quarta-feira, 8 de maio de 2013



Brasil mata seus matemáticos

CRISTIANO ALBERTO MUNIZ
Professor da FE-UnB, Matemático e doutor em educação pela Université Paris Nord Presidente da Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM).  CORREIO BSB 08.05
           

Cada criança que nasce é um ser matemático: se, quando cresce, ela não sabe ou não gosta de matemática, é porque falhamos em nossa missão educativa. Essa é uma paráfrase da grande educadora matemática francesa Stella Baruk, que sustenta nossa postura epistemológica e metodológica diante do fenômeno da aprendizagem matemática. O panorama da não aprendizagem matemática e da aversão ao conhecimento matemático que hoje domina as escolas e as famílias, constituindo uma representação social complexa e triste sobre a aprendizagem matemática, opõe-se à visão epistemológica de que todas as crianças sob nossa responsabilidade educativa têm enorme potencial para aprender e produzir matemática.

Nossas pesquisas demonstram que crianças tidas com dificuldades na aprendizagem matemática revelam-se produtoras de procedimentos matemáticos, de alta complexidade, de valor matemático e cognitivo. Muitas de nossas crianças consideradas fracassadas no aprender e produzir matemática na escola são os sujeitos mais capazes de desenvolver procedimentos inusitados, criativos e com capacidade crítica não presente nos demais que assimilam mecanicamente o saber transmitido pelos professores e livros didáticos.

Constata-se o quanto as formas próprias de fazer e aprender matemática de muitas das nossas crianças são ignoradas, negadas e rejeitadas pelos professores, numa escola em que prevalece a ideia de que a matemática se pauta pela assimilação mecânica e reprodutivista de fórmulas acabadas. Aprender matemática, nessa perspectiva, requer que os alunos estejam prontos para a assimilação pura e sem reflexão dos conteúdos. Assim, não há espaço para a criança estimulada para a reflexão crítica e criativa fazer matemática na escola, que se constitui, dessa forma, espaço social de reprodução de conhecimentos, desprovidos de significações históricas, políticas e culturais.

Pesquisas no contexto da educação matemática, com base nas contribuições da neurociência, psicologia cognitiva e antropologia histórica, vêm revelar que as crianças lançadas na vala da incapacidade de aprender matemática, cavada pela escola, são os seres matemáticos com maior capacidade de produção crítica e criativa. Com eles, temos a oportunidade de aprender novas formas de pensar e produzir matemática, com a revelação de procedimentos lógicos muitas vezes ausentes dos livros.

O Brasil, hoje, perde muito, seja na dimensão do desenvolvimento humano, seja na do cultural-científico-tecnológico, quando a escola não tem a competência de compreender e acolher formas próprias de fazer e pensar a matemática, ainda mais quando tratamos com crianças que convivem num mundo complexo, mergulhado em novas tecnologias, que favorecem a construção de pensamentos dinâmicos, elásticos e complexos que são, naturalmente, transferidos para o contexto do aprender matemática dentro da escola.

Em 6 de maio, quando comemoramos o Dia da Matemática, devemos buscar fomentar discussão mais ampla e profunda dos significados do fazer e aprender matemática dentro e fora das escolas. Devemos nos questionar o quanto nossos professores estão aptos a serem efetivos mediadores do desenvolvimento de nossas crianças. É necessário garantir mais investimentos do Estado, para capacitar profissionais da educação na identificação dos processos inusitados dessas crianças.

Ao negarmos compreender e valorizar as formas de pensamento matemático, estamos matando a crença de cada indivíduo na própria capacidade de resolver problemas, de construir crítica, criativa e eticamente soluções para os desafios do mundo. É triste ver que, a cada dia, mais brasileiros se declaram incapazes de aprender matemática. Temos de encontrar meios de estancar a fonte geradora de matofobias, ou seja, do medo de aprender que se nutre em nossas escolas.

Nos últimos 25 anos, a educação matemática vem construindo no Brasil um esforço coletivo para estabelecer novas formas de conceber a aprendizagem, fazendo que cada criança adore enfrentar desafios, se relacionar com o mundo por meio da matemática e perceber-se efetivamente como ser matemático. Que cada cidadão possa compreender que, por meio da matemática, é possível construir um mundo mais justo e humano, um Brasil mais solidário, em que a criança tenha prazer de ir à escola e mostrar a percepção do mundo por formas inusitadas de matematizar.

