segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Até 18/11 Educação - Inscrições para mestrado da UEG. Seletivo do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Agrícola

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Presidência do CNJ divulga andamento de processos contra juízes stf.jus.br

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STF e CNJ divulgam números sobre corrupção e improbidade stf.jus.br

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Excesso de reclamações ameaça conquistas da Justiça especial estadual

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A literatura como música

As coisas da vida apresenta aos brasileiros António Lobo Antunes como cronista e admirador do jazzista Charlie Parker CORREIO 05/11

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Depois da vinda a Paraty, para a Flip de 2009, Lobo Antunes ganha até volume especial: o novo livro, feito para o Brasil, reúne 60 crônicas

A capa de As coisas da vida traz uma fotografia de António Lobo Antunes segurando um cigarro na mão direita. A fumaça subindo em leve espiral e ocupando boa parte do quadro... O horror, o horror.

Lobo Antunes é mesmo um sujeito fora de moda. Ele é um escritor. Pior: um escritor de romances. Mas o intrépido leitor que se aventurar para dentro dessa fumacinha pode se surpreender. Lobo Antunes, tido como temperamental, cá nestas páginas se revela um camarada afável. Lobo Antunes, tido como autor difícil, por estas bandas se encontra bem mais descontraído e palatável.

Pois As coisas da vida traz um lado de António Lobo Antunes ainda pouco conhecido pelos brasileiros. Traz seu trabalho como cronista, escrevendo sob encomenda do jornal O Público e da revista Visão, ambos de Portugal. Daí o autor maneirar na sua prosa, contornar as habituais idiossincrasias estilísticas, e se tornar mais agradável aos olhos ligeiros do leitor ocasional, do leitor de domingo.

Lobo Antunes, no entanto, não está a trair sua essência. Daí o interesse em As coisas da vida não apenas como uma porta de entrada aos novatos no universo “lobístico”. Seus temas recorrentes estão todos por aqui, tanto os grandes temas (as chagas do colonialismo, a barbárie angolana, a sociedade patriarcal e escravocrata portuguesa) quanto os mais íntimos (os desvãos da memória, a infância, o amor e sua ausência).

Cabe notar que As coisas da vida tem esse caráter de amplo painel também por ser um artefato feito exclusivamente para o Brasil. O volume reúne 60 textos que se encontram no Livro de crónicas (1998) e no Segundo livro de crónicas (2002), ambos inéditos no país. As coisas da vida sai pela editora Alfaguara na esteira de seus frequentes lançamentos da obra de Lobo Antunes, que vem abastecendo as livrarias brasileiras pelos últimos cinco, seis anos.

Durante décadas, o Brasil esteve distante do radar de Lobo Antunes (que já fez troça dizendo ter deixado estas terras para José Saramago), mas agora o interesse é bem outro, com todos esses lançamentos, e com a vinda do próprio para Paraty em 2009.

O desacordo ortográfico

António Lobo Antunes, 69 anos, nasceu em Lisboa. Parece natural que, nas crônicas, ele se ponha a falar de sua cidade natal, sua geografia sentimental. Ou dos verões na Praia das Maçãs. As coisas da vida é dividido em várias partes e a primeira delas traz o território da infância. Pode até não ser o melhor de Lobo Antunes, mas já dá o tom afetivo & confessional das crônicas que se seguirão (até aquelas em terceira pessoa).

Em “As pessoas crescidas”, ele conta ter levado certo tempo para entender qual era a graça da “parente loira” que às vezes circulava entre os adultos da família — sempre muito simpática, muito pintada, muito cheirosa — e bem mais bonita que eles todos.

“Devo ter crescido. Se calhar cresci. Mas o que de facto me apetece é convidar a parente loira para jantar comigo no Gambrinus. Peço ao criado que nos traga duas doses de guarda-chuvas de chocolate e enquanto chupamos a bengalinha de chocolate mostro-lhe a minha coleção de gafanhotos numa caixa de cartão. Posso estar enganado mas pela maneira como me fazia festas no cabelo, com os olhos tão jovens como os meus, quase que aposto que ela há de gostar.”

