro de Dostoiévski. O personagem não ganha a vida apenas por seus atos atrapalhados e sim por seu jeito de pensar e ver o mundo, com a construção de um narrador genialmente inapreensível. Quem conta a história, afinal? É alguém onisciente, é o próprio Golyádkin, é um personagem secundário da história?

Na verdade, são todos eles ao mesmo tempo, dando a exata ambientação imprecisa que a narrativa demanda, uma vez que este homem rejeitado por todos terá apenas uma pessoa com quem se abrir: ele próprio. Surge a figura do duplo, não como um canal de escape, uma projeção alentadora, mas sim como a maior das ameaças.

Mistério

Golyádkin, o homem que mora em um birosca, que desconta todas as suas frustrações em um criado que mais parece um lacaio escravizado, que é alvo de toda sorte de fofocas da parte de seus colegas de repartição, que não goza do respeito e do afeto de ninguém, passa a se ver em uma figura misteriosa que surge durante uma densa nevasca nas ruas desertas de São Petersburgo. Há algo de sinistro no ar desde sua primeira aparição, e algo de venenoso no diálogo improvável que travam no quarto imundo onde o funcionário público se esconde. Mas Golyádkin, por carência ou por pura falta de tato, não percebe o perigo e acaba, de novo, sendo vítima de sua personalidade errática e covarde, de sua falta de condições de reagir, de sua submissão doentia e atroz.

O duplo, por sua vez, é seu oposto. Sabe como ninguém puxar o saco do chefe, usar de artimanhas para atingir seus objetivos mais torpes, é desprovido de princípios e escrúpulos. Tudo o que Golyádkin sempre sonhou e nunca alcançou, seu duplo amealha em pouquíssimo tempo, num jogo de falsidades com o seu criador. Criador? Sim, criador.

Dostoiévski nunca deixa claro que tipo de ser é esse duplo. Pura imaginação de uma mente atormentada ou uma figura mefistotélica que veio de alguma profundeza atormentar uma alma já à beira do precipício? Dúvida que é potencializada com a forma de Golyádkin se expressar e ser. Ele gagueja, hesita nas mais banais situações, não tem coragem de viver sua própria vida, lhe falta serenidade para aceitar e coragem para avançar.

O livro é crítico a convenções sociais que deixam em segundo plano o sentimento do próximo. Como ocorre em muitas de suas narrativas, Dostoiévski destaca o conflito de classes de uma sociedade muito estratificada e engessada em suas desigualdades, caldo de cultura para revoluções e revoltas.

O personagem principal é enxotado de todas as maneiras imagináveis, suas opiniões, além de mal expressas, são ignoradas, sua presença é desagradável, seu status é nulo. A desumanidade com que é tratado alimenta um ciclo vicioso em que à ausência de talento se junta uma inerente incompatibilidade com o mundo, uma carência abissal e uma incompreensão generalizada em torno de sua existência. O duplo vem, de alguma forma, suprir todas essas deficiências, mas, ao ganhar vida, começa a participar do linchamento de seu modelo original.

Criar um personagem desta natureza é um verdadeiro feito, uma vez que seria simples justificá-lo apenas pela loucura ou pela alucinação. Golyádkin exacerba esses limites. Seus contornos, ainda que indefinívies muitas vezes, não são tênues. Trata-se de uma pessoa coerente nos gestos, nas palavras, nos fracassos e na maneira inadequada com que lida com as pessoas.

O frio de São Petersburgo e a pompa das grandes recepções na cidade mais cosmopolita da Rússia do século 19 colaboram para a compreensão deste homem tão pobre de vida, mas tão rico em sentidos. Ele não matou uma velha usurária, ele não planejou um atentado, ele não assassinou o pai para se vingar dele e dos irmãos, ele não é um viciado inveterado em jogo, mas também cometeu um delito mortal: ele existe. E existe em dose dupla. Duas faces de um homem cheio de medos e lacunas.



