sexta-feira, 18 de janeiro de 2013










Revolução em sala de aulaGraças à dedicação de uma professora de português, estudantes da periferia de Planaltina foram estimulados a perder a inibição e a colocar as ideias em forma de texto. O resultado? Dezesseis passaram no vestibular.  CORREIO BSB 18.01.13

Extra, extra! Alunos do 3ª ano do Ensino Médio do Centro Educacional Pompílio Marques de Souza, em Planaltina, experimentaram, no ano passado, uma cápsula do tempo imaginária, na qual depositaram seus sonhos de vida. Uns querem ser médicos, professores e promotores de Justiça; outros, arquitetos, empresários, enfermeiros, nutricionistas, advogados e jornalistas. Dezesseis jovens garantiram vaga para o sucesso e estão aprovados em universidades federais e estaduais de Goiás.

A viagem ao futuro foi possível graças à dedicação da direção e dos docentes, em especial, da professora de português Conceição Guisardi. Apaixonada pela profissão, ela enxergou na escola — localizada no bairro Mestre D’Armas, periferia da cidade —, uma possibilidade de dar saltos mais altos. Tudo começou em 2012, quando a mestra chegou ao colégio transferida de uma unidade educacional do Paranoá. “Os alunos tinham pavor de redação. Para mim, aquilo não era normal”, observou ela.

Em uma tentativa de eliminar o bicho-papão da cabeça deles, a professora decidiu reinventar. Em uma das primeiras atividades do ano, incentivou-os a escreverem uma carta para quem quisessem. A atividade se chamava cápsula do tempo. Nela, a ideia era que cada jovem contasse como se imaginava dentro de uma ou mais décadas. “Um aluno disse que tinha se tornado um médico e o outro, um advogado”, contou Conceição, orgulhosa.

Ela ainda usou e abusou da tecnologia como recurso pedagógico. Tornou-se amiga da turma no Facebook. Postava os conteúdos a serem estudados via mensagem. Tinha data e horário para isso. Corrigia-os discretamente quando escreviam palavras como “hipocrisia” sem h.

As postagens de Camila Nunes, 17 anos, e de Lucas Oliveira, da mesma idade, na rede social foram usadas na prova bimestral, confeccionada em cores e com as mesmas regras de vestibular: era proibido usar corretivo e as respostas tinham que ser marcadas com caneta azul ou preta. Caso alguém fosse pego “colando”, a avaliação seria anulada.

O texto “Saudade que já dói”, de Lucas, gerou duas questões subjetivas para serem analisadas e marcadas. O que deveria ser um sufoco trouxe estímulo. “Montei uma prova colorida, com fotos e publicações deles e imprimi tudo em casa. Eles quase enlouqueceram ao verem os próprios textos na avaliação”, emocionou-se. Enlouqueceram mesmo. Mais que isso. Sentiram-se importantes, capazes, estimulados.

Aprovação

O Centro Educacional Pompílio Marques de Souza recebe os louros da aprovação de 16 estudantes em universidades públicas do país. Todos passaram na Universidade Estadual de Goiás (UEG), sendo 11 para letras e os demais para pedagogia, matemática e história.

O grupo ainda se inscreveu em vestibulares de universidades federais. Maria Beatriz Soares, 18 anos, foi uma delas. Ela passou em direito na Universidade Federal de Mato Grosso e aguarda o resultado da Universidade de Brasília (UnB). “Nas questões discursivas, a redação ajudou muito a gente. Quero ser promotora de Justiça porque acho uma linda profissão”, destacou.

Joadyson Silva Barbosa, 17 anos, deixou de lado os pensamentos negativos e se dedicou ainda mais aos estudos. Tirou 860 pontos na redação (1.000 é a nota máxima) e passou pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu) para odontologia, na Universidade Federal de Uberlândia (MG), mas agua rda resultado do vestibular para medicina na UnB. “Se eu não passar, vou tentar até conseguir. Medicina é tudo, é o meu sonho. Antes eu tinha complexo de inferioridade, mas vi que sou capaz”, admitiu o jovem.

