terça-feira, 9 de abril de 2013


SARAU »
Poesia e canções para Carlinhos Piauí.  CORREIO BSB 09.04


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Carlinhos Piauí: o poeta e cantador ganha homenagem da Tribo das Artes


Carlinhos Piauí era conhecido pela simpatia e postura acolhedora — características recorrentes no Nordeste. A região era a principal bandeira do músico, morto no início de março. As tradições, os elementos sertanejos, o folclore nordestino, eram as principais poéticas na música de Carlinhos. Um sarau promovido pela Tribo das Artes vai celebrar todas essas facetas e prestar tributo ao artista. O encontro acontece hoje, no Bar Doce Bar (Colônia Agrícola Samambaia), e conta com vasta programação musical e cênica.

O poeta Ruiter Lima, integrante da Tribo das Artes (movimento de Taguatinga que fomenta e divulga a produção cultural local), promete “um sarau bem participativo e poético”. Entre as várias atrações, o violeiro Cacau: “Eu e Carlinhos fomos amigos por mais de 20 anos. É gratificante poder participar dessa homenagem”. A amizade entre os dois começou por acaso. Graças à afinidade musical, acabou perdurando. “Cruzávamo-nos pelos eventos da cidade. Acabamos nos conhecendo por entre tantos shows. A identidade bateu e nos tornamos grande amigos”, contou.

Não deu tempo de Carlinhos Piauí e Manassés de Sousa se tornarem melhores amigos, embora tenham se conhecido e apreciado o trabalho um do outro. Há apenas dois anos Manassés mudou-se para Brasília. “Conseguimos fazer algumas coisas juntos”, contou o violinista cearense. O músico sobe ao palco do sarau ao lado de Cacau e do percussionista Ubiratan Lana e promete uma embalada performance.

Desde que chegou na capital, Manassés não perde a chance de apresentar o trabalho autoral e a habilidade com os vários instrumentos de corda que domina. Ao longa da carreira, acompanhou grandes nomes da música brasileira, como Elba Ramalho, Fagner, Nara Leão e Chico Buarque. “Também pude tocar para Mercedes Sosa. Estou pensando, inclusive, em mudar meu nome para Manassés Sosa, em homenagem a ela”. Segundo ele, o próximo trabalho talvez já traga a nova assinatura.

Quanto ao repertório de logo mais, não resta dúvida: “Só sei a primeira música. Dependendo do clima e reação, montamos o resto na hora. É sempre assim”, brincou. Cada canção é uma surpresa. A única certeza é que todas serão em homenagem a Carlinhos Piauí.

A cara do Gama
No último dia 4 de março, morria um dos artistas mais queridos da capital. Carlinhos Piauí representou por quase quatro décadas as tradições e folclores nordestinos, temas que sempre pautaram seus trabalhos desde que desembarcou no cerrado em 1974. No início da carreira, conciliou a produção cultural com o cargo de diretor social da administração do Gama. Acabou se tornando um dos símbolos da cidade do DF. Foi lá que venceu o concurso Festival da Canção da Cidade do Gama, ainda como membro do grupo Sertão, em 1980. O músico, que gravou três discos, faleceu logo depois de ter aprovado um projeto para a gravação do primeiro DVD, em decorrência de um câncer nos rins, descoberto em dezembro de 2012. (DPL)

» Três perguntas // Manassés de Sousa

           

Porque elegeu Brasília como residência?
Foi a proximidade da cidade com o resto do Brasil, acredito. Adoro minha terra, meu Ceará. Mas, lá eu dependia muito de projetos e editais para trabalhar. Resolvi sair. Tinha três opções: Brasília, Paris, onde passei alguns anos; tenho um filho que mora lá, inclusive; e Rio de Janeiro, onde vivi por 15 anos e onde se encontra minha filha. Não se explicar. Adoro isso aqui, estou sempre aprendendo.

Você tocou com Fagner, Elba Ramalho, Nara Leão… Não acredita que em Brasília terá menos oportunidades similares?
Bem no começo da minha carreira, tinha uma parceria com o Fagner. Depois ele ficou famoso e virei músico de banda. E assim fiquei. E, te digo, músicos de banda normalmente são maltratados. A produtora da banda do Fagner mesmo era uma tirana. Não concordava com aquilo. Agora posso mostrar minhas músicas, meu próprio trabalho. A sobrevivência é mais difícil, mas o prazer é muito maior.

