quinta-feira, 14 de março de 2013
LITERATURA » Brinde à poesia
.
João
Carlos Taveira é o homenageado da noite
Nicolas
Behr interpretará os poemas de Taveira
Anand Rao
apresentará os próprios trabalhos.
CORREIO BSB 14.03
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Com o
objetivo de integrar a literatura na vida das pessoas e comemorando o Dia
Nacional da Poesia, o Sarau do Beijo — Poemação no Beijódromo reunirá poetas da
cidade em um evento descontraído. Entre os convidados estão Ruiter Lima, João
Carlos Taveira, Anand Rao e Done Pitalurg. O evento será realizado hoje, às 19h,
no Memorial Darcy Ribeiro — Beijódromo (Universidade de Brasília, Câmpus
Universitário Darcy Ribeiro).
O dia em
que se comemora a poesia foi criado em homenagem a Castro Alves, na data de seu
nascimento. Entre as obras mais conhecidos estão Navio negreiro e Vozes
d’África. Para celebrar a data, a ação cultural terá a parceria com o projeto
performático Pipocando Poesia e curadoria do Coletivo Poemação, marcando o
início de uma série de saraus no decorrer do ano.
Na
primeira edição, o poeta homenageado será João Carlos Taveira, que terá seus
poemas interpretados por Nicolas Behr, Anand Rao, Jorge Amâncio, entre outros.
Além disso, eles apresentarão os
próprios trabalhos.
Segundo a
produtora Manuela Castelo Branco, a ação cultural visa “revelar a cidade pelo
ponto de vista dos poetas”. O fato do evento ser realizado no Memorial Darcy
Ribeiro também é simbólico, já que a proposta “se identifica muito com o
trabalho do Darcy Ribeiro, que tinha uma faceta poética, além do seu trabalho
como antropólogo”, ressalta.
A comida
fica por conta do grupo performático Pipocando Poesia, que atua na cidade há
quatro anos. A trupe vai oferecer os mais variados e inusitados sabores de
pipocas. Cada uma leva o nome de um poeta diferente, entre eles estão Castro
Alves, de sabor chocolate; Clarice Lispector, que leva curry e pimenta; Manoel
de Barros, com um toque de alecrim. Para saborear uma pipoca, um poema
declamado é a moeda de troca.O público também terá um espaço garantido para
apresentar poemas no sarau, e a trilha sonora da noite vai ficar por conta de
Carlos Pial.
A partir
de maio, os encontros ocorrerão nas primeiras terças-feiras de cada mês, sendo
sempre acompanhados por outras manifestações artísticas, como exposições, exibição de filmes e poesias. Afinal, “tudo
com poesia fica mais gostoso”, afirma Manuela.
Quem não
puder comparecer ao primeiro evento, poderá acompanhar todo o sarau ao vivo
pelo site www.ustream.tv.
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Pesquisa revela perfil dos
escritores e personagens da literatura brasileira contemporânea. UNIVERSIDADE PALMARES -
01/03/2013
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A
pesquisa inova ao dar números para o fenômeno, mostrando a dimensão do abismo
que separa a diversidade da sociedade brasileira e sua efetiva presença na
literatura. É a confirmação de uma hipótese que já se intuía: o campo literário
ainda é um território para poucos.
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Literatura
e estatística são campos que raramente se cruzam. Quando o fazem, podem gerar
polêmica. É o caso de uma pesquisa coordenada por Regina Dalcastagnè, da
Universidade de Brasília (UnB), que pretende traçar um perfil dos escritores e
dos personagens da literatura brasileira contemporânea.
Os
primeiros resultados foram divulgados em publicações acadêmicas, em 2005, com
repercussão na imprensa. O debate foi renovado com o lançamento, em 2012, do
livro Literatura Brasileira Contemporânea — Um Território Contestado (Editora
Horizonte/Editora UERJ, 208 páginas, R$ 45), que disponibiliza os números da
pesquisa. Foram lidos 258 romances, publicados de 1990 a 2004, pelas editoras
Companhia das Letras, Record e Rocco. A pesquisa revelou que os autores, na
maioria, são brancos (93,9%), homens (72,7%), moram no Rio de Janeiro e em São
Paulo (47,3% e 21,2%, respectivamente).