Há de se acostumar com o palavreado lusitano. Este é um livro, felizmente, livre do recente Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, uma lei feita para pasteurizar o idioma e que, pelo jeito, só colou por aqui entre os tupinambás. Lobo Antunes faz pouco de vírgulas e pontuações e quebra parágrafos de forma nada ortodoxa. Mas sua riqueza maior está na sonoridade — a nossa sorte de lê-lo no original.

Os primeiros romances de Lobo Antunes, publicados no fim dos anos 1970 e início dos 1980, já carregavam esse experimentalismo que se tornaria a sua marca, mas são textos bem mais carregados e amargos do que os destas crônicas. Não por acaso: refletiam sua experiência como médico em Angola. Os cus de Judas (1979) talvez seja o romance mais significativo desse período inicial. Aqui, em As coisas da vida, Angola volta a assombrar a escrita. Como um fantasma a se intrometer nos pensamentos — “Angola me veio com toda força ao corpo” (Emília e uma noites).

O negrume do inconsciente

Lobo Antunes vem trabalhando na carpintaria dos textos de maneira minuciosa. Até fazer do recente O arquipélago da insónia (2009) um exercício impressionante de estilo: colagem de imagens, de fragmentos de memórias, mistura de diferentes vozes narrativas e de diferentes tempos narrativos que acaba por roubar a linearidade do romance — deixando em troca uma experiência quase sensorial.

Mas Lobo Antunes se mostra arredio em entrevistas quando perguntado sobre esse fazer criativo. Arredio quando não simplesmente sarcástico. Ele não gosta de falar sobre estilo, sobre sua escrita, e isso já está claro. As entrevistas vêm com um quê de cabotinismo de almanaque, um indisfarçável desdém pela crítica. As coisas da vida, no entanto, traz um naco de Lobo Antunes por Lobo Antunes. São crônicas em que o escritor, sempre tachado de hermético, tenta se explicar — ou quase isso.

“A verdadeira aventura que proponho é aquela que o narrador e o leitor fazem em conjunto ao negrume do inconsciente, à raiz da natureza humana. Quem não entender isso aperceber-se-á apenas dos aspectos mais parcelares e menos importante dos livros: o país, a relação homem-mulher, o problema da identidade e da procura dela, África e a brutalidade da exploração colonial etc., temas se calhar muito importantes do ponto de vista político, ou social, ou antropológico, mas que nada têm a ver com o meu trabalho.” (Receita para me lerem)

Lobo Antunes cita William Faulkner (1897-1962) meio atravessado — “de quem já não gosto como gostava” — ao falar do ato de escrever, mas, na crônica “Deus como apreciador de jazz”, ele garante não carregar escritor algum como exemplo. Uma determinante influência para si seria o músico Charlie Parker (1920-1955), pai do bebop e espécie de padrinho espiritual da geração beat. “Esse pobre, sublime, miserável, genial drogado que passou a vida a matar-se e morreu de juventude.”

Antonio Lobo Antunes como apreciador de jazz — faz todo sentido.

As coisas da vida

De António Lobo Antunes. Editora Alfaguara, 232 páginas. Preço: R$ 34,90.

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POESIA » Memórias em verso e prosa. Thiago de Mello veio a Brasília lançar o livro Poetas da América de canto castelhano, com 400 textos traduzidos ao longo de 12 anos CORREIO 05/11

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Estava escuro, mas o poeta Thiago de Mello, do alto de seus 85 anos, ainda cantava. E canto de poeta é recital que, no caso dele, envolve mais do que a boca, a melodia da voz. Irradia para as mãos gesticulantes e firmes, os olhos úmidos, a atenção perene. Vestido como de costume, de branco dos pés à cabeça, ele estava ali para uma palestra de meia hora, mas seu depoimento ganhou ares de catarse e prolongou-se por mais de uma hora, pontuado por memórias e poesia.

Thiago de Mello esteve em Brasília para a bienal alternativa promovida pelo açougue cultural T-Bone, semana passada, na Asa Norte. Um dos motivos da visita foi a divulgação de seu novo livro, Poetas da América de canto castelhano, uma seleção de cerca de 400 poemas traduzidos de língua espanhola e de notas redigidas por ele, fruto de uma pesquisa de mais de 20 anos. O processo de burilar e verter cada verso para o português, tarefa que o poeta amazonense definiu como inalcançável, tomou-lhe 12 anos de dedicação diária, em sua passagem por oito países latinos. “Eu me espantei comigo mesmo quando vi esse exemplar. Não sabia que era capaz de tanta determinação”, comentou.

Como todas as forças que movem sua vida, a produção do volume nasceu de uma causa: aproximar a produção literária da América hispânica e do Brasil. “Não nos conhecemos. Borges não conhecia Drummond.” Durante a leitura, ele declamou “Alturas de Macchu Picchu”, de Pablo Neruda. Nos tempos em que o amazonense esteve exilado no Chile, durante a ditadura militar, os dois iniciaram uma amizade que evoluiu para a colaboração literária. Mello traduziu Neruda, e vice-versa.

A carta do avô

A literatura foi a linha que amarrou as reminiscências do autor. Uma das mais antigas remontou à infância. Aos 9 anos, recebeu uma carta do avô, elogiando sua evolução na escrita e eternizando o conselho: estude, leia e seja um homem de bem. “Ele colocou a leitura a serviço da ética”, elogiou o escritor, que saiu do Amazonas rumo ao Sudeste, viveu no Chile e se tornou um homem do mundo. Há mais de 30 anos, Mello retornou à terra natal, Barreirinha, onde mora em uma casa projetada por Lucio Costa, à beira de um rio. E ainda hoje guarda, emoldurada, a carta do avô Gaudêncio, homem de pouca instrução.

Outra lembrança familiar compartilhada foi a convivência com o filho Manuel, batizado assim em homenagem ao padrinho, Manuel Bandeira. Poeta, músico e compositor que chegou a viver em Brasília, Manduka (como era conhecido), manteve durante anos o hábito de chamar o pai de “companheiro”. Em um dia tranquilo em sua casa amazônica, o escritor recebeu a ligação de uma filha dando a notícia: Manduka estava se sentindo mal, com claros sinais de acidente vascular cerebral (AVC). Mello pediu para conversar ao telefone com ele, que, com dificuldade, articulou a frase: “Adeus, pai”. Poucos dias depois, faleceu. O poema “A lição das águas” foi escrito em homenagem ao filho que se foi.

O inventário emocional também incluiu a frase dita por Darcy Ribeiro no último encontro que eles tiveram. Debilitado, Ribeiro pediu ao amigo: “Não desanime nunca, p…. O Brasil um dia vai dar certo”. Mello bem que tenta manter a esperança, mas a tarefa é difícil. Tanto que anda desgostoso de ler “Os estatutos do homem”, poema frequentemente citado como sua obra-prima, traduzido para mais de 30 idiomas. “No primeiro verso, digo: ‘Fica decretado que agora vale a verdade’. Mas nunca se mentiu tanto neste país.”

Sua arma para combater o mundo que condena é dedicar a vida ao que define como causas difíceis. A carreira diplomática, por exemplo, foi encerrada após a promulgação do primeiro Ato Institucional. Envergonhado de uma pátria que permitia atrocidades como a que viu numa foto de jornal — o líder camponês Gregório Bezerra sendo arrastado por um jipe do Exército nas ruas do Recife —, ele entregou ao Itamaraty o pedido de renúncia e embarcou de volta para o Brasil. “Foi meu último gesto romântico. Desci do avião e fui preso”, contou.

Essas causas arraigadas ao caráter seriam, segundo o poeta, herança da meninice na Amazônia. “As vertentes fundamentais da minha vida, as que me acompanham e que eu persigo cada dia mais, já estavam comigo. Eu já sabia que o amor é possível, que o homem pode criar a beleza por meio da arte e que a poesia não está só na palavra”, ensinou.

Poetas da América de canto castelhano

De Thiago de Mello. Editora Global, 494 páginas. Preço: R$ 79.

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À sombra da corrupção. Vencedor do Prêmio Jabuti de melhor romance em 2010, Edney Silvestre lança o segundo livro de ficção, A felicidade é fácil, em que narra o sequestro de uma criança num dia de agosto, em plena era Collor CORREIO 05/11

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É duro encarar até o fim a segunda ficção de Edney Silvestre. Duro e rápido. O autor narra minuto a minuto a história do sequestro de uma criança. A criança errada. A felicidade é fácil, que ele lança em Brasília na próxima terça-feira, retoma a era Collor e os dias subsequentes ao confisco da poupança de todos os brasileiros para contar como um menino loiro e de olhos azuis foi confundido com o filho de um publicitário milionário e levado para o cativeiro por ex-arapongas e torturadores da época da ditadura. O menino era, na verdade, filho da empregada.

Silvestre idealizou o livro a partir de uma nota de jornal dos anos 1990. O sequestro seguido de morte do filho de caseiros de uma chácara e a pouca repercussão dada ao caso impressionaram o escritor. “Ao descobrirem que era o menino errado, mataram e jogaram na represa. E não interessou a ninguém. Afinal, era filho dos empregados. Se apenas 9% dos crimes são resolvidos no Brasil, imagine o sequestro de um filho de caseiros”, lembra. A década de 1990 e o ingresso desastrado na era democrática ambientaram a narrativa.

Baseado no fato, Silvestre trouxe para a ficção um episódio pouco explorado da história recente do Brasil. As Diretas Já, a era Collor, os esquemas de corrupção, uma população atônita diante de um plano de confisco de poupanças e a inflação ajudam a caracterizar os personagens e tratam de um país à beira do abismo. Olavo é o milionário cuja intimidade com a Esplanada dos Ministérios e a cúpula do governo nos anos 1990 se assenta no gerenciamento de contas em paraísos fiscais, destinadas a receber os desvios de dinheiro público movimentados por políticos e gente ligada ao poder. O publicitário deixa transparecer a estreiteza de suas ligações ao elencar clientes como Zélia, Bernardo, Fernando, Leonel, Pedro, Teresa e Gordo. Em momento algum Silvestre dá sobrenomes — as associações ficam a cargo do leitor.

Mara, uma ex-prostituta convertida em esposa graças às contas bancárias do publicitário, não se dá conta da realidade até o pequeno surdo-mudo da empregada ser sequestrado no lugar do filho dela, Olavinho. Em lampejo de humanidade duvidoso, a mulher do milionário ensaia um resgate moral ao insistir com o marido para não explorar a publicidade do caso e salvar o garoto. Mal sabe ela o pouco valor do menino surdo-mudo no universo de um Olavo perfeitamente à vontade na sombra da corrupção que ronda o país.

Ansiedade

O ritmo de Silvestre é rápido, ágil, um estilo já experimentado em Se eu fechar os olhos agora, Prêmio Jabuti no ano passado. Como no romance anterior, a ansiedade tem função estratégica na narrativa. Mas, ao contrário dos dois garotos prestes a perder a inocência do livro de estreia, os protagonistas de A felicidade é fácil já perderam boa parte do caráter e da dignidade. De inocentes, nada têm. A não ser a adolescente Bárbara, filha do segurança do casal, moça da periferia que sonha em fazer faculdade, mas vê as chances desmilinguirem quando a poupança do povo vai parar nas mãos do governo. A garota, então, planeja deixar o país e embarca no caminho da imigração ilegal, o que, para o autor, é muito representativo da década de 1990 no Brasil.

Edney acaba de voltar de uma viagem a Suécia, Sérvia e Berlim, onde esteve para pesquisar personagens do próximo livro. Assim como Bárbara, eles serão imigrantes. O escritor também vai retomar algumas figuras de Se eu fechar os olhos agora no terceiro romance, cuja confecção começou antes mesmo de A felicidade é fácil. “Não sabia que ele seria o segundo porque estou escrevendo outro. O primeiro foi tão difícil fazer que o segundo, comparativamente, foi fácil”, brinca Edney, que confessa não ter sentido pressão nenhuma durante a escrita do segundo livro.

A felicidade é fácil

De Edney Silvestre. Record, 220 páginas. Preço: R$ 29,90. Lançamento em Brasília, com sessão de autógrafos, na próxima terça-feira, às 19h, na Saraiva MegaStore (Shopping Pátio Brasil).

