segunda-feira, 22 de abril de 2013
VISÃO DO CORREIO »
Universidade sem doutores.
CORREIO BSB 22.04
.
Pior do que errar é não reconhecer o erro. É colocar o medo
do desgaste pessoal acima das consequências da falha cometida. Por isso mesmo,
se errar é humano, corrigir é virtude para o comum dos mortais e obrigação
irrecusável para a autoridade. Está, portanto, correto o Ministério da Educação
(MEC) em reconhecer o absurdo patrocinado por lei de autoria do Executivo
aprovada em 2012 e que entraria agora em vigor.
Ao regular a admissão de funcionários no serviço público
federal, a norma impôs, sem reservas, que a entrada deve se dar pelo nível mais
baixo das carreiras, sendo, portanto, vedada a exigência de diplomas de
pós-graduação. O resultado é que as universidade federais somente poderiam
fazer concursos para auxiliares de ensino, dos quais somente se pede a
graduação.
Elas ficariam, então, impedidas de exigir ou dar pontuação
extra para os candidatos a professores que tenham concluído mestrado, doutorado
ou pós-doutorado. Uma trapalhada capaz de anular a liberdade que devem ter as
universidades de preencher seus quadros docentes com o que de melhor e mais bem
preparado houver na inteligência do país.
Um equívoco de consequências tão nefastas para a busca da
qualidade do ensino superior no Brasil que é incompreensível que tal projeto
tenha tramitado intacto pelo Congresso Nacional. Entidades representativas dos
reitores e de professores universitários afirmam que tentaram chamar a atenção
do MEC para a necessidade de intervir na redação do texto, mas não foram
ouvidas.
Alertado para o desastre, o MEC reconheceu que lhe cabe
providenciar que o governo envie com urgência um projeto de lei ou medida
provisória corrigindo a falha e devolvendo a autonomia às universidades para
que possam realizar concursos com todas as exigências para preencher seus
quadros.
O episódio expõe o improviso e a falta de cuidado com as
decisões relativas à educação, setor que deveria ser prioridade inquestionável
de qualquer governo. De fato, não têm faltado demonstrações de que carecem de
visão de longo prazo e de adequado planejamento várias medidas que introduzem
mudanças operacionais e mesmo estruturais no sistema de ensino e nos processos
de avaliação.
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) só agora vem
ganhando confiabilidade, depois de anos de trapalhadas que refletiam
improvisação e inexperiência de seus gestores. Mais recentemente, a atualização
da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional estabeleceu que as crianças
terão de ser matriculadas numa escola aos
4 anos de idade, a partir de 2016.
É medida que já vem tarde. Vai garantir acesso à pré-escola
aos menos favorecidos e aumentar a média de anos de estudos no Brasil, uma das
menores do mundo. Mas nem por isso deveria ter sido tomada sem levar em conta
que faltam professores e tempo para prepará-lo adequadamente para essa delicada
missão. Sem contar que se trata de tarefa e custo que recairá sobre os
municípios, sabidamente a esfera de poder que fica com a menor fatia do bolo tributário.
>>>>
Em defesa da sala de aula
Vencedor do Nobel de Física propõe, na revista Science, que
professores universitários não valorizem apenas a pesquisa e se dediquem mais à
formação dos futuros cientistas. Para especialistas brasileiros, falta de
interesse pelo ensino também é um problema no país. CORREIO BSB 19.04
.
Aula na Universidade de Brasília: especialistas apontam
necessidade de maior contato entre mestres e alunos nas instituições
brasileiras
Apesar de a educação ser reconhecida há um bom tempo como
direito fundamental e essencial ao ser humano, ainda hoje existem vários
desafios a serem superados. Os problemas não se limitam aos países mais pobres.
As grandes potências econômicas também são confrontadas com a árdua tarefa de
identificar e reverter os principais obstáculos ao progresso do ensino básico e
superior. A renomada revista científica Science traz na edição desta semana um
especial que discute vários aspectos envolvidos na aprendizagem e no processo
de construção do conhecimento. Em artigos independentes, pesquisadores abordam
as barreiras encontrados nas salas de aula, na estrutura do sistema de ensino,
ou mesmo na sociedade envolvente.
Um dos grandes destaques da publicação é o trabalho do
físico estadunidense Carl Wieman, que recebeu o Nobel de Física em 2001 pela
criação experimental do condensado de Bose-Einstein. Reconhecido por
desenvolver pesquisas de ponta, o físico também é engrandecido por seu empenho
nas salas de aula. Segundo ele, a forma como a maioria dos centros de pesquisa
na América do Norte ensina ciência aos alunos de graduação é pior do que
ineficaz, “é anticientífico”. Desde que tomou para si a missão de educador,
Wieman diz não entender por que as instituições de ensino superior ainda hoje
desconsideram décadas de pesquisas que mostram a superioridade da aprendizagem
ativa em relação aos tradicionais 50 minutos de palestra em que o professor
fala, e os alunos somente escutam.
A aprendizagem ativa é o processo pelo qual um
comportamento é modificado pela experiência, um método que pode ser aplicado em
salas de aula presenciais ou a distância. Ela envolve atividades destinadas a
promover o desenvolvimento físico, intelectual e emocional dos alunos. O que
pode incluir jogos, educação sensorial, socialização, incentivo ao raciocínio
lógico e mesmo educação física. Outro elemento ressaltado pelo vencedor do
Nobel é a prática deliberada, que consiste, basicamente, em investir horas
praticando aquilo que se quer aperfeiçoar ou aprender. A ideia, desenvolvida
pelo psicólogo K. Ander Ericsson, da Universidade do Estado da Flórida, entende
o cérebro como um músculo que precisa ser exercitado para funcionar em seu
pico. Então, assim como um atleta treina rigorosamente para alcançar uma
performance de elite, os alunos precisam ser incentivados a resolver um
conjunto de tarefas ao mesmo tempo desafiadoras e factíveis para um bom
desenvolvimento cognitivo.