Esse
perfil médio do escritor brasileiro não é exatamente uma surpresa. A pesquisa
inova ao dar números para o fenômeno, mostrando a dimensão do abismo que separa
a diversidade da sociedade brasileira e sua efetiva presença na literatura. É a
confirmação de uma hipótese que já se intuía: o campo literário ainda é um
território para poucos.
— Achei
excessivo o número de autores brancos, comparando com a realidade do país.
Claro que sabemos que há uma dificuldade maior para pessoas não brancas
participarem de qualquer campo de discurso, mas foi um número que surpreendeu —
diz Regina (leia entrevista).
O perfil
médio dos escritores se assemelha à representação dos personagens nos romances
brasileiros contemporâneos. Eles são, em sua maioria, homens (62,1%) e
heterossexuais (81%). As principais ocupações dos personagens masculinos são
escritor (8,5%), bandido ou contraventor (7%) e artista (6,3%). As personagens
femininas são donas de casa (25,1%), artistas (10,2%) ou não têm ocupação
(9,6%). A assimetria prossegue no que diz respeito à cor. Os personagens negros
são 7,9% e têm pouca voz: são apenas 5,8% dos protagonistas e 2,7% dos
narradores. Os brancos são, em geral, donas de casa (9,8%), artistas (8,5%) ou
escritores (6,9%). Os negros são bandidos ou contraventores (20,4%),
empregados(as) domésticos(as) (12,2%) ou escravos (9,2%). Enquanto a maioria
dos brancos morre, na ficção, por acidente ou doença (60,7%), os negros morrem
mais por assassinato (61,1%). A escritora Ana Maria Gonçalves observa:
—
Teríamos que confrontar esses números com dados reais para saber o quão
próximos ou distantes estão da realidade. Mas também é certo que, por
ignorância — e uma de suas muitas consequências é o racismo — e/ou costume,
características tidas como negativas são muito mais atribuídas a personagens
negros — comportamento copiado da vida real — do que a personagens brancos.
O
escritor e crítico Sérgio Rodrigues, do blog Todoprosa, contrapõe:
— O
mérito sociológico do levantamento é evidente, mas esse tipo de análise baseada
no perfil sociocultural dos autores, típico dos estudos culturais, tem alcance
limitado para dar conta do fenômeno literário. A coisa não é tão simples.
Guimarães Rosa era branco, urbano e altamente educado, mas ninguém fez uma
melhor tradução literária do sertão profundo.
Pesquisa
será replicada no RS
Apesar de
pouco expressiva em números, a representação das mulheres na literatura indica
uma tendência de crescimento: elas estão sendo mais publicadas por grandes
editoras do que antes. Depois de estudar os romances publicados entre 1990 e
2004, a equipe de Regina Dalcastagnè fez o mesmo com romances da época da
ditadura, de 1965 a 1979. Das décadas de 1960 e 1970 para as décadas de 1990 e
2000, a proporção de autoras cresceu de 17,4% para 27,3%, uma possível
conquista do feminismo que floresceu nesse período. Já a presença de personagens
femininos decaiu de 40,7% para 37,8%. No que diz respeito à cor, a proporção de
autores brancos cresceu de 93% para 93,9%.
A
presença de autores nascidos no Rio Grande do Sul passou de 4,7% para 12,7%,
possivelmente devido à proliferação de oficinas literárias. Um dos
participantes da equipe de Regina, o professor de literatura Ricardo Barberena,
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), realizará uma
pesquisa semelhante, com foco nos personagens de romances publicados por editoras
gaúchas. Os primeiros números devem ser divulgados neste ano.
— Uma de
nossas hipóteses é que houve uma mudança para uma prosa mais urbana. A questão
espacial será interessante de se pensar — diz Barberena.
Fonte:
Fábio Prikladnicki/Combate ao Racismo Ambiental
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O cinema como prazer e comércio
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Para
Bernardini, a expressão "filme de arte" não atrai público, já que
"muitas vezes chamamos de 'filme de arte' aquele que simplesmente não é
americano". Valor Econômico 11.03.13
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Para
transformar o dono de brasserie provençal em um dos principais gestores do
circuito de cinema de arte do Brasil, foram necessárias uma leve dose de acaso
e a profunda convicção de que o trabalho deve ser prazeroso.
Dono do
cinema Reserva Cultural, em São Paulo, e da distribuidora Imovision, que foi
pioneiro na divulgação do cinema iraniano e do movimento Dogma 95 - o original,
dinamarquês, como faz questão de frisar -, o francês Jean Thomas Bernardini tem
o comércio no sangue e dispensa ao mercado de filmes artísticos o mesmo olhar
profissional que dedica aos fornos da Pain de France, padaria que abastece
hotéis, restaurantes e, é claro, cinemas de São Paulo.
Sem a
intervenção do acaso, a distribuidora, que hoje possui os direitos de mais de
40 filmes ainda a lançar e tem 20 estreias marcadas para os próximos meses,
teria durado menos de um ano. Era 1989, Bernardini vivia no Rio e fabricava
peças de roupas em jeans no interior de São Paulo. Um conhecido telefonou da
França perguntando se ele poderia ajudar a distribuir um filme recém-lançado.
Era "Inverno de 54", com Lambert Wilson e Claudia Cardinale.
Assim
nasceu a Imovision, cujo nome abria caminho para que a empresa, depois de
espalhar um único filme pelas salas do Brasil, se tornasse uma imobiliária.
"Nunca me preocupei muito com o nome da empresa, a ideia era fechá-la
depois de distribuir esse filme", diz o dono, que se prepara para celebrar
o primeiro quarto de século da companhia.
Acontece
que "Inverno de 54" conta a história do abade Pierre, um dos
personagens mais queridos pelos franceses por sua luta em defesa dos sem-teto.
O abade, morto em 2007, era querido também no Brasil: ao saber do lançamento,
Leda Collor, mãe do então presidente eleito Fernando Collor, telefonou para o
distribuidor iniciante e ofereceu incentivo para o filme, até então destinado
apenas ao limitado circuito de cineclubes.
Com o
apoio ilustre, o próprio clérigo francês fez uma visita ao Brasil, o filme teve
uma trajetória bem-sucedida e outros produtores europeus vislumbraram um canal
para promover seus filmes no distante mercado sul-americano.
"Na
França, pensaram que eu era bom de marketing. Começaram a oferecer filmes, mas
as salas eram poucas. Ainda por cima, o cinema francês era mal visto - porque,
naquela época, estava chato, mesmo. Então comecei a distribuir alguns filmes em
cineclubes, quatro ou cinco por ano", relembra. "Naquele tempo, isso
era suficiente, porque um filme podia ficar um ano em cartaz, como foi com o
'Mahabharata' [de Peter Brook]. Hoje, isso é impensável."
Paralelamente,
o interesse do empresário pelo ramo da moda já era minguante. "As pessoas
não tinham profissionalismo. Viajei com um estilista para a Itália e ele me
deixou na mão. Foi passear."
Ironicamente,
a política econômica do filho de dona Leda ajudou a sufocar o negócio de jeans.
Além do sequestro da poupança, o Plano Collor continha um congelamento de
preços que foi fatal para o europeu desacostumado com a flexibilidade ética dos
brasileiros.
"Eu
informei corretamente meus preços; outros não fizeram isso. Mas os fornecedores
de tecido aumentavam os preços por baixo do pano. Queriam receber o valor
oficial declarado e mais algum dinheiro por fora. Eu não tinha como
competir."