PERFIL:

Fiodor Dostoiévski (1821- 1881) é autor de alguns dos maiores clássicos da literatura mundial escritos no século 19. Entre eles estão Os Irmãos Karamazov , Crime e Castigo , O Idiota , Notas do Subterrâneo , Os Demônios e O Jogador . Nascido em Moscou, chegou a se formar em engenharia, mas a vida literária o arrebatou, primeiro com traduções de autores como Balzac e George Sand, depois com suas próprias criações. Em 1849, já tendo escrito algumas obras, foi preso sob a acusação de integrar um grupo que conspirava contra o czar Nicolau I. Julgado, foi sentenciado à pena de morte. Pouco antes da execução, já diante do pelotão de fuzilamento, Dostoiévski recebeu a notícias de que sua pena havia sido comutada para exílio e trabalhos forçados na Sibéria. Essa experiência marcaria profundamente sua vida e literatura.

Seus grandes livros são da fase posterior à prisão, onde perdeu as ilusões intelectuais e a boa saúde. Ele começou a ter uma visão mais independente da sociedade, exercitando sua veia crítica, muitas vezes por meio de metáforas ou personagens representativos de classes e conflitos. Jornalista também combativo, foi dono de jornal e revista, onde expôs muitas de suas ideias e também publicou fragmentos de sua obra literária. Influenciado por grandes romancistas franceses, ingleses e também russos, serviu de contraponto estético a muitos deles, inaugurando novas formas de narrativa que, mais tarde, seriam definidas como polifônicas (várias vozes intervenientes) e dialógicas (em uma relação mais próxima e transparente com os entes envolvidos na obra, incluindo o leitor). Epiléptico e com problemas pulmonares, Dostoiévski morreu em 9 de fevereiro de 1881 como um escritor popular e de grande prestígio entre críticos e estudiosos.

Livro: O Duplo
Autor: Fiodor Dostoiévski
Tradução: Paulo Bezerra
Páginas: 256
Preço: R$ 39
Editora: 34

>>> 
Tribunal de MG é acusado de promover juízes ilegalmente.  Ao julgar o caso, CNJ pode anular a nomeação de 17 desembargadores.   Entidade afirma que as promoções não foram publicadas em edital nem seguiram critérios como produtividade FOLHA SP 10/12 

-
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está julgando o pedido de anulação das promoções de 17 juízes ao cargo de desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, entre 2006 e 2009.

As promoções foram denunciadas ao CNJ por uma entidade nacional que representa juízes.

Segundo a Anamages (Associação Nacional dos Magistrados Estaduais), o tribunal privilegiou parentes de desembargadores e ex-dirigentes de outra entidade de classe em detrimento de juízes mais antigos.

Além de não observar critérios como antiguidade e produtividade, as promoções foram feitas às escuras, sem a publicação de edital, sustenta a Anamages.

Por meio de sua assessoria, o tribunal mineiro informou que vai aguardar a decisão final do CNJ e cumprir o que for determinado.

VOTAÇÃO

Dois conselheiros do CNJ já votaram. Ambos consideraram ilegais as promoções, mas divergiram sobre a providência a ser tomada.

Jorge Hélio Chaves de Oliveira pediu a anulação das promoções por considerar que os atos "não podem ser convalidados com o tempo".

O relator, Fernando Tourinho Neto, votou pela manutenção das promoções, somente se aplicando a resolução em casos futuros.

O julgamento foi suspenso em dezembro, após pedido de vista (tempo para análise do processo), e deve ser retomado em fevereiro.

O tribunal tem 130 cargos de desembargadores e dez vagas a serem ocupadas.

A acusação foi feita em 2009 ao CNJ. Entre os promovidos, há sete ex-dirigentes da Amagis (Associação dos Magistrados Mineiros), entre os quais Nelson Missias, atual secretário-geral da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros).

A AMB, maior entidade de juízes do país, é pivô da mais recente polêmica envolvendo o CNJ. A pedido da entidade, o Supremo Tribunal Federal tomou duas decisões que desidrataram o poder de investigação do conselho, impedindo que ele abra investigação por iniciativa própria.

CRITÉRIOS

Além de Missias, também consta da lista Doorgal Andrada, promovido quando era vice-presidente da AMB.

Segundo o pedido de anulação, a promoção de Andrada preteriu 41 juízes mais antigos do que ele.

Por sua vez, ao ser promovido, Missias era o 46º na lista de antiguidade e não atuava como juiz -no período, dedicava-se à Amagis e, por isso, não poderia ter sua produtividade analisada.

Nas sessões que decidiram pelas promoções, há desembargadores que justificam sua escolha ao elogiar a atuação dos juízes no comando das entidades de classe, sem levar em consideração sua atuação como magistrados.