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Dicas de português
por Dad Squarisi  - dadsquarisi.df@dabr.com.br CORREIO BSB 08.05


Recado
“Muito elogio atrapalha.”
Rolando Boldrin

           

Quero nota 10
João Eduardo quer tirar 10 na redação do Enem. Mas tem duas pedras no caminho. Uma delas: não gosta de escrever. A outra: considera impossível fazer um bom texto em 30-40 linhas. A limitação de espaço o inibe. Ele fica paralisado. As ideias se vão. Quando reaparecem, é tarde. O tempo acabou. "Me dá uma ajudinha?", pede o garotão. “Claro que sim”, respondemos nós.

Sem mistérios
Escrever é como preparar uma sobremesa gostosa ou uma festa nota mil. Uma e outra não caem do céu. Exigem planejamento e tempo. Para dar uma bela festa, temos de escolher a data, o lugar, os convidados, a bebida, a comida, a música. Depois, bolar e encaminhar os convites, comprar ingredientes, fazer as delícias, contratar garçons, providenciar pratos, copos, talheres e guardanapos. Ufa!

Redigir também dá trabalho. Várias providências antecedem a marcha da locomotiva. Há que delimitar o tema, traçar o objetivo, definir a ideia central, escolher argumentos, buscar uma introdução atraente, descobrir um fecho de ouro. Não é pouco. Mas está ao alcance da mão.

O que é?
Escrever é mandar recado. A receita de uma sobremesa é um recado. O convite para a festa de 15 anos é um recado. O horóscopo publicado no jornal é um recado. A redação da escola é um recado. Ensaios, dissertações e teses também.

Mandamos e recebemos recados todos os dias. A doméstica anota a mensagem para a patroa ausente. O médico prescreve remédios para o enfermo. O professor dá o tema da pesquisa. Você escreve um e-mail para o amigo. Seu colega manda um bilhete pra você. É tudo recado.
O trabalho escolar – de qualquer nível – é recado. Então, por que o frio na espinha? Só de pensar nele as mãos gelam. O coração dispara. O suor jorra. Esses sintomas têm nome – medo. Dois monstros respondem pelo pavor. Um: o que dizer. O outro: como dizer.

Desafio
Sobre o que escrever? Eis o grande desafio. Sem enfrentá-lo, nada feito. Uma ideia vaga na cabeça, a folha em branco e o teclado do computador? Acredite. Só com eles você não chega a lugar nenhum. É preciso pôr os pés no chão. Pensar. E deixar as ideias bem claras.

Guarde isto: você vai escrever um pequeno texto, não um verbete de enciclopédia. O primeiro passo é traçar uma rota. Uma só. Especifique a ideia vaga que tem em mente, restrinja o tema, ponha-lhe limites. Em suma: selecione um item particular no leque de possibilidades.

Escolha
Digamos que o tema seja moda. Ele oferece uma gama enorme de aspectos: a indústria da moda, quanto custa andar na moda, a moda ditada pela televisão, a moda dos anos 60, a moda hippie, a moda do verão, a história da moda, dize-me como te vestes e dir-te-ei quem és, os destaques dos desfiles de Milão, a moda no circuito Paris-Milão-Nova York. Etc. e tal.

Viu? Os tópicos destacam galhos de uma imensa floresta. Mais restrito, o tema se torna mais concreto. Ao se decidir por um, esquecem-se os demais. Concentram-se os esforços no desenvolvimento do eleito.

Olho vivo
A escolha exige cuidados. O mais importante: não fugir do tema. Impõe-se ter certeza de que o aspecto está relacionado com ele. Bem amarradinho. Mais ou menos não vale. Suponha que o tema seja criminalidade. Você optou pelo tópico violência na tevê. Meio fora, não? Deixe-o de lado. Busque um mais claramente ligado ao tema. Por exemplo: relação do consumo de drogas com o aumento da criminalidade.

Resumo da ópera
Definido o rumo, adeus, sensação de que só um livro seria capaz de esgotar o assunto.

Diquinha útil 1
Escrever é habilidade como nadar, saltar, digitar. Exige treino. Escreva muito e sempre. Todos os dias. Não se preocupe com a correção. Escreva e jogue no lixo. A prática desinibe a cabeça e solta a mão. Com ela, adeus, sensação de que não há nada a dizer. Adeus, sensação de que só um verbete de enciclopédia pode dar o recado.

Diquinha útil 2
Sobre o que escrever? Sobre qualquer assunto. Você escolhe. Gosta de futebol? Fale sobre a partida que você viu na tevê. Prefere novela? Escreva sobre um aspecto — um personagem especial, uma passagem inesperada, o encontro amoroso. Tem uma quedinha pelo telejornal? Redija sobre o tópico que lhe chamou a atenção.

O importante é escrever — muiiiiiiiiiiiiiito e semmmmmmmmmmmpre.

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