A mãe, Gilmária Santana, trabalha como auxiliar de serviços gerais no colégio Pompílio Marques e não disfarça a felicidade. “Na família, ele é o espelho. Estuda o dia inteiro e não quer saber de Facebook ou videogame. Fico muito orgulhosa”, admite.

Joadyson ainda venceu um concurso de redação promovido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), no ano passado. Havia cerca de dois mil concorrentes. O trabalho literário tinha como tema “O papel da internet na educação”. O estudante escreveu num trecho da redação que “a internet transforma paradigmas e integra as pessoas, mostrando-se aliada no processo de educação, tanto nas questões sociais quanto nas científicas”.

Furacão na escola

Joyce Rodrigues, 16 anos, tirou 900 pontos na prova dissertativa do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) do ano passado. Ela, porém, estava no 2º ano e não poderá cursar administração. “A redação foi decisiva. Amo ler e acabo escrevendo bem”, raciocinou a jovem, que diz ler pelo menos três livros literários por mês. Entre eles, estão A hora da estrela, de Clarisse Lispector e Dom Casmurro, de Machado de Assis.

Ravane Rabelo da Silva, 17 anos, passou para letras, na UEG, e prontificou-se a dar aulas de reforma ortográfica a professores do colégio. “Eu tinha muita dificuldade para escrever, mas a professora levantou minha autoestima”, garantiu. A mãe, Maria Leni Rabelo Campos, 50 anos, estava maravilhada. “O que aconteceu na escola foi uma revolução. Eu só tenho o que agradecer a professora. Ela mora no meu coração”, elogiou.

A professora Conceição teve o apoio do diretor Welton Rabelo. Ambos realizaram projetos e atividades o ano passado inteiro. Promoveram aulões, uma vez que os jovens não tinham condições de pagar cursinhos. Diversos simulados foram aplicados em turno contrário. Alunos disputavam quem tirava nota maior, quem desempenhava melhor as tarefas designadas.

 “Em 2012 passou um furacão na escola. Foi cansativo, mas quando se tem dedicação e vontade, as coisas funcionam. Os alunos do 3º ano deixaram bons exemplos para as outras turmas”, destacou Welton. “Eles são os mais ciumentos e dedicados que conheci em 14 anos de profissão”, concluiu Conceição. Fica a saudade.

Vagas na internet
O informatizado Sistema de Seleção Unificada (Sisu), gerenciado pelo Ministério da Educação (MEC), é um portal de ensino no qual instituições públicas de educação superior oferecem vagas para candidatos participantes do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
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Prefeito faz discurso de aproximação aos movimentos sociais

Um dia depois de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aconselhá-lo a abrir seu governo para a participação popular, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), discursou para representantes de movimentos sociais e pediu a ajuda da sociedade para debater as propostas para o município e ajudá-lo na comunicação com os paulistanos, para evitar a paralisação de projetos da nova gestão.  VALOR ECONÔMICO 18.01.13

"Tenho consciência da fragilidade de estar à frente do Poder Executivo sem contar com o apoio da população para resolver os nossos problemas", afirmou ontem, no lançamento da 4ª edição dos Indicadores de Referência de Bem-Estar no Município, feita pelo Ibope e pela Rede Nossa São Paulo, que reúne mais de 100 entidades da sociedade civil (ver reportagem na página 10).

Segundo a pesquisa, segue baixa a confiança em instituições como a prefeitura, a Câmara Municipal, o Judiciário e o Tribunal de Contas do Município. O item com pior avaliação, dos 169 pesquisados, foi "honestidade dos governantes", com nota 2,9, de 10 possíveis. "Hoje, a sensação na cidade é que tem uma negociata por trás de todo empreendimento, por trás de toda iniciativa pública", disse o prefeito, que reclamar das inúmeras consultas do Ministério Público aos projetos e da necessidade de responder a uma série de órgãos para viabilizar cada empreendimento.

