quarta-feira, 23 de dezembro de 2009
Educação - Falta sensibilidade nas salas de aula
Professores da educação infantil não estão atentos às necessidades individuais dos alunos, o que prejudica qualidade de ensino.
Ouvir um aluno com atenção deveria ser natural ao trabalho de qualquer professor, especialmente daquele que ensina crianças pequenas. Mas a realidade em sala de aula é bem distante disso. Pesquisa realizada por aluna do mestrado da Faculdade de Educação mostra que os professores da educação infantil não são formados para dar atenção adequada a cada um dos alunos. Mas essa sensibilidade é essencial para identificar os anseios dos estudantes e aumentar a qualidade de ensino.
Leonília de Souza Nunes, autora do estudo Escuta Sensível do professor: uma dimensão da qualidade da educação infantil, propõe na dissertação defendida em novembro que os futuros educadores tenham uma nova postura em sala de aula: a da escuta sensível. O conceito, estudado em outras áreas do conhecimento como a Psicologia, ainda não faz parte do currículo dos cursos de Pedagogia no Brasil.
A ideia é mostrar ao universitário que é possível sim e, acima de tudo, é essencial ter sensibilidade com as crianças, dar atenção exclusiva a cada uma delas e manter o diálogo permanente em sala. “Se o professor tem sensibilidade para ouvir a criança e respeitar a sua individualidade, ele pratica a escuta sensível e é capaz de planejar suas ações de acordo com as necessidades apresentadas pelos alunos”, defende Leonília.
METODOLOGIA - A pesquisadora acompanhou, durante os meses de abril e agosto, duas professoras e 35 crianças, entre 4 e 5 anos de idade, em um centro municipal de educação infantil de Palmas, Tocantins. Nesse período, Leonília teve acesso aos planos de aula, trabalhos e regimentos da escola. A expectativa era encontrar um ambiente acolhedor nos colégios.
Mas, em muitos momentos, percebeu claramente o distanciamento das professoras em relação às crianças e a utilização de métodos nada construtivos para “educar” os alunos. Ela conta que uma das professoras dava desenhos de carinhas pretas para os desobedientes e carinhas amarelas para os comportados. “Essa atitude gera preconceito. A criança pode imaginar que, se o outro é negro, não é boa coisa”, critica.
Na observação dos métodos pedagógicos dos educadores, a pesquisadora identificou que os professores não conseguiam perceber, nas brincadeiras ou no silêncio das crianças, como as necessidades e os medos interferiam na formação deles. “A principal consequência é a insegurança. Algumas crianças tinham pavor de ir à escola. Outras, dificuldade de aprender o conteúdo. Essa sequela elas carregarão para o futuro. Pode abalar a autoestima da criança e a própria individualidade”, reflete.
FORA DOS CURRÍCULOS - Para Fátima Guerra, orientadora de Leonília, a pesquisa apresenta uma nova perspectiva para o professor no Brasil, principalmente os do ensino infantil. “Existem algumas ações isoladas, mas a escuta sensível não faz parte da cultura de formação do educador. Se você observar o currículo da Pedagogia, não vai encontrar nenhuma disciplina que trabalhe o assunto. Isso leva o professor a ter dificuldade de ouvir e de manter diálogos com as crianças”, explica a professora da Faculdade de Educação.
Com 22 anos de carreira docente, 16 deles dedicados à educação infantil, Leonília conta que sempre se preocupou em ouvir os alunos, mesmo em salas com até 35 crianças. “Já trabalhei em escolas particulares e públicas. Escolas que ficavam na periferia, onde os alunos chegavam com a roupinha rasgada. Trabalhei com alunos com diferentes deficiências. Essa experiência contribuiu muito para que eu desenvolvesse uma escuta sensível”, relata, justificando o interesse no assunto.
Leonília defende a ideia de que a dar atenção a cada aluno, mesmo em salas cheias, não é uma utopia. “No Brasil, existem professores que atravessam a nado um rio para dar aula. Alunos que estudam debaixo de árvores. Mesmo com todas as condições desfavoráveis, as crianças têm um excelente desenvolvimento de leitura, raciocínio lógico e matemático. Aí está a sensibilidade do professor. Se eu não tivesse trabalhado em sala de aula, diria que era um trabalho utópico”, ressalta.
Ela apresentará o resultado da pesquisa, em janeiro, a 500 professores da educação infantil de Palmas. Com eles, ela discutirá o conceito de escuta sensível. Também apresentará os quatro indicativos de qualidade que considera fundamentais para a educação: empatia, sensibilidade, diálogo e espelhamento de sentimento. Características que os professores que sabem ouvir com atenção seus alunos conseguem desenvolver. A pesquisadora ainda vai desenvolver um curso para trabalhar a escuta sensível com os professores dos municípios de Araguaina e Gurupi, em Tocantins.
UnB.br 23/12
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário