segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Manchetes do Edu

ruy castro
Ruy Castro, escritor e jornalista  FOLHA SP 07.09. Texto bacana

Bola entre as pernas

RIO DE JANEIRO - De certa maneira, a culpa é do querido d. Pedro 2º. Em 1876, de chapéu de palha e guarda-chuva, ele circulava com os jurados pela Exposição do Centenário dos EUA, em Filadélfia, quando passou pelo estande de um jovem magro e humilde que conhecera semanas antes, em Boston. O rapaz tinha um aparelho para mostrar, mas ninguém se dignava a examinar sua criação. Por insistência de d. Pedro, os jurados aceitaram submeter-se a uma demonstração. O jovem se chamava Alexander Graham Bell. Seu invento era o telefone.

Outro dia, num episódio do seriado americano "Peter Gunn", de 1958, a que eu assistia em DVD, o herói está na rua e precisa falar com alguém na França. Liga para a telefonista, dá-lhe o número a chamar em Paris e o número de seu cartão de crédito. Dez minutos depois, a ligação é completada e ele se admira com as comunicações modernas. Ao ver isso hoje, em 2013, eu também me admiro --com que então, em 1958, os americanos já pagavam uma ligação internacional com cartão de crédito! Naquele tempo, nós, aqui, ainda nos comunicávamos por tambores.

E o que mais me impressionou na chegada do homem à Lua, em 1969, não foi a chegada em si, mas ver o presidente Nixon, da Sala Oval, ligar --direto-- para o Mar da Tranquilidade e mandar chamar os astronautas Neil Armstrong e Buzz Aldrin. Quanto a nós, aqui, ainda nos arriscávamos a morrer de velhice antes de completar uma ligação Rio-São Paulo.

Mais recentemente, os americanos levaram isso às últimas consequências, com seus aparelhos que escutam, leem, gravam e classificam tudo o que se fala em toda parte, sem que as pessoas percebam que estão sendo xeretadas.

E, quando percebem, reagem indignadas --pelo fato de, tão triunfalistas, autossuficientes e espertas, estarem há anos tomando bola entre as pernas.


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Literatura
Moleskine, fragmentos e fotos reinventam diários.  Heloisa Prieto: novo livro em formato moleskine.  Folhapress 08.09
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Heloisa Prieto é nome conhecido na literatura brasileira, em particular na infantojuvenil. Tem 52 livros publicados, além de diversos trabalhos de organização de séries e coleções. Mas nada disso se parece com seu novo livro. Na verdade, Escrita Secreta não se parece com nada que está nas livrarias. Tem formato de moleskine, fotos em quase todas as páginas, diagramação ousada, citações e textos fragmentados.
Numa difícil tentativa de classificá-lo, talvez a melhor seja “diário contemporâneo”, para usar expressão pinçada da conversa com a autora. “Gosto muito de diários”, diz Prieto. “Mas a ideia desde o início era criar algo inclassificável. Já sentia isso quando propus o desafio às meninas.” As “meninas”, na faixa de 22 e 23 anos, são Priscila Nemeth e Anne Checoli, fotógrafas, e Eugênia Hanitzsch, designer. São praticamente coautoras do livro, criando o suporte visual para os textos.
O projeto veio de Jokerman, conto que aparece no livro como seu trecho mais “convencional”, pelo menos na forma. Na temática, tem algo de gótico a história de Sara, mulher angustiada que visita um acampamento cigano. A autora escreveu o conto “há muito tempo” e, em 2009, assinou contrato de publicação a partir de uma versão reduzida, para talvez transformá-lo em romance.
Ao mesmo tempo, Prieto revirava sua “caixa de ideias”, como diz, e eram tantos textos inacabados que ela decidiu não apenas juntar tudo aquilo, mas escrever outros. Na abertura de Escrita Secreta, quis apresentar a obra. Em um jorro poético de exemplificações, como “cartas rasgadas”, “mensagens apagadas” ou “fiapos de personagens”, fez um texto tão fragmentado como os seguintes.
A primeira a entrar para o projeto já estava perto. Priscila é filha da autora e faz trabalhos de foto com a amiga Anne. Outra amiga, Eugênia, veio para “dar corpo ao livro”. O medo é tema forte nos textos. O que encerra o livro, o mais recente do material, trata de uma caminhada apavorada da narradora nas ruas da cracolândia paulistana.
Escrita Secreta não é infantojuvenil. “Não acredito em faixa etária para classificar livros, é uma limitação. Acredito, sim, na divisão por gêneros, e é por aí que enxergo a maior ruptura em relação aos outros que escrevi.” Para Prieto, sua narrativa sempre carrega algo da estrutura do folhetim, encerrando um episódio na vida dos personagens. Desta vez, a fragmentação deixa tudo solto. “Não sabia como reagiriam. E o retorno é ótimo. Uma amiga disse que vai comprar 15, para dar de presente!”

Livro: Escrita Secreta
Autora: Heloisa Prieto
Editora: Escrita Fina
Páginas: 72
Quanto: R$ 25




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