Nisso, o papel do educador é fundamental. “Há toda uma
indústria dedicada a medir o quão importante minha pesquisa é, ou em mensurar
qual é o impacto de meus artigos. No entanto, nós nem mesmo coletamos
informações sobre a maneira que eu ensino. Isso não recebe atenção nenhuma”,
reclama Wieman em seu artigo na Science. Ele defende que, se o ensino
permanecer ofuscado, as universidades se acomodarão a dedicar o mínimo possível
para tornar o ensino eficaz e continuarão investindo a maior parte do tempo e
dinheiro em pesquisa. Longe de desconsiderar a importância da produção de
conhecimento a partir das pesquisas, o que o físico defende é uma equiparação
das duas bases, que são fundamentais dentro da lógica do ensino superior.
Status
No Brasil, apesar das diferenças, muitas das críticas
expostas por Wieman são compartilhadas por pensadores da educação. Remi
Castioni, professor da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB),
lamenta o fato de hoje o professor não ser valorizado porque dá aula. “Se
pudesse, grande parte dos professores universitários não dariam aula. Ficariam
trancados no laboratório produzindo artigos, porque é o que dá status. Você é
valorizado pelo número de artigos em periódicos.” Nesse contexto, o mínimo de
oito horas semanais de aulas efetivas para os professores das instituições
federais — definidas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional —
acabam se tornando o máximo, diz Castioni. “Dificilmente, você consegue fazer
um professor na universidade dar mais de oito horas aula por semana. O problema
também é que poderíamos ter outro formato. Atividades como encontros e a
organização dos alunos em grupos menores de tutoria também poderiam ser
contabilizadas como horas-aula”, opina.
Para o pedagogo, o ideal seria uma combinação entre ensino
e pesquisa, além de uma reorganização do espaço da ocupação docente. Uma das
estratégias propostas por ele é estimular que as sumidades de cada curso, os
professores com grande destaque, por sua evolução na carreira acadêmica, sejam
colocadas para dar aulas introdutórias para os calouros, e não só para as
disciplinas avançadas. Segundo ele, isso poderia estimular os jovens que
acabaram de ingressar na universidade a se interessarem pelo curso. Outra
questão é evitar a evasão dos alunos de destaque para os laboratórios logo no
início de sua trajetória acadêmica. “Nas licenciaturas, o aluno que se destaca em
química, física, biologia é imediatamente recrutado para o laboratório e
abandona a licenciatura. Nossos cursos têm uma competição interna muito forte.
Com isso, perdemos um potencial de grandes professores”, lamenta.
Clarilza Prado de Sousa, professora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC SP), acrescenta que, enquanto na
pós-graduação, os professores pesquisam em conjunto com o aluno e estabelecem
uma relação mais próxima, na graduação, o contrato do professor precisa
equilibrar melhor as horas exigidas na sala de aula. “A estrutura de contrato
do trabalho do professor tem que levar em consideração as horas que ele gasta
para planejar as aulas.” Para ela, uma avaliação do ensino superior adequada
não pode analisar somente o conteúdo ensinado em cada curso, mas é importante
também avaliar as condições oferecidas pela universidade. Nesse ponto, entraria
a qualificação do professor, se ele tem tempo para organizar as aulas e os
próprios resultados de aprendizagem dos alunos.
Quatro perguntas para
Paulo Speller, secretário de Educação Superior do
Ministério da Educação
No Brasil, também existe dificuldade de conciliar pesquisa
e ensino, como está se debatendo nos Estados Unidos?
A própria definição de universidade implica na produção
científica, e o locus privilegiado dessa produção são as universidades. Então,
deve-se esperar que um professor, na sua carreira, busque a produção científica
dentro da perspectiva da relação indissociável de ensino, pesquisa e extensão.
Pesquisa aparece em primeiro lugar, porque, quando você fala em extensão e
ensino, você necessita de uma base de produção que vai ser ensinada e estendida
à sociedade. Então, o pilar da universidade é a pesquisa. Talvez o professor
Carl Wieman, ao falar da realidade dos Estados Unidos, aponte uma situação
relativamente diferenciada. Lá, você tem um processo que se aproxima da
universalização do acesso ao ensino superior, que se dá fundamentalmente por
meio dos colleges. Eles são, muitas vezes, a base inicial, um primeiro ciclo da
formação superior. A maioria não tem laboratórios de pesquisa e programas de
pós-graduação, que você vai encontrar nas universidades. Essa diferenciação
existe, mas uma universidade sem pesquisa, sem produção científica, sem cursos
de pós-graduação, não é uma universidade.
Qual é o desafio do Brasil para o ensino superior?
Um dos desafios é buscarmos atender o projeto que está
tramitando no Congresso Nacional prevendo 30% dos nossos jovens adultos, de 18
a 24 anos, matriculados em cursos de nível superior. O Brasil começou muito
tarde, nossa primeira universidade vem do século passado. Ainda que você tenha
tido as primeiras universidades com a vinda da Corte portuguesa, em 1808, foram
nos últimos 60 anos que começou o processo de criação de novas universidades.
Por isso, essa questão quantitativa é importante. Junto, temos que ter a
qualidade. Não adianta você expandir sem qualidade. Apesar de existir uma
discussão sobre o que é qualidade, estamos falando de uma pertinência social e
que atenda as demandas de crescimento do país. Você deve ter a preocupação de
incluir os diferentes estratos da população e atingir todas as regiões e, ao
mesmo tempo, atender demandas de crescimento econômico.