Está completando dois anos que chegou a Brasília. Deu tempo de conhecer o Carlinhos Piauí?
Sim. Sempre vinha a Brasília. Conheci Carlinhos há cinco anos. Até pela amizade dele com (o músico) Cacau. Fizemos coisas juntas. Algumas inusitadas, como quando apareci para um evento em Olhos D’Água (Alexânia) e aprontamos por lá. De surpresa. Tinha enorme respeito por ele.

Tributo a Carlinhos Piauí
Apresentação de vários artistas. Hoje, no Bar Doce Bar (Colônia Agrícola Samambaia, chácara 122 casa 21). A partir de 20h. Entrada: R$5. Classificação indicativa: 16 anos.

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ARTES VISUAIS »  Museu da República recebe doações.  CORREIO BSB 09.04


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Obra de José Zaragoza: protesto contra a violência nos porões da ditadura


O ano de 2013 será bom para o Museu Nacional da República. Inaugurado há seis anos sem uma coleção permanente, o museu tem agora um acervo que chega a 499 obras. Este ano, a instituição recebe duas doações importantes de trabalhos encarregados de ajudar a montar um mosaico da história da arte brasileira. Na reserva técnica do museu já estão as 25 pinturas da série Não matarás, doadas pelo publicitário José Zaragoza, um dos fundadores da agência de propaganda DPZ. Até o fim do semestre, a instituição recebe outra leva. Dessa vez, 15 pinturas e 15 desenhos de Elder Rocha, professor da Universidade de Brasília (UnB). “Todas as doações dialogam com a coleção do museu porque é, fundamentalmente, uma coleção de arte contemporânea que conta uma história da arte brasileira”, comemora Wagner Barja, curador do Museu Nacional da República.

O próprio Zaragoza escolheu a instituição como depositária ideal de suas pinturas. O publicitário pintou Não matarás entre 1980 e 1983 para protestar contra a ditadura militar. Nascido há 83 anos em Barcelona, ele imigrou para o Brasil em 1952 porque temia o passado de guerras da Europa e não se encaixava na ditadura do general Francisco Franco. “A Europa era insuportável”, lembra. “Imagina, tinha Stálin, Hitler, Franco, Mussolini. E até hoje, veja a economia, é um desastre.” Impedido de cursar a Escola Superior de Belas Artes de Barcelona para prestar serviço militar no exército de Franco, Zaragoza decidiu deixar o país tão logo que encerrasse suas funções no quartel. E assim fez. Seis meses depois de terminar o serviço militar, estava em um navio rumo ao porto de Santos.

No entanto, pouco mais de uma década depois de se estabelecer em São Paulo, o publicitário precisou enfrentar novamente os fantasmas de um país com os direitos cerceados. “Saí da ditadura do Franco e caí na ditadura militar brasileira. Fiquei revoltado”, conta. A revolta passou para as telas. A pintura trágica de Zaragoza mostra corpos submissos, mãos amarradas, cabeças baixas e generais obscuros. O Museu Nacional da República, segundo ele, é o lugar ideal para receber os quadros. “É o lugar certo porque é onde está o poder.”

Ter a própria trajetória representada no maior museu da cidade também era importante para Elder Rocha. Ele foi contemplado no edital do prêmio Marcoantônio vilaça, promovido pela Funarte, com R$ 150 mil e, em vez de se concentrar na criação de um novo trabalho, resolveu tocar o projeto Fio condutor, que prevê a seleção de 15 pinturas e 15 desenhos como prêmios de aquisição para o museu. A curadoria está a cargo de Grace de Freitas, mas Rocha faz questão de incluir obras de suas séries mais significativas das última década.

No ano passado, o curador Wagner Barja também recebeu um lote de gravuras do artista baiano construtivo Almandrade e parte do acervo do banco Bozano Simonsen com obras de Antonio Amaral, Arcângelo Ianelli, Beatriz Milhazes, Carlos Vergara, Daniel Senise e outros 20 artistas.

MAB
Uma comissão formada por cinco pessoas, entre elas o curador do Museu Nacional da República, Wagner Barja, apresentou à comunidade, na semana passada, o projeto para a reforma do Museu de Arte de Brasília (MAB). Fechado há sete anos, a instituição ganhou o compromisso do Governo do Distrito Federal (GDF), que promete retomar as obras de reforma ainda este ano.

