terça-feira, 19 de março de 2013


LITERATURA »  Presença brasiliense em Frankfurt     
Para Alvim, participação dos poetas foi tímida. Behr (abaixo) acredita que a feira em homenagem ao Brasil repercutirá.  CORREIO BSB 19.03

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A Feira de Frankfurt, que em sua edição deste ano homenageia o Brasil como país convidado, divulgou a lista dos 70 escritores brasileiros escolhidos para mostrar à Europa a cara de literatura brasileira contemporânea. Ancorados em critérios como a pluralidade e a diversidade, os curadores Antonio Matrinelli e Manuel da Costa Pinto selecionaram nomes provenientes de todas as regiões do país com a intenção de realizar um panorama abrangente da produção nacional. De Brasília, os curadores escolheram três nomes: os poetas Nicolas Behr e Chico Alvim e o autor infantojuvenil e ilustrador Roger Mello.

Na lista de 70 escolhidos figuram apenas oito poetas, detalhe que chamou a atenção de Behr e Alvim. “Achei pouco. Só 10%. Podia ter mais”, lamentou Behr. “Não sei se é falta de força editorial dos poetas, ou se a poesia é para poucos mesmo. Eu sei que é um gênero difícil, as pessoas acham excessivamente cerebral.” Alvim ficou contente por ter um companheiro de Brasília nos estandes de Frankfurt, mas também achou tímido o lugar da poesia no evento. “Modesto, bem modesto, como bem comprova, aliás, o número reduzido de poetas escolhidos”, reparou o autor de Elefante.

Fora esse detalhe, a dupla está bastante animada. A Feira de Frankfurt é, basicamente, um evento de negócios e não um espaço destinado exclusivamente à venda de livros. Editores e agentes negociam contratos para traduções, publicações e edições que movimentam o mercado editorial no mundo inteiro. “É a nossa maior vitrine literária”, acredita Behr. “É a maior que o Brasil já teve. Essa feira vai ter reflexos nos próximos 10 anos no mercado nacional.” A participação no evento alemão é, para Behr, resultado do interesse pelo país no cenário internacional. “É uma questão de geopolítica, isso reflete o upgrade que o Brasil teve no cenário mundial.”

E a presença, Chico Alvim aponta, não é apenas econômica. “(Isso) está provocando em boa medida essa curiosidade, o desejo estrangeiro de conhecê-lo melhor. A literatura é uma das vias mais atraentes para isso. Há que considerar contudo certos casos especiais. As obras de Machado e de Clarice, por exemplo, já decolaram; têm vôo próprio e não dependem do que se que se passa em nosso espaço aéreo e território. Valem por si”, garante o poeta. A lista de convidados traz desde autores jovens como Daniel Galera e Michel Laub até nomes tradicionais na cena literária brasileira, como Ana Miranda e Ana Maria Machado, presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL). Todo ano, os organizadores da Feira de Frankfurt elegem um país para ser homenageado e a escolha costuma ter enorme repercussão no meio editorial. O Brasil é hoje considerado o oitavo maior mercado de livros do mundo e editoras do mundo inteiro vão aproveitar a feira para fechar negócios na área. A feira alemã está programada para acontecer entre agosto e setembro deste ano. 

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Escutatória
Rubem Alves
Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória.
Todo mundo quer aprender a falar... Ninguém quer aprender a ouvir.
(Esse texto faz parte do livro de crônicas:   Rubem Alves. O amor que acende a lua. )

Pensei em oferecer um curso de escutatória, mas acho que ninguém vai se matricular. Escutar é complicado e sutil.
Diz Alberto Caeiro que... Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Filosofia é um monte de idéias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas. Para se ver, é preciso que a cabeça esteja vazia.
Parafraseio o Alberto Caeiro: Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito.
É preciso também que haja silêncio dentro da alma.
Daí a dificuldade:
A gente não agüenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor...
Sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer.
Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração...
E precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor.
Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil de nossa arrogância e vaidade.
No fundo, somos os mais bonitos...
Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos estimulado pela revolução de 64.
Contou-me de sua experiência com os índios: Reunidos os participantes, ninguém fala.
Há um longo, longo silêncio.
Vejam a semelhança...
Os pianistas, por exemplo, antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em silêncio...
Abrindo vazios de silêncio... Expulsando todas as idéias estranhas.
Todos em silêncio, à espera do pensamento essencial. Aí, de repente, alguém fala.
Curto. Todos ouvem. Terminada a fala, novo silêncio.
Falar logo em seguida seria um grande desrespeito, pois o outro falou os seus pensamentos...
Pensamentos que ele julgava essenciais.
São-me estranhos. É preciso tempo para entender o que o outro falou.
Se eu falar logo a seguir... São duas as possibilidades.
Primeira: Fiquei em silêncio só por delicadeza.
Na verdade, não ouvi o que você falou.
Enquanto você falava, eu pensava nas coisas que iria falar quando você terminasse sua (tola) fala.
Falo como se você não tivesse falado.
Segunda: Ouvi o que você falou. Mas, isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo.
É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou.
Em ambos os casos, estou chamando o outro de tolo. O que é pior que uma bofetada.
O longo silêncio quer dizer: Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou.
E, assim vai a reunião.
Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos.
E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia.
Eu comecei a ouvir.
Fernando Pessoa conhecia a experiência...
E, se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras... No lugar onde não há palavras.
A música acontece no silêncio. A alma é uma catedral submersa.
No fundo do mar - quem faz mergulho sabe - a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos.
Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos a melodia que não havia...
Que de tão linda nos faz chorar.
Para mim, Deus é isto: A beleza que se ouve no silêncio.
Daí a importância de saber ouvir os outros: A beleza mora lá também.
Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto.
 Esse texto faz parte do livro de crônicas:   Rubem Alves. O amor que acende a lua.

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