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LANÇAMENTO » Conversas entre pares. Certa vez, em conversa com o escritor angolano radicado em Portugal Valter Hugo Mãe, de passagem pela 27ª Feira do Livro, o maranhense Marco Polo Haickel ouviu a seguinte declaração: “A literatura está cada vez mais dividida entre aqueles que acreditam que ela tem o seu lugar, serve ainda para aumentar o que o indivíduo já é, e aqueles que entendem que a literatura é apenas mais um produto de consumo”. A fala do lusitano dá o tom da coletânea de entrevistas Falando de literatura (Thesaurus), publicada com apoio do Fundo de Apoio à Cultura (FAC), que o professor e autor nordestino, residente em Brasília, lança durante a edição atual da feira. CORREIO 14.11

Haickel costuma perambular por espaços da cidade — de botecos a escolas — com livros debaixo do braço. Um andarilho de palavra que acredita na força do boca a boca na formação de novos leitores, de tagarelas de mesas de bar a crianças que ainda estão aprendendo as primeiras letras. “Os escritores com quem converso dão conceitos mínimos, básicos de literatura, tanto para o leigo quanto para quem já aprecia. Os depoimentos ajudam a entender quais são as agonias do escritor, por que os livros refletem sentimentos e conhecimentos do ser humano. São arestas que cada um deles vai aparando a partir da literatura”, diz o poeta, sobre a compilação de textos.

Entre os selecionados, Haickel coleta diálogos com outros estrangeiros, como a portuguesa Alice Vieira e Mihai Zamfir, embaixador da Romênia no Brasil. Na lista de nacionais, figuram o pernambucano Flávio Lyra, o mineiro João Carlos Taveira e outros nomes.

FALANDO DE LITERATURA

De Marco Polo Haickel. Thesaurus, 92 páginas. Preço médio: R$ 15 (na Feira do Livro) e R$ 25 (nas livrarias).

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EDUCAÇÃO » Reconhecimento que vem da escrita. Representante do DF conquista o terceiro lugar em concurso de redação promovido pelo Senado. Aluno de São Sebastião escreveu sobre representatividade política CORREIO 14.11

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Carlos Vinícius mostra livros de poesia escritas pelos próprios alunos do colégio onde estuda: orgulho

A 30 km do centro de Brasília, estuda Carlos Vinícius Araújo. O jovem de 18 anos está no 3º ano do ensino médio do Centro Educacional São Francisco, em São Sebastião. Não só a escola, como o Brasil, descobriu um novo talento na escrita. Carlos foi escolhido, pela segunda vez consecutiva, para representar o DF no 4º Concurso de Redação do Senado Federal. Este ano, ele conquistou o terceiro lugar na etapa nacional.

A timidez torna o estudante econômico nas palavras. O que é reprimido na fala, liberta-se no texto. Carlos se mantém atualizado com notícias de jornais, de revistas e da internet. Todo conhecimento se reflete no papel. A dissertação com o título de “Direito irrevogável” apresenta uma visão crítica sobre o papel do cidadão comum na política. “Comparei a luta que o povo brasileiro deveria travar para acabar com a corrupção e a Revolução Francesa. O povo francês tomou consciência e eu acho que o brasileiro tem de lutar pelos seus direitos”, defende.

No início do segundo semestre, a Secretaria de Relações Públicas (SRP) do Senado enviou para mais de 18 mil estudantes e 500 escolas públicas de todo país kits de divulgação do concurso. Os interessados deveriam cursar o 2º ou o 3º anos do ensino médio e ter entre 16 e 19 anos. A SRP ainda não tem o número exato de quantos alunos participaram, pois aguarda o balanço das inscrições das secretarias estaduais de educação.

Seleções

Os textos passaram por três seleções, nas quais foram escolhidos o melhor de cada escola, os três finalistas de cada uma das Unidades Federativas e do país. Carlos chegou à última etapa e integra o trio com o primeiro e o segundo lugares — Matheus Oliveira Faria, de Passos de Minas (MG), e Janaína Santana Vilela, de Vianópolis (GO). Os 27 estudantes de cada estado serão premiados com notebook, medalha, certificado e publicação da sua redação no livreto produzido pelo Senado Federal.