O contato
com a falta de profissionalismo e a desordem institucional de um Brasil que se
redemocratizava poderiam ter desanimado o empresário, cujos avós eram
hoteleiros na França e cujo pai foi dono de uma rede de autoescolas. Com seu
faro de comerciante, o francês percebeu, atrás dos riscos, uma fonte
inesgotável de oportunidades de negócios. "No Brasil, tudo ainda estava
por fazer. Bastava ter uma ideia e colocá-la em prática. Se abríamos uma
empresa e ela quebrava, abríamos outra. Na Europa, já tiveram todas as
ideias."
'Não é
porque o filme não arrecada milhões que a pessoa tem de sentar numa poltrona
ruim, com a cabeça de alguém bloqueando a vista'
Nos
primeiros anos do século XXI, parecia que o circuito de cinema independente
estava condenado em São Paulo. Pouco a pouco, desapareciam os cinemas da região
da avenida Paulista. Fechou o Top Cine, fecharam os cinemas Gazeta e, mais
tarde, seria a vez do Gemini e do Belas Artes. As salas novas eram abertas nos
shoppings, "bem perto das praças de alimentação e cheios de
blockbusters", lembra Bernardini.
"Começou
uma história de que o cinema independente tinha se tornado inviável, mas eu
sabia por que parecia assim", diz o empresário. "Não adianta colocar
filme de arte em cinema de shopping. Não era o filme que não funcionava, a
programação é que estava equivocada."
Era um
tempo em que o campo do cinema estava cindido. De um lado, novos complexos com
salas confortáveis, som de qualidade e fácil acesso, passando os últimos
grandes sucessos de Hollywood. De outro, poucas antigas salas de rua que
sobreviviam por um fio, "bastante mal cuidadas", passando ainda
alguns filmes independentes. Por fim, as salas especiais, como o Cinesesc, e as
primeiras salas patrocinadas.
A cisão
estava na origem do problema que o empresário identificou. "O público do
cinema de arte tem de se reconhecer e se identificar com o lugar que frequenta.
Não é porque o filme não arrecada centenas de milhões de dólares que a pessoa
tem de sentar numa poltrona ruim, com a cabeça de alguém bloqueando a vista da
tela", argumenta.
Em 2005,
como se quisesse demonstrar sua tese, o distribuidor virou exibidor.
"Nunca fui a favor de misturar as funções. Para mim, o produtor deve
produzir, o distribuidor, distribuir e o exibidor, exibir. Mas estava começando
uma mistura de funções e eu também tinha minhas ideias", diz Bernardini.
"O importante é ser profissional: se um filme que eu distribuo vai pior
que o de outra distribuidora, sai o meu e fica o dela."
"Precisa
existir um cinema que se dedique especificamente ao filme de arte, mas que seja
bonito, agradável e atraia as pessoas", explica. Aproveitando o espaço dos
antigos cinemas Gazeta, na avenida Paulista, Bernardini fundou um complexo de
quatro salas, restaurante, livraria, café, um bar (que não deu certo e foi
fechado) e, agora, um pequeno entreposto de sua padaria. "Às vezes me
refiro ao Reserva Cultural como 'miniplex'. Ele tem a lógica parecida com a dos
cinemas de shopping, mas em outra escala e com um público específico",
explica o dono.
"Os
frequentadores do Reserva Cultural costumam ter bom gosto, mas isso não tem
nada a ver com dinheiro; na verdade, o novo-rico não vê cinema de arte de jeito
nenhum", diz. "No máximo, vai almoçar no restaurante, porque é uma
coisa bem vista, e acaba vendo um filme. Nesses casos, de repente consigo
fisgá-lo."
Para
Bernardini, a expressão "filme de arte" não ajuda a atrair público,
já que "ninguém gosta de filme de arte a priori" e, na realidade,
"muitas vezes chamamos de 'filme de arte' aquele que simplesmente não é
americano". Como o sistema de Hollywood dominou a produção e a distribuição
no mundo, grandes sucessos de bilheteria locais passam a parecer obras
alternativas no mercado externo.
"Tenho
amigos que começaram a frequentar meu cinema só para me agradar, mas hoje
dizem: 'Sabe que não consigo mais ver um filme americano?'" O empresário
se delicia com a lembrança. "Gostar de filmes menos comerciais é algo que
só acontece naturalmente. Uma pessoa não pode ser forçada, isso não se ensina
em cursos. Senão é como na escola, onde uma pessoa que detesta matemática é
obrigada a aprender a matéria, mas nem por isso vai começar a gostar."
O projeto
do Reserva Cultural - cuja realização arquitetônica, famosa pela ampla janela
entre o restaurante e a rua, ficou a cargo de Naassom Ferreira Rosa - era a
adaptação de uma ideia antiga, da qual o comerciante demonstra muito orgulho.
No começo dos anos 1990, o empresário francês teve a ideia de construir um
enorme complexo de cinemas em São Paulo, com 16 salas, algumas enormes, de até
1.400 lugares, para receber grandes sucessos de Hollywood, outras pequenas,
para o cinema independente. "Teria sido um dos primeiros multiplex do
mundo", afirma o idealizador.
"Vocês
Ainda Não Viram Nada", de Alain Resnais, filme francês que estreia no
Brasil em 22 de março pela Imovision
"Cheguei
a falar com o governo do Estado, que prometeu um terreno na marginal Tietê.
Encomendei um estudo de viabilidade à Fundação Getúlio Vargas (FGV), que veio
com mais de 400 páginas, e o projeto a Stanislas Fiszer, arquiteto dos Arquivos
Nacionais, de Paris", afirma Bernardini, que ainda guarda os documentos
como recordação. "Depois o governo me enrolou e não liberou terreno
nenhum", diz. Aquilo que teria sido um multiplex acabou se transformando
em "miniplex", mas "quem trabalha no Brasil, estrangeiro ou não,
tem que ter jogo de cintura", conclui.
O Reserva
Cultural, em plena avenida Paulista, poderia servir de exemplo de
empreendimento cultural que, sem vender-se à tentação puramente comercial dos
blockbusters, sobrevive sem patrocínio de grandes empresas. Mas o proprietário
não endossa o uso de seu espaço como exemplo, sobretudo porque a ausência de
parceiro não foi uma escolha deliberada.
"Já
tive várias conversas com possíveis patrocinadores, que acabaram não indo
adiante, por um motivo ou outro." O empresário acrescenta que nem todo
patrocinador seria interessante, apesar do aporte financeiro e da possibilidade
de cobrar ingressos mais baratos. "Eu adoraria uma empresa que
acrescentasse algo ao cinema, e não só colocasse a marca em troca de
dinheiro." Um exemplo de parceiro ideal seria uma empresa que atuasse com
tecnologia.
Muitos
amantes de filmes de arte torcem o nariz com veemência para Hollywood. Os
cinéfilos mais radicais talvez não imaginem que a sede da Imovision enfileira
nas paredes cartazes de antigos sucessos americanos, com estrelas de outros
tempos, como Elizabeth Taylor (1932-2011) e James Dean (1931-1955). O
empresário confessa uma certa nostalgia. "O cinema americano mudou muito.
Nos anos 50, era interessante, fez parte da nossa formação. Depois, virou puro
entretenimento e afastou os cinéfilos. Ficou tudo igual: o sujeito mata sete ou
oito e namora a menina mais bonita."
Enumerando
na ponta dos dedos as transformações que testemunhou no audiovisual brasileiro,
Bernardini se dá conta da variedade de experiências que teve. A Embrafilme foi
extinta pouco depois do surgimento da empresa. Depois vieram a Lei Rouanet e a
"retomada", e enfim a Lei do Audiovisual. O público aumentou algumas
vezes, diminuiu em outras, ainda mais para filmes independentes. Apesar de
tudo, Bernardini se diz otimista com o futuro do cinema independente no Brasil.
"Trabalho com isto há 25 anos e nunca precisei trabalhar com um filme só
porque ele daria dinheiro", diz. "Com todas as oscilações, pude
manter a saúde da empresa."
Das três
fases da cadeia do audiovisual - produção, distribuição e exibição -,
Bernardini julga que a produção, justamente aquela em que ele não atua, está
mais avançada. "Existem bons incentivos para produzir cinema no Brasil,
mas ainda falta avançar na distribuição e na exibição. Hoje, é muito comum
alguém fazer um filme e depois não conseguir mostrar, a não ser em
festivais."
Embora
reconheça que o mercado de distribuição melhorou de maneira geral, Bernardini
considera que quem mais se beneficiou foram os filmes comerciais. Sua sugestão
é que se criem mecanismos para facilitar a vida dos produtos mais difíceis.
"Um filme tcheco, excelente, distribuído com uma ou duas cópias, poderia
ter uma alíquota reduzida, por exemplo. Ele não é viável pagando o mesmo que produtos
com muito mais escala, que podem negociar preços com os laboratórios."
O
otimismo comanda o empresário a crer que o sistema vai se harmonizar de maneira
favorável, e vê um exemplo a seguir em seu país natal. A França, diz
Bernardini, pôde equilibrar o mercado audiovisual, com espaço para o cinema
comercial e o de arte, graças a anos de debate. "O governo, produtores,
distribuidores, exibidores, sentaram-se juntos e chegaram à conclusão óbvia:
todos têm de sobreviver e conseguir ganhar alguma coisa", diz.
Um
adversário inesperado da expansão dos cinemas de arte no Brasil foi a recente
explosão dos valores imobiliários nas maiores cidades. Satisfeito com os bons
resultados de seu "miniplex", Bernardini diz que gostaria de abrir
mais um, mas recuou diante do preço dos aluguéis.
Em vez
disso, o negócio mais recente de Bernardini é um café na Vila Madalena, onde
também se vendem os pães produzidos por sua Pain de France. O cinema, porém,
também é o horizonte deste empreendimento, embora gastronômico. Semanalmente,
filmes distribuídos pela Imovision são exibidos de graça no café, em DVD.
"Minha
única frustração com o Reserva Cultural foi ver que as pessoas não ficavam lá,
discutindo, depois dos filmes. Era isso que eu queria. Espero que no Café
Boulange isso aconteça!"
Glauber revigorado
Às vésperas do aniversário do
cineasta, dia 14, e do cinquentenário de Deus e o diabo na terra do sol, o
legado do diretor ganha dimensões inéditas. CORREIO BSB 13.02
-
Em novembro de 1965, o cineasta
Glauber Rocha foi preso. Participava de um protesto contra o regime militar nas
imediações do tradicional Hotel Glória, no centro do Rio de Janeiro. Com ele,
também foram encarcerados Carlos Heitor Cony e Márcio Moreira Alves. Cony se
tornaria imortal pela Academia Brasileira de Letras. O jornalista Moreira Alves
entraria para a história ao proferir em setembro de 1968, no Congresso
Nacional, o duro discurso motivador do Ato Institucional nº 5, que recrudesceu
ainda mais o regime militar. A Glauber Rocha coube ambas as façanhas: a
imortalidade e um (longo) capítulo na história.
O legado do cineasta, cuja
expressividade ainda repercute no mundo, foi ampliado. A produção intelectual —
versões inéditas de roteiros, manuscritos, desenhos — é maior que a imaginada,
o Tempo Glauber (principal centro de pesquisa e documentação do artista no Rio
de Janeiro, fechado há dois anos) será reaberto, e um filho, fruto de uma das
várias relações ocasionais de Glauber, foi descoberto em Brasília. “O mais
importante para mim é chamar a atenção para a obra do meu pai”, revelou
Henrique Cavalleiro, durante entrevista exclusiva ao Correio.
Foram mais de quatro décadas até a
confirmação da notícia e, posteriormente, chancelada por meio de um exame de
DNA (realizado em 2011) que envolveu Henrique, a filha legítima do diretor,
Paloma Rocha, e a mãe de Glauber, Dona Lúcia. O resultado é incontestável:
reside na capital um dos cinco filhos do mais cultuado diretor nacional.
Situação reversa àquela vivenciada em 1998, quando se provou que Daniel Rocha —
conhecido publicamente como filho de Glauber — era, na verdade, cria do artista
gráfico e compositor Rogério Duarte, autor do cartaz do filme Deus e o Diabo na
terra do sol, a mais famosa produção de Glauber, de quem era amigo pessoal.
Roteiros
Embora seja mais reconhecido como
diretor, Glauber enveredou por distintas vertentes. Os escritos como jornalista
são amplamente divulgados e, até hoje, pesquisados e utilizados como
referência. Poucos lembram, porém, que enveredou pelo teatro (escreveu a tragédia
Jango, em 1965, por exemplo) ou que era um aplicado desenhista — ferramenta
para seus roteiros.
Fosse qual fosse o ofício,
relacionava-se intimamente com o objeto de estudo. A dinâmica de trabalho
impressionava e a persistência resultou em uma herança superior àquela
conhecida pelo público em geral: “O processo de criação dele era muito célere.
Há projetos de livros, filmes, que ficaram apenas no papel. O potencial dele é
inacreditável”, afirma Gabriela de Souza de Queiroz, funcionária do Centro de Documentação
e Pesquisa da Cinemateca Brasileira.
Em entrevista à revista francesa
Positif, o próprio Glauber revelou projetos que nunca decolaram: “Escrevi
diversos roteiros que não foram filmados, nos quais eu tinha dificuldades em
criar personagens femininos, que são comigo sempre muito conscientes e têm
influência moral ou política”, disse a Michel Ciment, em 1981.
Desde 2010, quando o Ministério da
Cultura adquiriu parte do acervo do diretor, a cinemateca (domiciliada em São
Paulo) trabalha na digitalização dos documentos e filmes e no consequente
acesso pela população. O próprio Glauber, um ano antes da morte (em 1981), teve
a iniciativa de procurar a instituição: “Ele fez uma expressiva doação,
composta, principalmente, por materiais de imprensa — nacional e estrangeira —
que falavam dele”, revelou Gabriela de Souza.
O catálogo com os documentos e
manuscritos de Glauber na Cinemateca Brasileira pode ultrapassar 25 mil
páginas. “Muita coisa ainda não chegou ao grande público”, comentou. O cabedal,
dividido entre a cinemateca e o Tempo Glauber, soma mais de 50 mil itens.
Material suficiente para revelar um cineasta que julgávamos, erroneamente,
conhecer.
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VALOR
ECONÔMICO 07.03
-
Bons líderes públicos fortalecem
a AL
O motor
do desenvolvimento das sociedades é a força que reside em cada uma das pessoas
que as integram - na realidade, em cada uma das pessoas que formamos. VALOR
ECONÔMICO 07.03
Mas a
condição necessária para que essa força gere crescimento é o bom e correto
desempenho das instituições, sobretudo as públicas. Para que uma sociedade
experimente longo período de desenvolvimento sustentável, suas instituições
públicas precisam funcionar bem, de maneira adequada ao papel que lhes é
correspondente e desempenhando esse papel com transparência e eficiência.
As crises
institucionais quase sempre ocupam um lugar de destaque quando estudamos as
razões das crises econômicas e sociais. A crise na qual boa parte do mundo está
imersa hoje é prova disso. Qual a relação entre a resistência da América Latina
à crise financeira e o bom funcionamento de suas instituições bancárias e
regulatórias? Que parte da solução dos problemas europeus depende do que
acontecerá com as jovens instituições da União Europeia?
O
ex-presidente chileno Ricardo Lagos abordou algumas dessas questões na Brown
University, durante a inauguração da primeira edição do Programa de
Fortalecimento da Gestão Pública na América Latina da Fundação Botín. Para ele,
a crise financeira mostrou que a solução está na política. Assim, para onde foi
direcionado nosso olhar em busca de soluções? Para as instituições públicas,
fundamentalmente.
Para que
uma sociedade experimente longo desenvolvimento sustentável, suas instituições
públicas precisam funcionar bem, de maneira adequada ao papel que lhes é
correspondente e desempenhando esse papel com transparência e eficiência.
Por isso,
temos um desafio urgente: conseguir que nossos melhores profissionais se
dediquem ao serviço público, comprometidos com o desenvolvimento de suas
sociedades para servi-las, precisamente, desde as instituições.
É
importante identificar os melhores jovens universitários que têm essa vocação.
É fundamental que eles sejam bons, e que estejam entre os melhores. Não apenas
por que assim eles terão mais impacto em seus locais de atuação, mas também
porque eles poderão contagiar positivamente o ambiente em seu entorno.
A tarefa
não é fácil. Pesquisa da Fundação Botín realizada em dezembro de 2012 sobre
"O Prestígio da Profissão" apontou que, entre 100 funções, duas das
menos valorizadas foram as de deputado ou funcionário público. A amostra de 1
mil entrevistados reflete de modo eloquente que essas duas profissões estavam
entre as 15 mais desvalorizadas, muito atrás de médicos, engenheiros,
professores, administradores, jornalistas, advogados ou psicólogos.
Mesmo
assim, sabemos que há muitos profissionais interessados na área de gestão
pública. Seria suficiente então apenas detectar essas vocações e cuidar para
que elas sejam concretizadas em compromissos e decisões pessoais? Isso não é o
bastante, pois essa não é uma tarefa simples. É preciso dar a esses estudantes
as ferramentas para que, no futuro, quando eles se tornarem servidores
públicos, imprimam em suas instituições eficácia e transparência. Precisamos
ajudar esses profissionais a treinarem os músculos que eles utilizarão no
exercício de suas profissões.
Os
conhecimentos necessários foram adquiridos por esses jovens em suas
universidades. Mas devemos ajudá-los a encontrar bases éticas sólidas, a
desenvolver sua inteligência emocional e social, e a trabalhar em rede. A
ética, além de sólida, precisa ser prática, útil. É preciso que eles saibam
antes quais dilemas vão encontrar, e ter à mão argumentos e motivos para
solucioná-los colocando o interesse geral antes do particular quando lhes forem
apresentadas ocasiões para fazer o contrário.
As
inteligências emocional e social serão necessárias para que esses profissionais
possam se conhecer e se gerenciar, para reconhecer e resistir à frustração
quando a sofrerem, para detectar a euforia ou o medo quando precisarem usar
esses sentimentos em seu favor, para que se atrevam a inovar, colocar-se no
lugar do outro e chegar a acordos. Há 20 anos não sabíamos o quão importante
era tudo isto, mas hoje sabemos que isso não pode ser deixado de lado em
nenhuma profissão, e de nenhum modo no serviço público.
Desde que
Manuel Castells escreveu seu famoso livro "A Sociedade em Rede", a
realidade seguiu lhe dando razão. Somos redes, e trabalhar em rede - dividindo
conhecimentos, oportunidades, problemas e projetos - é multiplicar o fruto dos
esforços. Se conseguirmos que alguns destes futuros servidores públicos da
América Latina estejam e trabalhem em redes que transcendam seus países,
multiplicaremos a eficiência de qualquer estratégia de fortalecimento das
instituições.
Detectar
aqueles que, entre os melhores estudantes da América Latina, têm vocação para o
serviço público, cuidar dessa vocação para que ela seja convertida em
compromisso, e ajudar a esses futuros servidores públicos a desenvolver as
ferramentas que lhes permitirão ser eficazes e eficientes são os objetivos do
Programa de Fortalecimento da Gestão Pública da Fundação Botín.
Iñigo
Sáenz de Miera é diretor-geral da Fundação Botín para o fortalecimento da
gestão pública na América Latina
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