O senhor pode dar um exemplo?
Você pode pegar a discussão referente à necessidade de
engenheiros. O país não tem um número suficiente. Então, você tem uma política
de Estado com programas específicos, alocação de recursos para abertura de
novos cursos. Os resultados já começam a aparecer. Na semana passada, tivemos a
notícia de que a matrícula nos cursos de engenharia já supera a dos cursos de
direito. Estamos caminhando paulatinamente para uma efetiva universalização do
acesso ao ensino superior, com novas instituições, ensino a distância com maior
qualidade, tecnologias de informação em comunicação. Ao mesmo tempo, você tem
que trazer a preocupação de uma educação básica de qualidade, que é por onde
passam a criança e o jovem antes de chegar à universidade.
E como evitar a evasão e garantir a permanência dos alunos
no ensino superior?
Hoje, existe um programa nacional que investe R$ 500
milhões nas universidades federais para permitir programas de auxílio-moradia,
transporte e alimentação. Não basta criar e interiorizar universidades, fazer
lei de cotas, se você não dá condições objetivas para que o aluno permaneça até
o fim do curso, um local para ele comer, morar e formas de se deslocar. É um
desafio colocado para reverter os índices de evasão, que são preocupantes. São
com ações desse tipo, materialmente identificadas, que você vai enxergar como
reverter esse quadro. Esses recursos ainda precisam crescer, e vão crescer.
>>>>
Constituição sem
avanços na proteção do mar
LEANDRA GONÇALVES E MARCIA HIROTA
Fundação S.O.S. Mata Atlântica. CORREIO BSB 22.04
.
Em outubro, a Constituição Federal completará 25 anos.
Durante esse período, algumas diretrizes constitucionais se consolidaram e
trouxeram benefícios concretos de sua existência. Maior prova disso é o caráter
democrático, ao qual o presidente da Assembleia Nacional Constituinte, o
deputado Ulysses Guimarães, baseou-se para chamá-la de Constituição Cidadã.
Outras ainda precisam ser fortalecidas, enquanto ainda temos questões
fundamentais que nem sequer deram o primeiro passo de vida nesse um quarto de
século. É o caso do meio ambiente.
Segundo o art. 225, “todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Porém, até os
dias de hoje, em cumprimento ao que determina a Constituição Federal, o único
bioma que possui uma lei específica é a Mata Atlântica.
Os desafios ligados
simultaneamente à proteção dos recursos naturais e à manutenção da qualidade de
vida das populações estão associados à implementação de um modelo de
desenvolvimento, com condições mínimas de sustentabilidade.
Vários estudiosos da questão ambiental defendem o
estabelecimento de uma sociedade sustentável que incorpore o uso racional e
criterioso dos recursos naturais, em sintonia com a melhoria da qualidade de
vida. Essa posição, inevitavelmente, impõe a redefinição das relações
homem–natureza, já que esse conceito pressupõe o reconhecimento de limites à
intervenção econômica e a adoção de uma conduta mais equilibrada diante da
natureza, uma vez que cada indivíduo (país ou sociedade), ao adotar seu estilo
de vida, torna-se corresponsável pelos impactos que produz sobre o ambiente.
Hoje, a Mata Atlântica já foi incorporada aos valores da
sociedade, o que contribui para sua proteção. Trata-se da região mais habitada
do país e, dessa forma, os desafios ligados simultaneamente à proteção desses
patrimônios da nação para as futuras gerações e à manutenção do bem-estar e da
qualidade de vida das pessoas estão associados à implementação de um modelo de
desenvolvimento, com condições mínimas de sustentabilidade, ainda não
alcançado.
Ao ampliarmos o olhar para outra grande porção territorial
brasileira — o mar — estamos realmente mais distantes do que a Terra está do
Sol em termos de preservação. Embora 25% da população brasileira viva na zona
costeira e mais de 4 milhões de brasileiros utilizem de seus recursos naturais
para a sobrevivência, parece que o Brasil está de costas para o mar.
Toda política pública ambiental brasileira foi feita
baseada em atividades terrestres, em uso da terra, em áreas protegidas na
Amazônia, e faz-se sempre o difícil e praticamente impossível exercício de
aplicá-las às questões marinhas.
Considerando o que temos até hoje de legislação, podemos
encontrar pontos bastante positivos no Plano Nacional do Gerenciamento
Costeiro, que também celebra bodas de prata. No entanto, estamos longe de poder
comemorar. O plano carece de implementação e necessita de reforços estruturais
e institucionais. Além disso, refere-se apenas ao território costeiro e à faixa
marítima de até 12 milhas náuticas, ou seja, não inclui a zona econômica
exclusiva (ZEE) — área de rica biodiversidade e abundância de recursos
naturais.
As soluções para combater a degradação dos oceanos começam
com a adoção de uma Política Nacional para os Oceanos, que seja acordada de
forma participativa e que considere o papel dos oceanos em escala global para o
lazer, locomoção, alimentação e para a preservação da biodiversidade e dos
estoques pesqueiros.
Para que seja possível celebrar as grandes alegrias de uma
bodas de prata, é necessário olhar para o mar. E, das páginas do Livro dos
abraços, do uruguaio Eduardo Galeano, vem a lição do que precisa ser feito,
tanto pelos governos como pela sociedade civil. Conta o escritor que, quando o
menino Diego viu o mar pela primeira vez, ficou mudo. Quando finalmente
conseguiu falar, pediu ao pai: “Me ajuda a olhar”.
>>>
CINEMA » A voz
potente da Ceilândia
Longa-metragem discute o controverso papel de ocupação dos
operários no Distrito Federal e que deu origem à cidade. CORREIO BSB 19.04
.