O petista evitou, porém, criticar a gestão anterior, do ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD), que na campanha foi atacada por Haddad pelos casos de corrupção. A mudança de postura ocorreu logo após a eleição, quando Kassab se tornou um aliado importante para garantir a governabilidade na Câmara - o PSD tem a terceira maior bancada.

Haddad preferiu adotar o discurso de que essa sensação de negociatas é nutrida pela falta de comunicação. "Quando você se expõe e discute os problemas sem reservas, as pessoas passam a acreditar e ver a sinceridade dos seus argumentos. Quanto mais você explicar para as pessoas, mais vai angariar apoio para as difíceis decisões que o dia a dia te impõe", afirmou.

Haddad, contudo, buscou mostrar diferenças em relação a Kassab, que investiu pesado em propagandas na televisão para melhorar a avaliação do governo. Para o petista, o essencial é o diálogo com a sociedade. "Não vejo outra possibilidade do que ganhar a batalha da comunicação. E para isso não é a propaganda na TV, é disposição para debater e dialogar. Não é publicidade e propaganda", pontuou.

Segundo Haddad, a receita da cidade para investimentos é pequena e será preciso firmar parcerias com os governos estadual e federal, a iniciativa privada e a comunidade. O prefeito previu que eventuais problemas surjam disso e pregou o diálogo para resolver isso. "Se eu contava com recurso federal que não veio, vou dizer. Se um secretário meu falhou, vou dizer. Se eu falhei, vou dizer. É a única maneira de corrigir os erros", afirmou.

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...E O HOMEM CRIOU DEUS A

pós receber o Jabuti como ilustrador, Ferreira Gullar revela ao Correio as inspirações do recém-lançado monólogo escrito para o teatro



“A primeira coisa que eu quis ser na vida foi pintor. Não deu certo.” Ainda bem. Caso contrário, o país talvez não conhecesse o neoconcretismo. Ferreira Gullar, um dos maiores expoentes da poesia nacional, seria anônimo. Obras como A luta corporal (1954) ou o célebre Poema sujo jamais viriam à tona. Árduos sacrifícios. Em se tratando de Gullar, porém, não há prejuízos. Depois do mérito literário alcançado, sobrou tempo para a pintura reger os poemas. Ou vice-versa.  CORREIO BSB 18.01.13


Quando subiu ao palco da Sala São Paulo, em 2011, para receber o Prêmio Jabuti pela obra Em alguma parte alguma, não seria nenhum absurdo imaginar que no ano seguinte ele poderia repetir o feito. Afinal, o mais tradicional prêmio literário nacional já o laureou algumas vezes. Dito e feito. Em outubro de 2012, Ferreira Gullar voltou a ser contemplado. Dessa vez, como ilustrador.


 Bananas podres reflete o melhor da habilidade plástica do poeta. Pinturas, recortes, colagens e desenhos reunidos em um curto, mas expressivo livro. Segundo trabalho de ilustrações a chegar ao público (o primeiro foi Zoologia bizarra, de 2010), a obra deu a Gullar oportunidade de exercitar uma paixão que o persegue desde a infância. “Era garoto em São Luís quando fiquei fascinado pela pintura. Fiz, pintei. Até me entregar à poesia”. O encantamento permaneceu: “Comecei a escrever sobre pinturas, frequentar os pintores. Eu, inclusive, sempre fui muito mais ligado aos pintores do que aos escritores. Até hoje”, contou, em entrevista ao Correio.


A disposição para exercer, profissionalmente, estilos menos recorrentes não se restringe às ilustrações. Depois de 26 anos sem divulgar qualquer obra dramatúrgica, Gullar reaparece para o teatro com o recém-lançado O homem como invenção de si mesmo, um ousado monólogo que apresenta os elementos vitais da vida como resultados da criativa mente humana. Sem exceções. Assim, temos o intelectual de volta às acirradas discussões culturais. Aos 82 anos, Gullar bebe de uma fonte inesgotável de vitalidade, que continua a render trabalhos (neste ano, há dois novos livros previstos) e uma das mais intrigantes mentes da cultura nacional.