"Não se fala em produtividade, assiduidade ou qualquer outro critério, apenas se dá ênfase ao compadrio pessoal ou associativo", acusa a Anamages em documento enviado ao CNJ.

Andrada e Missias classificam o caso como uma retaliação, fruto de disputas no Judiciário mineiro.


>>> 


ANDRÉ LUIZ MACHADO DE CASTRO.   Corporativismo contra a Defensoria
A OAB-SP pleiteava cortar verba da Defensoria; os mais pobres ficam reféns de uma entidade que, em SP, quer apenas manter uma receita para seus filiados.   Ontem, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo completou seis anos. O período provocou uma significativa mudança no contexto de exclusão social perante a Justiça. FOLHA SP 10/12 
-
Graças ao preparo, a competência e a dedicação dos apenas 500 defensores públicos e dos 330 servidores de apoio, atuantes em somente 29 cidades do Estado, as ações do órgão ultrapassaram as fronteiras desses poucos municípios, várias delas recebendo o reconhecimento de prestigiosas instituições de análise e avaliação de boas práticas no sistema de Justiça, como o Instituto Innovare.

As vitórias processuais nos tribunais superiores em Brasília, por muito tempo acessados apenas por pessoas com recursos financeiros, contam-se aos milhares.

Mas não foi por isso que a Defensoria Pública de São Paulo ocupou espaço recentemente no noticiário, e sim por conta de uma falsa crise e de um falso dilema com a OAB-SP.

Sob o argumento de que a Defensoria Pública não consegue atender as mais de 300 comarcas do Estado, a OAB-SP pleiteava reduzir drasticamente o seu orçamento. O objetivo era gastar esses recursos exclusivamente com o convênio que o Estado mantém com ela há quase 30 anos para a prestação de assistência judiciária onde não há defensores públicos suficientes.

O convênio custa anualmente aos cofres públicos cerca de R$ 300 milhões e beneficia quase 50 mil advogados, que para prestarem o serviço precisam apenas estar em dia com os cofres da ordem, não passando por qualquer tipo de seleção.

Todo o debate dos últimos meses na imprensa, no governo e na Assembleia Legislativa (se o convênio e os seus milionários recursos tinham de ser transferidos da Defensoria para a Secretaria de Justiça e se a Defensoria fiscalizava demais ou de menos) era uma falsa discussão.

A questão principal, nesse tema da efetivação do direito constitucional de acesso à Justiça, é esta: por que ainda há apenas 500 defensores e 330 servidores em 29 cidades?

Essa questão jamais foi sequer tocada pela OAB-SP, contrariando o estreito apoio que o Conselho Federal da OAB e diversas outras seções estaduais sempre prestaram -e continuam prestando- ao fortalecimento das defensorias públicas.

Deve-se perguntar aos poderes Executivo e Legislativo do Estado a razão pela qual, depois de seis anos, houve um aumento de apenas cem defensores e a ampliação da atuação para apenas mais oito cidades.

Existem recursos, pois os milhões gastos com a prestação terceirizada seriam suficientes para custear a prestação direta de assistência jurídica às pessoas carentes.

Enquanto não houver um crescimento gradual e constante do número de defensores públicos -por exemplo, cem novos cargos por ano até se atingir o número necessário estimado de 1.600 (há cerca de 2 mil juízes e 1.800 promotores no Estado) -, a parcela mais pobre dos paulistas e o próprio governo vão ficar reféns de uma entidade que, em São Paulo, não está preocupada com o fortalecimento do Estado democrático de Direito e a efetivação dos direitos humanos para todos, mas apenas com a manutenção de uma fonte de receita para uma parcela de seus filiados.

Nenhuma outra ordem profissional (de médicos, engenheiros, contadores etc.) possui ou jamais pensou em possuir algo assim.

O governador Geraldo Alckmin, agora novamente eleito, já provou, ao superar as mesmas forças resistentes que retardaram a criação da Defensoria em 18 anos, que tem consciência e compromisso com a necessidade jurídica e social da efetiva implementação da Defensoria Pública no Estado.

As centenas de entidades da sociedade civil que, no último mês, novamente se reuniram para defender a Defensoria Pública certamente anseiam por isso.

ANDRÉ LUIZ MACHADO DE CASTRO, 38, mestre em direito civil, é presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep)

Nenhum comentário: