quarta-feira, 6 de junho de 2012


Livro busca decifrar enigma João Gilberto
Edição comemorativa traz entrevistas, depoimentos e ensaios sobre o cantor, que completa 81 anos no domingo. FOLHA SP 06.06
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Organizador e editores buscaram deixar em segundo plano o folclore em torno do criador da bossa nova

Francisco Pereira    

João, entre Luiz Roberto e Quartera, de Os Cariocas, Tom Jobim e Vinicius de Moraes, nos anos 1960, no Rio de Janeiro
PAULO WERNECK
EDITOR DA “ILUSTRÍSSIMA”
Depois do anticlímax de ter a turnê de seu aniversário de 80 anos cancelada no ano passado, João Gilberto completa 81 no próximo domingo debaixo de um holofote que pode ajudar a compreender por que, afinal, tanta gente o considera um gênio.

Misto de fortuna crítica e homenagem, o livro "João Gilberto", que a Cosac Naify lança nesta semana, tem tudo para se tornar um marco, como "O Balanço da Bossa" (1968), de Augusto de Campos, ou "Chega de Saudade" (1990), de Ruy Castro.

Organizado por Walter Garcia, professor do Instituto de Estudos Brasileiros da USP, sob coordenação dos editores Milton Ohata e Augusto Massi, o livro pretende reunir tudo o que já se escreveu de importante sobre João e que estava fora de circulação.

Jornalistas, musicólogos, músicos e pesquisadores foram mobilizados para mostrar diferentes ângulos da arte de João, sua recepção na França, na Itália, no Japão, suas conexões com a arquitetura e a literatura.

Lá estão as primeiras entrevistas e perfis dos anos 1950, as resenhas feitas no calor da hora, os depoimentos de músicos e parceiros e uma empolgada convocação do cronista Antonio Maria para que o leitor fosse ouvir o baiano em sua companhia, numa boate em Copacabana.

"Este é um livro a favor", explica Ohata. E ser a favor, aqui, significa pôr em segundo plano o anedotário que aderiu à figura de João. Esqueça o homem que fez o gato se suicidar, que fala no telefone por código Morse, que só sabe reclamar do som e do ar-condicionado etc. Não por acaso, há no livro uma seção chamada "Antianedotário".

"É uma grande bobagem reduzir João ao anedotário", disse Garcia à Folha. "Espero que o livro ajude a desmitificar muito do que se fala de João Gilberto."

Na busca por essa "desmitificação", Garcia foi atrás de Aderbal Duarte, músico e professor baiano que conseguiu demonstrar como se dá, na pauta musical, a famosa batida criada por João.

Outra "aventura" foi localizar, em Manhattan, o baterista Sonny Carr, que atuou no cultuado disco branco de 1973 e que muitos acreditavam não passar de pseudônimo.

ENSAIO

Embora também traga reportagens e depoimentos, além de fotos inéditas (veja uma delas acima), a tônica do livro é o ensaio.

O melhor exemplo de tentativa de apreender criticamente a obra de João e tratá-la como uma questão intelectual é um texto de 1992, talvez o mais citado ensaio sobre o cantor.

No curto e brilhante "João Gilberto e o projeto utópico da bossa nova", o musicólogo Lorenzo Mammì demonstra como João simbolizou uma geração que apresenta "seu mais rigoroso trabalho como um lazer, como o resultado ocasional de uma conversa de fim de noite".

Nem tudo, porém, está no holofote da Cosac Naify. Sobram EUA, Europa e Japão, mas falta esquadrinhar sua passagem pelo México, onde gravou um de seus discos mais importantes. Falta também uma análise mais densa de sua parca produção como compositor.

Dissecar o mito, no entanto, nem sempre escapa ao tom de "vida de santo" tão comum nos textos sobre o baiano. Que o diga o produtor japonês Shigeki Miyata, que em seu "O Cotidiano de um Deus" relata em êxtase um telefonema de João, numa abstrusa mistura de português e inglês: "Sentia como se tivesse ouvido uma linda música durante minutos".

Como escreve Mammì, "a perfeição de João Gilberto [...] carrega objetivamente os estigmas da obsessão".

Ou, como resumiu o amigo e parceiro Vinicius de Moraes, em 1964: "Eu sei que dentro da sua neurose, dentro da sua esquisitice, existe um lugar que ele rega diariamente com as lágrimas que chora por dentro. Um lugar que podemos chamar de Brasil, por exemplo".

JOÃO GILBERTO

ORGANIZADOR Walter Garcia
EDITORA Cosac Naify
QUANTO R$ 215 (512 págs.)

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ANÁLISE.  Condições do país ainda favorecem o desmatamento. FOLHA SP 06.06

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Entre 2010 e 2011, a Amazônia perdeu 642 mil hectares de floresta. Considerando a riqueza típica de espécies na região, isso significa 480 milhões de árvores com diâmetro acima de 10 cm.

Apesar desses números trágicos, a área desmatada foi a mais baixa desde que o monitoramento por satélite foi iniciado, em 1988. Em comparação com o pico de 2004, a queda foi de cerca de 75%.

Essa redução do desmatamento decorreu de uma combinação de políticas públicas mais eficazes, de pressão de campanhas ambientais e da redução de preços de mercadorias agrícola.

Entre 2003 e 2007, o Ibama aumentou o valor total de multas emitidas de R$ 153 milhões para R$ 1,4 bilhão. O número de itens confiscados e embargos subiu de 81 para 7.092 por ano. Entre 2005 e 2007, mais de 500 pessoas foram presas em investigações de crimes ambientais.

A segunda política que mais avançou foi a criação de áreas protegidas, que atingiram 487,1 mil km² de novas Unidades de Conservação.

No Pará, uma ação do Ministério Público em 2009 levou os frigoríficos a exigirem a regularidade ambiental das fazendas. Essa pressão aumentou o número de imóveis no cadastro ambiental de cerca de 400 para mais de 43 mil. Isso ajudou o desmatamento no Pará a cair em 2011, enquanto subiu em Mato Grosso e Rondônia.

Entretanto, o sucesso recente não é garantia de sucesso futuro. Ruralistas e setores do governo reforçaram o lobby contra as leis ambientais, incluindo as mudanças no Código Florestal e a redução de áreas protegidas.

O desmatamento em 2011 foi maior em torno de regiões onde estão sendo construídas hidrelétricas no Pará e em Rondônia.

Para continuar reduzindo o desmatamento, o Brasil teria de barrar as propostas de enfraquecimento das leis ambientais, corrigir as falhas das políticas atuais e implementar outras.

Por exemplo, uma parte substancial do desmate restante está associada a pequenos produtores, contra os quais é difícil apenas aplicar penas sem contrapartidas de incentivos. Mas o governo ainda não criou um programa robusto de incentivos.

A situação fundiária continua caótica. Sem saber quem é dono da terra, fica mais difícil aplicar as penas. Mas o programa para regularizar as ocupações quase não avançou recentemente.

Enfim, podemos comemorar a redução da tragédia, mas ainda há muito a fazer.

PAULO BARRETO é engenheiro florestal e pesquisador sênior da ONG Imazon



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Angeli e Laerte serão surpresa na Flip
Décima edição da Festa de Paraty, de 4 a 8 de julho, terá uma mesa bônus no sábado à noite com os cartunistas. FOLHA SP 06.06

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Amigos há quase 40 anos, eles falarão sobre HQ, comportamento e humor, além de coordenarem oficina

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Surpresa guardada até agora pela organização da Flip, os cartunistas Angeli e Laerte farão parte de uma mesa extra na programação da décima edição, de 4 a 8 de julho, em Paraty.

Expoentes da HQ nacional, os dois amigos falarão na Tenda dos Autores, o palco principal do encontro, no sábado à noite (dia 7), com mediação do jornalista Claudiney Ferreira e patrocínio do Itaú Cultural. Os ingressos serão vendidos em data mais próxima ao início da festa.

O debate, afirmam eles, será o mais informal possível, uma conversa entre amigos de quase 40 anos.

"Já fizemos muitas palestras juntos. Eu já sei até o que ele fala e ele sabe o que eu falo", brincou Angeli.

"Não consigo seguir roteiro. Se propõem um, digo que sim, mas na hora eu mudo. Continuará assim. Vamos falar sobre HQ, comportamento e, principalmente, humor."

"O mais gostoso", acrescenta, "é responder ao público". O criador da Rê Bordosa (de quem será lançada uma antologia na Flip) dá a deixa aos fãs: "Quando o público provoca, fica até melhor".

Ambos quadrinistas e cartunistas da Folha, Angeli, 55, e Laerte, que fará 61 no domingo, também vão coordenar, nos dias 6 e 7 de julho, a oficina literária da décima Flip, já divulgada anteriormente, para 30 ilustradores selecionados em concurso.

Segundo Laerte, ele e Angeli recordarão sua experiência desde o tempo em que faziam fanzines. "Costuma se entender oficina como algo mais didático, mas nem eu nem ele temos tarimba em ensinar. Vamos falar do nosso trabalho e ouvir o que os meninos têm a dizer."

Angeli concorda. "Nunca soube ensinar para alguém o que faço, não tenho método. Prefiro bater um papo, conversar de igual para igual."

Sobre a relação entre HQ e literatura, os amigos têm visões ligeiramente desiguais.

"HQ não é literatura, são coisas distintas, linguagens diferentes para contar histórias", disse Angeli.

"Encaro o que faço como literatura, sim. O fato de [a HQ] ser uma narrativa em imagens aproxima as linguagens", afirmou Laerte.

Questionado sobre como se define profissionalmente numa ficha de hotel, Angeli respondeu que como jornalista. "Tenho olhar de jornalista, de trazer pro meu trabalho o que está acontecendo."

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