Adirley Queirós e Nancy Araújo em A cidade é uma só?: hoje,
às 8h30, na Universidade de Brasília
Um protesto sem hasteamento de bandeiras foi feito na
programação paralela do 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro contra as
políticas culturais no DF. A cidade é uma só?, primeiro longa-metragem do
diretor ceilandense Adirley Queirós, foi retirado pelo próprio realizador da mostra paralela do festival. Desde então,
o título que recebeu prêmios nos Festivais de Tiradentes, Rio e Fórum Doc de
Belo Horizonte nunca foi exibido em Brasília. A primeira sessão oficial no
Plano Piloto será feita em sessão matinal da mostra Luz, câmera, UnB 50 Anos em
filmes, hoje, às 8h30, no auditório da FAC (ICC Norte). Em maio, está prevista
a estreia em salas comerciais, com lançamento feito pela distribuidora Vitrine
Filmes.
Uma aproximação temática entre A cidade é uma só? e o
documentário Conterrâneos velhos de guerra (1990), de Vladimir Carvalho,
promove um encontro entre duas gerações de cinema do Distrito Federal. Uma das
vertentes do doc de Vladimir (lançado em DVD somente agora pelo Instituto
Moreira Salles) é a marginalização dos trabalhadores da construção de Brasília,
retirados da Vila IAPI, no centro da cidade, e movidos para a região que mais
tarde viria a se chamar Ceilândia.
Quarenta anos depois, Queirós redescobre a Campanha de
Erradicação de Invasões, cuja sigla CEI daria origem ao nome Ceilândia por meio
da história real da cantora e radialista Nancy Araújo, recrutada ainda na
escola primária para participar das gravações do jingle da campanha que a
levaria com a família para a periferia do DF. O cineasta constrói narrativas
paralelas com inclusão de dois personagens fictícios, correspondentes, a
segunda geração de ceilandenses. Distanciando-se do recente ciclo da favela no
cinema nacional (onde a questão da violência urbana era preponderante) e anos
luz de distância do marxismo do cinema novo, A cidade discorre sobre a utopia
de igualdade na nova capital pelo ponto de vista daqueles que não habitam nela
e explícita o problema da novo arranjo urbano do DF, promovido pela gula da
especulação imobiliária recente.
MOSTRA LUZ, CÂMERA, UNB 50 ANOS EM FILMES
Hoje, às 8h30, no Auditório da FAC (ICC Norte), exibição do
longa-metragem A cidade é uma só?, de Adirley Queirós. Sessão seguida de debate
“A política de cultura e de cinema no DF e no Brasil”, com Leopoldo Nunes,
secretário Nacional do Audiovisual(MinC), Hamilton Pereira, secretário de
Cultura do DF, o cineasta Adirley Queirós e o presidente da Associação
Brasiliense de Cinema e Vídeo (ABCV), André Carvalheira. Mediado pelo diretor
da FAC/UnB, David Renault. Entrada franca. Não recomendado para menores de 12
anos.
TRÊS PERGUNTAS// ADIRLEY QUEIRÓS
Como surgiu a ideia do Partido da Correria Nacional e do
candidato a deputado distrital?
Queria mostrar o partido de um homem só. O candidato a
deputado distrital (e presidente do partido) é um faxineiro e o empresário dele
é tão f… quanto ele. O Partido da Correria Nacional é isso, um núcleo do
proletariado que foi esquecido. A construção política nos espaços periféricos é
muito confusa. Olhe para as representações das periferias no Senado e na
Câmara? A esquerda que está aí não me representa. Por mais que tenha havido
avanços no país, a esquerda assumiu o comportamento de centro direita.
A cidade e O som ao redor (Kleber Mendonça Filho) são dois
filmes nacionais recentes pintados com as tintas dos contrastes sociais que não
vitimizam os personagens marginalizados. Como encontrar o equilíbrio?
Nos dois filmes, os personagens conseguem se articular e
experimentar o espaço, sem necessariamente depender do Estado. Não são
coitados, não são mocinhos. Me incomoda muito quando o marginal (a pessoa que
vive fora do centro) vira bom moço. Por que esse cara marginal tem de ser
politicamente correto? É a ideia que o que tudo vai se acalmar no futuro e que
o paciente vai ter paciência para sempre. O bom mocismo é um tipo de exclusão,
esvazia o discurso político.
Como o coletivo CeiCine elabora as histórias sobre
diferenças sociais, evitando o academicismo do cinema novo e sem exibir a
violência explícita do ciclo de favela?
Desde Dias de greve (curta—metragem), a gente discutia na
CeiCine como o operário se organiza e como essa discussão é feita de cima para
baixo pela gramática política. No cinema novo, tem muito isso. os intelectuais
jovens de elite tentam organizar o discurso da favela. O que a gente concluiu é
que essa discussão tem de ser feita na nossa base. Temos mais dúvidas do que
certezas, mas a gente quer que a discussão passe por aquelas formas e por
aquele conteúdo. Se o personagem fala rápido, ele fala por que a gente quer. É
acertar e errar. A partir daí, a gente constrói os personagens e a relação com
o espaço e com o tempo.
Os personagens
Dildu (Dilmar Durães)
Morador de Ceilândia, Dildu dá duro como faxineiro no Plano
Piloto. Fundador do Partido da Correria Nacional (PCN), concorre as eleições
para deputado distrital com um jingle de campanha sincopado e gângster.
Zé Antônio (Wellington Abreu)
Um especulador imobiliário de pequeno porte. Mexe com
compra e venda de lotes nas cidades satélites enquanto ajuda o cunhado, Dildu,
durante a campanha para deputado distrital.