Cinco perguntas / / Ferreira Gullar

Foram mais de 20 anos para voltar a fazer algo para o teatro. Por que tanto tempo?
Não sou uma pessoa que planeje a vida com uma preocupação profissional ou pensando em ganhar dinheiro. Não é essa minha cabeça. Faço as coisas pelo prazer e suscitado por coisas casuais, como foi o caso dessa peça (O homem como invenção de si mesmo). Nem estava pensando em escrever para o teatro. Não que eu tivesse algo contra, mas não funciono assim. Sou motivado pela vontade, pelo processo de vida, pelo espontâneo.

Como se deu o processo de criação do enredo?
Eu comecei a entender que a vida é uma coisa inventada. Estou convencido disso. O homem se inventa enquanto pessoa, enquanto ser humano. Nascemos incompletos. O homem não é capaz de sobreviver somente com as mãos, os pés, a boca, os dentes. Não sobrevive dispondo só disso. Então, ele precisa criar a lança, o machado, a roda, o avião, o computador. Ele vive em um mundo inventado. A cidade é uma coisa inventada. Não nasce espontaneamente.

O texto defende que Deus faz parte dessas invenções. A justificativa é a mesma?
Claro! Da mesma maneira que o homem nasce incompleto na questão física, ele nasce perplexo, indagando: “O que estou fazendo aqui?” e “o que é o mundo?”. Perguntas sem respostas. O mundo foi inventado ou sempre existiu? Não há resposta. Se você diz: “O mundo existe porque Deus o criou”, está tudo respondido. Deus é a resposta para as perguntas sem respostas. O homem inventou Deus para que esse o criasse. Como diz Waldick Soriano: “Eu não sou cachorro, não”. “Sou filho de Deus”, mas para isso, preciso criá-lo primeiro. Eu não quis escrever um tratado de filosofia sobre isso. Não tenho essa pretensão. São ideias minhas que quis expor. Acredito nelas. Não acho que sejam uma bobagem.

Co mo, então, Ferreira Gullar responde aos enigmas humanos?
Eu fico sem as respostas. Acho a religião fundamental para a vasta maioria das pessoas. Feliz aquele que acredita. Não falo do fanatismo, do sectarismo. Isso é o oposto, algo negativo. Mas a religião como amor pelo ser humano, como tentativa de entender a vida, é importante. Quem tem isso convive mais tranquilamente. Tem mais consolo do que uma pessoa como eu. Mas tampouco sou um ateu mal-humorado, negativo: “Deus não existe, o mundo é um absurdo”. Nada disso. O incompreensível ultrapassa a capacidade humana de entender, pela sua vastidão, pela amplitude. Por isso mesmo, torna-se fascinante e extraordinário.

Aos 82 anos, há algo que o deixe temeroso?
Eu, às vezes, fico deprimido. Mas não tenho razão para isso. Pela minha vida, meu histórico, não acho que há motivo. Acho que seja algo biológico. Tenho meus filhos, netos. Pessoas carinhosas ao meu re dor. Minha companheira, Cláudia. Meus amigos, pessoas tão gentis. Meus leitores, tão generosos comigo. Então, não há motivo. Bate uma certa depressão, mas passa. Só pode ser biológica, porque lógica não é! (risos). Nada que me atrapalhe. Na maior parte do tempo, estou trabalhando, discutindo. E rende. Sou insultado por tudo quanto é canto! (risos). Há pouco, publicaram uma antologia da literatura negra. E fui dizer que não há literatura branca, nem negra. Há literatura e ponto. Escrita por negros e brancos. Eu inventei de escrever isso. Para quê? Embora eu tenha dito que o maior escritor brasileiro é um mulato, sem nenhuma dúvida: Machado de Assis. As pessoas são cheias de preconceitos. Principalmente, quando falamos das minorias, mulheres ou gays. Não existe mais opinião. Existe preconceito. Se o cara mencionar uma opinião crítica sobre isso, ele é preconceituoso. Mas discuto sem raiva. É uma das funções do escritor.



             

O homem como invenção de si mesmo
De Ferreira Gullar. Editora José Olympio, 80 páginas. Preço médio: R$ 29,90.



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