segunda-feira, 16 de janeiro de 2012


O boi na universidade
Mestre Teodoro Freire encontrou na UnB um espaço de articulação para a sua epopéia nas profundezas da cultura popular brasileira UNB 16.01

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A morte de Seu Teodoro no ano do cinquentenário da UnB eterniza uma aliança que é expressão da própria história da universidade. Brasília celebrava seu primeiro ano de existência no dia em que desembracou na cidade aquele jovem maranhense, com seus 31 anos, vindo do Rio de Janeiro para presentear a nova capital com a beleza singela de uma das manifestações mais autenticas da tradição popular de terras tropicanas.
Foi no coração da capital do Brasil, a rodoviária do Plano Piloto, que o boi agitado e colorido praticou suas primeiras peripécias candangas, como que convidando aquelas pessoas a experimentar – para além da construção física de toda uma cidade – a construção simbólica de elementos identificadores da nova comunidade em formação. “O boi de Seu Teodoro, embora remonte a tradição popular do Maranhão, ganhou contornos próprios ao se consolidar em Brasília. Assim como a Via Sacra de Planaltina ou o Clube do Choro, a tradição folclórica do bumba-meu-boi ajudou a construir um perfil cultural de uma cidade que se criou artificialmente”, analisa o professor José Carlos Condova Coutinho, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.
Ex-diretor do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do DF, Coutinho lembra que o bumba-meu-boi do seu Teodoro foi uma das primeiras manifestações artísticas a receber o registro de patrimônio imaterial da cidade.
ESCOLHA – Após essa primeira visita, Teodoro recebe o convite para voltar de vez ao Distrito Federal. Antes de topar, porém, recusou convites para trabalhar no Senado e na então guarda-civil local. Só não titubeou quando surgiu a chance de ser contínuo na UnB, em 1962, meses após a inauguração  da universidade, onde permaneceu até sua aposentadoria compulsória, em janeiro de 1991. “Mesmo depois de se aposentar, Seu Teodoro não se desligou da universidade, vinha aqui sempre encontrar-se com professsores e funcionários. Ele queria saber de tudo o que acontecia”, relembra a professora Geralda Dias, do Departamento de História.
Aqui, o criativo maranhense encontrou o espaço de articulação e fruição artística necessários ao desenvolvimento da brincadeira do boi. No horário de almoço, relata o jornalista Eraldo Peres no livro O Ecantador: Seu Teodoro do boi, o mestre se “enfurnava” na carpintaria da  universidade onde fabricava “uns pandeiros quadradros”. As primeiras apresentações – quando o recém-formado grupo de bumba-meu-boi já ensaiava em um terreno doado na cidade de Sobradinho – só foram possíveis graças ao apoio financeiro de Darcy Ribeiro, que viabilizou a compra de adereços, roupas e instrumentos com 65 mil cruzeiros.
A relação com a UnB atravessou todas as crises, inclusive o cerco militar da ditadura, que afastou professores e alunos, ameaçando a continuidade do grupo de cultura popular. Seu Teodoro narra no livro de Peres a angústia com que assistiu, ao vivo, a prisão do estudante Honestino Guimarães: “O Honestino gritando, eles torcendo o braço do Honestino. Ele veio várias vezes em Sobradinho ver o ensaio do boi e nós conversávamos muito”.
IMPORTÂNCIA – “Seu Teodoro, em si, é a expressão do cinquentenário da UnB”, sintetiza o reitor José Geraldo de Sousa Júnior. Preparando as comemorações oficiais para 2012, o dirigente assegura que o legado do artista será tratado na dimensão de sua relevância histórica. “Sem dúvida, faremos o tributo em homenagem por sua trajetória e ligação com a universidade”, projeta. “Tanto a cidade quando a universidade só vão se consolidar quando incorporarem em seu calendário de memórias o produto da criatividade de seu povo, e mestre Teodoro é figura inconteste nessa moldura”, conclui Coutinho. 
Emocionado com o tamanho da perda, o cineasta e professor emérito da Faculdade de Comunicação da UnB, Vladimir Carvalho, também situa mestre Teodoro em um lugar destacado na formação da cultura brasiliense. “A atuação dele foi irreversível, Teodoro sozinho constitui um capítulo da história cultural da cidade”. O cineasta, nordestino da Paraíba, diz que cruzou a primeira vez com seu Teodoro nos corredores do Instituto de Ciências Humanas, há mais de 40 anos.
“Somos oriundos da mesma região do país e essa afinidade nos aproximou a ajudou a construir uma forte amizade”. A influência chegou ao cinema. “Reputo a ele uma contribuição extraordinária para o meu trabalho. Teodoro me proporcionou depoimentos sobre bumba-meu-boi em documentários que eu dirigi. Trata-se de um memorialista nato”, enfatiza. “Uma vez, propus que a UnB lhe concedesse o título de Doutor Honoris Causa, talvez seja o reconhecimento simbólico mais legítimo de sua contribuição”, completa.


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Saudade do líder Ulysses
Hélio Rocha
Em recesso depois de um ano legislativo pouco produtivo, o Congresso Nacional retoma os trabalhos no início de fevereiro, depois virão o carnaval e a Semana Santa e a seguir os parlamentares se dispersarão muito por conta da campanha para as eleições municipais. As deliberações sobre reforma política não devem avançar neste ano. Não se prevê nada de relevante e, sendo assim, metade da Legislatura estará praticamente desperdiçada. OPOPULAR 13.01.12
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Os mais pessimistas e incrédulos acham que não tem jeito não com o Congresso, mas é preciso colocar a leve esperança de que futuras eleições melhorem o perfil parlamentar brasileiro. Há 26 anos, quando o eleitorado escolheu os integrantes da Assembleia Nacional Constituinte, o Congresso teve um saudoso desempenho. Senadores e deputados, num total de 549 parlamentares, aos quais as eleições de 1986 conferiram a função de constituinte, assumiram em 1º de abril de 1987, iniciando uma jornada que se encerrou no dia 5 de outubro de1988, a histórica data na qual Ulysses Guimarães proclamou a Constituição - a qual ele chamou de Constituição Cidadã.

Esta Constituição em vigor não operou milagres, como também nenhuma outra, mas a ela, fundamentalmente, devemos a conversão do Brasil em um país democrático, com desigualdades e injustiças ainda, as quais essa própria democracia irá paulatina e pacientemente removendo. Note-se que essa conversão se deu três anos apenas depois do processo de redemocratização e do restabelecimento do primado do poder civil.

A liderança de Ulysses Guimarães, o herói da resistência à ditadura, produziu o espírito da então nova Constituição, tornando-a emblematicamente a alma da democracia brasileira. Pode ser que alguns dispositivos ainda não sejam bem observados, mas este encontro entre Constituição e cidadania incorporou-se à alma da democracia para fazê-la funcionar. Temos persistentes imperfeições ainda, mas os direitos civis e os direitos humanos são incomparavelmente muito mais respeitados do que nos tempos amargos da ditadura. As mulheres conquistaram maior espaço político - e tanto é assim que uma delas está na Presidência da República. Minorias encontraram lugar mais confortável e, embora ainda tenha inimigos, a liberdade de expressão, de opinião e de imprensa está plenamente em vigor.

Como afirmou Winston Churchill em relação à resistência inglesa na Segunda Guerra Mundial, "nunca tantos ficaram devendo tanto a tão poucos", podemos dizer o mesmo aos que, corajosamente, se juntaram a Ulysses Guimarães para resistir. No pior dos momentos, este líder proclamou, recorrendo às frase do almirante romano Pompeu, a qual o poeta Fernando Pessoa levou para um poema: "Navegar é preciso, viver não é preciso."

Aquela corajosa navegação conclamada por Ulysses tornou-se uma vitoriosa odisseia e encontrou o porto da liberdade. A Constituição Cidadã foi como o farol que clareou suficientemente o caminho para o restabelecimento do respeito ao povo e para a consolidação da\da soberania nacional.

Quatro anos depois de ter proclamado a Constituição Cidadã, também em um outubro, Ulysses Guimarães morreu em um acidente de helicóptero, no litoral paulista. Não se encontrou o seu corpo. Disse um almirante holandês que o mar é o único digno de um almirante bátavo. Talvez se possa dizer o mesmo em relação a Ulysses, que repousa em seu sepulcro marinho.


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QUANDO A EDUCAÇÃO FAZ TODA A DIFERENÇA
INDEPENDÊNCIA PELOS LIVROS. Correio BsB 15.01.12

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Na caminhada para se tornar a quinta potência do mundo, o Brasil enfrenta um obstáculo ainda perverso, e de difícil solução: após 10 anos de avanços econômicos, que fortaleceram a moeda e estimularam o consumo, preocupa os especialistas o baixo nível educacional da população. Estimativas indicam que cada ano a mais na formação de trabalhadores tende a elevar o crescimento da economia em até 7%. "A revolução do ensino precisa começar já, ou nunca seremos referência em um tema que tem nos custado tão caro", afirma Mozart Neves Ramos, conselheiro da ONG Todos pela Educação. As mudanças nesse cenário, felizmente, começam a aparecer: o aumento da renda permite, para muitas famílias, o acesso à universidade.



O aumento da escolaridade é a maior arma de que o país pode dispor para se livrar do atraso que dificulta a caminhada rumo ao desenvolvimento. Cada ano a mais de ensino na formação de trabalhadores tende a elevar o crescimento econômico em até 7%NotíciaGráfico



A transformação social do Brasil nos últimos 10 anos, fruto da consolidação da estabilidade econômica, resultou na ascensão de mais de 40 milhões pessoas à classe média e em um mercado consumidor invejável.

Depois de mais de duas décadas de estagnação, hiperinflação e desemprego recorde, esse contingente de brasileiros pôde ir às compras, reformar a casa, botar o primeiro carro na garagem. Enfim, satisfazer necessidades relegadas por tanto tempo. Mas quando descontados todos os avanços, nada salta mais aos olhos do que o baixo nível educacional da nação que caminha, a passos largos, para se tornar a quinta potência do mundo até 2015.

"Se o Brasil quiser completar os 200 anos de independência, em 2022, livre das amarras do atraso, a única opção que lhe resta é fazer a revolução da educação. E ela precisa começar já, ou jamais seremos referência nesse tema que tem nos custado tão caro", diz Mozart Neves Ramos, conselheiro da ONG Todos pela Educação. Felizmente, ainda que o ritmo não seja o desejado, as mudanças estão se impondo no horizonte. Em muitas famílias, pela primeira vez, um de seus integrantes está tendo acesso à universidade, seja pelo aumento da renda, seja por meio de uma bolsa de estudo ou de um financiamento bancário.

Com mais anos de estudo no currículo, os brasileiros estão deixando para trás um destino que, para muitos, parecia traçado: conseguir, no máximo, um subemprego e viver açoitado pela pobreza e pela falta de perspectivas. Não à toa, tornaram-se exemplos para os mais próximos. Atualmente, o Brasil oferece 29,5 mil cursos em instituições públicas e privadas de nível superior, três vezes o número existente em em 2000. Naquele ano, cerca de 300 mil estudantes concluíam, anualmente, a graduação. Pelas contas do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), pelo menos 1 milhão de profissionais foram formados em 2011.

Potencial
Em algumas regiões, como o Nordeste, o ingresso de estudantes em curso superior cresce vertiginosamente: as matrículas passam de 1 milhão por ano, atrás apenas do verificado no Sudeste, onde estão os estados mais ricos do país. Nos cálculos do pesquisador Marcelo Neri, do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, o incremento educacional no Nordeste tem impulsionado mais a economia do que os programas de transferência de renda do governo. Entre 2001 e 2009, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita nordestino avançou 41,8%, dos quais 31,8 pontos percentuais decorreram do aumento da escolaridade e 5,4 pontos, dos repasses governamentais.

No conjunto da economia, o impacto da educação tem potencial ainda mais expressivo. O acréscimo de um ano na média de escolaridade dos brasileiros, que, atualmente, é de apenas 7,2 anos, é capaz de ampliar em até 7% o PIB, a soma de todas as riquezas produzidas em um ano, diz o economista Samuel Pessôa, sócio da Consultoria Tendências. Ele explica que tal crescimento resultaria da combinação do avanço no salário médio dos trabalhadores com a criação de condições mais favoráveis para o investimento e o desenvolvimento de novas tecnologias. "O aumento da escolaridade tem, inegavelmente, impactos diretos e indiretos sobre o PIB a longo prazo", ressalta.

Na avaliação de Pessôa, longe de ser apenas uma benesse oferecida à população, o estímulo à educação é uma estratégia adotada tardiamente pelos governos no Brasil. Os primeiros esforços para fazer do ensino uma ferramenta para o crescimento econômico surgiram há menos de 20 anos. Apesar de o país ter, atualmente, 6,4 milhões de alunos matriculados em cursos superiores, mais do que o dobro de uma década atrás, o contingente representa apenas 15% da população com idade entre 18 e 24 anos.

O secretário de Ensino Superior do Ministério da Educação, Luiz Cláudio Costa, reconhece que o número é pequeno, mas afirma que o trabalho feito nos últimos 10 anos não pode ser desprezado. "Nós estávamos com um percentual de jovens e de adultos lamentavelmente muito baixo nas universidades. Mas, por mais que tenhamos feito, ainda estamos muito além do ideal", admite.

A vitória individual dos brasileiros que aproveitaram as poucas oportunidades de que dispunham e o caminho de espinhos a ser percorrido por aqueles que veem na educação de qualidade a porta da libertação do atraso serão temas de uma série de reportagens publicadas pelo Correio  a partir de hoje.

Valorização do professor
Mozart Neves Ramos, conselheiro da ONG Todos pela Educação, assegura que, sem uma estratégia consistente do governo para melhorar a qualidade do ensino no país, dificilmente haverá motivos para comemoração mais à frente. "Não podemos perder o bonde da história. É preciso aproveitar o bom momento da economia do país e melhorar a qualidade do aprendizado. E o passo mais importante é valorizar o professor", diz. Ele ressalta que nenhuma grande economia do mundo atingiu padrões de vida civilizados sem um comprometimento real com a educação.

União de forças
Jorge Werthein, especialista em educação e ex-diretor da Unesco, admite que é desanimador comparar os índices da educação no Brasil, a sexta maior economia do mundo, com os níveis de formação profissional das nações desenvolvidas. "A distância do Brasil ainda é muito grande. Apesar da melhoria dos indicadores educacionais nos últimos anos, o país está longe de recuperar as décadas de atrasos e de superar o descaso com o sistema de aprendizado", afirma. A seu ver, não adianta apenas o governo federal a  parte dele. É preciso que estados e municípios se somem aos esforços.

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Transparência no Judiciário
João Lemes - joao.lemes@ojc.com.br
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Quando adolescente, ficava horas e horas ouvindo meu pai contar histórias de admiração pelas instituições, especialmente o Executivo e o Judiciário.  (...)  O POPULAR /GO   15/01


Eram relatos de suas lidas para resolver problemas que envolviam a Justiça ou o governo do Estado. Naqueles tempos, com base no que ouvia, via o Judiciário como uma coisa quase inatingível, suas decisões inquestionáveis e seus membros pessoas acima de qualquer suspeita.


Hoje os tempos mudaram e a realidade nos leva a outra visão do órgão: o Judiciário vive uma grave crise devido aos questionamentos sobre falta de transparência em suas instâncias. Há suspeita de atos e ações que não combinam com o perfil desejado de quem deve aplicar a lei, mas seus membros resistem a uma investigação externa.

A polêmica ganhou força em dezembro, após o ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, em decisão liminar, limitar os poderes de investigação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), criado exatamente com o objetivo de fiscalizar os atos do Judiciário. A decisão foi em resposta a recurso da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) questionando ação da corregedora do CNJ, ministra Eliana Calmon, que iniciou investigação contra juízes e servidores do Judiciário nos Estados.

Após declarações da corregedora, que vê "corporativismo ideológico perigosíssimo" no Judiciário, chegando a falar em "bandidos de toga", Marco Aurélio questionou os atos do CNJ, disse que a entidade não pode ser um superórgão e que acima dele está o STF. Estudiosos do assunto veem na liminar de Marco Aurélio um divisor de águas. Ela expõe a magistratura, daqui para a frente, ao risco de consolidar a imagem de instituição avessa à transparência e defensora de privilégios.

Previsto na reforma do Judiciário com a missão de controlar a atuação administrativa e financeira do setor, o CNJ foi criado em 2005. Mas o que tirou o sossego do Poder foi a decisão do Conselho de mexer na "caixa preta" dos tribunais, ao inspecionar as folhas de pagamento e declarações de bens de juízes, em especial os de São Paulo.

Enquanto o debate na sociedade aponta para a transparência dos atos, a Justiça, como mostra a liminar do ministro Marco Aurélio, caminha no sentido contrário. Um termômetro da desconfiança da população em relação ao Judiciário pode ser visto na pesquisa do Grupom, publicada dia 8 no POPULAR e que avaliou o grau de confiança dos entrevistados nas instituições públicas. A Justiça teve uma das piores avaliações, com 10,5% de confiança.

O intrigante nesta história é a resistência do Judiciário em dar transparência a seus atos. Como órgão responsável por zelar pelo cumprimento das leis, cabe ao Judiciário dar o exemplo, dando clareza aos atos de seus membros. Afinal, como bem diz o ditado, quem não deve não teme.
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