Nancy Araújo
A cantora e radialista Nancy Araújo foi uma das crianças
recrutadas para gravar o jingle da Campanha de Erradicação de Invasões (CEI),
na década de 1970. Adulta, Nancy compõe letras de música com visão crítica a
respeito da expulsão dos moradores da Vila IAPI. É a única personagem real do
filme.
>>>>>
As histórias de Stefan Zweig
Os encantos e desencantos do escritor austríaco apaixonado
pelo Brasil são analisados pela lente atual de alberto dines. CORREIO BSB 19.04
,
É preciso ler até a metade do capítulo 17 de Maria
Antonieta — Retrato de uma mulher comum para entender o fascínio de Stefan
Zweig por sua biografada. A rainha odiada pela população e símbolo da
ostentação e do fim da monarquia francesa ganha uma dignidade muito humana
quando percebe, finalmente, estar diante da história. Com o desterro antes da
guilhotina, Maria Antonieta passa da rainha boba, mimada e alienada a uma
grande mulher.
Que não se espere de Zweig uma análise de historiador sobre
o personagem ou um ensaio crítico sobre a Revolução Francesa. É pela monarca
austríaca que o autor se apaixona. Assim como se encanta pelo navegador em
Fernão de Magalhães — O homem e sua façanha. Biógrafo com obsessões de
arqueólogo, Zweig não precisa se declarar arrebatado pelos biografados para
deixar claro o quão se envolveu com os personagens.
Essa relação foi de grande valia para o jornalista Alberto
Dines quando começou a preparar a história da vida do escritor austríaco, ainda
nos anos 1980. Como um biógrafo precisa das reticências para encerrar seus
livros, a quarta edição de Morte no paraíso— A tragédia de Stefan Zweig chega
aos 32 anos sem ponto final, mas reescrita e incrementada com informações que
ajudam a desenhar um perfil mais preciso do austríaco.
Além do relançamento da biografia, Zweig retorna às
prateleiras das livrarias brasileiras com uma série de reedições de títulos
esgotados desde a década de 1980. É o caso de Maria Antonieta, a biografia mais
apaixonada do escritor, Três novelas femininas, que inclui a celebrada 24 horas
na vida de uma mulher e Mundo insone — Outros ensaios, organizado pelo próprio
Dines. “Jornalisticamente é muito interessante porque tem ensaios inéditos. Tentei
fazer uma espécie de biografia intelectual dele. Pego os primeiros ensaios e
vou acompanhando até o último, escrito em Petrópolis”, avisa o jornalista. A
Zahar tem ainda o projeto de reeditar a obra completa do escritor em
colaboração com a Casa Stefan Zweig.
País do futuro
Zweig chegou ao Brasil em 1936. Judeu nascido em Viena, já
havia emigrado para a Inglaterra em 1933, quando Adolf Hitler chegou ao poder e
começou a esboçar as regras antisemitas que marcariam o nazismo. O escritor
queria conhecer a América Latina e embarcou em um navio para participar de um
congresso do Pen Clube, em Buenos Aires, mas antes parou no Rio de Janeiro e se
encantou pelos trópicos. Quatro anos depois, com a Segunda Guerra já em
andamento e a tragédia do Holocausto arquitetada, Zweig decidiu se mudar de vez
para o Brasil. De tão sério, o compromisso com a ideologia pacifista afastava o
escritor de qualquer situação relacionada à guerra. Zweig se recusava até mesmo
a falar sobre o assunto. No Brasil, ele acreditava encontrar um paraíso
protegido do conflito bélico disseminado pela Europa.
Durou dois anos o deslumbre com o suposto pacifismo
brasileiro. Na visão ingênua do autor, o Brasil era um país tolerante e nada
racista, uma nação multirracial capaz de inspirar a escrita de Brasil, um país
do futuro. Publicado em 1941, o ensaio fez de Zweig — cujo rótulo de escritor
famoso o transformou em celebridade em 1936 — um alvo para boa parte da crítica
literária e da intelectualidade brasileira na época. Muitos encaram o livro
como um elogio à ditadura de Getúlio Vargas.
Na biografia, Dines reproduz trechos de pelo menos cinco
artigos destinados à desconstrução do texto do austríaco. “As pessoas queriam
atacar o governo brasileiro, mas não tinham coragem, porque era uma ditadura,
então preferiam atacar o Zweig, achando que era financiado pela ditadura. É uma
das coisas terríveis: o cara se encanta pelo povo e logo vão achar que ele é
financiado pelo governo”, lamenta. O curioso é ninguém ter lembrado dos motivos
que levaram um judeu a fugir da Europa nem da condição pró-fascista de Vargas.
Em 1936, enquanto o então presidente recebia o escritor famoso, Olga Benário, a
judia comunista alemã casada com Luís Carlos Prestes, era deportada para a
Alemanha para ser entregue aos nazistas.
Na casa em Petrópolis, na qual morou com a segunda mulher,
Lotte, Zweig ainda escreveria o clássico Histórias de xadrez e a autobiografia
O mundo que eu vi antes de se desiludir com o Brasil. Logo depois do carnaval
de 1942, um navio brasileiro foi afundado por submarinos alemães e Zweig
entendeu o prenúncio: o país entraria na guerra e apoiaria a Alemanha nazista.
Dias depois, ele e Lotte decidiram se matar. Em fevereiro, os corpos foram
encontrados abraçados na cama da casa em Petrópolis. Muitas teses surgiram
desde então, inclusive a da frustração diante das críticas a Brasil, um país do
futuro e a de uma suposta conspiração do governo Vargas para o assassinato do
escritor. Mas Dines vai por outro caminho. “Cada vez avanço mais na doutrina de
que ele se matou porque percebeu que o Brasil entraria na guerra e ele era um
pacifista”, garante o jornalista, filho de judeus ucranianos que imigraram para
o Brasil no início do século 20.