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Arte e ciência fazem o homem. Por  LÁZARO GUIMARÃES,    Magistrado.  CORREIO BSB 09.04
           
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Os soldados russos ficaram surpresos ao encontrar, num abrigo subterrâneo, em meio aos escombros de Berlim, em maio de 1945, cerca de 100 homens, alguns jovens, em trajes civis, enquanto os seus conterrâneos jaziam nos campos de batalha ou se amontoavam nos campos de concentração. Aqueles eram os músicos da Orquestra Filarmônica, que Hitler tinha, desde 1934, liberado do serviço militar, por sugestão de Goebels, ministro da Propaganda, que convencera o Fuhrer de que assim eles seriam muito mais úteis à Alemanha e ao seu louco projeto de conquistar o mundo. O nazismo sucumbiu, mas a Filarmônica de Berlim não perdeu a condição de liderança mundial de qualidade. Aquele foi um dos poucos acertos da famigerada gestão do III Reich.

O ser humano destacou-se das demais espécies animais há cerca de 200 mil anos, em razão da sociabilidade, das relações familiares, grupais, intergrupais, por meio da linguagem, da arte e da ciência. O cérebro humano tornou-se maior que o dos outros mamíferos, robusteceu as zonas do inconsciente, que comandam os processos da visão, da audição, do olfato e do tato, que guardam as vivências na memória para posterior reprodução consciente, e foi capaz de construir a civilização, a partir das obras de cientistas e artistas.

Para melhor conhecer essa evolução e os segredos da neurociência é importante ler Subliminar, o novo trabalho do físico Leonardd Mlodinow, o mesmo de O andar do bêbado. Nele, o autor norte-americano, filho de sobreviventes do Holocausto, mostra, num estilo simples e objetivo, como os estudos de psicologia, medicina e física se entrelaçam para revelar com amplitude e intensidade o funcionamento da mente humana. A razão da riqueza do cérebro humano não se limita ao fato de ser bem maior que os dos demais mamíferos, mas, principalmente, na sua contínua expansão da capacidade de interação, o que principia com a produção de desenhos, esculturas constantes de achados arqueológicos, a comunicação verbal e, sobretudo, a invenção da escrita, da partitura musical, daí por diante, a incrível revolução tecnológica.

A humanidade reconhece e reverencia os grandes artistas e cientistas, como Shakespeare, Dickens, Camões, Cervantes, Da Vinci, Newton, Einstein, Beethoven, Bach, Mozart, Mahler e tantos outros, porque na obra de cada um deles estão as raízes da cultura universal, algo  que toca a humanidade inteira. No Brasil, além desses valores universais, devemos a nossa formação cultural e a sua evolução a Castro Alves, Olavo Bilac, Villa Lobos, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Ariano Suassuna, João Cabral de Melo Neto, Vinicius de Moraes e, para fazer justiça aos mais novos, Ruy Espinheira Filho, que é apontado por Antonio Cândido como um poeta maior, graças à capacidade de expressão lírica e intensa da vida como um todo, desde o amor ao sentimento do mundo.

Sobre Manuel Bandeira, escreve Ruy Espinheira, em Forma e alumbramento (Rio de Janeiro, 2004): “... Se há uma coisa de que ele certamente não poderá ser acusado, é esta: ter sido frágil. E aquela famosa humildade, que tanto poetizou e que foi proclamada por muitos que sobre ele escreveram, só funcionou mesmo como método de resistência ao pertinaz assédio da Dama Branca...”. E cita os versos finais de O martelo, do poeta federal: “Sei que amanhã quando acordar/ouvirei o martelo do ferreiro/bater corajoso o seu cântico de certezas”.    

Ao interagir, homens e mulheres precisam preservar a união, daí o ensinamento de Mlodinow: “Uma das vantagens de pertencer a uma sociedade coesa, em que as pessoas ajudam umas às outras, é que o grupo costuma ser mais bem equipado que um conjunto aleatório de indivíduos para lídar com ameaças externas. As pessoas percebem intuitivamente que existe uma força nos números e se consolam na companhia de outras, em especial em tempos de infelicidade ou carência”.

São homens como esses, os intelectuais orgânicos, como dizia Antonio Garmsci, que os povos têm o dever de reverenciar, porque eles criam, eternizam o melhor de nós, e proporcionam os laços que fortalecem e animam o convívio social.

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Na Venezuela, música é transformação social
CHICO CÉSAR,  Cantor e secretário de Estado da Cultura da Paraíba.  CORREIO BSB 09.04
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A Venezuela, país vizinho e hermano, possui um dos programas de educação musical mais exitosos do mundo. O Sistema Nacional de Orquestras e Coros Juvenis e Infantis da Venezuela, conhecido internacionalmente como El Sistema, inspirou a criação de projetos similares em 35 países e transformou crianças das favelas de Caracas em astros internacionais da música clássica. O exemplo mais famoso é o maestro Gustavo Dudamel, também diretor musical da Filarmônica de Los Angeles. A nós paraibanos também inspirou na criação do Programa de Inclusão através da Música e das Artes — Prima.

Em turnê pela América Latina, o maestro Dudamel e a Orquestra Sinfônica Simón Bolívar estão de volta ao Brasil. Além de apreciarmos a energia jovem que emana dos concertos do premiado grupo, é importante refletirmos a respeito do que está por trás do sucesso desse projeto, que não é apenas musical, mas também um poderoso instrumento de transformação social que envolve inclusão e autoestima.

A história de El Sistema começou há mais de 30 anos, quando o maestro José Antonio Abreu abraçou e chamou para si a tarefa de formar jovens venezuelanos em situação de risco por meio do aprendizado da música de um jeito revolucionário, coletivo, onde quem sabe um pouquinho já vai ensinando quem sabe menos. Sua obra virou política pública do Estado venezuelano e transformou em direito a todos o que antes era privilégio da elite: o acesso à arte e à cultura.

O alicerce metodológico e administrativo que dá forma ao El Sistema são seus núcleos. Atualmente, são 285, espalhados por toda a Venezuela, atendendo 400 mil crianças, adolescentes e jovens. Os instrumentos orquestrais são disponibilizados gratuitamente aos estudantes dos interiores e periferias de todo o país. O resultado é impressionante: na Venezuela existem mais orquestras que municípios. Estes são 335, e aquelas já são 400! (Bem, temos muito chão pela frente na Paraíba: com um ano somos 12 polos e atendemos cerca de 300 crianças.)

A metodologia adapta-se a cada núcleo e a cada região, o que dialoga muito bem com a atual forma como se estrutura a própria sociedade venezuelana. Hoje, muitos dos núcleos do El Sistema se encontram em áreas onde também existem Consejos Comunales, territórios geridos pelos próprios moradores, criadas durante o governo do recém-falecido presidente Hugo Chávez a fim de incentivar o protagonismo e a organização popular. Seu governo aportou mais recursos para El Sistema e aumentou sua projeção com a criação da Fundação Musical Simón Bolívar, órgão estatal que rege o programa. Paralelamente ao El Sistema, criou programas semelhantes voltados para a riquíssima cultura popular do país, como a Missão Cultura, o Sistema Nacional de Culturas Populares e o Alma Llanera, programa dentro do El Sistema que incentiva a música tradicional da Venezuela.

Ao incentivar a prática coletiva da música por intermédio da criação de orquestras sinfônicas e coros, El Sistema desperta e trabalha nos jovens a consciência do coletivo, a importância do grupo: numa orquestra, a harmonia e a excelência vêm com a disciplina, a concentração e o trabalho de todos os integrantes. Saber ouvir, saber a hora de protagonizar, saber o momento de apoiar o colega que protagoniza. Isso tudo vai para a vida também. Mais do que formar músicos profissionais de alta qualidade, esse sistema forma jovens conscientes de sua importância para o bom funcionamento do trabalho orquestral, mas também do mundo em que vivem.

Há muito o que aprender com El Sistema. Alegra-me saber da criação de várias orquestras juvenis inspiradas e apoiadas pelo programa venezuelano no Brasil. Regozija-me ainda mais trazer essa experiência para a pequenina e valorosa Paraíba. Torço e trabalho para que a música contribua para maior integração cultural entre nossos povos, tão necessária para ampliar o sentimento de fraternidade na América Latina. Que seja bem-vinda a Orquestra Simón Bolívar ao Brasil.

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