A partir do tema “O Brasil que a gente quer é a gente quem faz”, eles dissertaram sobre processo democrático e exercício da cidadania. O objetivo, segundo a secretaria, é estimular a participação política e esclarecer aos futuros eleitores o papel institucional do Senado e do Poder Legislativo.

Carlos ficou sabendo do tema e logo definiu uma abordagem: a turbulência política, resultado dos recentes escândalos de corrupção. Para ele, o direito de definir os rumos do Estado é irrevogável. “A sociedade não pode esperar para que haja uma revolução. A mudança deve partir da gente. Como nosso país é democrático, é nossa responsabilidade votar de maneira consciente. Temos de cobrar dos políticos o que eles prometeram.”

Oportunidade

Os 27 finalistas estaduais vão ter a oportunidade de participar dos bastidores da política com uma cerimônia de premiação e o projeto Jovem Senador. Na semana que vem, eles vêm a Brasília atuar como senadores e vivenciar o processo de criação de leis dentro do plenário da Casa. Na quarta-feira, às 10h, haverá uma cerimônia de posse, conduzida pelo presidente José Sarney, semelhante à dos senadores. Durante três dias, eles simularão comissões parlamentares e votarão as propostas de lei que eles mesmos criaram. De acordo com Carlos, o Senado pediu para que todos respondessem a um questionário sobre a proposta. “Deu mais trabalho que a redação”, confessa. Nesse caso, o tema escolhido foi a legislação que regulamenta os crimes virtuais.

Não só o engajamento desperta o gosto pela leitura e pela escrita. O exemplo vem de casa. “Meu pai me inspira. Ele gosta muito de ler, é consciente e inteligente”, diz o estudante. Carlos Magno Araújo, pai do representante do DF, sempre fez questão de deixar claro para os filhos o papel dos estudos. “Se alguém quer vencer, é por meio do estudo. É isso que vai lhe colocar em uma posição melhor.” Araújo reconhece as deficiências do ensino público, mas diz que nem por isso o estudante deixa de aprender. “Cinquenta por cento da aprendizagem parte do aluno.”

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Rubens Ricupero. Corrupção e declínio. Temos problemas parecidos aos italianos, mas a agenda brasileira é ditada por queda de ministros e escândalos FOLHA SP 14.11

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Ao contrário do que sustentam alguns politicólogos, a corrupção inseparável do presidencialismo de coalizão praticado no Brasil acabará por gerar crises crescentes de governabilidade até ocasionar o declínio da economia e a destruição do regime político.

Os que se fixam apenas nas maiorias legislativas não enxergam dois fatores que solapam o sistema na raiz. O primeiro é a destruição da confiança, base, como ensinava Bobbio, da democracia.

O fenômeno já abarca entre nós quase a totalidade da opinião pública informada. Ninguém mais acredita que partidos e candidatos tenham outro objetivo que não seja o enriquecimento rápido e ilícito.

No limite, a perda de confiança conduz a explosões de cólera conforme vem ocorrendo nos países árabes, onde a causa principal da revolta das multidões é o protesto contra a injustiça e a corrupção dos governantes. Em nossa história esse sentimento desempenhou papel crucial na mobilização da classe média nas crises do suicídio de Vargas, da eleição de Jânio, do impedimento de Collor, e, ao lado do anticomunismo, do golpe de 1964.

O governo se felicita com razão da expansão dos setores médios e sua transformação em maioria, mas deveria lembrar que o comportamento político da classe média se caracteriza pela intolerância ante a corrupção. À medida que o setor se expande, essa intolerância só tende a aumentar.

O segundo fator subestimado é o preço crescente, em termos econômicos, dos arreglos com partidos. Argumenta-se que o dinheiro envolvido na corrupção é insignificante comparado ao tamanho da economia. Pode ser verdade em relação às somas do suborno e da extorsão.

O problema está no custo astronômico da multiplicação de ministérios inúteis, cargos supérfluos, perda de eficiência, irracionalidade na aplicação de recursos, incompetência na escolha e gestão de projetos dos quais são exemplos o trem bala e Belo Monte. E o custo das reformas que não se fazem porque mexem com os interesses dos partidos da coalizão? No início dos 1970 o setor público poupava 6% do PIB, parte do qual investido em infraestrutura de energia e transportes.

Hoje, o governo é deficitário e não consegue investir. Quanto dessa perda se deve ao custo político da coalizão? Por que um presidente como Lula nem sequer tentou propor a reforma da estrutura sindical herdada do corporativismo fascista apesar de ser uma das bandeiras históricas do seu partido?

Por décadas a Itália foi também governada por coalizões corruptas e ineficazes. Não tem importância, alegava-se, pois o dinamismo e a inovação das pequenas empresas garantiam o crescimento. A ilusão se desfez quando o fim do regime terminou esclerosando a economia.

Em grau distinto, alguns de nossos problemas se parecem aos italianos: crescimento lento, investimento baixo, incapacidade de aumentar produtividade e competitividade, aposentadorias precoces. Política doente contagia a economia.

O sintoma de nossa doença é que, em vez de ser dominada por essas questões, a agenda brasileira é ditada semana após semana pelos escândalos de corrupção e a queda de ministros.

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Malvina Tuttman. O ato de aprender e ensinar, questão ética

O Enem já se mostrou exitoso; o que está hoje em discussão, portanto, é o comportamento que fere a ética de profissionais que se intitulam educadores FOLHA SP 14.11

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Pensar o significado da educação implica ir além de uma observação simplista, fragmentada, que se ocupa, apenas, em analisar partes do processo educacional.

É necessário reeducar o modo de olhar e perceber os princípios e os valores que estão subjacentes às práticas em exercício nas instituições de ensino. Refiro-me, especialmente, à questão da ética.

Paulo Freire, em suas obras "Pedagogia da Autonomia" e "Pedagogia da Indignação", de modo incisivo, aborda essa temática denominada por ele de ética universal.

Freire aponta que os educadores devem exercitar uma "ética inseparável da prática educativa". Esse exercício deve se concretizar no cotidiano, na prática diária.

Ainda, segundo o autor, é preciso que o educador possa "testemunhá-la (a ética), vivaz, aos educandos". Fortalecida por suas palavras, indago-me: o que estará pautando o ato de ensinar e aprender em nossas escolas?

O fato isolado da apropriação indevida de questões sigilosas de um exame nacional me faz, enquanto educadora, refletir sobre a atualidade dos pensamentos de Paulo Freire em relação a essa atitude.

Onde estão os princípios da solidariedade? O fortalecimento do espírito público? Será que a ética do mercado, já denunciada por Freire, que se atrela a interesses pessoais de uma pequena parcela da sociedade brasileira, está se sobrepondo à dignidade que deve pautar a ética universal defendida por ele?

Tão importante quanto avaliar todo o processo de elaboração ou aplicação de um exame ou algo similar é rever as atitudes, as formas de agir de educadores. Isso também deve ser pautado pela sociedade.

Que cidadãos estamos formando quando expomos centenas de estudantes ao constrangimento de receber e ocultar informações privilegiadas? Queremos que valores como a mentira e a fraude façam parte dos ensinamentos às futuras lideranças do nosso país?

É gratificante saber, entretanto, que, apesar de possíveis influências negativas, jovens de 16, 17 anos já têm presentes em sua formação a preocupação com o outro, com o respeito à verdade. Pude perceber isso quando alunos, indignados, procuraram o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) sem receio de expor livremente a verdade.

Nesse momento, senti a força de outro tipo de educação, que vai além da escolar: a educação familiar. É preciso, mais do que nunca, fortalecer a eticidade. O currículo de nossas escolas deve considerar mais que conteúdos acadêmicos.

O nosso compromisso como educadores é o de agir coerentemente com princípios éticos. Paulo Freire nos ensina que a conduta do professor educa mais do que a simples abordagem conteudista.

Como diz Freire, "a força do educador democrata está na sua coerência exemplar: ela que sustenta sua autoridade. O educador que diz uma coisa e faz outra, eticamente irresponsável, não é só ineficaz: é prejudicial".

Como professora há mais de 40 anos, posso afirmar que o que ocorreu em Fortaleza é um caso isolado. Porém, precisamos ficar atentos ao que está acontecendo. Todos somos responsáveis. Não deixemos que mudem o foco do real significado dessa lamentável realidade.

O Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), que ocorreu nos dias 22 e 23 de outubro, acompanhado por toda a sociedade, já se mostrou exitoso, tanto do ponto de vista pedagógico como operacional.

O que está em questão não é o Enem, e sim o comportamento que fere a ética de profissionais que se intitulam educadores.

O Inep tem a clareza de que é preciso, cada vez mais, aprimorar todo o processo. Ainda há muitas questões a serem aprofundadas, e esse instituto está pronto para a tarefa.

MALVINA TUTTMAN é presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). Foi reitora da Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro).

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Alain Fresnot. Cinema brasileiro, simples e eficaz

Em dois a três anos, adotando algumas medidas, é possível atingir nível de produção que permitirá ao cinema brasileiro ter 40% do mercado interno FOLHA SP 14.11

A Argentina recentemente estabeleceu um imposto progressivo sobre o numero de cópias dos filmes americanos oferecidos. O fato de dois ou três lançamentos hollywoodianos simultâneos ocuparem mais de 70% da oferta é comum em praticamente todos os países, e reflete a demanda existente.

Ao operar em escala "interplanetária", o cinema americano consegue reunir capitais que permitem desenvolver os produtos e simultaneamente criar a demanda.

A capilaridade da divulgação dos filmes americanos em produção é extremamente eficiente. A divulgação é permanente. Pequenos jornais do interior têm mais materiais "jornalísticos" dos filmes que serão lançados, com um, dois anos de antecedência, do que o dos filmes nacionais do ano em curso.

Com o PSDB, foi criada a agência reguladora, Ancine, e instituídos os incentivos fiscais que fizeram o cinema brasileiro ressuscitar depois da tragédia Collor de Mello.

Com o PT, criamos o Fundo Setorial, o Vale Cultura e, recentemente, o PL 116, sobre conteúdo em TV, estes últimos ainda dependentes de regulamentação. A ministra Ana de Hollanda vem coordenando os esforços da agência reguladora e do Conselho Superior do Cinema para estabelecer um novo patamar de crescimento do setor.

É possível alavancar nossos filmes em quantidade e qualidade, hoje com só 15% em média de "market share". Para isto, é o bastante desfazer um dos maiores erros cometidos contra a atividade: a redução da porcentagem disponível para as empresas aplicarem em cultura, de 6% para 4%, imposta em 1998 pelo ministro Francisco Weffort, e que deve ser revista com urgência.

Implantada em consequência da crise na Ásia e com promessa de reversão, nunca foi reconsiderada. Sudan, Suframa e outras áreas cujos incentivos foram reduzidos na ocasião tiveram suas alíquotas recuperadas, só a cultura não.

Além disso, ao longo destes anos, institutos e fundações foram criados, afastando grandes grupos do patrocínio à produção cinematográfica. Televisões públicas, secretarias de cultura estaduais e municipais buscam também recursos incentivados, gerando uma competição fratricida e desigual entre agentes públicos e privados e entre as diversas linguagens artísticas.

Com a regulamentação do PL 116, haverá aumento dos recursos públicos investidos diretamente na atividade. Resta agora recuperar a margem dos produtores no contato direto com empresas, devolvendo a possibilidade de investir 6% do Imposto de Renda devido em cultura.

Isso permitirá um equilíbrio entre as duas fontes de recursos, deixando aos produtores a possibilidade de buscar financiamento mais adaptado a cada filme.

Com isso, no prazo de dois a três anos, é possível um nível de produção que permitirá ao cinema brasileiro participar de 40% de seu mercado interno, com os benefícios daí decorrentes.

Não há hipótese de nossos filmes aumentarem sua presença sem um comprometimento do poder público para além do Ministério da Cultura e da Ancine. É necessária uma vontade de Estado, que envolva vários ministérios, a Fazenda e a própria Presidência da República.

ALAIN FRESNOT é membro do Conselho Superior de Cinema, diretor e produtor de "Ed Mort", "Desmundo" e "Família Vende Tudo". Foi presidente da Associação Paulista de Cineastas.

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