Cinema
Só a novela 24 horas na vida de uma mulher inspirou cinco
filmes. O mais recente data de 2002 e é dirigido pelo francês Laurent Bouhnik.
Zweig é um escritor bastante apreciado pelo cinema. Seus contos e novelas
renderam 67 filmes. É mais, em títulos, do que os 55 livros escritos pelo
austríaco. O último filme do ator Walmor Chagas, A coleção invisível, é baseado
em uma história do Stefan Zweig.
Memorial
A Casa Stefan Zweig, em Petrópolis, foi fundada em 2006 por
um grupo de admiradores que comprou o imóvel no qual o escritor morou e
organizou uma espécie de memorial para o austríaco.
Morte no paraíso — A tragédia de Stefan Zweig
De Alberto Dines. Rocco, 736 páginas. R$ 69,50
Maria Antonieta — Retrato de uma mulher comum
De Stefan Zweig. Tradução: Irene aron. Zahar, 504 páginas.
R$ 59,90.
Uma dívida nacional
Alberto Dines tinha 8 anos quando conheceu Stefan Zweig,
convidado para conversar com os alunos da escola na qual estudava. O rosto do
austríaco já era familiar ao garoto graças ao retrato autografado pendurado no
escritório do pai. Aos 12 anos, ele ganhou dos pais os volumes que faltavam à
coleção completa dos livros de Zweig. “Na biografia, tento provar que ele não
veio ao Brasil por acaso, não caiu de paraquedas aqui, não foi um turista
acidental. Ele queria descobrir a América do Sul e isso aconteceu exatamente um
mês depois de voltar da Rússia, em 1928, desencantado com a violência do regime
stalinista, da ditadura. Ele ficou muito perturbado, porque imaginava que um
país socialista dirigido por intelectuais não seria uma ditadura, mas enganou-se.
Um mês depois, ele escreve para seu agente, na Argentina, dizendo que queria
conhecer a América do Sul. Isso em 1928”, explica.
Para Dines, o Brasil ainda deve uma homenagem decente a
Stefan Zweig. “Acho que o governo brasileiro está em dívida com o Stefan Zweig.
Não fez nada. O livro Brasil, um país do futuro, merecia uma homenagem, uma
comemoração. Quando o livro completou 70 anos, sugeri, procurei pessoas e tal.
Mas não fizeram nada”, lamenta o autor.
Quatro perguntas // Alberto Dines
Que impacto o Brasil teve na vida de Stefan Zweig?
Isso é muito importante e é um dos dados, digamos, novos.
Tento provar que ele não veio ao Brasil por acaso, não caiu de paraquedas aqui,
não foi um turista acidental. Em 1932, ele escreve essa carta (e manifesta vontade
de conhecer a América Latina), logo depois de Hitler tomar o poder. A
oportunidade de conhecer a América do Sul só se materializou em 1936, quando
ele recebe um convite para participar de um congresso do Pen Clube na
Argentina. Ele parou primeiro no Rio e aí aconteceu o contrário: o Brasil, que
era secundário, passou a ser o grande protagonista do sonho dele. Ele começou a
escrever sobre o Brasil, encantou-se com coisas às quais hoje ninguém dá
importância. Nem o próprio governo brasileiro soube valorizar o livro que ele
escreveu sobre o Brasil. E não foi a riqueza do Brasil, a extensão territorial,
o que ele achou formidável é que o Brasil estava construindo uma sociedade
multirracial, miscigenada, num momento em que a Europa estava dilacerada pelo racismo,
pelos ódios. O governo Getúlio Vargas tirou partido do livro, mas, de lá para
cá, ninguém soube reler e ver que ali tinha uma chave de um projeto. Ele fala
do “experimento Brasil”: uma sociedade não violenta, tolerante, não racista.
Isso é uma coisa extraordinária. Se alguém escrevesse isso hoje seria
extraordinário, imagina em 1941?
Acha que ele teria o mesmo encanto hoje?
Hoje ele teria o contraste. Ele vinha com a impressão de
uma sociedade tolerante, harmoniosa, e hoje a sociedade brasileira não é
tolerante nem harmoniosa. O Zweig viveu uma experiência muito interessante em
São Paulo, na primeira viagem. Ele foi levado a um presídio modelo, no qual era
aplicada uma doutrina educacional de um psiquiatra alemão que acreditava na
recuperação dos assassinos e criminosos. Ficou encantado, mencionou isso no
livro, nas cartas. Embora a doutrina seja de um psiquiatra alemão, não era
aplicada na Alemanha. Esse é o Brasil que o encantou, humanizado, ele é um
humanista e encantou-se com a diversidade brasileira e a riqueza humana.
No livro, o senhor o chama de caçador de utopias? Por quê?
Porque, ao longo da vida, ele se amarrou em alguns
idealismos. O pacifismo foi um deles, mas antes, com 20 e poucos anos, foi
envolvido pelo sonho sionista, porque o criador do sionismo político era um
jornalista vienense, que ele conhecia e que, aliás, o lançou literariamente.
Ele embarcou nesse sonho por pouco tempo e percebeu, quando estourou a Primeira
Guerra Mundial, que o grande problema da humanidade era o nacionalismo. O
nacionalismo afastava os homens e não os aproximava. Ele era um
internacionalista. Ele não repudiava as conquistas da comunidade judaica na
Palestina, mas não achava que seria a solução.
Se ele visse a Israel de hoje,com acha que reagiria?
Morreria de novo. Ele era um internacionalista. E não era o
único. Tinha uma série de grandes escritores de origem judaica que defendiam as
mesmas posições, achavam que havia outras soluções para o problema judeu além
da Palestina.
>>>
90 anos de Lygia Fagundes Telles e eventos em torno de
Hilda Hilst celebram dupla. FOLHA SP
20.04
.
A literatura ainda só usava calças compridas --e as
mulheres só usavam saias-- quando as duas apareceram no então provinciano
cenário das letras nacionais.
Livro, filmes e teatro revitalizam Hilda Hilst
Na Casa do Sol, Hilda Hilst deixou material para quatro
obras
"Tenho pudor da loucura", diz Lygia Fagundes
Telles, 90
Cada uma à sua maneira --uma, moça comportada e narradora
de corte clássico; outra, desbocada e prosadora de viés experimental--, elas
abriram caminho para as mulheres brasileiras na carreira literária, sem terem
feito concessões ou se dobrado a uma ficção "feminina" de duvidosa
qualidade.
Hilda Hilst e Lygia Fagundes Telles
Ver em tamanho maior
»
Reprodução
AnteriorPróxima
As escritoras Hilda Hilst (esq.) e Lygia Fagundes Telles
Lygia Fagundes Telles chegou ontem aos 90 anos ainda na
ativa e com sua obra "arrumadinha" em uma coleção da Companhia das
Letras, editora para a qual acaba de transferir a obra de seu marido, o crítico
de cinema Paulo Emílio Salles Gomes, morto em 1977.
"Recuperar a imagem do que foi, mas que ficou para
sempre, é o esforço bem logrado da prosa ardente de Lygia Fagundes
Telles", anotou o crítico Alfredo Bosi num famoso texto de 1979.
Já Hilda Hilst, morta em 2004, aos 73 anos, completaria 83
anos amanhã e atinge agora uma nova onda da projeção que sempre sonhou, mas não
viveu para gozar.
Editada com rigor pela Globo, que lança no fim do mês um
volume de entrevistas, a poeta é um hit dos estudos literários, tem dois filmes
baseados em sua obra sendo produzidos e ganha traduções no exterior. Além
disso, a Casa do Sol, onde morou, terá agora um teatro de arena.
Díspares e complementares, a "dama" e a
"vagabunda" das nossas letras têm vida e obra revisitadas pela
"Ilustrada". (RAQUEL COZER E PAULO WERNECK)
*
HILDA HILST
Origem
Nasceu em Jaú (SP), em 21/4/1930, filha da portuguesa
Bedecilda Vaz Cardoso e do fazendeiro e poeta Apolônio A. P. Hilst,
esquizofrênico paranoico
Formação
Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em 1952
Estreia em livro
"Presságio", em 1950
Principais obras
"Júbilo, Memória, Noviciado da Paixão" (1974) e
"A Obscena Senhora D" (1982)
Reconhecimento
Prêmios Pen (poesia), Anchieta (teatro), Cassiano Ricardo
(poesia), Jabuti (poesia e prosa) e outros
Beleza
Despertou paixões e escandalizou a sociedade com namoros
breves
Momento decisivo
O ano de 1965, quando constrói a Casa do Sol em Campinhas
(SP)
Paixões
Várias e breves, incluindo Marlon Brando (que preferiu um
amante francês) e Júlio de Mesquita Neto
Companhias inseparáveis
O escritor espanhol José Luis Mora Fuentes e dezenas de
cachorros
Sobre sua literatura
"Quero ser lida em profundidade, não como distração. É
a última coisa que se devia pedir a um escritor: novelinhas para ler no
bonde"
*
LYGIA FAGUNDES TELLES
Origem
Nasceu em São Paulo, em 19/4/1923, filha de Durval de
Azevedo Fagundes, promotor público que perdeu tudo no jogo, e da pianista Maria
do Rosário de A. Fagundes
Formação
Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em 1945
Estreia em livro
"Porão e Sobrado", em 1938
Principais obras
"Antes do Baile Verde" (1970), "As
Meninas" (1973) e "Seminário dos Ratos" (1977)
Reconhecimento
Prêmio Camões (2005), dois prêmios Jabuti e a imortalidade
na Academia Brasileira de Letras e na Academia Paulista de Letras
Beleza
Ficou em segundo lugar no concurso Rainha dos Estudantes de
1936
Momento decisivo
O ano de 1954, quando publica "Ciranda de Pedra"
e nasce Goffredo, seu filho
Paixão
O crítico Paulo Emílio Salles Gomes (1916-1977), com quem
se casou em 1960
Companhia inseparável
O filho Goffredo Telles Neto (1954-2006), que dedicou o
filme "Narrarte" à mãe
Sobre sua literatura
"O conto tem que desabrochar como uma fruta, como uma
manga verde que você põe dentro da gaveta e espera amadurecer
>>>
A vulnerabilidade e a
força das mulheres negras.
ELEONORA MENICUCCI
Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Políticas para as
Mulheres
CORREIO BSB 20.04
.
Basta um mínimo de sensibilidade para perceber que ser
mulher no Brasil exige lutar o tempo todo, desde pelo direito à vida própria
(autonomia) até o direito à própria vida (no enfrentamento à violência). Se a
mulher for negra, essa exigência chegará ao absurdo. Isso, apesar do espaço conquistado
por meio das lutas históricas das mulheres em geral, e das negras em
particular. Lutas que conseguiram se traduzir em políticas públicas; aliás,
razão de ser da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM): enfrentamento à
violência, acesso a trabalho e renda, à educação e saúde e de empoderamento
político.
