quarta-feira, 31 de julho de 2013

Manchetes do Edu

ENTREVISTA /ADRIANA CALCANHOTTO »
Para todas as idades
Compositora gaúcha investe na literatura e lança coletânea de poemas dirigidos às crianças, de Gonçalves Dias a Gregório Duvivier.    
Antologia ilustrada da poesia brasileira – Para crianças de qualquer idade 
Vários autores. Organização e ilustrações de Adriana Calcanhotto. Editora Casa da Palavra. Páginas: 136. Preço médio: R$ 48  CORREIO BSB 31.07

      
"Ao longo do processo descobri porque há poucas antologias como estas: a burocracia é tanta para conseguir a cessão dos poemas que é fácil desistir da ideia" Adriana Calcanhotto


Desenho que ilustra o poema As borboletas, de Vinicius de Moraes  


Foi Carlos Drummond de Andrade quem provocou a primeira faísca na mente de Adriana Calcanhotto. Em A educação do ser poético, o escritor mineiro questiona os motivos que levam as crianças a deixar de lado a verve poética ao longo da vida. Adriana não responde. “O importante é a pergunta”, argumenta. A reação à indagação veio em forma de livro. Antologia ilustrada da poesia brasileira, que acaba de chegar às livrarias, reúne textos selecionados e ilustrados pela cantora. Mais um trabalho de uma artista que canta, escreve, desenha e, agora, declama.

Contrariando as antologias tradicionais, Adriana optou pela ordem cronológica. A seleção inicia em 1846, com Canção do exílio, de Gonçalves Dias, e segue até 2008, com a inusitada escolha do humorista Gregório Duvivier, que assina Receita para um dálmata. Entre o ponto de chegada e o de partida, passam Olavo Bilac, Mário de Andrade, Mario Quintana, João Cabral de Melo Neto, Ferreira Gullar, entre outros.

Manuel Bandeira e Cecilia Meirelles ficaram de fora, por imbróglios autorais, mas foram reverenciados com um agradecimento ao fim do livro. O poetinha Vinicius de Moraes ganhou a dedicatória. “Feliz em lançar o livro no ano de seu centenário”, disse.

Além de exaltar o amor pela poesia, a cantora aproveitou a oportunidade para exercer a faceta de ilustradora. Os lúdicos desenhos que acompanham cada um dos poemas facilitam a interação entre as crianças leitoras e os textos. Apesar da atmosfera infantil que circunda a obra, Adriana adverte: “O livro se destina às crianças de todas as idades”. Sem restrições.


Como surge a ideia de coletar e ilustrar poemas?
Na verdade, eu sentia falta desse livro. Uma coletânea de grandes poetas que escreveram para crianças. Não necessariamente escrito para elas, mas de quem possam gostar. Não é uma questão de entender. Procurava por esse livro e não encontrava. Achei algumas antologias que separavam os poemas por assunto. Preferi separar por ordem cronológica, que traz o eco de um poeta em outro, de uma geração na outra. As rupturas, os retornos. No fundo, fiz esse livro porque queria tê-lo para mim (risos). Então, compartilhei.

 Foi a primeira empreitada pelo gênero?
Eu já tinha feito uma coisa parecida, ao ilustrar O poeta aprendiz, um poema de Vinicius (de Moraes) emblemático, que depois virou uma canção. Enquanto canção ganhou ares mais lúdicos, embora Vinicius e Toquinho tenham a gravado em um álbum “adulto”. De qualquer forma, sempre achei que essa música falava com as crianças, falava comigo. Fiz esse trabalho, pois acredito que quanto antes se entra em contato com a poesia, melhor. Quando você, muito novo, decora um poema, aprende, mesmo que ainda não tenha acesso a todas as “camadas”, você passa a carregar aquela voz poética, para sempre.

Qual foi o critério utilizado para selecionar os poemas?
Mais do que simplesmente visualizá-los, precisava vê-los com espontaneidade. Teve um poema do Cassiano Ricardo que escolhi. Acho-o lindo. Mas não consegui desenhá-lo. Tentei de uma forma, de outra, mas não gostava. Acabei trocando de poema. Tive o cuidado para deixar espaço para a imaginação do leitor. São apenas vinhetas. A intenção não é esgotar o assunto, muito menos explicar o poema. De jeito nenhum, poetizar o poema (risos). Minha ideia é abrir portas, não fechá-las.

Como se manteve motivada após a dificuldade com os direitos autorais?
Simplesmente porque não acho que as crianças devam ser prejudicadas por imbróglios adultos.

Você escreve poemas?
Não, faço letras de músicas. Sempre com uma melodia minha ou de um parceiro na cabeça. Posso também musicar o poema de alguém. Mas sentar para escrever poesia? Não. Tenho escrito prosas, crônicas. Poesia eu deixo para os profissionais.

O lançamento está relacionado com o mundo infantil, por que assinar como Calcanhotto e não Partimpim?
É muito difícil essa questão de ter um heterônimo. Às vezes, fico confusa. A Partimpim está voltada para a música. Ela não teria a disciplina para reunir esses textos. Ela não tem bagagem, estofo, para ler toda essa poesia. Além disso, ela não desenha. Ela é música. A leitora de poesia é a Adriana Calcanhotto. A Partimpim só faz bagunça, faz o que quer. Talvez até goste de poesia, mas daí a organizar um livro...

Em algumas ocasiões,você canta canções da Partimpim, mas declama poemas. Como resolve o conflito?
Tem sido experiências interessantes, que nunca tinha feito. Faço voz e violão de canções da Partimpim, mas falo sobre o livro. Não é uma coisa fácil para mim (a cantora faz uma pausa). A única canção que parece transitar entre as duas Adrianas é Fico assim sem você. O resto eu não consigo misturar. Eu sempre espero que as crianças não façam muitas perguntas, pois o que eu mais tenho medo é de pergunta de criança (risos).

Recorda alguma pergunta curiosa?
No show, elas perguntam o porquê de a ordem das canções ser diferente da do disco. Como respondo isso de forma sincera em poucas palavras? (risos). Mas são as melhores perguntas, na maior parte das vezes.


      
Antologia ilustrada da poesia brasileira – Para crianças de qualquer idade 
Vários autores. Organização e ilustrações de Adriana Calcanhotto. Editora Casa da Palavra. Páginas: 136. Preço médio: R$ 48 


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