Mas como a vulnerabilidade é mais aguda para as negras? Uma
leitura das estatísticas, somada à escuta de narrativas delas, abre uma fresta
para o entendimento dessa realidade.
As mulheres são mais da metade da nossa população (51,5%,
ou 100,5 milhões). As negras são metade das brasileiras: 50,2 milhões
(Pnad/IBGE, 2011). Além do peso do estigma sexista, elas, as mulheres negras,
suportam sozinhas o peso da herança escravista. E a desigualdade trazida pelo
sexismo é mais desigual ainda para com as negras. Por exemplo, no trabalho. Se
para as mulheres em geral, a dedicação desigual às tarefas domésticas e aos
cuidados com filhos e idosos dificulta seu ingresso e ascensão no mercado, para
as negras essas barreiras tornam-se verdadeiros pedágios sociais.
Esses, se conseguido o acesso, geram diferença de ganho. Se
as mulheres em sua grande maioria ganham menos do que os homens, e os negros
também no geral ganham menos do que os brancos, essas duas condicionantes
enfeixam-se perversamente nas negras e derrubam mais ainda os seus rendimentos.
Para a sociedade, consideradas as mesmas funções, é “natural“ que uma negra
ganhe 30% menos do que uma branca.
Acrescente-se que o mapa do país tem gradação de cor,
determinada pela pobreza. Há mais negras nas regiões mais pobres: no Nordeste,
68,9% delas são negras; no Norte, 73,4%; no Centro-Oeste, 54,5%; no Sudeste,
42,1%; e no Sul, 20%.
É por tudo isso que, além das políticas públicas voltadas
às mulheres, a SPM alinha todas as suas ações ao combate ao racismo. Uma dessas
iniciativas terá seu ponto alto na terça-feira, quando se homenagearão as
vencedoras do Prêmio Mulheres Negras Contam sua História.
O prêmio contempla relatos das negras e as tira do anonimato
para assim reposicioná-las como sujeitos na construção da história do Brasil.
Com isso, permite ao país conhecer (e se reconhecer num) um acervo de
narrativas preciosas pelos dramas, pela coragem e pelas atitudes.
Cito três exemplos, dos 520 redações e ensaios inscritos:
— Uma menina foge da guerra em Angola, exila-se em Portugal
e finalmente chega ao Brasil. Na dura vida de empregada doméstica no Paraná,
sua moeda de troca com os patrões é o estudo. Ele será sua porta de saída para
o escritório, isso, depois de fugir para Cuiabá. Já em Brasília, cursa
jornalismo, contata a Embaixada de Angola e revê sua família. Hoje, essa
angolana-brasileira é repórter da TV Angolana.
— Menina da periferia paulistana sonha com a USP — isso,
antes das políticas afirmativas do governo Lula. Essa narrativa, em forma de
ensaio, compara o antes e o depois dessas políticas para a população negra. No
antes, as tentativas de entrar na USP, os cursinhos comunitários, a alimentação
à base de pão e iogurte barato. Finalmente, enfermagem. Mas ali, de negros, só
estudantes — e, mesmo assim, apenas 10%.
— O bullying marca o relato de uma pernambucana filha de
famoso militante e poeta. Já no Rio, na mistura de militância e poesia do duro
dia a dia, ela teve de conviver com o apelido dado a quem estudava na sua
escola. Com o lanche ali resumido a mate e angu, viram-se todos e todas ainda
por cima cruelmente carimbados de “mate com angu”.
É essa realidade, contada pela voz forte dessas mulheres e
pelos números, que cabe a todos mudarmos. O que já foi conquistado, pela
sociedade e pelo governo, deve ser cada vez mais consolidado — e como marca de
compromisso, para banir de vez o preconceito racial. Por fim, lembro que o
enfrentamento cotidiano à violência e aos preconceitos em nosso país tem três
faces inseparáveis: gênero, raça e classe social — mulheres, negras e pobres,
na grande maioria. Só será possível erradicá-los por meio de uma mudança de
valores e comportamentos na sociedade, para que ela se torne mais justa,
baseada no respeito, na autonomia e na igualdade entre homens e mulheres.
>>>
POLíTICA CULTURAL » Festival do FAC. CORREIO BSB 20.04
.
Desde o ano passado, a Secretaria de Cultura reúne as
contrapartidas dos projetos aprovados no Fundo de Apoio à Cultura (FAC) numa
espécie de mostra gratuita, que teve a primeira versão concentrada na Sala
Martins Pena. Neste ano, o II FestFAC acorrerá em três cidades do Distrito
Federal, de 4 a 15 de setembro, com objetivo de promover um maior alcance e
visibilidade das ações culturais incentivadas pelo Fundo.
Poderão inscrever-se
os proponentes que possuírem contrapartida pendente de realização dos tipos:
palestras; oficinas; seminários; workshops; espetáculos de dança, teatro,
circo, música, cultura popular; exibição de filmes; leitura de textos e declamação
de poesias; Exposições de artes plásticas entre outras manifestações
artísticas. Os beneficiários que tiverem interesse em realizar a sua
contrapartida no evento deverão preencher a ficha de inscrição e envia-la por
e-mail para contrapartidas.fac@gmail.com.
Em tempo: foi ampliado o período de contribuições para o
novo decreto do FAC até 1º de maio. A
reunião presencial para debater as propostas ocorrerá nos dias 4 e 5 (sábado e
domingo), a partir das 14h, no auditório da Biblioteca Nacional de Brasília. Só
serão consideradas as contribuições feitas por escrito citando o artigo a ser
alterado, justificativa e base legal (se houver) para o e-mail:
consultapublicafac@gmail.com.
7
EDITAIS
Compõem o primeiro bloco de 2013 do FAC com inscrições
abertas.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário